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1 2 Perguntas de pesquisa

Capítulo 3 Metodologia do Estudo

2 Revisão da literatura

2.2 A teoria do eu estendido

Compreendendo o consumidor como ser e reconhecendo o Eu como elemento dinâmico que impacta de todas as maneiras as atividades de consumo, Belk (1988) ofereceu uma nova perspectiva de estudo para a área de comportamento do consumidor, por meio do conceito de Eu estendido (Extended Self). Ele sustentou que a chave para a compreensão do

que as posses significam seria o reconhecimento de que os indivíduos consideram suas posses como parte de si mesmos.

Antes de aprofundar o conhecimento sobre a ideia do Eu estendido, é importante conceituar possessividade. Ela é considerada por Belk (1983, p. 514) como sendo “a inclinação e a tendência em reter controle ou propriedade sobre uma posse”. Esta posse não diz respeito apenas aos objetos tangíveis ou à propriedade legal sobre algo, podendo ser ampliada para experiências e pessoas (PONCHIO; STREHLAU, 2011).

A ideia de Belk acelerou e solidificou o interesse dos pesquisadores nas formas como o consumo auxilia na definição do senso pessoal do Eu (AHUIA, 2005), compreendendo o

self, também chamado de senso de Eu ou identidade, como sinônimo de como o indivíduo

subjetivamente percebe quem ele é. Este autor distingue self (eu) do self estendido (meu) ao considerar o self como o ser e o Eu estendido como as posses na forma da extensão daquilo que o indivíduo é. Como Ponchio e Strehlaau (2011, p. 301) revelam, “o self está relacionado à forma como as pessoas se enxergam, ou seja, à sua identidade; já o self estendido é aquilo que o indivíduo enxerga como seu, estendendo a sua identidade aos objetos que possui”. Por meio da posse destes objetos, é permitido aos indivíduos revelarem suas crenças, atitudes e aspirações.

De modo a elucidar a discussão aqui lançada sobre a definição de self e self estendido, o Quadro 2(2) foi desenvolvido. Ele contém as conceituações destes dois construtos que são adotados no presente estudo, apontando também alguns autores que sustentam as definições seguidas. Entre eles, os autores base para a compreensão do self (SIRG, 1982), e do extended-

self (BELK, 1988), que guiaram esta dissertação.

Definição Autor (ano)

SELF Sinônimo de identidade ou autoconceito, o self é entendido como a maneira que o indivíduo se define, sendo composto por percepções presentes, passadas e futuras. Apresenta diversas dimensões, tais como o self real (o que sou) e o self ideal (como gostaria de ser).

Sirg (1982); Belk (1988);

Ponchio; Strehlau

SELF ESTENDIDO

Os indivíduos consideram suas posses como partes de si mesmos. Assim, entende-se como self estendido a identidade do indivíduo transpassada e exposta pelo bem que possui, dotado de significados que definem o seu possuidor.

Belk (1988); Ahuia (2005);

Ponchio; Strehlau

(2011);

GJERSOE et. al (2014). Quadro 2(2): Definição do self e do self estendido.

Fonte: Desenvolvido pela autora a partir dos autores citados no quadro (2015).

O conceito de Eu estendido engloba posses que vão além do corpo físico e dos processos cognitivos, incluindo todos os objetos que os indivíduos mantém como sua propriedade (GJERSOE et. al, 2014). Assim, o Eu estendido pode ser composto por objetos externos e posses pessoais, pessoas e lugares que os indivíduos consideram como seus, além de partes do corpo e órgãos vitais (BELK, 1988). Destas categorias, pessoas, lugares e coisas parecem ser as mais claramente estendidas (BELK, 2013).

O Eu estendido é um Eu vivido por meio de um conjunto concreto de pessoas, lugares e coisas em um caminho triplo em vez de puramente uma ideia abstrata sobre como o indivíduo se autodefine (BELK, 1988; TIAN; BELK, 2005). Esta compreensão revela a relação tripartite existente no processo do Eu estendido. Em vez de uma interação entre pessoa e coisa, tem-se uma relação pessoa-coisa-pessoa (BELK, 1988; AHUIA, 2005). O self não se encontra isolado dos outros; muito pelo contrário, os outros influenciam o consumo e a identidade dos indivíduos de várias maneiras (RUVIO; BELK, 2013). Por exemplo, parte do desejo de um indivíduo pela propriedade de um objeto reflete uma relação de competição com o outro que pode também querer o objeto de propriedade alheia.

