4. CAMINHOS PERCORRIDOS
4.4 Os primeiros passos
4.4.2 Organização da educação de surdos no município
Tendo em vista a crescente demanda pertinente à educação especial e as especificidades
e diversidades que seu público abarca a Secretaria Municipal de Educação do município em
1978, por intermédio do Serviço de Orientação Educacional (SOE), iniciou o trabalho
educacional destinado a alunos com deficiências na Rede Municipal de Ensino (SME). O Setor
de Educação Especial é constituído por equipes distintas que, apesar de atuarem de forma
integrada, possuem programas e planos de ação, destinados a cada especificidade do público
alvo da educação especial. A saber:
• Programa de Sala de Recursos;
• Programa de Deficiência Intelectual/Mental;
• Programa de Surdez;
• Programa de Autismo e demais transtornos globais do desenvolvimento;
• Programa de Deficiência Visual;
• Programa de Deficiência Física, Deficiências Múltiplas e Tecnologias Assistivas;
• Programa de Altas Habilidades/Superdotação.
No período de realização da pesquisa, os integrantes de cada programa, além de
acompanharem as escolas de acordo com a especificidade alvo, também passaram a
acompanhar as escolas no que se refere às demais deficiências. Assim, o que antes era
atendimento especializado tornou-se um atendimento generalista. O Programa de Surdez
apresenta configuração própria e diferenciada dos demais programas, pois além de visar o
desenvolvimento cognitivo dos alunos, ele é feito com foco no ensino e aperfeiçoamento da
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Figura 02: Estrutura funcional do Programa de Educação de Surdos
Fonte: Figura elaborada pela autora para fins dessa tese
Como podemos verificar através da imagem apresentada, a formação pedagógica
destinada a professores de turmas bilíngues e das SRM, Assistentes educacionais, Instrutores
de Libras (06) e Intérpretes de Libras/Língua Portuguesa, é pensada pela rede como parte
comum a todo o processo de escolarização dos alunos. Ênfase é dada também ao ensino da
Libras, destinada a professores, alunos e aos familiares e à comunidade escolar.
4.4.2.1. Funcionamento da educação de surdos no município na prática
Entendemos que muitas vezes um ideal pensado coletivamente nem sempre pode ser
vislumbrado, por diversos fatores, na prática. Dessa forma, destacaremos a seguir, como de fato
encontra-se em funcionamento o programa para educação de surdos implementado pela rede de
ensino investigada.
• Classes Bilíngues - Turmas com cerca de dez (10) alunos, formadas exclusivamente por
crianças e jovens surdos. As turmas são atendidas por professores bilíngues, nas quais a língua
de instrução é a Libras. O currículo utilizado é compatível com o das classes regulares, sem
qualquer redução. Nesse espaço o foco é o ensino através da Libras, com aulas de Libras
oferecidas pelos assistentes surdos. É papel do assistente dar subsídios ao professor acerca das
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estratégias visuais a serem utilizadas nas turmas, bem como ser um referencial linguístico para
os alunos surdos.
• Classes regulares com alunos surdos em processo de inclusão – Turmas com número reduzido
de alunos e que tenham, de preferência, dois ou mais alunos surdos. Esses são acompanhados
por um intérprete de Libras (TILSP) que realiza a tradução simultânea das aulas, assim como
intermedia a comunicação entre professor/aluno surdo e alunos surdo/aluno ouvinte. Os alunos
surdos recebem acompanhamento em todos os espaços e durante a realização das mais diversas
atividades escolares (festas, gincanas, apresentações culturais, reuniões...).
O município investigado defende a prática de inclusão de alunos surdos, apenas a partir
do segundo segmento do ensino fundamental (6° ao 9° ano de escolaridade). No entanto, caso
a família dos alunos requisite, é possível matriculá-los também em classes regulares na no
primeiro segmento do ensino fundamental (1° ao 5° ano de escolaridade), ao invés de
frequentarem as classes bilíngues. A rede não possui classes de Educação Infantil bilíngues,
devendo os alunos frequentarem classes regulares nessa etapa.
