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PERÍODO MODERNO

8. A teologia liberal protestante

Por cerca de dois séculos, os pensadores protestantes sustentaram uma cosmovisão cristã básica apoiada nas Escrituras e nos grandes credos cristãos históricos. Com o advento da modernidade, a razão e a ciência foram colocadas em pé de igualdade ou mesmo acima das Escrituras e da tradição. Surgiram duas opções para os pensadores influenciados pela nova mentalidade que queriam continuar cristãos: criar formas próprias de cristianismo (unitários) ou permanecer nas igrejas históricas e reinterpretar as doutrinas protestantes clássicas (liberais). A tarefa dos pensadores liberais protestantes foi descobrir a verdadeira essência do cristianismo e reconstruir a teologia em torno dessa essência. O termo “liberal” expressava a ênfase no direito do indivíduo de definir os termos da sua própria fé sem ser constrangido por nenhuma autoridade externa.

O objetivo dessa nova teologia não era simplesmente negar certas crenças, mas transformar o pensamento cristão à luz da filosofia, da ciência e da erudição bíblica modernas. Para esses teólogos, a própria sobrevivência do cristianismo como religião atraente para as novas gerações estava em jogo. Alguns pensadores radicais descartaram totalmente a crença no sobrenatural e nos dogmas clássicos, mas a maior parte preferiu simplesmente dar-lhes pouca ênfase ou reinterpretá-los. A modernidade com a qual interagiam foi um conjunto de perspectivas e atitudes que perdurou de meados do século 17 até meados do século 20. Correspondeu basicamente ao iluminismo e seus efeitos culturais posteriores. Seus temas básicos eram a supremacia da razão, a uniformidade da natureza e o progresso inevitável da humanidade. A partir dessa ênfase antropocêntrica, o principal papel da religião seria a educação moral dos seres humanos.

O maior pensador iluminista, e também o crítico mais contundente do iluminismo, foi o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804). Ele expressou muitos temas essenciais desse movimento, mas ao mesmo tempo restringiu a razão a uma esfera mais limitada do que os seus antecessores aceitariam. Em sua principal obra sobre a temática religiosa, A religião dentro dos limites da razão pura, ele restringiu o cristianismo ao âmbito da ética, depreciando tanto a religião revelada quanto a religião natural. Para Kant, a religiosidade autêntica era viver de acordo com os deveres racionalmente discerníveis; seu principal propósito era fornecer às pessoas fundamentos e instruções morais. Essa religião não- especulativa e não-sobrenatural não poderia entrar em conflito com a ciência. Mesmo assim, ele manteve a crença em Deus, na imortalidade da alma e nas retribuições morais após a morte.

Reagindo contra Kant, Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831), outro grande filósofo alemão, procurou reintroduzir um forte conceito de Deus que não contrastasse com a mentalidade científica moderna. Em Preleções sobre a filosofia da religião, ele explicou Deus como um Espírito (Geist) mundial imanente que está por trás da natureza, da história e da cultura, e com elas evolui. Deus e o mundo pertencem um ao outro e crescem juntos. A humanidade e a cultura humana são Deus chegando à autoconsciência. A nova teologia filosófica da modernidade, plenamente compatível com a ciência, herdou de Kant a ênfase no dever ético e de Hegel o conceito de Deus como força espiritual impessoal e universal que marcha com a história.

Até o início do século 19, os teólogos protestantes europeus em geral se opunham à modernidade sempre que ela entrava em conflito com a ortodoxia. Esse cenário mudou com Friedrich Daniel Ernst Schleiermacher (1768-1834), considerado o pai da teologia liberal moderna. Ele foi o primeiro teólogo protestante a propor mudanças radicais na ortodoxia para se harmonizar com o espírito da modernidade. Seu pai era um pietista fervoroso e o jovem recebeu sua formação acadêmica nessa tradição. Ao estudar na Universidade de Halle, recebeu a influência do pensamento iluminista e da filosofia de Kant, passando a ter dúvidas quanto a algumas doutrinas cristãs. Tornando-se ministro da igreja reformada, atuou como capelão hospitalar em Berlim e catedrático de teologia na universidade onde havia estudado. Em 1806 voltou para Berlim, onde pastoreou uma igreja influente e ajudou a fundar a Universidade de Berlim. Tornou-se deão da faculdade de teologia e adquiriu renome como herói nacional e grande intelectual.