Outro aspecto a se considerar na inicial Teoria do Eu estendido de Belk (1988) é que o

self é entendido como uma estrutura consistente composta por múltiplas camadas,

apresentando um self nuclear expandido para incluir itens que podem se tornar parte do Eu estendido. Reconhece-se que;

Algumas posses são mais centrais para o self do que outras. As posses centrais para o self podem ser visualizadas em camadas concentradas em torno do self nuclear, e diferirá entre indivíduos, ao longo do tempo e ao longo das culturas que criam significados simbólicos compartilhados para diferentes bens (BELK, 1988, p. 152).

Belk (1988) afirma que sua Teoria do Eu estendido tem como foco um conceito individualista do Eu, existindo tempos e lugares onde a noção do Eu é mais coletivista do que individualista. Apoiando esta consideração, Kitayama e Park (2013) reforçaram a importância de se considerar a cultura para a compreensão do self, reconhecendo diferenças nos processos cognitivos, emocionais e motivacionais entre culturas ocidentais e culturas orientais.

Complementando as ideias de Kitayama e Park (2013), Gjersoe et al. (2014) revelaram que o grau de importância que pessoas dão para a relação entre o seu Eu e a posse pode ser fortemente influenciado por fatores culturais. A autenticidade dos itens e o contágio das posses por meio do seu proprietário anterior, por exemplo, influenciam no Eu estendido de forma diferente ao perceber o quão individualista ou coletivista é uma sociedade. No Ocidente, por exemplo, itens contagiados por celebridades tem maior valor monetário quando comparados ao valor atribuído a estes produtos no Oriente (GJERSOE, et al, 2014).

As posses presentes no Eu estendido também oferecem aos indivíduos um arquivo pessoal que os permitem refletir sobre suas histórias e como eles mudaram ao longo do tempo (BELK, 1988). A acumulação das posses fornece um senso do passado e mostra quem os indivíduos são, onde têm que estar e para onde estão indo (BELK, 1988). Ao adicionar a dimensão do tempo na visão do Eu estendido, os indivíduos se tornam personagens mais ricos, literalmente e figurativamente multidimensionais (BELK, 1991). A partir desta consideração, percebe-se a importância das posses que ligam o indivíduo a um futuro desejado ou esperado e não apenas a um passado vivenciado (BELK, 1990).

Ademais, as posses auxiliam na construção dos estilos de vida e revelam informações a respeito de seus proprietários, do grupo ao qual pertencem e de suas relações enquanto seres sociais. O ato de tê-las está intimamente relacionado às questões do ser e do fazer. Como revelam Roux e Korchia (2006), a posse do objeto não é apenas o desejo de tê-lo, mas um

desejo de ser unido com tal objeto em uma relação íntima. Assim, o fato de perdê-las de maneira não intencional gera uma diminuição ou perda de uma parte do Eu (BELK, 1988).

Partindo-se do princípio do Eu estendido, é possível considerar que as pessoas são, até certo ponto, o que elas possuem (BELK, 1988; OLIVEIRA; TROCCOLI; ALTAF, 2012). A propriedade ou pelo menos o senso de propriedade, portanto, surge como elemento central nesta teoria, seja ela uma propriedade individual ou coletiva, permanente ou temporária.

O trabalho de Belk (1988) para o desenvolvimento do conceito de Eu estendido gerou muitas especulações, concordâncias e críticas. Suas ideias contribuíram para que as discussões sobre a relação entre o self e o consumo fossem realçadas e, por meio delas, outros conceitos foram desenvolvidos. As principais críticas, novas compreensões e reformulações sobre a teoria do Eu estendido são apresentadas na subseção seguinte.

2.2.1

Críticas,

desdobramentos,

novas

compreensões

e