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Educação inclusiva e formação docente

No Brasil, a partir da Portaria Ministerial nº 1793, foi reconhecida a importância de complementar os currículos de formação de docentes e de outros profissionais que atuam em áreas afins, sendo recomendada a inclu- são de disciplina específica focalizando aspectos ético-político-educacionais relativos às pessoas com necessidades especiais, prioritariamente nos cursos de Pedagogia, Psicologia e em outras licenciaturas, assim como a inclusão de conteúdos específicos em cursos da área da Saúde e em outras áreas.

Na Resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE), que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica, há referência à inclusão e à formação de professores:

A Educação Básica deve ser inclusiva, no sentido de atender a uma política de integração dos alunos com necessidades educacionais especiais nas classes comuns dos sistemas de ensino. Isso exige que a formação dos professores das diferentes etapas da Educação Básica inclua conhecimentos relativos à educação desses alunos. (BRASIL, 2001, p. 25-26)

Está previsto, assim, que na formação inicial, durante a graduação, todos os futuros professores da Educação Básica devem desenvolver competências para atuar também com alunos que apresentem necessidades especiais, em

qualquer etapa ou modalidade de ensino, na perspectiva de se efetivar a educação inclusiva.

Especificamente voltada para a Educação Especial, foi aprovada a Reso- lução nº 02/2001, do CNE e da Câmara de Educação Básica, instituindo as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, que reforça necessidade de haver a capacitação tanto de profissionais do ensino regular, como de docentes de docentes especializados para atender, de maneira diferenciada, as necessidades dos educandos (art. 8, inciso I).

Evidencia-se, porém, que apesar da existência da Portaria nº 1.793/94 e das Resoluções do CNE, muitas instituições de ensino superior não se estruturaram no sentido de oferecer disciplinas e /ou conteúdos relativos ao tema nos seus cursos de licenciatura, enquanto que outras o fazem de maneira precária, através da oferta de disciplina eletiva, ou com carga horária reduzida, ministrada de maneira aligeirada, o que não favorece a aquisição de conhecimentos, o desenvolvimento de destrezas, habilidades e atitudes relativas ao processo de atendimento à diversidade dos educandos. (MARTINS, 2009)

A partir do sancionamento da Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, reconhecendo a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como meio legal de comunicação e expressão de natureza visual-motora, com estrutura gra- matical própria, de uso das comunidades de pessoas surdas, os sistemas educacionais federal, estadual e municipal e do Distrito Federal são obriga- dos a garantir a inclusão da disciplina de Libras nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia, de Pedagogia e demais licenciaturas. No que tange à Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em relação ao campus central, no ano de 2009, existiam oito cursos de licenciatura que apresentavam, em sua estrutura curricular, uma disciplina obrigatória voltada para a educação de pessoas com necessidades especiais, enquanto que apenas quatro cursos apresentavam, além da disciplina obrigatória, alguma(s) em caráter eletivo. Este é o caso do curso de Peda- gogia, que ofertava, também, quatro disciplinas eletivas: Fundamentos de Educação Especial (90 h/a), Metodologia de Ensino em Educação Especial I (DV), II (DM) e III (DA), cada uma com 60 h/a.3

3 A partir de 2011, com a reformulação curricular, no Curso de Pedagogia existem 2

disciplinas obrigatórias: Educação Especial numa Perspectiva Inclusiva e Língua Brasileira de Sinais – Libras e 4 disciplinas eletivas: Metodologia de Ensino em Educação Especial

Por sua vez, 14 licenciaturas apresentavam apenas um componente curricular optativo, geralmente denominado Introdução à Educação Espe- cial. A partir de 2010, passou-se a oferecer também a disciplina Libras, em todas as licenciaturas, em caráter obrigatório ou eletivo.

Com vistas a conhecer a visão que graduandos apresentam sobre as disciplinas que cursaram nessa área, realizamos, em 2009, uma pesquisa com alunos de cursos de licenciatura que, na sua estrutura curricular, têm componente(s) curricular(es) de formação em Educação Especial. Para tanto, centramos a nossa atenção em alguns cursos sediados no Campus Central, em Natal.

Foi empreendida, neste sentido, uma pesquisa de campo com 96 alunos matriculados em vários cursos de licenciatura, utilizando o questionário como instrumento para a construção dos dados. Tal investigação envolveu uma série de questões apresentadas por escrito aos acadêmicos, tendo por objetivo o conhecimento de suas opiniões a respeito: da formação inicial ministrada na área, na licenciatura cursada; da repercussão da disciplina na percepção que apresentam sobre as pessoas com necessidades educa- cionais especiais e sua educação; do aprimoramento da formação inicial de professores na área.

