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2. LETRAMENTO E ALFABETIZAÇÃO: TUDO JUNTO, MISTURADO OU

2.1 Alfabetizar é ensinar a ler e a escrever letras, palavras, frases

Para dar início à discussão acerca do entendimento do processo de alfabetização, por

parte dos profissionais na área de Educação, convidamos Soares (2004, p. 24) para esse diálogo

inicial que, em suas palavras, destaca o fato de que “a aproximação, ainda que para propor

diferenças, entre letramento e alfabetização, tem levado à concepção equivocada de que os dois

fenômenos se confundem, e até se fundem”.

A autora nos remete a algumas questões: é possível denominar e dominar processos de

ensino aprendizagem que abordam o que ainda nem apreendemos como conceito? Como pôr

em prática estratégias relacionadas a esses temas em nossas salas de aula, se o que nos parece

conceito, muitas vezes, é apenas senso comum, construído no cotidiano escolar? A concepção

desses “conceitos” estaria permeando as práticas de professores alfabetizadores e de Língua

Portuguesa? Estaria o processo de alfabetização baseado apenas em ensinar a ler e a escrever

letras, palavras, frases?

Infelizmente o sistema educacional brasileiro ainda atribui à alfabetização o status de

processo de codificação/decodificação diretamente relacionado aos sons em letras, ou seja, uma

visão estritamente fonética. Como consequência, tal pensamento contribui para o

fortalecimento da crença de que a linguagem escrita representa a fala na modalidade escrita

(GOULART, 2006). Entretanto, autores como Olson (1998) propugnam que a escrita não deve

ser considerada uma transcrição da oralidade, antes um modelo conceitual diretamente

relacionado ao discurso, permitindo a percepção de elementos e estruturas linguísticas nele

presentes. Entendemos que a escrita e a fala são processos que se complementam, mas que a

escrita não representa a fala em sua totalidade, pois esta possui aspectos fonológicos que nem

sempre são adequados a utilização em textos escritos. Na língua escrita existe uma maior

exigência também, no que se refere as regras da gramática normativa.

Todavia, no Brasil ainda persiste a concepção de que a alfabetização está diretamente

relacionada à aprendizagem inicial da leitura e da escrita, tendo como prioridade, oportunizar

ao aluno o reconhecimento das palavras e sua correspondência fonográfica, de forma que o

processo de ensino e aprendizagem, muitas vezes, não favorece a abordagem de palavras

significativas para o aluno em seus ambientes de convivência. Rego e Dubeux (1994, p 44)

corrobora com tais afirmações ao inferir que a alfabetização “de uma maneira geral, tratava-se

de uma visão comportamental da aprendizagem que era considerada de natureza cumulativa,

baseada na cópia, na repetição e no reforço”.

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A autora destaca ainda os anos 80 como marco inicial dos questionamentos

concernentes à alfabetização escolar brasileira, pois, nesta época, ainda se priorizavam

associações e memorizações correlacionando fonemas a grafemas, em detrimento do

desenvolvimento de habilidades relacionadas à compreensão e ao funcionamento da escrita

alfabética e sua utilização em contextos reais de comunicação.

Podemos afirmar que o domínio das competências de leitura e de escrita com ênfase nas

práticas sociais, direcionadas ao letramento e às dificuldades relacionadas ao processo de ensino

aprendizagem da escrita, eram tratadas como processos distintos, o que Soares (1998) descreve

como um tratamento de “não-causalidade” entre alfabetização e letramento.

A autora faz uma crítica à ineficácia do processo denominado de alfabetização, porque

o considera como “uma progressiva invenção da palavra e do conceito de letramento, e

concomitante desinvenção da alfabetização, resultando na polêmica conjuntura atual que me

atrevo a denominar de reinvenção da alfabetização”. Para Soares (1998), essa reinvenção estaria

diretamente relacionada ao reconhecimento da importância (e da necessidade) de

desenvolvimento de habilidades que favorecessem a utilização da leitura e da escrita.

Destacamos ainda, que o termo alfabetização não se aplica ao letramento de surdos pois

baseia-se na fonética do alfabeto.

