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PARTE II A UNIÃO EUROPEIA ENQUANTO ACTOR GEOPOLÍTICO

2.2. A União Europeia como actor histórico-cultural

Quando nos referimos à União Europeia estamos, tal como o próprio nome o indica, a utilizar um termo que, de imediato, nos remete e associa ao continente que comummente designamos por Europa. Mais do que inevitável é, pois, impossível dissociar a herança histórica e cultural do Velho Continente da génese da construção europeia. Falamos de um projecto que nasce no seio do continente europeu e que hoje, volvidas mais de seis décadas desde a sua génese, se confunde com o próprio conceito de Europa, numa clara expressão do seu carácter identitário. Como base da União Europeia está, tem de estar, uma certa ideia de Europa e um leque de valores que definem uma civilização.13 Segundo Magalhães Godinho:

“Europa: A única civilização capaz de se pôr em causa a si própria, que substitui a crença e o dogma pela dúvida metódica e pela razão, o súbdito e o senhor pelo cidadão e pelo povo (…) e realiza-se na criação cultural – das artes plásticas à música, da pintura à literatura, na paisagem e no nodo de viver. A Europa é uma civilização do pensar.”14

É nesta, e não noutra, civilização que encontramos as grandes referências do pensamento e da razão, nos seus mais amplos e variados domínios. A racionalidade constitui, inequivocamente, uma conquista e um cunho distintivo da cultura europeia. Em certo sentido, foi com ela que a Europa conquistou o mundo, porque a forma de racionalidade que se desenvolveu em primeiro lugar na Europa é aquela que modela hoje a vida de todos os continentes.15 Segundo Ratzinger “A Europa não é um continente claramente compreensível em termos geográficos; é, pelo contrário, um conceito cultural e histórico.” (RATZINGER, 2005:48) É, precisamente, quando se procura conceber a Europa sob uma perspectiva histórico- cultural, que se torna inevitável identificar e referir a fórmula clássica que congrega helenismo, religião cristã e cultura romana como as três grandes raízes histórico- culturais do Velho Continente.

13Magalhães Godinho, 2007, p.14. 14Idem, ibidem, pp.14-15.

De Atenas, a cultura europeia herdou a reflexão filosófica e a pesquisa científica que permitiram a germinação de uma concepção que distingue a esfera sagrada da esfera profana. Esta emancipação de um entendimento da realidade assente na razão, independente da acepção religiosa, foi de tal forma uma conquista relevante, a ponto de nunca mais ter desaparecido da cultura europeia. Também no plano artístico e literário a cultura europeia não mais deixou cair em esquecimento as referências gregas em domínios como a escultura, a arquitectura, a épica, a poesia, a filosofia, oratória ou a dramaturgia. Nomes como Homero, Ésquilo, Eurípides, Sófocles ou Heródoto, juntam-se aos, igualmente ilustres, Platão, Aristóteles e Sócrates como referências históricas intemporais que continuam, ainda hoje, a ser objecto de estudo e análise.

Quanto a Jerusalém, a sua herança é inquestionavelmente o cristianismo,16 religião

universalista, monoteísta e salvífica, segundo a doutrina. Foi, pois, esta noção de religião de alcance universal, cuja crença reside na existência de um único Deus, criador do Universo, que encarnou como homem em Jesus Cristo para, através da sua vida, morte e ressurreição, bem como da sua Palavra, libertar e salvar a humanidade do mal e do pecado,17 que se estabeleceu até hoje como o padrão de

culto divino na maioria das sociedades europeias.

De Roma, a cultura europeia veio herdar o direito romano. Foi neste império que se estatuiu a separação entre as normas que regulam as relações entre o estado e os membros da sociedade (direito público) e as normas que regulam as relações dos membros da sociedade entre si (direito privado). Esta destrinça entre a esfera do direito público e a esfera do direito privado foi, igualmente, outra conquista da cultura europeia, que as sociedades do Velho Continente adoptaram como elemento basilar, e não mais abandonaram, até hoje. Também o cristianismo, conheceu importantes desenvolvimentos com este império, nomeadamente o início formal do papado, na pessoa de São Pedro, bem como a sua afirmação enquanto religião

16Como o próprio nome da religião o indica, advém do sobrenome Cristo, conferido ao seu

fundador, Jesus, um pregador judeu nascido em Belém na Palestina, cerca da última década do século I a.C.

dominante18, estendendo-se de uma forma particular aos estratos sociais mais desfavorecidos, heranças que a Europa ainda hoje preserva.

