• Nenhum resultado encontrado

Eu vi quando eles botaram lá perto do mercado São José, eles fizeram a

4.2.2 Aspectos no uso (ou na participação como usuário) do projeto

4.2.2.6 Vantagens do Projeto

Apesar dos problemas descritos pelos informantes sobre o projeto Bike PE, estes continuam a utilizá-lo. Existem, portanto, vantagens que fazem com que os usuários se mantenham neste tipo de compartilhamento. Esta seção traz a análise destas vantagens de acordo com a narrativa dos entrevistados.

Alguns deles elogiaram a ideia do projeto em si, de possibilitar o acesso sem a necessidade da posse, levando em consideração os benefícios de tal prática em detrimento da propriedade.

Eu acho que o que é bom desse projeto é a parte de poder ter um meio, pra

quem não tem bicicleta, de utilizar, juntar amigos e sair, não ficar em

casa só as redes sociais usando a internet em casa (Entrevistada 5).

Vale a pena. Vale a pena, porque eu faço as minhas pedaladas sem

grandes preocupações. Vou até um destino, paro, dou um tempo e tá lá, tá

entregue. Quando eu preciso pego de novo e isso aí, não fico com aquele

cuidado né, não tenho que ficar olhando se todos vão roubar, se não vão

roubar, entreguei a bicicleta, botei na estação, pra mim vale a pena (Informante 10).

Vale, vale, porque como eu não posso ter bicicleta, no caso meu pai não

quer me dar uma bicicleta, aí o projeto facilita. No meu caso eu queria

usar a bicicleta pra andar no final de semana, ir pro marco zero que é mais rápido. E a questão de não tá usando carro, não tá usando ônibus também, porque é estressante, até no final de semana é estressante usar ônibus aqui em Recife. Então eu acho que é uma questão mais assim, de relaxar (Informante 12).

Com certeza, é muito válido. Sempre é válido você oferecer ao usuário um

uso compartilhado, isso inclusive também, penso eu, estimula a consciência de coletivo. Por mais que tenha problemas, eles sempre vão

surgir, até por ser também um projeto muito novo, numa situação de feedback, mas eu acho que sim. Acho válido [...].Ele estimula o pensamento coletivo de que eu vou preservar esse bem, porque outra pessoa vai usar/ eu também talvez use no futuro, preservar as estações também. Uma coisa que eu andei reparando e já vi que duas estações estavam pichadas, mas a grande maioria está intacta, não tem dano aquele bem. Penso eu também que os movimentos que causam dano, que picham como uma forma de revolta, vêm naquilo ali, como eu vejo, um estímulo ao coletivo. Ao, quê mais? Tinha duas palavrinhas que eu queria falar. [...] Então isso é muito bom pras pessoas que querem fazer exercício físico também, pessoas de idade, também é válido, você não tem que ter aquele bem na sua casa, você não

tem que ter a manutenção daquele bem na sua casa, tem pessoas que não tem nem onde colocar, moram num apartamento, não tem lugar

embaixo pra guardar, não vai querer gastar com corrente e etc, não tem que botar em cima. Então você vai lá na esquina, na praça, pega a bicicleta, dá uma volta na cidade e depois guarda ela de novo. Pra quem tem aplicativo você pode ver se aquela estação que você vai guardar tem bicicleta, também é cômodo. Então eu acho que ele veio com uma proposta muito boa, muito inovadora e muito, muito válida, é uma das coisas que falta na nossa

sociedade também, uma malha viária planejada previamente. Acabamos

tendo muitos carros e é uma dificuldade o trânsito. O fato de ter bicicletas a disposição da sociedade também é uma, é um ponto a mais, um pró. Na nossa sociedade também de pessoas adultas, consome muita comida sem os nutrientes adequados, fico me referindo à possibilidade de obesidade. Então você podendo usar aquela bicicleta como um esporte, o exercício físico também combate isso. É um pró também a questão da saúde. Uhn, quê mais?

[pausa] E também é um uso de transporte que não agride o meio ambiente, é bom ressaltar isso também. Que a grande maioria dos meios de transporte que os seus usos eles vão causar danos ao meio ambiente de uma forma ou de outra, e o simples uso, talvez a manutenção, a troca, mas o simples uso não causa [refere-se a bicicleta]. Isso é outro ponto também (Informante 18). Eu acho que o projeto é uma iniciativa muito massa, é coletiva, mas eu acho que ainda falta muito pra chegar no nível que ele poderia chegar, entendeu. É tipo mais zelo. Eles começam uma coisa massa e do nada, não sei por que motivo, por falta de uso não é, eles param de fazer o negócio, eles não continuam tomando conta, sei lá o que acontece (Informante 22).