Em outro de seus artigos, Soares (2004, p. 96) refaz o percurso histórico referente à

alfabetização nas escolas brasileiras, nomeando este processo de “uma trajetória de sucessivas

mudanças conceituais e, consequentemente, metodológicas”. No entanto, a autora destaca

estarmos novamente enfrentando um desses momentos de mudança, denunciando ainda que

“pesquisas têm identificado problemas nos processos e resultados da alfabetização de crianças

no contexto escolar, insatisfações e inseguranças entre alfabetizadores, perplexidade do poder

público e da população diante da persistência do fracasso da escola em alfabetizar”. Tais

afirmações, segundo a autora, têm sido evidenciadas através dos processos de Avaliações

Nacionais, Estaduais e Internacionais das quais o Brasil participa.

Não apenas no Brasil, mas em muitos países, o número de avaliações tem aumentado

significativamente nas últimas décadas. A saber: Sistema de Avaliação do Ensino Básico

(SAEB)

15

e o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes — Programme for

International Student Assessment (PISA) —, da Organização para a Cooperação e

Desenvolvimento Econômico (OCDE).

16

15 Disponível em <https://www.somospar.com.br/saeb/>. Acesso em 15 jun. 2019.

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Os programas em questão visam avaliar os níveis de alfabetização da população que se

encontra em pleno processo de escolarização. Os resultados obtidos têm sido alvo de muitas

críticas no Brasil e em muitos outros países, devido à concepção equivocada e totalizante da

aprendizagem da língua escrita. Essa concepção está pautada em um único padrão/nível de

conhecimento, que supostamente estaria presente em todo território nacional, desconsiderando

os aspectos socioculturais, presentes nos diferentes estados brasileiros. Soares (2004, p.12)

ressalta que essas críticas incidem “particularmente da ausência, no quadro dessa concepção,

de instrução direta e específica para a aprendizagem do código alfabético e ortográfico”, ou

seja, que o processo de alfabetização está centrado na decodificação de fonemas ou signos,

completamente afastados dos estudos de letramento.

Dessa forma, torna-se necessário refletir e analisar as teorias e as práticas de

alfabetização em voga, de forma a reconhecer a necessidade da elaboração, e consequentemente

da efetivação de “comportamentos e práticas sociais na área da leitura e da escrita que

ultrapassem o domínio do sistema alfabético e ortográfico, nível de aprendizagem da língua

escrita perseguido, tradicionalmente, pelo processo de alfabetização” (SOARES, 2004, p. 96).

A autora afirma ser esse o contexto em que surge, há cerca de duas décadas, o conceito de

letramento abordado por diversos autores (KLEIMAN, 2009; SCRIBNER; COLE, 1981;

SOARES; BATISTA, 2005), ou seja, que o surgimento deste seria decorrente da

imprescindibilidade de representar e designar atitudes e práticas sociais, concernentes à

aquisição e utilização da leitura e da escrita.

A ampliação da ideia de que as práticas sociais de leitura e de escrita adquiriram maior

perceptibilidade e relevância, já que a vida em sociedade e as relações e ocupações profissionais

encontram-se pautadas na utilização da língua escrita. Isso tornou evidente a ineficácia de

somente alfabetizar e, por conseguinte, surgiu a necessidade de ampliação do que viria a ser o

conceito de alfabetização, visto que esse era concebido por muitos como restrito ao ensino da

codificação e da decodificação dos signos.

Quando refletimos acerca das mudanças conceituais e metodológicas que se sucederam

no decurso da história - com foco no ensino da língua escrita -, ainda no início do processo de

escolarização, fica mais claro que, até os anos 80, as classes de alfabetização tinham como o

processo de ensino aprendizagem do sistema formal da escrita. Visando atender esse objetivo

central, vários métodos de alfabetização se revezavam. A saber: ora optava-se pelo princípio da

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síntese

17

, e a seguir pelo princípio da análise

18

. Podemos depreender que em ambas as opções

a ênfase é dada ao ensino e à aprendizagem do sistema alfabético/ortográfico.

Porém, em ambas as concepções, a finalidade era a aprendizagem do sistema alfabético

e ortográfico da escrita; se bem que devemos reconhecer que quanto à utilização do princípio

da análise, havia uma atenção especial com o sentido difundido pelo código. Soares (2004,

p.24) nos faz uma breve definição a despeito da utilização do princípio da análise ao destacar

que:

Seja no nível do texto (método global), seja no nível da palavra ou da sentença (método da palavração, método da sentenciação), estes – textos, palavras, sentenças – são postos a serviço da aprendizagem do sistema de escrita: palavras são intencionalmente selecionadas para servir à sua decomposição em sílabas e fonemas, sentenças e textos são artificialmente construídos, com rígido controle léxico e morfossintático, para servir à sua decomposição em palavras, sílabas, fonemas.

