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Abordagem centrada na pessoa: Douglas Robinson e sua análise consciente

No documento Do ensino de tradução literária (páginas 78-82)

1. O ensino de tradução no contexto americano e europeu nos últimos 30 anos

1.1. Abordagens de ensino de tradução desenvolvidas nos últimos 30 anos

1.1.7. Abordagem centrada na pessoa: Douglas Robinson e sua análise consciente

sua análise consciente com descobertas subliminares

Os estudos de tradução e a formação de tradutores profissionais são, sem dúvida, parte integrante da explosão das relações interculturais e da transmissão de conhecimentos científicos e tecnológicos; a necessidade de um novo método para os processos de ensino e aprendizagem também se faz sentir nos programas de formação de tradutores e intérpretes do mundo inteiro (ROBINSON, 2002, p. 9).

É com essa afirmação que Douglas Robinson inicia a introdução de Becoming a Translator: An Accelarated Course, publicado em 1997, e traduzido em 2002 no Brasil com o título Construindo o tradutor. Foi reeditado em 2003 com o título Becoming a Translator: An Introduction to the Theory and Practice of Translation. De acordo com Robinson, existe a falsa crença de que não se pode acelerar o aprendizado

76 “[...] Les résultats de toute activité d’enseignement dépendent des apprenant, des enseignants, de la matière et de la méthode, ainsi que des interactions entre tous ces facteurs; l’ensemble est un système complexe dont le comportement n’est pas toujours prévisible.”

sem prejudicar o estudante, porém, de qualquer modo, há a necessidade da prática tradutória, e que o tradutor em formação seja capaz de transitar entre o aprendizado analítico, consciente, lento, e o subliminar, inconsciente, rápido. Para ele, os tradutores em formação, bem como os profissionais, devem ser capazes de identificar e resolver as unidades de tradução, ou seja, “reconhecer áreas problemáticas” (ROBINSON, 2002, p. 12).

De acordo com esse teórico da tradução, o universo do ensino de tradução transita por diversos aspectos: os conhecimentos externos; a perspectiva do usuário (leitor) com relação à tradução; os conhecimentos internos, a perspectiva do tradutor; o aprendiz de tradutor; o processo tradutório; a experiência; as pessoas que têm as línguas em questão como materna, discussão abordada no capítulo “Gente” de seu livro; os profissionais; as línguas; as redes sociais; as culturas e os hábitos.

Os conhecimentos externos, ou seja, a perspectiva dos usuários (contratantes e leitores), levariam em consideração que “o texto, enquanto produto e mercadoria, é o mais importante” (ROBINSON, 2002, p. 16), e, desse modo, para satisfazer às diversas crenças dos usuários com relação à tradução, buscariam a fidelidade ao texto, o que acarretaria no uso de métodos tradicionais de tradução no ensino e prática de tradução. Diz Robinson:

Antigamente, grande parte do pensamento e da didática da tradução era controlada em essência, pelos conhecimentos externos, por métodos voltados para os textos, que se poderiam imaginar de maior interesse para quem não é tradutor do que para os tradutores – tanto, de fato, que essas perspectivas externas chegaram em muitos aspectos, a predominar na área (ROBINSON, 2002, p. 17).

Contudo, raras são as possibilidades de o tradutor ir contra a vontade do contratante, que, geralmente, busca um produto que agradará a um público maior. Por essa razão, “[...] os tradutores [...] raramente podem dar-se ao luxo de ignorar as perspectivas externas de quem não é tradutor, mas é, afinal, sua fonte de renda” (ROBINSON, 2002, p. 23).

Mas, por outro lado, o que caracteriza o tradutor? “Que habilidades fazem com que seja possível “tornarem-se’ médicos, advogados, engenheiros, poetas,

executivos, mesmo que por alguns momentos diante da tela do computador?” (ROBINSON, 2002, p. 42). Assim, continua Robinson:

[...] Em resumo, sim, todos os tradutores e (principalmente) intérpretes têm algo do ator, do mímico, do imitador, e desenvolvem uma capacidade de memória incrível que lhes permitirá recordar-se de palavras (geralmente em língua estrangeira) que só ouviram uma vez (ROBINSON, 2002, p. 42-43).

Percebe-se, então, uma característica do tradutor, “quanto mais agradável achamos que é traduzir, editar, caçar palavras e frases obscuras, mais rapidamente nos tornamos proficientes nessas atividades” (ROBINSON, 2002, p. 78). Desse modo, Robinson relata no decorrer de seu livro as diferentes formas de aprendizagem, visto que cada pessoa apreende novos conteúdos de maneiras diversas e, com isso, demonstra a importância de saber diferenciá-las. O tradutor também deve estar em constante busca por conhecimento, além do que lhe é apresentado nos textos a serem traduzidos, e por esse motivo, deve buscar constantes atualizações com relação às novas tecnologias relacionadas às atividades tradutórias, às novas perspectivas e teorias dos Estudos da Tradução, quer seja por meio de participação em congressos, cursos de extensão e de pós-graduação. Porém, ainda de acordo com Robinson (2002), o tradutor nunca deixa de ser um aprendiz, pois, por meio das traduções requeridas, está sempre aprimorando seus conhecimentos, sendo apresentado a um novo universo de informações.

Para o tradutor profissional, a tradução é um ciclo constante de aprendizado que passa pelos estágios do instinto (disposição indistinta), experiência (trabalho no mundo real) e hábito (“prontidão para a ação”) e, dentro da experiência, pelos estágios de abdução (conjecturas), indução (criação de modelos) e dedução (regras, leis, teorias) [...] um profissional, para quem os processos mentais complexos se tornaram naturais (e, portanto, subliminares), e um aprendiz, que precisa constantemente enfrentar e resolver problemas novos de maneiras analíticas conscientes. [...] Ou seja, o tradutor seria um profissional eternamente sedento por conhecimento (ROBINSON, 2002, p. 133).

Robinson recheia seu livro com atividades e técnicas baseadas em métodos utilizados em cursos de línguas estrangeiras e demonstra a importância de cursos de tradução no ambiente universitário ao analisar o modo como ocorre a aprendizagem por meio da abdução, da indução e da dedução, ou ao propor o desenvolvimento das

competências necessárias ao tradutor por meio da “roda da experiência” (ROBINSON, 2002, p. 148).

Figura 5. “Roda da experiência” (ROBINSON, 1997, p. 104).

Por essa razão, ele afirma ainda que “não existe apenas um método teórico ‘correto’ ou ‘útil’ para a tradução: pelo contrário, cada aluno pode aprender a escolher o que achar útil no conjunto de métodos teóricos” (ROBINSON, 2002, p. 359). Segundo Robinson (2002, p. 71),

a tradução é uma atividade inteligente que envolve processos complexos de aprendizado consciente e inconsciente; todos aprendemos de maneiras diferentes, e o ensino institucional deve ser, portanto, o mais flexível, complexo e rico possível, para ativar os canais pelos quais cada aluno aprende melhor.

Percebe-se, assim, que mesmo sendo uma abordagem centrada no aprendiz, Robinson demonstra a importância da instituição e do professor na formação do tradutor.

A seguir apresentaremos a abordagem metacognitiva, proposta pelo professor da Universidade de Montreal (UdeM), Álvaro Echeverri, a qual tem suas

bases na psicologia cognitiva da década de 1970 e que se baseia na importância da reflexão e da busca pela autoformação dos aprendizes.

No documento Do ensino de tradução literária (páginas 78-82)