Não foi, com efeito, apenas durante o primeiro milénio que a Europa se conseguiu estabelecer como um espaço cultural. Também no segundo milénio da nossa história, o Velho Continente, graças à cristandade ocidental, teve um papel preponderante no estabelecimento de novos desenvolvimentos culturais. Entre eles, destacam-se os alcançados durante o período do Renascimento como o desenvolvimento da ciência moderna,19 em paralelo com a difusão do conhecimento científico, da escrita e da leitura. Graças a estas inovações a Europa conseguiu contribuir para uma maior alfabetização e para uma afirmação da imprensa, ambas à escala global.

A Europa foi ainda o berço do crescimento económico exponencial dos séculos mais próximos, que rapidamente se alastrou a toda a sociedade mundial20. Foram os europeus que estabeleceram as suas raízes, promovendo e aplicando o conhecimento científico à esfera económica. Através de um processo de expansão, resultante de uma emigração em massa para diferentes regiões do globo, os europeus abriram, portanto, caminho à convergência das sociedades em torno de uma economia global e liberalizada. Deste modo, conferiram-lhes um carácter cultural e identitário à imagem e semelhança da Europa.

18O Cristianismo viria a ser adoptado como religião oficial, para além do próprio Império Romano

(364 d.C), pela Arménia (303 d.C), pela Ibéria (318 d.C), pela Abissínia (principio séc. V d.C) e pela Núbia (princípio séc. VI d.C). Note-se, ainda, que esta expansão do cristianismo como religião dominante emerge de um período de perseguição e martírio dos cristãos, um fenómeno que vem a ressurgir nos séculos XX e XXI, sobretudo nos países onde predominam regimes totalitários, nacionalismos étnicos ou o fundamentalismo islâmico. Assim o comprovam os dados do Observatório da Liberdade Religiosa, segundo os quais, no ano de 2012 cerca de 105 mil cristãos foram assassinados por causa da sua fé.

19Galileu Galilei (1565-1642) é considerado o fundador da ciência moderna, sendo igualmente o pai

do método científico. A partir deste período o objecto da ciência deixa de ser a essência das coisas para passar a ser a função das coisas. Obras como “Das revoluções das esferas celestes” de Nicolau Copérnico, ou “Diálogo sobre os dois primeiros sistemas do Mundo” de Galileu Galilei foram apenas algumas, entre outras, que impulsionaram esta revolução científica.

20Adam Smith (1723-1790), economista escocês, é considerado o pai da economia moderna e o

Nota, ainda, para o desenvolvimento de uma cultura laica que, rejeitando a dimensão religiosa, ganhou expressão nas sociedades do Velho Continente e que depressa se expandiu, ainda que sob a forma de diferentes correntes doutrinárias. Foram, assim, uma vez mais, os desenvolvimentos culturais gerados no seio da Europa que se difundiram e originaram o estabelecimento de uma sociedade-mundo moderna e, posteriormente, contemporânea.21

Não podemos, todavia, fazer uma análise rigorosa da U.E enquanto actor cultural sem fazer alusão a dois grandes factores que sustentam a projecção cultural da Europa no mundo: as línguas e as religiões. Relativamente às primeiras é inegável que não existe hoje nenhuma outra região do globo com uma dimensão e uma relevância linguísticas que possam ser objecto de comparação com a Europa. Quer em termos de alcance, quer em termos de diversidade, as línguas europeias fazem do Velho Continente um conceito histórico-cultural de expressão mundial. Para isso, basta termos em consideração o facto de mais de metade da população mundial saber falar, pelo menos, uma língua europeia e de quase um quarto ter uma língua europeia como língua materna. Cerca de dois terços dos países não europeus adoptaram já como língua oficial uma língua de origem europeia, sendo, mesmo na sua maioria, essa a língua correntemente mais falada. Também o facto das grandes organizações internacionais e mundiais terem como línguas oficiais, na sua maioria, línguas europeias, constitui um sinal, ainda mais inequívoco, da projecção cultural da Europa no plano linguístico.

