• Nenhum resultado encontrado

Para Gadotti e Gutiérrez (2001, p. 18), um dos paradigmas da Era da Informação é o de que “o conhecimento do conhecimento é poder”, e “saber como é tão importante quanto saber o que: saber como encontrar as informações, saber como usá-las, saber como elas serão apresentadas”.

A disputa pela informação, se gera poder, também gera desequilíbrio, especialmente com a força dos grandes meios de comunicação de massa e o monopólio do ferramental que ampliariam a possibilidade de comunicação, e que seria disponibizado a partir dos próprios grandes meios ou interesses do capital dominante – a exemplo de

33 A palavra stakeholder tem origem no mundo da

Administração, e significaria “acionista”. Atualmente, a definição mais comum de stakeholder no campo da Comunicação Social é a que traz HARRISON, Jeffrey S. (2005, p. 31) de que “são os públicos de interesse, grupos ou indivíduos que afetam e são significativamente afetados pelas atividades de alguma organização, como imprensa, governo, comunidade, entre outros”.

equipamentos como computadores, programas, e o próprio acesso a internet, que é oferecido por empresas privadas.

Preocupação atual, mas que já era percebida na década de 1970, quando a UNESCO organizou uma Comissão Internacional para os Estudos dos Problemas da Comunicação. Essa Comissão publicou, em 1980, o documento Um Mundo, Muitas

Vozes, mais conhecido como Relatório MacBride, contendo um panorama da

comunicação mundial e reflexões sobre os impactos das tecnologias da informação no contexto socioeconômico e cultural. Melo (2005) lembra que este relatório já apontava a exclusão midiática de grupos e povos socialmente excluídos, cerceando não só o direito à informação e aos meios, mas também o da liberdade de expressão. Este documento sugere 11 princípios, da eliminação de monopólios públicos ou privados de comunicação, à pluralidade de fontes e canais de informação, passando ainda pelos direitos de todos povos, baseando-se na igualdade, justiça e benefícios mútuos, no que diz respeito ao acesso a informação e participação ativa nos fluxos de comunicação.

Publicado em português em 1983, o Relatório MacBride também fez alertas importantes sobre a modernização das tecnologias de comunicação, o que não necessariamente favorecem a democratização dos meios:

Devido à modernização das tecnologias de comunicação, o controle popular torna-se ao mesmo tempo mais vital e mais difícil. O estabelecimento e desenvolvimento de sistemas de informação em grande escala e de bancos de dados conduzem à acumulação de massas enormes de dados de importância essencial nos setores social, econômico e político. O acesso a essas fontes de informação pode naturalmente ficar limitado aos que as controlam ou pode se estender a um amplo público de usuários potenciais. O público deve exercer pressão para atingir uma participação democrática mais ampla nas decisões relativas à difusão do conteúdo da informação para se opor à concentração do controle da comunicação (...). Em suma, os processos técnicos podem chegar a ser obstáculos ou ameaças para a democratização da comunicação. Mas, ao mesmo tempo, esses novos serviços podem conduzir também a algumas estruturas descentralizadas e mais democráticas. (UNESCO, 1983, s/p).

Esta publicação teve reflexos em escala mundial, e também no Brasil, país signatário de pactos e documentos com o tema do acesso a informação e comunicação

como o Regulamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos (1980). A Corte recebe e julga denúncias de violações de Direitos Humanos internacionalmente e foi a primeira instância a reconhecer o direito de acesso a informações públicas como um direito humano.

Existem outros pactos internacionais importantes que o Brasil também participa, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais (1989), que trata do direito à comunicação prévia sobre questões que afetam povos e comunidades tradicionais como os indígenas; e ainda a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992), que contém 27 princípios para a garantia da integridade da vida no planeta – entre eles, o princípio 10, que estabelece o direito de acesso a informações ambientais.

