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A teoria sócio-histórico cultural da aprendizagem

A teoria sócio-histórico cultural da aprendizagem liderada por Vigotski, tal como sua denominação nos indica, enfatiza os aspectos sociais e culturais num contexto histórico no processo da aprendizagem (e realmente, em todo o desenvolvimento humano no que respeita ao psiquismo), entenden do-se o social macro conceitualmente como o âmbito geral onde interatuam

os seres humanos em determinada população pertence a uma sociedade específica e o cultural desde o ponto de vista micro-conceitual como no âmbito social particular ao qual pertence cada indivíduo em interação com seus semelhantes que participam desse grupo cultural, que pode ser de tipo étnico, religioso, tradicional, geográfico etc.

Assim, acontece toda uma influência social em geral, e cultural em particular expressas fundamentalmente pelo processo educativo que atua sobre cada membro dessa sociedade (sociedade ou cultura) exercido atra- vés principalmente da família e da escola, porém, também dos grupos, da mídia, das outras pessoas, das diferentes instituições públicas e privadas, em fim, de todo o que é produzido pelo conjunto de seres humanos em interação, é dizer, pela sociedade.

Tanto na evolução filogenética como ontogenética, o ser humano vai incorporando novas dotações em sua existência biológica e psicológica que o distancia do resto dos animais, ainda que, os mais evolucionados. Assim, paulatinamente o natural obtido geneticamente na espécie ou em cada homem, se modifica para deixar de ser uma individualidade e converter-se num patrimônio cultural de um grupo de individualidades que interatuam entre si.

O que determina esta mutação são precisamente as relações sociais, a interação entre os homens primeiro em sua luta pela sobrevivência e pelo seu melhoramento depois. Deve ficar claro que nestas relações, tudo o que é cultural é social embora, tudo o que é social não seja cultural.

No entanto, a cultura como fenômeno humano (o que é), não existem tantas contradições como as que podemos encontrar com relação à dinâ- mica de seus resultados no ser humano (o como e o porquê). Assim, o fator cultural tem sido muito estudado com distintas concepções estruturalistas e funcionalistas, fundamentadas de diferentes formas, desde a Psicanálise de Freud e Adler com suas contestações behavioristas assim como a visão antropológico-sociológica de Levy Strauss e Margaret Mead até posiciona- mentos neo-cognitivistas e variantes atuais desde o ponto de vista ecológico contemporâneo, e nesta historiografia, por suposto, a visão de Vigotski e o sócio-histórico e culturalista.

Hawley (1944 apud GOUVÊA, 1977, p. 88), diz que a “Cultura é [...] a maneira de nos referirmos à técnica prevalecente através da qual a po-

pulação humana se mantém em seu habitat.” Efetivamente, a influência cultural constitui um instrumento social para homogeneizar as condutas de um grupo de pessoas com vista a harmonizar as relações interpessoais que nela se produzem e portanto, padronizar a estrutura social da qual essa cultura forma parte.

Esta consideração reafirma o critério instrumental do psicólogo russo com respeito ao papel que exerce a cultura (aculturação) principalmente através dos signos, fundamentalmente da linguagem, num mundo carac- terizado pelo convívio em sociedade onde se estreitam os relacionamentos humanos (socialização).

Para Vigotski (1998, p. 116), o psicológico humano, não esta determi- nado pelo biológico, pelo natural e/ou pelo genético, além de relacionar-se com estes fatores: “[...] a natureza psicológica do homem é a totalidade de suas relações sociais transferidas a esfera interna e tornadas funções da personalidade e formas de sua estrutura”, assim, na medida que mudam tais relações sociais, também muda o individual psicológico.

Desta forma, tanto o biológico quanto o natural e o genético estabe- lecem pautas rígidas no comportamento humano (como se estabelece nos animais); a influência social e a consequente socialização na pessoa lhe asseguram mudar comportamentos, incluindo as mesmas condutas bio- lógicas como no caso, por exemplo, de uma greve de fome motivada por princípios ideológicos ou na mesma superação de um deficiente mental em sua aprendizagem quando tem um apoio social adequado.

Esta consideração dialética fundamenta o caráter dinâmico e portanto mutável da composição psicológica dos sujeitos e que se expressa na sua personalidade, podendo repercutir significativamente em seus aprendizados. Pino (2001, p. 47) estabelece uma estreita relação entre o social e o cultural na visão de Vigotski destacando a importância de entender ambos os conceitos para compreender tal relação:

[...] a existência social humana pressupõe a passagem da ordem natural para a ordem cultural. Discutir a natureza do social e a maneira como ele se torna constitutivo de um ser cultural é, sem duvida alguma, um detalhe muito importante na obra de Vigotski [...].

Por outro lado, muitas vezes encontramos a denominação desta Escola como sociocultural; embora existem autores – eu modestamente somado a eles – que defendem o terceiro componente a o sociocultural já apontado: o histórico (assim, sócio-histórico e cultural) para não deixar “de lado” o principio de historicidade defendido pelo próprio Vigotski e seguidores que considera a dependência das culturas e as sociedades ao “tempo” em que existem os homens, ao momento da história humana em que se pro- duzem seus relacionamentos interpessoais, seja pessoa-pessoa e/ou pessoa- -instituição, onde as determinadas épocas com seus costumes, exigências, valorações e normas, “matizam” as influencias positivas e/ou negativas na conformação de suas personalidades e de seus próprios aprendizados assim como do próprio desenvolvimento das sociedades e suas culturas.

