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A transição para o DVD e a batalha de padrões

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3. Estratégias das empresas

3.3 Ilustração – a experiência da indústria de vídeo digital chinesa

3.3.5 A transição para o DVD e a batalha de padrões

Como o VCD não foi explorado em nenhum outro país além da China, o DVD avançou muito e a expectativa da maior parte dos especialistas era de que o DVD substituiria o VCD no mercado chinês, prejudicando as firmas chinesas. Poucos perceberam que a experiência e a capacitação desenvolvidas com a indústria de VCD poderiam permitir uma transição diferente para o DVD, aproveitando a competitividade construída pela indústria de VCD.

Em 1998, preocupados com o impacto do DVD, a comunidade industrial e o governo concluíram que era necessário atrasar a entrada do DVD na China, através da introdução de aprimoramentos na tecnologia VCD. No processo de desenvolvimento do padrão para um novo produto, as firmas chinesas se dividiram em dois grupos.

O primeiro grupo, liderado pela Shinco e apoiado inicialmente pelo Ministério das Indústrias da Informação (MII), desenvolveu o padrão SVCD. Outras empresas, incluindo a C-Cube, desenvolveram o padrão CVD. Caso esse último fosse definido como padrão oficial, a Shinco ficaria “trancada dentro” (lock-in) e seria deslocada do mercado. Nesse caso, a C- Cube recuperaria seu monopólio no fornecimento do decodificador, deslocando a ESS. Para impedir que isso ocorresse, a Shinco aliou-se à Panda e à Hua Lu, ambas estatais, para fazer

lobby junto ao governo. O MII definiu como padrão uma terceira alternativa, o Super VCD,

compatível tanto com o SVCD como com o CVD. A tentativa de recuperar o monopólio pela C-Cube foi eliminada e ela foi adquirida pela LSI Logic, em 2002.

A introdução do Super VCD não atrasou muito a entrada do DVD mas dificultou o processo, já que 20 milhões de Super VCDs foram vendidos no mercado em dois anos. Além disso, a batalha entre as firmas pela definição do padrão contribuiu para o aumento de suas capacitações, especialmente quanto à compatibilidade de padrões e sistemas.

A Shinco decidiu entrar na indústria de DVD em 1996, em parceria com a Sony. A primeira trazia a idéia e a segunda desenvolvia as soluções óticas e de semicondutores. Os fundamentos para a entrada da Shinco na indústria de DVD foram as capacitações desenvolvidas durante a fase do VCD (tecnologia de produto, conceito de mercado, desenvolvimento de software, design de produtos e processos).

Nenhuma firma de DVD era capaz de produzir in-house o chip decodificador. Esse componente era fornecido pela ESS. Em seu laboratório no Silicon Valley a Shinco participava com idéias e conceitos baseados nas necessidades do produto final e concorria em igualdade de condições com os principais fabricantes internacionais de DVD.

Um dos diferenciais mais importantes da Shinco foi a sua capacidade de integração de sistemas (integração de recursos tecnológicos externos orientada por inovação de produto). O que diferencia essa capacidade da Shinco da simples adoção de tecnologia externa é a autonomia no desenvolvimento do produto. A firma que faz integração de sistemas participa no design do sistema e constitui locus de inovação do produto.

Em 1999, a Shinco fez uma aliança com outras firmas chinesas e, em 2000, fez um enorme investimento em uma nova planta. O preço do DVD caiu de 2.500 yuan, em 1997,

para 1.500 yuan, em 1999, 1.000 yuan, em 2000 e 790 yuan, em 200186. Em 2002 a Shinco possuía 28% do mercado chinês ao passo que todas as marcas estrangeiras, juntas, respondiam por menos de 11%.

O DVD da Shinco era superior ao dos demais fabricantes em vários atributos. Quanto ao desempenho, possuía a melhor capacidade de auto-correção, que tornou-se ainda mais importante porque como o DVD armazena oito vezes a quantidade de dados do VCD, as perdas seriam muito maiores sem a auto-correção. Quanto à compatibilidade, era compatível com CD, VCD, Super VCD, MP3 e, após substituir o sistema de drive da Sony por um próprio, passou a ser compatível também com CD-R e CD-RW, permitindo a conexão com a Internet. Em 2002, passou a ser compatível também com o CD de fotografia da Kodak. Novos atributos foram adicionados, como o scanning progressivo, a redução no tamanho do equipamento, a estrutura anti-choque e anti-poeira. Posteriormente, a Shinco desenvolveu o DVD portátil, o DVD para carro e o DVD para carro com GPS (Global Positioning System). Os equipamentos da Shinco tinham também preços inferiores aos das marcas estrangeiras. Em 2002 a Shinco começou a exportar, tornando-se uma das três maiores fabricantes de DVD do mundo.

O produto da Shinco incorporava multi-tecnologias. Nenhuma firma isoladamente seria capaz de desenvolver internamente todas essas tecnologias. Daí a importância da capacidade de integrar tecnologias. A Shinco tornou-se capaz de influenciar os fornecedores de tecnologia componente a partir de seu próprio conceito de produto e de design de sistema.

Nessa etapa consolidou-se uma mudança fundamental na indústria. Os fornecedores estrangeiros de componentes não determinavam mais as funcionalidades do produto; a inovação de produto por firmas chinesas freqüentemente induzia a mudanças nas tecnologias componentes. A integração de sistema permitiu à Shinco desempenhar papel fundamental na rede de valor a partir do produto final. Além do efeito direto, ao induzir a mudanças na tecnologia do fornecedor de componente a Shinco indiretamente afetava toda a indústria, já que o novo componente seria também fornecido para outros fabricantes.

A experiência do VCD permitiu o acúmulo de competências que foram fundamentais para a fase do DVD: gestores e engenheiros, tecnologia e marketing, além de ativos complementares como plantas produtivas, sistemas de controle da qualidade, redes de comercialização. Atualmente, somente o DVD compatível com o VCD consegue penetrar no mercado chinês. Não é à toa que 80% do mercado é suprido por antigos produtores de VCD,

que se tornaram muito mais habilitados do que grandes firmas de bens de consumo eletrônicos que diversificaram para o DVD ou do que montadoras estrangeiras.

3.3.6 A disputa envolvendo direitos de propriedade intelectual e a definição de padrões -

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