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CAPÍTULO III – A experiência com controles de capitais no Brasil pós crise internacional:

3.1. O novo regime cambial e o aprofundamento da abertura

Após a severa crise do balanço de pagamentos, o ano de 1999 marcou a consolidação de um novo conjunto de transformações estruturais na política cambial, em meio a um processo de intensificação da abertura financeira. Ainda no ano de 1999, após intensa desvalorização do real, o BCB abandona o regime de bandas cambiais, dando lugar a um regime de câmbio flutuante. Em consequência, este novo cenário levou o BCB a remover um novo conjunto de restrições ao fluxo de capitais, em função da nova política cambial e da necessidade de financiamento externo.

Nesse ínterim, uma medida de grande importância foi a Resolução do BCB n° 2.628, de 6 de agosto de 1999, que liberalizava amplamente a aplicação de recursos de investidores institucionais estrangeiros em operações de renda fixa, desde que respeitado o limite de 30% de seu patrimônio líquido ou carteira.

Outra regulamentação de extrema relevância para a facilitação da entrada de recursos estrangeiros nesse período foi a publicação da Resolução nº 2.689 de 26 de janeiro de 2000. Como destaca Biancarelli (2003), esta medida extinguia as diferentes modalidades de aplicação previstas na Resolução n° 1.289, mantendo somente aquelas mencionadas no Anexo III, de fundos fechados. A partir desse momento, efetivamente foi permitido ao investidor estrangeiro o acesso a qualquer ativo disponível no país, sob o requisito de manter seus depósitos em uma instituição financeira autorizada a operar no país e submeter seu investimento a uma operação de contratação de câmbio. Ademais, a partir da nova regulamentação, os investimentos estrangeiros estavam autorizados também a indivíduos, ante a restrição anterior que limitava os ingressos de recursos aos investidores institucionais.

É importante destacar que essas mudanças não tornavam ainda o real uma moeda plenamente conversível. A manutenção de depósitos em moeda estrangeira no país seguia vedada e, como já mencionado, a Resolução n° 2.689 exigia que investidores não residentes mantivessem conta com uma instituição doméstica para realizar a compra e venda de ativos no país. No entanto, a Resolução n° 2.689 permitia que investidores não residentes pudessem operar no mercado de derivativos cambiais sem limites, ante a permissão anterior que se limitava apenas a operações de hedge nos mercados à vista (ações e renda fixa) (PRATES, 2015). Com isso, as possibilidades de acesso a inovações financeiras no mercado de derivativos foram ampliadas também aos investidores estrangeiros.

Entre janeiro de 2000 e o mês de março de 2005 se deu um período sem avanços significativos na abertura financeira, até que se procedesse um conjunto de regulamentações no mercado de câmbio. Até março de 2005, o mercado de câmbio era segmentado em duas vias, o Mercado de Câmbio de Taxas Livres (MCTL), destinado a transações comerciais, interbancárias e operações registradas no BCB, como investimento estrangeiro e empréstimos externos e o Mercado de Câmbio de Taxas Flutuantes (MCTC), que compreendia as transações realizadas por instituições autorizadas pelo BCB para fins como viagens internacionais, investimento brasileiro no exterior e remessas de recursos pelas contas “CC5”. Em ambos os mercados seguiam limitadas as possibilidades de envio de recursos ao exterior. A partir 4 de março de 2005, então, o mercado de câmbio é unificado pela Resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) nº 3.265. Neste momento, do ponto de vista legal, são igualadas as possibilidades de ingresso e saída de capitais do país, pois foi permitido a qualquer residente a operação de envio de reservas ao exterior, sem a intermediação das “contas livres de instituições financeiras não residentes” (PRATES, 2015). Ademais, até o ano de 2005, recursos provenientes de venda de investimento no exterior tinham a obrigatoriedade de retornar ao país. A Resolução n° 3.265 do CMN revoga essa restrição, permitindo que esses recursos possam ser reaplicados no exterior.

Em 9 de março de 2005, o BCB, através da Carta Circular n° 3.280, publica também a primeira versão do Regulamento do Mercado de Câmbio e Capitais Internacionais (RMCCI), que sintetiza o novo arcabouço regulatório do sistema financeiro no Brasil e consolida as regras do mercado de câmbio. A partir de então, com a ampla liberalização das

outward transactions, foi possível a extinção das “Contas CC-5”, que permitiam a brasileiros

manter recursos em reais no exterior18.

Em 27 de setembro de 2006, a partir da Resolução n° 3.412 do CMN, a abertura às remessas foi ainda ampliada, permitindo que pessoas físicas e jurídicas pudessem aplicar em mercados de capitais no exterior.

Também em concordância com a diretriz de abertura, foi promulgada a Lei nº 11.371, de 28 de novembro de 2006, que desvinculava os contratos de câmbio para exportação da documentação necessária ao embarque das mercadorias. Com isso, transferiu-

18 Desde o ano de 1996, a manutenção de saldos nas contas CC-5 era restrita a no máximo R$

10.000,00. Todavia, haviam suspeitas da utilização destas contas para transferências ilegais de recursos. Nesse sentido, a extinção das contas CC-5 contribuía com a formação de um mercado unificado de câmbio, embora surgisse como resultado das próprias medidas de liberalização dos fluxos de capitais, que tornaram seu uso pouco necessário.

se ao CMN o poder de discricionariedade acerca da cobertura cambial às exportações (BIANCARELLI, 2010). Ainda nessa direção, permitiu-se gradualmente que as receitas de exportações pudessem ser mantidas fora do país, primeiramente pela Resolução n° 3.389 do CMN, de 7 de agosto de 2006, que isentava em até 30% dessas receitas de retornar ao país e finalmente pela Resolução 3.548, de 12 de março de 2008, que elevava esse coeficiente para 100%.

A partir dessas medidas, a abertura financeira se aprofundava, garantindo amplo acesso estrangeiro ao mercado de capitais brasileiro. Embora o real seguisse como uma moeda “não-conversível”, a intensificação da abertura financeira, aliada a um ambiente de ampla liquidez internacional, seria um elemento fundamental para que o país vivenciasse um novo surto nos influxos a partir dos anos 2000.