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A visão “crítica” sobre os controles de capitais no Brasil

CAPÍTULO II – A experiência com controles de capitais durante a abertura financeira no

2.3. A visão “crítica” sobre os controles de capitais no Brasil

Entre os economistas antagônicos à visão convencional, existe um relevante grau de concordância em relação à necessidade de moderar os fluxos de capitais. Em defesa dos controles, alguns autores (DE PAULA; OREIRO; DA SILVA, 2003; OREIRO, 2004) argumentam que a abertura excessiva da conta de capitais conduz a perda de autonomia de política econômica, aumento da fragilidade externa da economia, diante da possibilidade de reversões súbitas nos fluxos de capitais de curto prazo e apreciação nominal e real da moeda doméstica. Nesse sentido, De Paula (2003) defende que os controles de capitais podem ser úteis para reduzir a vulnerabilidade externa da economia brasileira, quando há excesso na entrada de capitais externos, selecionando qualitativamente os fluxos de capitais a serem recebidos, reduzindo os volumes de natureza especulativa e isolando a economia local do contexto internacional, ao desvincular a alta correlação entre o cupom cambial e a taxa de juros doméstica.

Um aspecto importante também levantado por De Paula, Oreiro e Da Silva (2003) é a questão dos custos da adoção dos controles de capitais. Conforme destacam os autores, a economia convencional não teria mostrado evidência de que os custos dos controles seriam maiores que seus benefícios. Nesse sentido, a partir das afirmações de Rodrik (1998), não haveriam estudos empíricos conclusivos acerca da afirmação de que países com maior abertura financeira tenham maiores taxas de investimento e crescimento econômico, ou menores taxas de inflação.

Entretanto, sobre a experiência dos anos 1990, cumpre observar, que a literatura crítica conferia maior ênfase em relação ao sentido geral da abertura financeira. Nesse âmbito, para além das questões relativas ao “trilema” macroeconômico, outro aspecto importante levantado por Prates e Freitas (2001), reside na falha da abertura financeira em cumprir sua

promessa de estimular a concorrência bancária doméstica, bem como fomentar internamente mecanismos de financiamento de longo prazo. Conforme argumentam as autoras, a abertura financeira “contribuiu para o aumento da vulnerabilidade externa do país ao estimular o crescimento da dívida externa securitizada e dos investimentos de portfólio, que compõem (ao lado da dívida externa bancária e do estoque de IED) o passivo externo bruto da economia brasileira”. (FREITAS; PRATES, 2001)

Ainda em relação ao sentido geral da abertura, outro aspecto usualmente levantado pela literatura crítica diz respeito ao ritmo de abertura financeira nos anos 1990, revelando preocupação com as consequências da rápida remoção dos controles “administrativos” anteriores, resultando na baixa qualidade dos influxos. Como mostram Bastos, Biancarelli e Deos (2006), em contraste com a experiência asiática – muito mais prudente em relação à abertura financeira – a abertura no Brasil estava sujeita a reversões súbitas de capitais.

A principal consequência da alta velocidade da abertura financeira à associação da economia local aos ciclos de liquidez internacional. Ao submeter o financiamento das contas externas aos influxos de capitais, a economia brasileira, a exemplo de outras economias periféricas, passou a vincular seu ciclo econômico às mudanças na disposição dos investidores internacionais em alocar seu portfólio em ativos de maior risco.

De fato, nos anos 1990, como consequência da abertura financeira e da retomada do acesso do país ao crédito internacional, os influxos de capitais apresentaram grande volatilidade, com momentos de expansão seguidos de momentos de escassez, vinculando os movimentos na economia local com as mudanças no cenário internacional. O Gráfico 3 ilustra esses momentos de reversões intensas nos fluxos de capitais a partir das crises no México, na Ásia e na Rússia.

Assim como o Brasil, essas economias também experimentaram movimentos de agressiva abertura financeira, acompanhados pela deterioração nas contas externas e pela ocorrência de crises cambiais, o que elevava, sobretudo nos momentos de ruptura, o grau de incerteza acerca da sustentabilidade da própria economia brasileira. Apesar da manutenção de um grande diferencial de juros em relação às taxas praticadas na esfera internacional, o Brasil vivenciou momentos de fuga de capitais em 1995, com a crise no México, em 1997, com a crise no sudeste asiático e em 1998, com a crise russa. Nesses momentos, enquanto país recebedor, revelava-se baixa a capacidade do Brasil em determinar o sentido dos influxos, tanto nos momentos de fuga quanto nos momentos de recuperação.

Gráfico 3 – Brasil: Investimento estrangeiro em carteira de 1995 a 1999 (líquido, em US$ milhões)

Fonte: Elaboração do autor, com dados do BCB

Nesse movimento de crítica à forma da abertura financeira no Brasil, destaca-se aqui também o contraponto feito à plena conversibilidade do real, defendida por Arida (2003a, 2003b). O autor faz uma defesa explícita da plena conversibilidade da moeda, incluindo a completa remoção dos controles “administrativos”, argumentando que a ausência de conversibilidade da moeda brasileira implicaria em maiores prêmios internacionais de risco, levando consequentemente a taxas de juros e a uma menor credibilidade da moeda local. Em contraposição, Ferrari Filho et al. (2005) argumentam, em essência, que a conversibilidade plena do real teria um efeito contrário ao desejado, implicando em maior volatilidade da taxa de câmbio, dada a redução dos instrumentos à disposição da autoridade monetária para manejá-la, bem como levaria a uma maior dependência do financiamento do balanço de pagamentos pelos ingressos na conta de capitais. Carneiro e Belluzzo (2004) ressaltam ainda o fato de que, na presença de uma moeda estrangeira, tida pelos investidores como um ativo “mais líquido”, a moeda local se enfraqueceria, não suprimindo os efeitos indesejados aos quais se desejava superar.

-10000 -5000 0 5000 10000 15000 US $ m il h õ es Crise no México Crise na Ásia Crise na Rússia Crise no Brasil

Por fim, aponta-se ainda a natureza de ordem política dos controles de capitais, mencionada por Bastos, Biancarelli e Deos (2006):

“os controles de capital tendem a reduzir o poder de veto dos agentes do mercado financeiro internacional a políticas pró-crescimento, reforçando a autonomia de política econômica para canalizar a riqueza financeira, a baixas taxas de juros, para investimento em ativos de capital fixo, geradores de renda e emprego, inibindo ganhos especulativos, a curto prazo, em mercados de ativos líquidos. Com isso, governos podem ser mais responsáveis perante aspirações democráticas (pleno emprego e gastos sociais) em vez de se responsabilizarem, a todo momento, por assegurar sua “credibilidade” perante gestores de portfólio interessados em ganhos patrimoniais de curto prazo – o assim chamado “mercado” ”. (BASTOS; BIANCARELLI; DEOS, 2006, p.551)