A regulamentação da comunicação e do acesso à informação na forma de políticas públicas, no Brasil, no entanto, caminha a passos lentos. O direito de acesso à informação é reconhecido pela Constituição de 1988 e houve várias tentativas de incorporar à legislação as especificidades relacionadas a esse direito, na prática pouco conhecidas. Em 2002, a Convenção 169 da OIT foi ratificada pelo Brasil34 e reconhecida pelo Decreto-Lei federal no 5051/2004, mas até os dias atuais não foi plenamente regulamentada. A construção da hidroelétrica de Belo Monte, na bacia do Rio Xingu, no norte do Pará, por exemplo, não levou em consideração a consulta prévia aos povos indígenas que seriam afetados pela obra, como recomenda a Convenção 169. Isto não aconteceu mesmo com ações movidas pelo Ministério Público Federal, que defende o direito de consulta para os povos indígenas35.

O acesso a informações socioambientais também tem uma lei federal pouco divulgada: a de no 10.650/2003, que dispõe sobre o acesso público aos dados e

34 Informação disponível em: <http://bit.ly/1HH9QtZ>. Acesso em 20 jan 2015.

35 Sobre o tema da consulta prévia aos povos indígenas, no final de janeiro de 2015 um grupo indígena da

etnia Munduruku e ribeirinhos de assentamentos no Pará entregaram à Secretaria Geral da Presidência da República, protocolos de consultas que eles próprios elaboraram sobre a obra de outra usina hidrelétrica, a de São Luiz do Tapajós (PA). A entrega do protocolo foi considerado etapa necessária mo processo de licenciamento ambiental da usina. O MPF cobrou da FUNAI, órgão que cuida das questões indígenas no Brasil, o acesso público a esse relatório. Informações da notícia Índios e Ribeirinhos entregam protocolos

de consulta prévia da UHE São Luiz do Tapajós, disponível em: <http://bit.ly/1JpBprV>. Acesso em 6 jan

informações existentes nos órgãos e entidades integrantes do SISNAMA36 (Sistema Nacional de Meio Ambiente). Essa lei estabelece que estes órgãos e entidades são obrigados a permitir o acesso público a documentos, expedientes e processos administrativos que tratem de matéria ambiental.

São exemplos de informação ambiental: relatórios, legislação, diretrizes, instruções normativas, resoluções, entre outros, de interesse público. Este direito inclui, também, acesso público a Estudos e Relatórios de Impactos Ambientais (EIA-RIMAs), documentos que, embora sejam elaborados por empresa também privadas, são instrumentos para que estas empresas obtenham licenciamento para determinados empreendimentos que causam impactos ao meio ambiente. Temas relacionados a qualidade do meio ambiente, diversidade biológica, resultados de monitoramento de atividades poluidoras e ainda acidentes e situações estão entre os que são obrigatórios na garantia do acesso a informação na lei, que ainda orienta que este acesso seja em meio escrito, visual, sonoro ou eletrônico.

Se as informações ambientais não forem disponibilizadas, qualquer cidadão pode solicitá-las, por escrito, aos órgãos ambientais, desde 2003. Mas foi somente com a promulgação de outra Lei Federal, a de no 12.527/2012 (conhecida como a Lei de Acesso à Informação), que as entidades federais passaram a dar mais visibilidade à questão do direito à informação, orientando os cidadãos brasileiros com mais clareza em todos os portais eletrônicos de órgãos públicos e em um portal específico37, e ainda monitorar a

implementação dessa lei.

O Sistema Eletrônico do Serviço de Informação ao Cidadão (e-SIC) traz dados38 de que, entre o período de maio de 2012 (quando o sistema de registro de pedidos

de informações foi aberto ao público) a dezembro de 2014, houve 232.040 pedidos de acesso a informações; 824 delas direcionadas ao ICMBio, órgão que cuida das UCs

36 O Sisnama foi criado pela Lei Federal no 6938/81 e reúne órgãos e entidades federais, estaduais e

municipais responsáveis pela proteção, melhoria e recuperação da qualidade ambiental no Brasil. O objetivo é formar uma rede para normatizar regras e práticas nos três níveis de governo. Informação disponível em: http://www.mma.gov.br/governanca-ambiental/sistema-nacional-do-meio-ambiente. Acesso em 20 jan 2015.