Não deixa, com efeito, de ser curioso e relevante, o facto de algumas das principais línguas europeias serem hoje, línguas maternas de países não-europeus. Ao contrário do que possa aparentar, o maior país de língua espanhola é o México e não Espanha, o mesmo sucedendo com os E.U.A relativamente à língua inglesa e com o Brasil relativamente à língua portuguesa. De facto, como alerta Nuno Valério: “Poder-se ia colocar a questão de saber em que medida o espanhol, o inglês e o português podem considerar-se hoje línguas primordialmente

europeias.”22 Todavia, não é este o debate que pretendemos alimentar na presente tese.

Relativamente ao papel das religiões, foi já supra referido a importância que o cristianismo tem não só na Europa, a ponto de ser considerado como uma das suas raízes histórico-culturais basilares, como também no mundo. Convém, no entanto, realçar que, hoje, cerca de um terço da população mundial é católica. Com efeito, as correntes agnósticas e ateístas, também elas com origem na Europa, por via do socialismo e do liberalismo laico, representam cerca de um quinto da população mundial.

De igual modo, tal como no caso das línguas, também as religiões de matriz europeia encontram a sua maior expressão em países não-europeus. O exemplo mais evidente é o do cristianismo católico que, não obstante ter nascido em Jerusalém, e ter o seu centro de poder sediado em Roma, apresenta hoje um número maioritário de fiéis no continente americano (Brasil, México, E.U.A). Uma vez mais, não querendo alimentar o debate em torno desta questão, não podemos, no entanto, deixar de reconhecer a pertinência da dúvida deixada por Nuno Valério quando reflecte sobre “em que medida devem o cristianismo e as atitudes ateias ou agnósticas ser considerados, hoje, doutrinas primordialmente europeias.”23 A interrogação deve, no entanto, e acima de tudo, num período de incerteza como o que vivemos, onde tudo se coloca em causa, remeter os europeus para a uma profunda reflexão sobre uma questão para a qual que o então cardeal Ratzinger já nos alertava: “O que é a nossa cultura e o que ainda nos resta dela?” (RATZINGER, 2005:24)De acordo com o mesmo autor, para isso será necessário que os europeus encontrem a resposta “sobre o que pode garantir o futuro e sobre que coisa está em condições de continuar a fazer viver a identidade interior da Europa através de todas as metamorfoses históricas.” (RATZINGER, 2005:27)

A Europa dos grandes pensadores, das grandes conquistas, das grandes realizações e acções colectivas é a mesma Europa na qual o projecto de construção europeia

22Valério, 2010, p.51. 23Idem, ibidem, p.52.

emergiu como um dos frutos mais bem-sucedidos e fascinantes da sua secular e incessante busca pela utopia e pelo ideal supremo. Desde a arte, à música, ao teatro, passando pelas línguas e pelas religiões, a cultura teve sempre um lugar especial na Europa. Nesse sentido, e ciente da necessidade de preservar a herança cultural europeia e de que as actividades culturais desempenham um papel insubstituível no reconhecimento e na promoção da sua própria identidade, a U.E decidiu desenvolver uma política cultural de dimensão europeia.24 25 O seu significado actual traduz-se na adopção do lema oficial “Unidade na Diversidade”26 e projecta- se em domínios como a economia, a coesão social, a cooperação e o desenvolvimento ou a política externa. A inclusão de uma dimensão cultural em diversos domínios e políticas, quer da sua esfera de actuação interna, quer da sua esfera de actuação externa permitem à U.E lançar as bases para o enraizamento de uma consciência cultural europeia.27 Deste modo, o diálogo e o intercâmbio

interculturais constituem um elemento fundamental na promoção de uma União Europeia socialmente coesa, de uma cidadania europeia activa e de um sentido de identidade europeia.28 É nesse sentido que a U.E, através da sua política cultural nas

suas múltiplas dimensões, tem procurado desenvolver um papel activo e

24Os primórdios da política cultural no quadro da U.E remontam à entrada em vigor do Tratado de

Maastricht em 1993, com o estabelecimento de uma política de cooperação cultural entre os Estados-Membros.