De fato, o Consumo Colaborativo surge como uma possibilidade de oferecer acesso aos indivíduos sem que esses tenham a necessidade de possuir o bem acessado (BELK, 2014a; BARDHI; ECKHARDT, 2012). Por meio do projeto Bike PE, os usuários utilizam as bicicletas sem precisar adquiri-las. Tal prática possibilita aos usuários uma interação e socialização com os demais ciclistas (informante 5) a fim de gerar uma identidade grupal que integre o self (BELK, 2013), uma pedalada relaxada sem grandes preocupações com a manutenção e com o local adequado para deixar a bicicleta (informantes 10, 12 e 18), além de estimular a consciência coletiva (informantes 18 e 22). Esta consciência é apontada por Botsman e Rogers (2011) como a crença no bem comum, um dos princípios do Consumo Colaborativo. Os usuários passam a compreender que certos bens podem ser úteis para todos, de modo que haja a colaboração entre os pares no uso e compartilhamento correto do que é compartilhado (JORGE; BRASIL; FERREIRA, 2013; VAQUERO; CALLE, 2013). Ainda destaca-se o elemento da reurbanização (BARDHI; ECKHARDT, 2012) na fala do informante 18, revelando que é vantajoso o acesso à bicicleta para aquelas pessoas que não possuem espaço em suas casas para guardar este objeto.

O projeto ainda pode auxiliar na melhoria da qualidade de vida e na diminuição da poluição urbana, havendo também uma economia de tempo.

Vale, vale muito a pena porque no meu caso eu utilizo pra locomoção e pra exercício físico, pra trazer uma melhor qualidade de vida. E assim, facilita e muito minha vida. Muitas vezes eu saio em cima da hora, pego a

bicicleta e em dois minutos eu chego em algum lugar que eu desejava. E

assim facilita muito, traz uma melhor qualidade de vida, praticar exercício, um movimento pra o organismo, os benefícios são show de bola né, e

também pra pessoas que só utilizam o carro, moto, que tem o seu meio de locomoção próprio e diminui o impacto no meio ambiente, emissão de CO2, desses gases e até pelo trânsito também, diminui o trânsito. Não ajuda a piorar ainda mais e pelo que eu vi, vez ou outra eu entro no site na internet, e eu sempre vejo que têm um numerozinho de redução dos gases né. E assim, é um projeto fantástico, que eu acredito que deveriam existir mais estações, mais investimento nesse projeto pra que mais pessoas possam aderir, ter uma melhor qualidade de vida, ter facilidade de locomoção, de acesso aos lugares e, enfim, diminuir os impactos na natureza (Informante 11).

A questão do projeto eu acho que tem que ter, acredito que deve haver uma revisão realmente de como esse projeto pode ser inserido, porque é algo inovador, algo que pode mudar muito a qualidade de vida, não só com relação à mobilidade, mas também com relação à saúde da população. A gente fala tanto de sustentabilidade, fala tanto de mudança, mas a gente acaba às vezes indo no mercado e comprando um produto que não é reciclável e não fazendo diferença no dia-a-dia. Incentivar o não uso de carro, acho que tem muito a expandir, isso pra todo mundo poder ter acesso (Informante 20).

Apesar de não ser a principal finalidade do Consumo Colaborativo, suas práticas possibilitam uma menor degradação do meio ambiente (BOTSMAN; ROGERS, 2011; COSTA, 2014). Tal elemento é percebido pelos informantes 11 e 20, trazendo junto consigo o aspecto social da sustentabilidade ligado à saúde e qualidade de vida da população (SACHS, 2002). A capacidade da bicicleta se apresentar como modal rápido mediante os engarrafamentos também é apontado pelo entrevistado 11 como vantagem, fazendo-lhe poupar tempo para chegar aos lugares.

Por fim, alguns usuários apontam que o projeto apresenta vantagens para aqueles que o utilizam com o intuito de lazer.

Eu acho que primeiro um lazer gratuito, porque dez reais pro custo de vida que hoje você tem, que vai pro shopping, pro cinema e paga cinema, paga estacionamento, então a todo momento a sua vida você tá a todo momento sendo cobrada alguma taxa. Então até se você se deslocar, tem lugares que você vai pagar um pedágio, Se você for pro Paiva, lá perto de Recife, você paga pedágio. Então dez reais hoje em dia é um valor simbólico que eles cobram. E é justamente isso, um lazer, você vai ter contato com a

natureza, ou o que restou dela, num espaço público, com segurança, pelo menos lá na orla é seguro, com um sistema que funciona e você tem boas

bicicletas, porque até agora eu não peguei uma bicicleta que eu cai, que a corrente quebrou. É uma realidade que você não vê aqui no Brasil. O tanto que eu pensava que não funcionava essas coisas (Informante 1).

Você tendo uma paciência, né, mantendo seu chakra alinhado, tendo

paciência mesmo pra usar, você consegue, tendo paciência com os

atendentes, “Ah, beleza”. Mas como eu usava antigamente todo dia, eu

dependia da bicicleta pra ir pro trabalho, aí eu me irritava mais. Hoje

em dia não, eu uso uma vez por semana, aí não me afeta tanto, diminui um pouco né, mas vale a pena, devia ter mais, devia melhorar, pra valer mais a pena ainda (Informante 4).