37 Portal de Acesso à Informação do Governo Federal: http://www.acessoainformacao.gov.br. Acesso em

20 abr 2015.

federais, contendo 6126 perguntas de 399 solicitantes. Ainda segundo os dados disponibilizados no Portal e-SIC, 816 solicitações de informações tiveram o acesso concedido – cinco tiveram acesso negado (o portal não informa o motivo), duas o órgão não tinha competência para responder sobre o assunto; e uma resposta foi parcialmente concedida. O portal não dá acesso às questões detalhadas.

Embora o Portal não apresente as perguntas e respostas, ele oferece uma tabela com os assuntos mais abordados nas solicitações de acesso a informação. Ainda dentro da pesquisa relacionada ao órgão ICMBio, a tabela 1 parece indicar que os usuários solicitantes têm muitas dúvidas relacionadas a qualidade ambiental e ao tema das UCs:

Tabela 1 – Temas das solicitações de acesso a informação junto ao ICMBio, no período entre maio de 2012 e dezembro de 2014

Tema Quantidade % total

Meio ambiente - Qualidade ambiental 445 54,00%

Meio ambiente - Áreas protegidas 298 36,17%

Meio ambiente - Gestão de meio ambiente 42 5,10%

Meio ambiente - Cidadania ambiental 9 1,09%

Meio ambiente - Infrações ambientais 5 0,61%

Meio ambiente - Ambientes ocupados pelo homem 4 0,49%

Trabalho - Profissões e ocupações 4 0,49%

Governo e Política - Administração pública 2 0,24%

Economia e Finanças - Administração financeira 2 0,24%

Meio ambiente - Economia e meio ambiente 2 0,24%

Fonte: e-SIC, disponível em: <http://bit.ly/1IaJvrK>. Acesso em 20 jan 2015.

Mais um dado interessante sobre os 824 pedidos de informações relacionadas ao ICMBio, a partir do Portal de Acesso a Informação: 19,15% desses pedidos são provenientes do Distrito Federal; 14,10% de São Paulo e 12,50% do Rio de Janeiro – quase 50% do total de pedidos. Nos demais estados, os pedidos são pulverizados, o que denota, também, menor articulação desses estados e desconhecimento da possibilidade de se obter informações de interesse por meio do portal na internet.

Além de desconhecimento sobre a Lei de Acesso a Informação, é importante refletir sobre o quanto o acesso à internet no Brasil – onde essa lei se ampara - ainda não

é realidade para muitos estados. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD39) em 2013, informa que 85,6 milhões de pessoas com 10 ou mais anos de idade

(49,4% da população) haviam acessado a internet nos três meses anteriores à pesquisa. E enquanto o Sudeste, o Centro-Oeste e o Sul ultrapassam os 50% do total da população acessando a internet, no Norte e Nordeste este número cai para 29,9% e 33,6%, respectivamente. O acesso a internet chega a 89,8% entre as pessoas com 15 anos ou mais de estudo; e cai para 5,4% para quem não tem nenhuma instrução.

A partir da leitura desses números, é importante refletir sobre o tipo de acesso a informação pública que deveria ser promovido pelo Poder Público, que não pode ser resumido a pedidos via internet, como é o caso do portal de acesso a informação.

Há a necessidade de se utilizar outros instrumentos e formas para que a população em geral tenha a oportunidade de tirar suas dúvidas junto a instituições públicas. Além disso, é preciso também promover orientações sobre o uso desse portal. Sobre informação pública, Batista (2010) destaca que é diferente daquilo que o Poder Público seleciona para ser publicizado. A informação pública seria “um bem público, tangível ou intangível, como forma de expressão gráfica, sonora e/ou iconográfica, que consiste num patrimônio cultural de uso comum da sociedade e de propriedade das entidades/instituições públicas da administração centralizada, das autarquias e das fundações públicas” (BATISTA, 2010, p. 40).

A informação pública não necessariamente é produzida apenas pela administração pública, e deve ser disponibilizada ao público em geral. Este acesso teria “o poder de afetar elementos do ambiente, reconfigurando a estrutura social” (BATISTA, 2010, p. 40). No caso de informações socioambientais, trata-se de um componente importante para qualificar a participação em tomadas de decisão e ampliar a possibilidade do controle social, como já foi apontado, na introdução deste trabalho, a partir de Jacobi (1996) e Furriela (2002).