Mesmo que 87,5% dos pesquisados tenham analisado de maneira bastante positiva as disciplinas cursadas, em decorrência da metodologia utilizada e dos conteúdos que foram ministrados, para aprimoramento da sua formação inicial vários graduandos, que integram cursos de licenciatura na UFRN, sugerem:

• inclusão de mais de uma disciplina voltada para a Educação Inclusiva, em caráter obrigatório, em todas as licenciaturas;

• ampliação da carga horária das disciplinas que vêm sendo desenvol- vidas;

• desenvolvimento de atividades que proporcionem um maior contato com as pessoas com deficiência, altas habilidades/superdotação e transtornos globais do desenvolvimento, tais como visitas a escolas e

I (Deficiência Visual), II (Deficiência Mental) e III (Deficiência Auditiva), e Tecnologia Assistiva, sendo cada uma com 60 h/a, o que propicia aos alunos que participam do referido curso mais oportunidade de aprofundamento neste campo educacional.

associações atuantes na área, entrevistas, palestras com profissionais convidados, aulas práticas;

• discussões sobre dificuldades comuns encontradas na sala de aula por docentes e como enfrentá-las, de maneira a realizar uma maior correlação entre teoria e prática educativa;

• inserção de conteúdos relativos às pessoas com necessidades educa- cionais especiais em outras disciplinas oferecidas nas licenciaturas: exs. Fundamentos da Psicologia Educacional, Fundamentos Histó rico- Filosóficos da Educação; História da Educação Brasileira; Estrutura e Funcionamento do Ensino;

• ampliação de atividades extracurriculares na área, no âmbito da UFRN, tais como seminários, cursos, oficinas, entre outros. (MAR- TINS, 2011)

Para tais graduandos, portanto, necessário se faz que haja ampliação de disciplinas e uma maior correlação entre a teoria e a prática, de maneira que possam ser incluídas de forma mais satisfatória, como bem situa Torres González (2002, p. 245), “[...] dimensões relativas aos conhecimentos, destrezas, habilidades e atitudes relacionadas ao processo de atenção à diversidade dos alunos”.

A formação dos profissionais de ensino, porém, de maneira geral, não se esgota na fase inicial, por melhor que essa tenha se processado. Para aprimorar a qualidade do ensino ministrado pelos profissionais de ensino em geral, nas escolas regulares, atenção especial deve ser atribuída tam- bém à sua formação continuada, de acordo com os princípios de atenção à diversidade.

Segundo afirmam Ramalho e Beltrán Núñez (2011, p. 73), este tipo de formação

[...] é mais que instrução ou aprendizagem de conhecimentos e formação de habilidades e de competências, pois inclui, entre ou- tras coisas, interesses, necessidades, intenções, motivações, caráter, capacidades, condutas, crenças, atitudes e valores. [...] é o tipo de atividade que o professor se apropria da cultura profissional e modifica [...] elementos chaves do seu agir profissional, de forma a influenciar no desenvolvimento profissional.

Contribui, pois, para possibilitar condições para que os docentes pos- sam refletir sobre a sua prática, de forma a melhor atuar com as diferenças que se fazem presentes no alunado, entre as quais aquelas decorrentes de deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/ superdotação.

Correia (2008, p. 28), com vistas a essa perspectiva formativa, destaca que

os educadores, os professores e os auxiliares de acção educativa necessitam de formação específica que lhes permita perceber mi- nimamente as problemáticas que seus alunos apresentam, que tipo de estratégia devem ser consideradas para lhes dar resposta e que papel devem desempenhar as novas tecnologias nestes contextos.

Dessa forma, realça que não apenas o professor precisa estar preparado para a atuação com a diversidade do alunado, no cotidiano da escola, mas todos os profissionais que ali atuam.

A formação permanente, pois, é um dos fatores imprescindíveis para que os profissionais de educação possam atuar, efetivamente, frente aos alunos sob sua responsabilidade em classe e no ambiente escolar, de maneira mais ampla, por mais diversificado que esse grupo se apresente, oferecendo- -lhes condições de atendimento educacional que sejam adequadas às suas condições e necessidades e, não apenas, realizando a mera inserção física desses educandos no ambiente escolar.