A principal tendência cultural do fim do século 18 era o romantismo, uma reação à ênfase racionalista do iluminismo. Os românticos celebravam os “sentimentos”, ou seja, os anseios humanos profundos e a apreciação da beleza da natureza, dando origem a um florescimento das artes (por exemplo, Goethe na literatura e Beethoven na música). Na tentativa de influenciar seus contemporâneos românticos, céticos quanto ao cristianismo tradicional, Schleiermacher escreveu uma obra que se tornou clássica – Sobre a religião: discursos aos seus menosprezadores cultos (1799). Insistiu que a essência da religião não está em argumentos racionais, dogmas revelados ou rituais eclesiásticos, mas num profundo sentimento (Gefühl) de total dependência de uma realidade infinita. O cristianismo tem uma forma peculiar e mais sublime dessa consciência universal, intrínseca à natureza humana. O importante é descobrir e alimentar essa religiosidade latente que existe dentro de cada um.

A partir desse fundamento, Schleiemacher elaborou um sistema de doutrina cristã para os tempos modernos em sua obra mais importante, A fé cristã (1821, revista em 1830). Esse livro foi considerado o texto mais significativo e sistemático de teologia protestante desde as Institutas de João Calvino. O objetivo do teólogo alemão foi apresentar uma alternativa à religiosidade vaga de Kant e Hegel, levando em conta os avanços do pensamento moderno. Nessa obra, ele se referiu ao Gefühl como “ter consciência de Deus”. A teologia cristã seria uma tentativa de colocar em palavras o sentimento religioso. A essência do cristianismo foi definida como a plena consciência da dependência de Deus e de Jesus Cristo como o vínculo com ele. As Escrituras e as doutrinas cristãs deviam ser avaliadas por esse critério básico. Apelando à tradição pietista, Schleiermacher considerou

a experiência religiosa a autoridade suprema em matéria de fé. A Bíblia é o registro das experiências religiosas do antigo povo de Deus. Não é divinamente inspirada nem infalível. A doutrina de Deus foi reconstruída da mesma maneira. Falar em Deus é sempre falar da experiência humana de Deus. A doutrina da Trindade e a crença em milagres foram consideradas de pouca utilidade. O liberalismo de Schleiermacher aparece mais claramente em sua cristologia. Para ele, Jesus Cristo tinha a mesma natureza que o restante da humanidade. A única diferença é que desde o início ele teve plena consciência de Deus. Ele foi o Salvador no sentido de que transmitiu essa consciência aos outros por meio de sua comunidade, a igreja. Seu conceito de expiação se aproximou da teoria de Abelardo, a influência moral. Jesus é somente um “ser humano exaltado”, à semelhança da antiga posição adocionista. Como era inevitável, a teologia liberal de Schleiermacher sofreu críticas à esquerda (demasiadamente cristão) e à direita (subjetivismo total).

Um nome mais estreitamente ligado à teologia liberal protestante é Albrecht Ritschl (1822-1889), que foi por muitos anos professor de teologia sistemática na Universidade de Göttingen, na Alemanha. Toda uma geração de teólogos foi treinada na sua teologia. Ritschl buscou separar a teologia da ciência mediante duas estratégias: primeiro, argumentando que as proposições de ambas são totalmente diferentes (a ciência trata de fatos e a religião, de valores); segundo, afirmando que a essência do cristianismo é inteiramente compatível com a cosmovisão moderna. Assim, rejeitando as especulações metafísicas de Hegel e Schleiermacher e apelando ao pensamento de Kant, ele limitou a religião e a teologia à esfera dos valores. A essência do cristianismo está no ideal de Jesus quanto ao “reino de Deus”. Esse reino, que é o interesse central da teologia, consiste na unidade ideal da humanidade, fundamentada no amor. O cristianismo não é uma religião referente a outro mundo, mas à transformação deste mundo mediante a ação ética inspirada no amor. Ser cristão é procurar estabelecer o reino de Deus na terra de modo relevante, racional e prático. Como Kant, Ritschl reduziu o cristianismo à moralidade. Ele também reinterpretou a divindade de Jesus. Ela somente significa que Jesus cumpriu plenamente a sua vocação de corporificar o reino de Deus entre os seres humanos. Ele não preexistiu à sua vida humana a não ser na mente de Deus.

Se por um lado a teologia liberal tornou a religião imune às novas descobertas da ciência, por outro lado resultou na subjetivação quase completa da fé cristã, reduzida à experiência espiritual (Schleiermacher) e moral (Ritschl). Três temas principais condicionaram essa teologia: primeiro, a imanência divina, ou seja, a continuidade entre Deus e a natureza numa espécie de panteísmo ou de panenteísmo (mutualidade entre Deus e o mundo); segundo, por influência de Kant, a moralização do dogma, isto é, a tendência de reinterpretar todas as doutrinas cristãs em termos éticos e morais; terceiro, a crença na salvação universal da humanidade (universalismo).