Vê, ele é um projeto que eu gosto muito, do Bike PE. Eu tenho um carinho muito grande pelo Bike PE, porque ele é uma iniciativa inovadora no Recife, não foi uma iniciativa inovadora no mundo porque isso daí é fichinha pra o que existe em outros lugares, mas ele foi uma iniciativa, eu comecei a ser adepto depois do Bike PE, sabe. Quando eu subi na bicicleta do Bike PE e fui pro Recife antigo e comecei a viver mais a cidade, eu não sei se tu vai abordar essa questão de vivência da cidade na tua pesquisa também, mas a

bicicleta é uma coisa que lhe aproxima muito do centro urbano, da cidade. Eu acredito que vale a pena se você não depender disso, “ah, eu vou fazer um passeio”, mas se você marcar com uma pessoa de encontrar

alguém lá, não vá fazer uso do bike PE, porque pode ficar muito na mão. Já marquei uma carona com uma pessoa no Derby num determinado horário, eu disse “dá tranquilo pra eu ir de bicicleta”. Só que quando eu cheguei, o app dizia que tinha vaga disponível lá pra eu guardar a minha bicicleta, que eu peguei perto da minha casa, e quando eu cheguei lá, estava aquele problema do sensor quebrado, todas as bicicletas estavam no lugar e eu tive que ir pra outro ponto que estava disponível. Aí quando eu cheguei no outro ponto, no clube intermunicipal, todas as bicicletas estavam no lugar. Aí eu tive que ir pra Madalena. Aí eu cheguei uns 20 minutos atrasado na minha carona. Eu tive que pegar um táxi, ou seja, se fosse uma medida de economia, tinha saído muito mais caro. Aí são lições que você vai aprendendo, se você

precisar do serviço, você tiver um compromisso marcado e depender dele, não vale a pena não. Vale a pena como lazer. “Ah, eu quero ir no

Recife Antigo, se eu não conseguir, eu vou voltar de ônibus, vou voltar de táxi”, aí vale a pena sabe, mas pra depender, depender, não funciona não (Informante 7).

Como eu falei, só diversão mesmo, porque eu não consigo usar

diariamente e também não dá por causa do sistema, sempre por causa do

sistema [...] Só tem a ciclofaixa no domingo. Eu acho que começa o que, seis, sete horas da manhã até quatro horas da tarde. Então, durante a semana eles não respeitam muito assim (Informante 13).

Vale, porque antes a gente não tinha essa questão de lazer e achei muito importante em Recife ter essa mobilidade, principalmente no marco zero, a questão de fechar aquela rua, das pessoas terem uma área de lazer, terem uma área cultural. Eu acho muito importante isso também. Eu acho muito importante, apesar que tenha muito que melhorar (Informante 14).

Como revela a informante 1, o projeto possibilita o uso a lazer por uma taxa simbólica, funcionando em uma realidade contrária a sua existência, devido à cultura de não cuidado com o bem público. De fato, os outros informantes também apontam que o projeto é vantajoso por possibilitar uma prática de lazer ao ar livre, geralmente próxima de áreas

culturais, surgindo como forma de interligar os indivíduos à história da cidade (Informantes 4, 7, 13 e 14). Para estes, o Bike PE não é adequado e não incentiva o uso diário da bicicleta como meio de locomoção. Esta realidade é reflexo dos problemas que os usuários vivenciam e que tornariam o uso diário insuportável. Reforça-se, portanto, a impossibilidade do projeto atender satisfatoriamente aqueles que utilizam as bicicletas como meio de locomoção. Atrelado a isso, soma-se a inexistência de ciclofaixas no centro urbano durante os dias úteis. O informante 6 descreve este sentimento de insatisfação.

[pausa longa] (Vale a pena?) Unh, acho que vale né, eu tô usando ainda [risos]. Mas é realmente, eu faço o maior esforço do mundo pra não precisar usar (É desgastante?). É desgastante, é uma luta, a pessoa tem que ser um

ciclo-ativista pra querer usar. Um cidadão normal vai desistir, ainda mais

a gente é tudo de uma cultura de carrocracia, aí quando você vai tentar mudar seu modal, você tem tanta dificuldade assim, é completamente

desestimulante (Informante 6).

Os problemas vivenciados dia-a-dia desestimulam o uso. O projeto não incentiva uma continuidade daqueles que o utilizam para locomoção, sendo tal prática um sacrifício para os usuários que precisam ou ainda desejam acessar o sistema com tal finalidade.

Estes e outros problemas podem ser reforçados ou amenizados pelas relações entre os usuários desenvolvidas durante o acesso às bicicletas. Esta temática é abordada no próximo tópico.