Podemos depreender, portanto, que a alfabetização nas escolas brasileiras, até os anos

80, teve como principal característica a alternância entre os dois métodos citados. No entanto,

ambos com o mesmo propósito: o domínio do sistema alfabético/ortográfico, que tinha como

premissa o desenvolvimento de competências para a utilização da leitura e da escrita. Dessa

forma, os alunos primeiramente aprendiam a ler e a escrever, para apenas posteriormente serem

expostos a atividades envolvendo a leitura e a produção textual.

A partir da década de 80, inicia-se a abordagem do processo de alfabetização utilizando

a perspectiva psicogenética, com destaque à obra e ao desempenho formativo de Emília

Ferreiro. Em seus estudos sobre letramento, Ferreiro trouxe à voga os estudos denominados de

“construtivismo”, provocando assim, alterações significativas no que concerne aos

pressupostos e objetivos no âmbito da alfabetização. A divulgação do construtivismo no Brasil

transformou essencialmente o entendimento do processo de aprendizagem e dissipou a

discriminação existente entre o processo ensino-aprendizagem do sistema de escrita das práxis,

antes consolidadas, de leitura e de escrita.

No entanto, o construtivismo priorizava a realização, por parte da criança, de processos

de conceptualização da língua, bem como se fundamentava na importância da interação desta

com práticas de leitura e de escrita, ou seja, processos espontâneos de compreensão utilizados

17 Princípio no “qual a alfabetização deve partir das unidades menores da língua – os fonemas, as sílabas – em direção às unidades maiores – a palavra, a frase, o texto (método fônico, método silábico)”.

18 Princípio “segundo o qual a alfabetização deve, ao contrário, partir das unidades maiores e portadoras de sentido – a palavra, a frase, o texto – em direção às unidades menores (método da palavração, método da sentenciação, método global)”.

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como artifício para motivar e provocar a ocorrência do processo de alfabetização em detrimento

do ensino pautado nas relações estabelecidas entre a fala e a escrita.

Consequentemente, Soares (2004) faz duras críticas ao construtivismo por vários

aspectos, dentre os quais, por ter culpado todos os métodos que evidenciavam o ensino óbvio e

sistemático da escrita, sem sequer apresentar uma alternativa de como alfabetizar, ou seja, não

propunha um método de ensino consistente. A autora ressalta ainda que dessa forma os

professores foram induzidos ao erro, ao presumir que as próprias crianças construiriam de forma

casual as relações entre a fala e a escrita como consequência de sua interação com incontáveis

e diversificadas práticas de leitura e de escrita, cuja autora denomina de “atividades de

letramento”.

Acreditamos que tais argumentos possam ter corroborado com o surgimento de várias

propostas utilizando como base o método fônico. Dessa forma, o retorno a velhas práticas, como

a utilização do método citado, surgiu como alternativa para uma antiga demanda, ou seja, a

aprendizagem da leitura e da escrita em nossas escolas.

A inabilidade quanto à criação de objetivos e estratégias eficazes de ensino e de

aprendizagem, cujo resultado deveria ser a ampliação do significado do conceito de

alfabetização, ainda em vigor, pode ter contribuído significativamente para justificar o advento

de surgimento do termo letramento.

Entendemos que o conceito de letramento encontra-se arraigado ao conceito de

alfabetização; pois este pode ser facilmente encontrado através da análise de “fontes como os

censos demográficos, a mídia, a produção acadêmica” (SOARES, 2004, p. 7), o que tornou

comum a citação do termo letramento, muitas vezes em substituição ao termo alfabetização, ou

mesmo paralelamente a ele. Mudanças acerca do conceito de alfabetização estão presentes nos

censos demográficos, verificando-se uma gradativa ampliação deste no decorrer de décadas,

como veremos a seguir.

Em vigor até o censo de 1940, o conceito de indivíduo alfabetizado podia ser atribuído

a todo aquele que autodeclarasse saber ler e escrever o próprio nome. Posteriormente

passou-se a considerar alfabetizados todos os que possuíspassou-sem a “capacidade de ler e escrever um bilhete

simples, ou seja, capaz de não só saber ler e escrever, mas de já exercer uma prática de leitura

e escrita, ainda que bastante trivial” (SOARES, 2004, p.7).