25Segundo João Teixeira Lopes “Uma política cultural começa quando se estabelece um

reconhecimento da autonomia relativa do campo cultural (dos actores, suas posições e relacionamento, das regras de jogo que lhes são próprias) por parte do poder político”. Com efeito, de acordo com o mesmo autor “Ainda é frequente a cultura ser encarada não como um domínio merecedor de uma política relativamente autónoma, mas um acréscimo de legitimação do poder político que se apresenta e representa através das mediações simbólicas: panis et circenses, “pão e circo” – visibilidade, espectáculo, festa, arena, entretenimento das massas, alienação das mesmas... Neste sentido, jamais se poderá falar de uma autêntica política cultural – antes de um uso instrumental de certas actividades, práticas e actores inseridos de forma diversa no campo cultural, subalternizado e definido heteronomamente – sem uma lógica interna que lhe seja imputável.” João Teixeira Lopes; Políticas Culturais Públicas na Europa, em JANUS 2003: Anuário de Relações Exteriores; Público e Universidade Autónoma de Lisboa; Lisboa, 2002. Disponível em: http://janusonline.pt/2003/2003_1_4_13.html.

26A adopção deste lema é facilmente entendível pela explicação que a professora Luísa Leal Faria

nos dá nos seus apontamentos sobre multilinguismos e multiculturalismo, fornecidos pela própria no âmbito da cadeira “Economia Política da Construção Europeia” leccionada pelo Professor Eduardo Lopes Rodrigues. Assim, de acordo com a autora: “A perspectiva unificadora parece ser fundamental para conferir coesão a um conjunto de estados autónomos e historicamente desunidos, hostis e mutuamente competitivos. É esta perspectiva que permite falar em unidade na diversidade, ou vice-versa, como se implicitamente a Europa formasse um espaço de harmonia e consenso no qual as diferenças pudessem coexistir.”

27Delegation of The European Union to the United States, 2010, p.1. 28Idem, ibidem, p.2.

reconhecido pelos demais agentes e actores geopolíticos internacionais, contribuindo, deste modo, para a sua afirmação e para o reforço do seu estatuto enquanto actor cultural precursor. Os esforços desenvolvidos particularmente junto de regiões e países não-europeus no apoio à protecção e promoção da diversidade cultural, bem como a inclusão e promoção de uma dimensão cultural nos acordos e nas parcerias internacionais com os mesmos, independentemente do domínio em causa, postulam-se, assim, como elementos fundamentais de cooperação cultural internacional. Destacam-se, também, o apoio à protecção dos direitos humanos, nos quais se incluem, naturalmente, direitos culturais como o direito das minorias e das pessoas socialmente marginalizadas, e o apoio ao financiamento de diversos programas e agendas culturais. Ainda no plano externo, os esforços para a construção de uma ordem global assente na paz, na compreensão mútua e no respeito pelos valores partilhados requer o reconhecimento do papel da cultura nas relações externas.29 Neste âmbito destacam-se a agenda europeia para cultura30 e as relações de cooperação mútua entre as delegações da U.E e os organismos e instituições culturais dos EM, com o intuito de promover a identidade e a cultura europeias junto de países terceiros.

O actual momento de turbulência e incerteza que assola o Velho Continente é, em parte, explicado pelo facto de estarmos perante uma Europa mergulhada numa profunda crise de identidade, órfã de si própria, cujas raízes e cujos fundamentos histórico-culturais aparentam ter caído no esquecimento. É, pois, indispensável que a Europa saiba ler e interpretar os sinais do presente e que nunca se esqueça verdadeiramente das suas raízes históricas.31 É um facto que a Europa não goza hoje da projecção cultural que outrora a caracterizou. Com efeito, esta é sempre, uma perda de vitalidade relativa e nunca absoluta, pois por mais que se tente menorizar ou olvidar a matriz - razão, pessoa e direito - estes são e serão, sempre, conceitos de raiz europeia e que não mais poderão ser apagados dos anais da

29Idem, ibidem.