Isto, infelizmente, ainda é feito em algumas realidades escolares, em especial no que diz respeito aos alunos com deficiência, sobre os quais deteremos mais o nosso olhar. Nesses casos, quando muito, a inclusão se reduz a um simples espaço de socialização. Necessário se faz que esta seja desenvolvida com mais responsabilidade, observando aspectos relacionados à escola, ao aluno – que é ímpar em suas características e necessidades – e também ao docente. A inclusão é um processo complexo e esta complexi- dade deve ser respeitada, atendida e não minimizada.

Se almejamos, pois, uma escola que possa garantir a efetiva participação e aprendizagem dos alunos em geral, necessário se faz a sua reestruturação, implicando na busca pela remoção de barreiras visíveis (de acessibilidade física, pedagógicas) e invisíveis, que são as mais sérias de serem removidas,

pois envolvem atitudes, preconceitos, estigmas e mecanismos de defesa ainda existentes frente ao aluno tido como “diferente”.

Em face disso, várias ações vêm sendo empreendidas nos sistemas edu- cacionais, principalmente nos últimos anos, sob a “bandeira” da educação para todos, da inclusão de todos na escola regular. Muitos cursos e eventos vêm sendo realizados, porém, podemos observar que, muitas vezes, essas ações não se desvinculam da lógica tecnicista de transmissão, assimilação e reprodução do saber, não resultando em mudanças de percepções, posturas e práticas.

Para que ocorra essa desvinculação, o que nem sempre acontece, neces- sário se faz

[...] considerar os educadores e as educadoras nos seus contextos de sujeitos socioculturais, que trazem em suas trajetórias marcas e características próprias – particularidades que estarão presentes numa determinada forma de olhar o mundo, de se permitir analisar as lógicas da realidade e, claro, de conceber a educação. (DINIZ; RAHME, 2004, p. 130)

No tocante à formação de recursos humanos para atuação na escola regular com alunos com deficiência e outras necessidades educacionais especiais, o Ministério da Educação deu início, em 2003, ao Programa

Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, promovido pela Secretaria de Edu- cação Especial, visando: disseminar a política de Educação Inclusiva nos municípios, em todo país; apoiar a formação de gestores e educadores para efetivar a transformação dos sistemas educacionais inclusivos. Fundamenta- -se no seguinte princípio: garantia do direito dos alunos com necessidades educacionais especiais de acesso e permanência, com qualidade, na escola regular de ensino. (BRASIL, 2006)

Em setembro de 2010, o referido programa atingia 168 municípios-polo, que atuavam como multiplicadores para vários outros municípios da região. Segundo dados do Ministério da Educação (MEC), ocorreu a formação de 133.167 professores e gestores, no período de 2004 a 2009.

O MEC, através da SEESP, também elaborou e distribuiu materiais bibliográficos que visavam servir como referencial para o programa em desenvolvimento, contemplando, inclusive, experiências inclusivas signifi- cativas, que vêm sendo empreendidas no país, em várias regiões.

Na UFRN, com apoio financeiro do MEC, vem sendo empreendido o

Projeto Continuum, desde 2011, que objetiva capacitar professores do ensino fundamental para o processo de inclusão de estudantes com necessidades educacionais especiais, tendo em vista seu ingresso, acesso e permanência, com qualidade, no ambiente escolar. O público-alvo é constituído de pro- fessores efetivos da rede pública estadual e municipal, com formação em nível superior, que atuam no Ensino Fundamental, de 1º ao 9º ano, em salas de aula regulares e em Salas de Recursos Multifuncionais.

O referido curso, possui uma carga horária de 180 horas/atividades, distribuídas em 144h presenciais e 36h vivenciais, que são destinadas às atividades desenvolvidas pelos professores/cursistas em sua própria escola. No ano de 2011 foram empreendidos sete cursos, nos municípios de Natal (2), Mossoró (1), Currais Novos (1), Nova Cruz (1), Santa Cruz (1) e Macau (1), abrangendo um total de 269 cursistas.

Dada a repercussão positiva dos referidos cursos, em 2012 estão sendo previstos outros sete cursos destinados a docentes das redes públicas de Natal e municípios circunvizinhos (6) e de Mossoró (1).

Nesses cursos tem sido considerado de suma importância a problema- tização dos saberes presentes nas vivências cotidianas e os aspectos que fundamentam o saber-fazer dos docentes, de maneira a se constituírem em pontos de partida para novas experiências e vivências.

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