Analogamente à evolução do conceito de alfabetização, como foi interpretado pelos

Censos pós anos 50, o mesmo ocorreu em relação à mídia, que abordou constantemente a

temática no decorrer dos anos 90 (SOARES, 2004). Nesta mesma época, notícias sobre índices

de alfabetização no país eram divulgadas nos resultados dos Censos, que apresentavam o

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percentual de analfabetos, porém evidenciavam o alto número de Desqualificados. Segundo a

Folha de S. Paulo, fonte citada pela autora, tal perfil estava relacionado ao indivíduo que se

autodeclarava apto a ler e a escrever um bilhete simples, mas que possuía menos de quatro (04)

anos de escolaridade. A esses, a folha de São Paulo considerava como analfabetos funcionais.

Em reportagens atuais sobre a mesma temática, temos visto a utilização de “termos

como semi-analfabetos, iletrados, analfabetos funcionais, ao mesmo tempo que se tornou

comum ouvirmos duras críticas à vinculação de informações sobre índices de alfabetização e

analfabetismo que têm como base apenas o critério censitário de saber ou não saber “ler e

escrever um bilhete simples”” (SOARES, 2004, p.08). Ou seja, tem sido divulgado e defendido

pela mídia um conceito de alfabetização que muito se assemelha ao conceito de letramento.

Fizemos uma breve pesquisa em sites da internet em novembro de 2019, abarcando o

período de 2014 a 2019, que abordaram questões referentes à alfabetização. Nossa busca

evidenciou que esse quadro ainda persiste. Observamos que em chamadas de reportagens

veiculadas online, o foco das pesquisas ainda é o letramento, como verificado no noticiário

divulgado pelo site do G1

19

, na edição de 14 de dezembro de 2016, ao apresentar o seguinte

título: “Brasil fica em sexto em ranking de países mais ignorantes do mundo”. Trata-se de uma pesquisa

realizada em 40 países dentre os quais a Índia ocupa o primeiro lugar e a Holanda o último. Os índices

foram determinados usando os critérios diferença entre percepção e realidade de cada país.

Os entrevistados responderam a perguntas tais como: Qual a porcentagem de

muçulmanos que está vivendo atualmente em seu país e a quanto pode chegar até 2020? Qual

o percentual da população que se acha feliz? Qual o número de pessoas que pensam que o

aborto e a homossexualidade são moralmente inaceitáveis? Além dessas questões, os

participantes também foram questionados acerca da distribuição de renda, dos gastos públicos

na área de saúde e o tamanho da população.

Através da análise dos exemplos citados, podemos depreender que o conceito de

alfabetização vem sendo progressivamente substituído pelo conceito de letramento, pois as

perguntas da pesquisa realizada não estão relacionadas ao conceito de alfabetização, ou seja, à

capacidade de ler, escrever e interpretar textos. Fica, portanto, evidente, que tais questões

possuem relação direta com o conceito de letramento no que tange ao contexto social, pois essas

19 G1 é um portal de notícias brasileiro mantido pela Globo.com e sob orientação da Central Globo de Jornalismo. O portal disponibiliza o conteúdo das diversas empresas do Grupo, além de reportagens próprias em formato de texto, fotos, áudio e vídeo.

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abordam o cotidiano social, em que mesmo um analfabeto, que circula neste meio, seria capaz

de responder.

Já o Programa de Avaliação Internacional do Aluno (PISA), da Organização para a

Cooperação e o Desenvolvimento Econômico

(OCDE), cujos resultados são divulgados no

próprio site, em 2018 avaliou alunos de 79 países, abrangendo países da OCDE, Brasil, Letônia

e a Rússia. Esta avaliação teve como foco o desempenho em matemática, Ciências e nível de

letramento (leitura) dos participantes. No que se refere ao letramento ao qual foi atribuído o

papel de compreender, usar, refletir sobre e envolver-se com os textos escritos, a fim de alcançar

um objetivo, desenvolver conhecimento e potencial e participar da sociedade.