Na acepção dialética desta “historicidade”, o homem, assim como seu produto (e sua aprendizagem é um resultado dele), deve ser analisado acorde ao momento histórico em que vive, ou seja, considerando as influencias sociais e culturais prevalecentes em sua sociedade e cultura em determinado momento de sua historia individual-social.

O mesmo Pino acrescenta o conceito de historicidade partindo da lei- tura que ele faz de um dos primeiros materiais escritos por Vigotski onde esboça, quase esquematicamente, suas principais ideias e que é conhecido como Manuscrito de 1929:

[...] Vigotski estabelece uma relação dupla no significado de his- toria: de um lado, com a dialética, do outro com o materialismo histórico (pagina 49). Historia, em termos genéricos, significa uma abordagem dialética geral das coisas’; em sentido restrito, significa ‘a historia humana’ [...] a primeira historia é dialética; a segunda é materialismo histórico. (PINO apud CEDE, 2001, p. 48)

Esta consideração do “histórico” desde o ponto de vista filosófico ba- seada no materialismo dialético e histórico do desenvolvimento humano, quando é aplicada a aprendizagem pode explicar o porquê hoje devemos ser mais exigentes quanto aos aprendizados que devemos promover em nossas crianças e alunos, diferente do que exigíamos delas faz 20 ou 50 anos atrás, pois o desenvolvimento científico-técnico atual possibilita um desenvolvimento psicossocial muito maior que nesses tempos para uma vida contemporânea que resulta sofisticada e pelas grandes exigências que

a própria sociedade nos faz reclamando de capacidades cada vez maiores e mais complexas... claro que estamos considerando estas possibilidades a partir de condições socialmente igualitárias para todos e de qualidades superiores do ensino que nem sempre existem.

É preciso destacar que Vigotski, bem cedo se incorporou por suas ideias ao que hoje se denomina “Construtivismo Interacionista” (ou Interacio- nismo Construtivista) conjuntamente com Piaget.

No contexto construtivista, Vigotski acredita igual a Piaget e outros, em que todo produto mental, principalmente o conhecimento, é inerente a uma autoconstrução do próprio sujeito o qual adquire dados oferecidos pelos outros ou pelos fenômenos do meio natural e social, e ainda pela sua própria experiência de relação com o meio, o qual reorganiza e reelabora segundo sua capacidade, suas motivações e interesses e adicionando informação de sua própria experiência para “construir” determinado conhecimento (ou habilidade ou afeto ou valorização etc.).

Desta forma, resulta importante a estimulação ambiental (externa e in- terna) em termos de exigência e dados, assim como também é importante a possibilidade autônoma de manipular tais oferecimentos para obter um resultado genuíno que pode coincidir com os resultados de outros apren- dizes, não perde a autenticidade de ser pessoal, pois como nós sabemos, na realidade, que todas as pessoas podem “ver o mesmo” (o conceito de cachorro, por exemplo) porém, em cada uma “esse olhar” é diferente (tal conceito é remitido a suas relações com o cachorro que cada qual conhece). Esta particularização construtiva se observa facilmente nos mesmos re- sultados que uma turma escolar obtém numa prova avaliativa em qualquer disciplina, onde todos os alunos podem aprovar determinada pergunta, porém com nota diferente: todos dominam a resposta certa porém, com distintos níveis de qualidade; assim, as diferentes qualificações na faixa de aprovados (notas ... 7, 8, 9, 10).

Tal individualidade na construção de aprendizados está presente desde que a criança nasce até que alcança níveis superiores no desenvolvimento, que somente terminam no final da vida, o que pode ser compreendido de forma cabal se analisamos detidamente cada fato de aprendizado que acontece ao longo de toda nossa vida.

Neste percurso ontogenético e relacionado intimamente com seu posi- cionamento construtivista, Vigotski destaca uma relação conceitualmente muito importante em sua teoria geral e que resulta vital para compreender a teoria da aprendizagem no olhar sócio-histórico e cultural: a relação entre desenvolvimento e aprendizagem, inserindo-se assim numa posição interacionista igual a que Piaget por partir do pressuposto de interação entre o meio e o sujeito em sua formação psicológica, porém com uma visão diferente. Piaget no que concernente à dinâmica da ordem em que acontece o individual e o social no produto psicológico em geral e de ma- neira particular na aprendizagem, que realmente caracteriza e diferencia do pensamento vigotskiano e com ele, toda a concepção sócio-histórico e cultural na fundamentação interacionista da psique humana.

Antes de analisar esta nova versão interacionista presente em Vigotski, primeiramente, devemos refletir sobre alguns conceitos, por exemplo, o que é desenvolvimento.

Por desenvolvimento se entende todo o percurso biológico, psicológico e social que atravessa o ser humano desde que é concebido (fecundação) até o fim de sua vida, durante do qual vai se passando de etapas inferiores para etapas superiores progressivamente num continuum evolutivo que assegura sua adaptação ao meio (externo e interno) já que lhe permite enfrentar as exigências de tipo biológica, psicológica e social reclamadas em suas relações com seu ambiente natural e/o social.

Sobre o desenvolvimento e as zonas de

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