Um dos maiores divulgadores do liberalismo protestante foi Adolf Harnack (1851- 1930), professor de história da igreja e teologia histórica na Universidade de Berlim e um intelectual de grande prestígio na Alemanha, inclusive na esfera política. Foi o sucessor de Schleiermacher e Ritschl como líder do liberalismo teológico clássico. Escreveu a volumosa História do dogma, na qual tentou demonstrar a helenização do pensamento cristão antigo e apelou à redescoberta do evangelho simples de Jesus Cristo. Em sua obra O

que é o cristianismo?, sintetizou a essência da fé cristã em três grandes idéias apresentadas por Jesus: a vinda do reino de Deus (o governo de Deus no coração das pessoas); Deus como Pai e o valor infinito do ser humano (“a paternidade de Deus e a fraternidade dos homens”); e a justiça centralizada no amor.

O pensamento de Harnack contribuiu nos Estados Unidos para o surgimento do “evangelho social”, cujo principal articulador foi o pastor e teólogo batista de origem alemã Walter Rauschenbusch (1861-1918). Seguindo os passos do pai, ele lecionou teologia e história da igreja por muitos anos no Seminário Teológico de Rochester, no Estado de Nova York. Ao formular o evangelho social, foi influenciado por Ritschl e pelo ensino de Harnack sobre o “evangelho simples” de Jesus acerca do reino de Deus. Sua obra derradeira e mais importante foi Uma teologia para o evangelho social (1917), na qual reorientou totalmente a teologia para a ética social. Deu destaque especial à “salvação dos seres superpessoais”, ou seja, as grandes estruturas da vida social (estado, corporações). A obra que mais ajudou a popularizar os ideais do evangelho social foi a novela Em seus passos que faria Jesus, de Charles Sheldon. A teologia liberal chegou ao seu apogeu na década de 1920. Sua visão otimista acerca da humanidade foi contestada tanto pelos novos acontecimentos (I Guerra Mundial, crise econômica) quanto por outras correntes teológicas (fundamentalismo, neo-ortodoxia). Deixou um legado duradouro, que se manifesta no desinteresse pela doutrina e piedade tradicionais e ênfase na formação moral e no ativismo social.

Textos: Scheiermacher, Sobre a religião.

Análises: Olson, 547-568; González, III:353-394; Lane, II:78-90; Hägglund, 307-327; Küng, 149-176; McGrath, 133-135, 138-141, 422-423; Costa, 283-315; Tillich II, 113-151, 225-228.

9. O fundamentalismo

A crescente influência da teologia liberal nas igrejas, seminários e ambiente cultural dos Estados Unidos provocou uma forte reação conservadora no início do século 20, denominada fundamentalismo. O termo provém do esforço dos protestantes conservadores no sentido de defender os “fundamentos” da fé cristã e bíblica que eles consideravam ameaçados pelo liberalismo ou modernismo teológico. Esse movimento pode ser definido como uma forma específica de ortodoxia protestante norte-americana que reagiu contra a teologia liberal do século 19 e início do século 20. Em oposição ao relativismo da teologia liberal, os fundamentalistas adotaram uma postura de afirmação intransigente de doutrinas consideradas essenciais, a começar da inspiração verbal e da inerrância das Escrituras. O que distinguiu o fundamentalismo de outros grupos conservadores foi sua atitude de militância agressiva, intolerância diante de posições divergentes e, em situações mais extremas, radicalismo separatista. Essas características contribuíram para a imagem negativa do movimento e de seu nome na mídia e na cultura popular. O fundamentalismo foi mais ativo no período de 1910 a 1960 e experimentou diferentes fases e tendências.

Os antecedentes históricos do fundamentalismo remontam à ortodoxia protestante do período posterior à Reforma, com sua metodologia escolástica, definição minuciosa das

doutrinas confessionais e ênfase na inspiração e infalibilidade das Escrituras. Um dos principais expoentes do escolasticismo reformado foi o teólogo ítalo-suíço François Turretin (1623-1687), autor de uma teologia sistemática altamente complexa em três volumes, Institutio theologiae elencticae. Em sua defesa da autoridade bíblica, esse estudioso chegou a afirmar que até os pontos vocálicos do texto hebraico do Antigo Testamento eram divinamente inspirados. Em 1812, quando foi fundado o primeiro seminário presbiteriano dos Estados Unidos, em Princeton, Nova Jersey, a obra de Turretin se tornou o principal livro-texto utilizado na formação teológica e pastoral dos futuros ministros. Durante mais de um século (1812-1921), quatro teólogos e professores calvinistas – Archibald Alexander, Charles Hodge, Archibald Alexander Hodge e Benjamin Breckinridge Warfield – ensinaram o que ficou conhecido como Teologia de Princeton, uma versão da ortodoxia protestante adaptada ao contexto norte-americano. Essa teologia lançou os alicerces doutrinários do futuro fundamentalismo.