30Trata-se de uma estratégia, lançada em 2007 pela Comissão Europeia, com uma vigência de cinco

anos, e com o triplo objectivo de promover o diálogo e a diversidade cultural; promover a cultura como catalisador para a criatividade e inovação, e promover a cultura como parte integrante das relações externas da U.E. Disponível em: http://eur- lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2007:0242:FIN:PT:PDF.

história. Afinal, quando um deles falha o que fica em causa é a própria pessoa humana.32 É por isso que União Europeia tem, e terá sempre, necessidade da sua herança cultural, não só para se afirmar de forma singular dos demais actores e agentes geopolíticos, como, sobretudo, para se reencontrar consigo mesma e reconhecer a sua própria identidade.

É, sobretudo, importante que dentro dos vários ambientes culturais já não haja nenhuma uniformidade, pois todos são caracterizados por tensões radicais no seio da sua própria tradição.33 Na Europa secularizada, o choque e proximidade entre fé cristã e racionalidade laica é uma evidência óbvia e constante. Mas também noutras culturas, desde o islamismo ao budismo, entre outras de menor expressão, se identificam polos de tensão mais ou menos idênticos. Tanto a cultura da fé cristã e da racionalidade laica, cada uma a seu modo, exercem a sua influência em todo o mundo e em todas as culturas.34 Assim,se prova, uma vez mais, que, também nas demais culturas, se encontram indícios bem reveladores do alcance e da relevância da cultura europeia. Com efeito, tal não significa, de modo algum, que devamos partir do pressuposto de que estamos perante uma cultura europeia com um grau de superioridade exclusivo, pois como fez questão de lembrar, ainda, o Cardeal Joseph Ratzinger:

“Mas isto não significa que as outras culturas se possam pôr de lado como uma quantité négligeable. […] É importante que as duas grandes componentes da cultura ocidental estejam prontas a escutar, e se mantenham numa autêntica correlação também com aquelas culturas. É importante envolvê-las na tentativa de uma autêntica correlação polifónica na qual se abram à essencial complementaridade da razão e fé, de modo que possa crescer um processo universal de purificação, no qual, por fim os valores e as normas de algum modo conhecidos ou intuídos por todos os homens possam resplandecer novamente e, assim, possa readquirir uma força efectiva entre os homens aquilo que mantém o mundo unido.” (RATZINGER, 2005:90)

É, no entanto, a cultura europeia que, apesar da sua progressiva perda de vitalidade, continua, ainda assim, a reunir as melhores condições para desempenhar um papel único mesmo num mundo globalizado. É, precisamente, graças à influência

32Borges, 10 de Novembro de 2012, Diário de Notícias. 33Ratzinger, 2005, p.86.

transversal que as suas raízes histórico-culturais continuam a ter, quer na preservação das demais culturas já existentes, quer no despontar de novas culturas que possam vir a surgir que, apesar de tudo, faz e continuará a fazer sentido falar em Europa e em cultura europeia e, nesse sentido, numa U.E enquanto actor histórico-cultural portador e promotor identitário desta mesma cultura. Porque, acima de tudo, como nos relembra, uma vez mais, o cardeal Joseph Ratzinger “os europeus partilham um património cultural comum, que é o resultado de séculos de criatividade, de fluxos migratórios e de intercâmbios”, (RATZINGER, 2005:90) sendo, igualmente, portadores de uma diversidade cultural e linguística que serviu e continua a servir de inspiração para os diversos actores e agentes internacionais35. Compete, pois, à União Europeia um papel e uma responsabilidade preponderantes na preservação e na difusão da cultura europeia, sob pena de ela própria se ver desprovida do seu carácter identitário, vendo-se, assim, perigosa e inevitavelmente, condenada à irrelevância.

É, pois, em grande parte devido à sua dimensão histórico-cultural que a U.E consegue, ainda, reclamar para si uma parte significativa da relevância no contexto geopolítico internacional. A existência de uma cultura de valores comuns, de uma cultura institucional consolidada ou a aposta no desenvolvimento de uma política e de uma cooperação culturais multidimensionais (todas elas com uma notória