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3 A NOVIDADE DA SOLIDARIEDADE CRISTÃ

3.1 Aproximação entre atualidade e eternidade

3.1.1 A singularidade solidária de Jesus

Falar da singularidade de Jesus, em perspectiva solidária, significa olhar a história não só do ponto de vista da novidade imutável, mas em sua manifestação do amor de Deus pela humanidade. Um Deus que acolhe a humanidade em seu filho Jesus e por Ele revela todo seu amor. “Não se compreenderá a vida de Jesus, sem a cruz, como também não se compreenderá a cruz sem o caminho para ela. E por isso que a comunidade das origens pode reconhecer no Nazareno ‘o homem das dores’ de que fala o profeta. (cf. Is.53,3).”185 É na singularidade da cruz que a humanidade poderá encontrar o maior gesto de solidariedade e amor possível pela salvação de todos. O sofrimento e a morte na cruz tornam-se, certeza e esperança na Ressurreição. Uma história de amor revelada na luz trinitária.

A história da paixão aparece então como a consumação suprema da entrega de Jesus ao Pai por nosso amor: na luz trinitária revelada plenamente na Páscoa, mas já presente na relação filial única e exclusiva do Nazareno com Deus, ela é a história do Filho na carne, o seu caminho para a alteridade, ao encontro da morte do

183FORTE, Bruno. À Escuta do Outro, p. 141.

184A Igreja, através da Constituição Pastoral Gaudium et Spes, olha à condição humana. “Na verdade, os desequilíbrios que atormentam o mundo moderno se vinculam com aquele desequilíbrio mais fundamental radicado no coração do homem. Com efeito, no próprio homem muitos elementos lutam entre si. Enquanto, de uma parte, porque criatura experimenta-se limitado de muitas maneiras, por outra parte, porém, sente-se ilimitado nos seus desejos e chamados a uma vida superior.” (Cf. Gaudium et Spes, n. 230).

despojamento incondicional de si para dar-se ao Pai e levar-nos consigo para sua vida. 186

A história da paixão solidária encontra o êxodo e despoja-se até as últimas consequências o que garante a plenitude da vida. O amor que se revela na ternura do Pai e na compaixão por todos da terra se expressa na “singularidade única e irrepetível do Nazareno, funda-se no fato de que Ele, na Páscoa, foi proclamado Senhor e Cristo, isto é, foi ressuscitado, recebendo aquela abundância do Espírito (cf. Rm. 1,4).”187 Esse reconhecimento da história, nas origens da comunidade cristã, orienta o presente e encaminha o futuro, na experiência Pascal de Jesus de Nazaré, na qual todos participam. Forte assim a expressa:

Esse processo de ‘releitura pascal’ da história desenvolveu-se segundo um duplo movimento: de um lado, partiu do presente da comunidade em direção a Cristo, interrogando-se sobre a razão por que ele constitui o objeto de um interesse supremo; de outro, foi do Ressuscitado ao hoje dos crentes, para reconhecer os sinais e os instrumentos de sua presença. [...] Singularidade e contemporaneidade do Crucificado-Resssuscitado constituem, assim, as duas dimensões fundamentais, segundo as quais se exprime o alcance do evento pascal para todo o caminho do tempo. 188

A singularidade de Cristo constitui o alcance do evento pascal para a humanidade. Da mesma forma, em que traduz a redenção subjetiva da decisão humana no tempo. A questão fundamental da singularidade de Jesus Cristo centra-se em ser Ele o ungido do Pai na plenitude do Espírito Santo. A confissão originária dessa singularidade solidária de Jesus “é aquela que acolheu o dom de Deus, como ninguém jamais tinha acolhido, na história de sua obediência incondicional e dedicação voluntária ao Pai.”189 Nessa tendência a teologia situa a própria alteridade de Deus que reserva tempo aos homens e às mulheres da atualidade. É aqui que Deus faz um pacto, oferecendo-se, incondicionalmente, na força do Espírito Santo. Assim, todos participam do seu amor solidário no oferecimento da vida.

Em Jesus há possibilidade de reler a história e abrir-se ao outro, que não despreza o mundo, mas o acolhe em toda sua originalidade. Cuida do que é terreno e pressupõe salvação. Considera também a cristologia da fé no Ressuscitado. Um Deus que supera a morte e

186FORTE, Bruno. Jesus de Nazaré, p. 284. 187Ibidem, p. 307.

188Ibidem, p. 305. 189Ibidem, p. 308.

anuncia no horizonte histórico a libertação da humanidade.190 A esperança na ressurreição é sinal de vida e salvação. O que lembra a presença do Redentor, como imagem revelada e o primogênito de toda criatura. Portanto, Jesus é o enviado do Pai para cumprir a sua vontade e resgatar todos pelo seu amor.191

Outro aspecto imprescindível da singularidade de Jesus de Nazaré é, sem dúvida, a presença da comunidade nascente que se revela impregnada de esperança pascal. Esse mistério contém toda caminhada de Jesus presente na história como também a nossa própria história. Sonda-se aqui a história trinitária que cuida e edifica o Reino, de modo que a história humana possa ir ao Pai por Cristo no Espírito. Para Forte “a ressurreição não encerra a história na revelação antecipada do fim, mas abre o caminho do tempo, na promessa da presença consoladora do Deus trinitário, para o futuro, que ele prepara para o homem e com o homem.”192 A excelência do ser humano encontra seu fundamento no amor solidário de Deus, que assume a vida até as últimas consequências. Não obstante, a mudança do coração e da vida acontece pelo encontro com a Palavra da cruz libertadora. É a presença de um Deus fiel que abraça o êxodo e a possui na comunhão de sua própria alteridade.

Jesus é o Cristo, o Ressuscitado o Senhor da Vida, que vive o êxodo deste mundo para o Pai, o “reditus” à gloria da qual veio. Ele é a testemunha da alteridade de Deus em relação a este mundo, do Último em relação ao penúltimo, revelado como tal no julgamento da Cruz e Ressurreição do Pobre. Ele é o doador do Espírito Santo, a água viva que brota das fontes eternas para atualizar no tempo o dom de Deus e conduzir os homens à glória dele, todo em todos.193