A média de respostas corretas do Brasil foi de 41,3%, abaixo da obtida por países da

OCDE. Embora numericamente os dados indiquem um pequeno avanço, desde que o exame

teve início (em 2000). A avaliação do relatório é que houve pouca mudança nos últimos dez

anos, pois em 2000, a pontuação do Brasil no que se refere às habilidades de leitura foi de 396

pontos. Em 2009, chegou a 412. Cerca de dez anos depois, em 2018, a pontuação obtida pelos

estudantes foi de 413. As notas dos demais países variam de 340 a 555, na média, ou seja, a

média de 400 pontos representa um nível básico de compreensão.

O Correio do Povo

20

, Jornal de Porto Alegre, publicado em 07 de julho de 2019, também

destaca problemas de alfabetização ligados à perspectiva de letramento ao noticiar que “Brasil

tem cerca de 38 milhões de analfabetos funcionais”. O site do jornal destaca a dificuldade dos

brasileiros em entender e se expressarem por meio de letras e números em situações cotidianas,

como fazer contas de uma pequena compra, identificar informações em um cartaz de vacinação

ou mesmo de calcular o custo de uma conta.

O estudo, feito pelo Ibope Inteligência, é desenvolvido pela ONG Ação Educativa e pelo

Instituto Paulo Montenegro. Segundo o indicador, 29% dos brasileiros são considerados

analfabetos funcionais. Deste total, 8% são analfabetos absolutos (aqueles que não conseguem

ler palavras e frases). Outros 21% estão no nível considerado rudimentar (não localizam

informações em um calendário, por exemplo). De acordo com o Instituto Paulo Montenegro,

estes brasileiros estão entre 15 e 64 anos, aproximadamente, e não conseguem escrever de modo

aceitável e pleno. O site cita ainda que, de acordo com o IBGE, o quantitativo de analfabetos

funcionais é de aproximadamente 30 milhões de brasileiros.

20 Disponível em: https://www.correiodopovo.com.br/not%C3%ADcias/ensino/brasil-tem-cerca-de-38-milh%C3%B5es-de-analfabetos-funcionais-1.268788

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Por último, mas corroborando com as reportagens anteriores, o site da jusbrasil

apresentou como destaque o seguinte título: “Pesquisador conclui que mais da metade dos

universitários brasileiros são analfabetos funcionais”. O site apresenta uma reportagem

veiculada pelo DF/TV, Programa Segunda Edição, da Rede Globo, uma matéria destacando

uma pesquisa feita pela Universidade Católica de Brasília, cujos resultados obtidos

demonstram que aproximadamente mais de 50% da média dos 800 universitários

participantes do estudo sofrem de analfabetismo funcional. A pesquisa avaliou aspectos como

estratégias de estudo, tempo de empenho, além de características socioculturais e formação.

Ou seja, se analisarmos os destaques apresentados por nosso sucinto levantamento,

podemos concluir que existe ainda nos dias de hoje uma preocupação mais centrada no processo

de letramento. Na medida em que enfatizam a necessidade de utilização de práticas que

possibilitem aos alunos a imersão no universo do letramento, as mesmas reportagens nos

remetem ao fato de que há uma tentativa de desvincular o processo de alfabetização do

letramento, seja por desconhecimento ou intencionalmente.

Outro problema revelado por Soares (2004) é referente à confusão existente entre os

dois conceitos. Argumenta que o termo letramento está originalmente ligado à busca ineficaz

da ampliação do conceito de alfabetização. A autora ressalta que se houvesse a recomendada

ampliação do conceito de alfabetização, talvez não fosse necessária a distinção entre os dois

conceitos defendendo sua distinção apenas no plano pedagógico pois, apesar de distintos, “os

dois processos sejam reconhecidos como indissociáveis e interdependentes” (SOARES, 2004,

p. 97).

Como dito anteriormente, os conceitos de letramento e alfabetização parecem ser

considerados, de alguma forma, homogêneos, o que nos suscita as seguintes perguntas: com

que frequência tais conceitos são utilizados como sinônimos pelos professores participantes de

nossa pesquisa? Essa confusão conceitual, se existente, reflete no processo de ensino da Língua

Portuguesa para alunos surdos? Em que medida as concepções dos professores pesquisados

interferem na construção de suas práticas pedagógicas?

Por acreditarmos na relevância em distinguir os dois conceitos, abordaremos a seguir o

conceito e as questões referentes ao processo de letramento, de forma a subsidiar as inferências

que faremos no decorrer deste estudo.

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