• Projeto bilíngue – Tem como objetivo a oferta da disciplina Libras para alunos de seis escolas
da rede municipal. As aulas são ministradas, preferencialmente, em escolas que tenham alunos
surdos matriculados e possui o status de disciplina, sendo parte integrante do quadro de horário
e com um tempo semanal, que tem a duração de cinquenta (50) minutos. O público alvo são os
alunos das classes regulares, do primeiro ao nono ano do ensino fundamental e da EJA. O
desejável e que as aulas ocorram em codocência, ou seja, tendo como regentes um Instrutor de
Libras surdo e um professor bilíngue, sendo este último substituído por um Intérprete (TILSP)
se necessário. O objetivo do programa e tornar a Libras uma língua que circule em todos os
ambientes e atividades realizadas nas escolas. Os professores que atuam no projeto também são
responsáveis pela produção de material e elaboração de atividades que divulguem a língua de
sinais, bem como informações quanto a sua estrutura e de divulgação de eventos relacionados
a comunidade surda.
• Sala de Recursos Multifuncional Específica – com funcionamento no contraturno, essa
modalidade de ensino é realizada por um professor bilíngue. Tem como foco principal o ensino
da Língua Portuguesa em sua modalidade escrita. Para tanto, as aulas ministradas são sempre
na primeira língua dos alunos surdos (Libras) e através dela ocorre todo o processo de mediação
e ensino da L2. Ênfase é dada também ao ensino da Libras para os alunos da educação infantil,
para os matriculados em turmas regulares do primeiro segmento do ensino fundamental e para
os jovens e adultos incluídos na EJA. Possui um quantitativo máximo de 14 alunos, cujo
atendimento pode ser ofertado individualmente ou coletivamente, de forma a atender as
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especificidades dos casos. O horário de atendimento é distribuído em dois encontros semanais
que podem durar de cinquenta minutos a duas horas. Destacamos que além do ensino da Libras
e da Língua Portuguesa com L2, outras atividades são designadas ao profissional que atua no
AEE. Dentre essas, a orientação aos professores das classes regulares, e a oferta de suporte,
assim como da sugestão de estratégias que favoreçam a aprendizagem do aluno surdo incluído
e da produção de materiais pedagógicos.
Apesar da existência de um trabalho considerado substancial em relação a oferta de
atendimento educacional especializado aos alunos surdos, há ainda dificuldades quanto ao
acesso de todos os alunos a estes. Um exemplo disso é que os cargos de Intérpretes tradutores
de Libras e Língua Portuguesa (TILSP), Instrutores de Libras e Assistentes Educacionais
Surdos não são efetivos, ou seja, existe a necessidades da constante contratação de profissionais
através da realização de PSS, em 2017
25, para o desempenho dessas funções. Esse fato
impossibilita muitas vezes a continuidade do trabalho realizado na rede e inviabiliza que novos
projetos sejam implementados. Tais questões serão foco de nossas discussões no próximo
capítulo.
O número de alunos surdos incluídos na rede municipal faz com que o Setor de
Educação Especial necessite de maiores subsídios de outros setores da SME. Dessa forma, é
possível garantir a contratação de profissionais como os citados anteriormente, bem como
serviços fundamentais como transporte, infraestrutura nas escolas e recursos que contemplem
os alunos em questão. No entanto, com as dificuldades financeiras que a gestão do município
alega estar passando, o atendimento aos estudantes que necessitam tem sido oferecido
precariamente, o que dificulta o acesso aos ambientes escolares e até mesmo a permanência dos
mesmos nas escolas.
No que se refere ao ingresso de alunos público alvo da educação especial na rede, a
matrícula em turmas regulares acontece nas próprias unidades escolares. Quanto à matrícula de
alunos nas turmas bilíngues, é realizada via avaliação e encaminhamento do Setor de Educação
Especial (Programa de Surdez). A avaliação geralmente é solicitada pelas unidades escolares
quando recebem um aluno com laudo de surdez ou deficiência auditiva.
25 Último processo seletivo realizado pela rede municipal, destinado à contratação de intérpretes de Libras e Língua Portuguesa, professores de Libras e Assistentes Educacionais Surdos.
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