O maior desses precursores foi Charles Hodge (1797-1878), procedente de uma família presbiteriana conservadora da Nova Inglaterra. Ele freqüentou o Seminário de Princeton, onde se dedicou ao estudo da obra de Turretin. Após a formatura e ordenação, aprofundou os estudos em várias universidades européias, nas quais teve contato com a teologia liberal, que considerou inadequada em contraste com sua própria herança calvinista. Buscando um fundamento filosófico para sua teologia, descobriu o realismo escocês do senso comum, de Thomas Reid (1710-1796), segundo o qual os seres humanos são dotados de faculdades que proporcionam observações e idéias confiáveis acerca do mundo. Basta reunir e classificar as evidências, generalizando cuidadosamente tais fatos. Com Hodge, esse se tornou o embasamento filosófico da teologia de Princeton. Em sua volumosa Teologia sistemática (1871-1873), ele tratou a teologia como uma ciência racional cujo método consiste em coletar e organizar os dados da revelação bíblica, assim como a ciência o faz com os dados da natureza. A partir daí, Hodge elaborou um sistema altamente coerente de teologia reformada conservadora. Esse sistema se apoiava inteiramente nas Escrituras, que Hodge considerou verbalmente inspiradas, infalíveis e normativas, contendo proposições, ou seja, declarações da verdade, que deviam ser organizadas por seres humanos racionais, orientados pelo Espírito Santo.

A crítica de Hodge à teologia liberal se concentrou em Schleiermacher, cujas preleções havia assistido em Berlim. Considerou sua influência perniciosa e debilitante por causa de seu subjetivismo e por reduzir o cristianismo a uma intuição mística. O sistema doutrinário de Hodge foi uma expressão da ortodoxia protestante clássica como algo a ser defendido e transmitido fielmente, sem inovações. Deu ênfase à majestade e soberania de Deus, mas no tocante à eleição optou pelo infralapsarismo. Condenou o arminianismo como uma concessão ao humanismo e um atalho para o liberalismo. Suas posições foram mantidas e reforçadas por seu discípulo Benjamin Warfield, que o sucedeu como professor de teologia didática e polêmica em Princeton (1887-1921). Nessa época, a Igreja Presbiteriana do Norte experimentou uma longa controvérsia sobre a natureza das Escrituras e a “alta crítica”, ou seja, os novos métodos literários e históricos de investigação da Bíblia que questionavam conceitos tradicionais de autoria, data e composição dos livros bíblicos. Em artigos e livros Warfield defendeu o alto conceito das Escrituras adotado pela teologia de Princeton, insistindo que a alternativa seria o desvio para o liberalismo e o relativismo. Curiosamente, esses dois teólogos não encararam a teoria darwinista da

evolução como uma ameaça para a ortodoxia, considerando-a um recurso que Deus poderia ter usado na criação.

Esses teólogos calvinistas prepararam o terreno para o fundamentalismo de três maneiras principais: identificando o cristianismo com a doutrina correta; dando ênfase à revelação como verdade objetiva e proposicional comunicada por uma Bíblia inspirada e inerrante; oferecendo respostas polêmicas à teologia liberal e aos métodos da alta crítica. Considera-se que movimento propriamente dito teve início em 1910, quando dois homens de negócios patrocinaram a publicação e ampla distribuição de doze brochuras com ensaios escritos por destacados estudiosos protestantes conservadores, sob o título Os fundamentos. Essa série foi uma resposta conservadora à teologia liberal e ao popular e influente evangelho social. Ao longo daquela década vários grupos começaram a elaborar listas de doutrinas consideradas fundamentais, tais como a inerrância da Bíblia, a Trindade, o nascimento virginal de Cristo, a queda da humanidade, a expiação vicária, ressurreição e ascensão de Cristo e até mesmo a crença pré-milenista quanto ao retorno de Cristo. Entre as primeiras organizações do movimento estavam a Associação Cristã Mundial dos Fundamentos, criada em 1919 pelo pastor W. B. Riley (1861-1947) e a Associação dos Fundamentalistas, fundada no ano seguinte pelo batista Curtis Lee Laws, diretor de uma revista conservadora.

O teólogo mais erudito do movimento foi J. Gresham Machen (1881-1937), um ex- aluno de Warfield no Seminário de Princeton, no qual lecionou Novo Testamento de 1906 a 1929. Antes disso, estudou teologia em algumas universidades alemãs, onde conheceu de perto o liberalismo. Em virtude de sua posição e qualificações, Machen se envolveu em várias disputas na defesa da fé reformada histórica. Escreveu um livro influente, Cristianismo e liberalismo (1923), no qual argumentou que a teologia liberal representava uma religião diferente do cristianismo. Todavia, ele não se sentia inteiramente à vontade entre os líderes fundamentalistas, por não concordar com suas posições pré-milenistas e antievolucionistas. Em 1926, após um processo em que não teve oportunidade de defesa, ele foi forçado a sair da sua denominação. Com outros colegas, fundou a Igreja Presbiteriana Ortodoxa e o Seminário Teológico Westminster, em Filadélfia.

Inicialmente o fundamentalismo foi uma força cultural e política respeitável, com grande potencial para influenciar positivamente o cenário teológico e religioso norte- americano. Todavia, em 1925 um episódio trouxe descrédito e humilhação ao movimento – o caso Scopes ou “julgamento do macaco”. John Scopes, um professor de biologia, foi preso sob a alegação de ensinar o evolucionismo, o que era contrário às leis do seu estado, o Tennessee. A União Americana de Direitos Civis contratou para defendê-lo um famoso advogado criminalista de Chicago, o agnóstico Clarence Darrow. Atuou como promotor de acusação o político populista de Nebraska e ex-candidato à presidência William Jennings Bryan, de 65 anos, um líder emergente do fundamentalismo. Embora Scopes tenha sido condenado, a atuação decepcionante de Bryan aliada à cobertura sensacionalista da imprensa deu aos fundamentalistas uma imagem de tolos obscurantistas em total descompasso com a era moderna. Cinco dias após o julgamento, Bryan morreu em desonra e mais tarde as leis antievolucionistas foram revogadas.

Nos anos seguintes, agravou-se a polarização entre fundamentalistas moderados e radicais. Neste último grupo, líderes como John R. Rice, Bob Jones e Carl McIntire insistiram na prática da “separação bíblica”, recusando-se a conviver com cristãos conservadores que cooperassem com não-fundamentalistas. O rompimento definitivo entre os dois grupos ocorreu em 1941, quando McIntire criou o Concílio Americano de Igrejas Cristãs e no ano seguinte os moderados fundaram a Associação Nacional de Evangélicos, sob a liderança de um pastor congregacional de Boston, Harold John Ockenga (1905-1985). Essa associação passou a incluir um grande segmento do protestantismo conservador norte- americano, composto de reformados, batistas e pentecostais. Um dos seus líderes mais conhecidos foi o evangelista Billy Graham (1918-). Nas décadas subseqüentes, a ala ultraconservadora, a única que continuou a denominar-se fundamentalista, acabou isolando- se e ficando na defensiva à medida que promovia campanhas contra o evolucionismo, o comunismo, o ecumenismo e a favor do dispensacionalismo.

Do ponto de vista teológico, as características marcantes do fundamentalismo são as seguintes: (a) ênfase na inspiração verbal e na inerrância das Escrituras, aliada a uma hermenêutica fortemente literal; (b) oposição militante e intensa à teologia liberal em todas as suas formas; (c) identificação do cristianismo autêntico com um sistema ortodoxo de doutrinas. O legado do movimento se traduz em um grande número de igrejas e ministérios, bem como editoras, livrarias, colégios e institutos bíblicos, tanto nos Estados Unidos quanto em outros países. Todavia, a maior parte dos evangélicos preferem ser conhecidos como conservadores, não fundamentalistas, revelando maior afinidade com o início do fundamentalismo e com personagens como Gresham Machen.

Textos:

Análises: Olson, 569-584; Lane, II:96-101. 10. A neo-ortodoxia

Uma importante corrente teológica do século 20 é a neo-ortodoxia, também denominada teologia dialética, nova teologia da Reforma e teologia da Palavra de Deus, que foi uma reação tanto contra o liberalismo (acomodação ao espírito moderno), quanto contra o fundamentalismo (biblicismo, literalismo), atraindo as críticas de ambos. Buscou resgatar os grandes temas protestantes e reformados da depravação humana, supremacia da