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1. PENSANDO E INVESTIGANDO A APRENDIZAGEM DA LÍNGUA

1.3 A Revista Espaço e o letramento de alunos surdos: o que tem a nos dizer?

Nossa segunda tentativa em busca de verificar o lugar dos estudos sobre letramento,

destinado a alunos surdos, elegeu um dos três periódicos disponibilizados pelo site do Instituto

Nacional de Educação de Surdos

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(INES), a Revista Espaço. Destacamos que tal periódico se

configura como instrumento de disseminação de conhecimento da instituição, – considerada

referência nacional na área – da educação de surdos.

Após a seleção dos textos disponíveis - totalizando os quatrocentos e vinte textos

selecionados (420) dispostos desde o lançamento até a data de realização desse estudo -

abordando diversas temáticas referentes ou não a surdez -, definimos quatorze (14) eixos

temáticos. A saber: tradutor e intérprete de língua de sinais/TILSP, bilinguismo, aquisição da

L2, formação de professores, prática docente, políticas públicas, culturas e identidades surdas

e implante coclear, linguagem, língua de sinais, audiologia, letramento, inclusão e outros. A

tabela a seguir apresenta a distribuição do número de artigos por eixo.

Tabela 01: Distribuição do número de artigos por eixo

Eixo Temático N◦ de

Artigos

Eixo Temático N◦ de

Artigos

Aquisição da L2 34 Letramento 03

Audiologia 29 Língua de sinais 24

Bilinguismo 25 Linguagem 20

Culturas e identidades surdas 30 Outros 154

Formação de professores 08 Políticas públicas 15

Inclusão/ Integração 19/06 Prática docente 17

Implante coclear 06 TILSP 14

Total 420

Fonte: Tabela produzida pela autora

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Pudemos observar que os temas, inicialmente, eram distribuídos pelas edições, sem

muitos parâmetros, mas que posteriormente teve início a organização por temas e finalmente

sob a forma de dossiês temáticos, fato que tornou a busca do leitor por determinados temas mais

prática.

Um dos eixos temáticos para nós de maior importância, tendo em vista que este vai ao

encontro do nosso estudo, se refere a aquisição da segunda língua (L2) - Neste caso

especificamente, a Língua Portuguesa - que teve a maior representatividade, ou seja, trinta e

quatro (34) artigos. No que tange a essa maior demanda de artigos, destacamos que a

preocupação com a aprendizagem da língua oficial do país é algo latente e já abordado por

diversos autores já há algum tempo (LACERDA, 1998; LODI, 2004; FERNANDES, 2006;

GUARINELLO, 2006; PEIXOTO, 2006; PEREIRA, 2010 e 2011; entre outros).

No tocante a aquisição da L2 por alunos surdos, Fernandes (2006, p. 132), tendo como

base estudos de diversos pesquisadores, propugna que “a língua escrita pode ser plenamente

adquirida pelos surdos se a metodologia empregada não enfatizar a relação letra-som como

pré-requisito”.

Em consonância com os autores supracitados, a Revista Nova Escola, edição de 01 de

dezembro de 2010, traz entre suas reportagens, o artigo intitulado “O desafio de ensinar Língua

Portuguesa a alunos surdos”. A autora, Paula Nadal, disserta sobre as expectativas de

aprendizagem para estudantes surdos desde a Educação Infantil até o 9º ano, fazendo

colocações acerca da necessidade de flexibilização de atividades e utilização de experiências

visuais em todo o processo de ensino da Língua Portuguesa.

Os estudos de letramento obtiveram a menor expressividade no levantamento realizado,

ou seja, apenas três (03), entre os 420 artigos, tratavam efetivamente de questões relativas a

temática. A incipiência de artigos sobre o tema em questão pode estar diretamente relacionada

ao fato de que o termo letramento é bastante atual no campo educacional brasileiro.

Soares (2009) destaca que esse termo, provavelmente foi utilizado pela primeira vez -

no Brasil - em 1986, por intermédio do livro de Mary Kato, “No mundo da escrita: uma

perspectiva psicolinguística”. Não obstante, queremos evidenciar, que no âmbito da Revista

Espaço, a primeira menção ao termo letramento aparece na edição de número quatro (04), de

janeiro/junho de 1994, sob a forma de “saber letrado”. O texto “Fazer e acontecer: construção

de uma prática pedagógica”, sob a autoria de Marilene de Almeida Nogueira, discorre sobre

a necessidade de “instrumentalizar a criança para apropriar-se do saber letrado” (1994, pg. 22).

Na edição de número nove (09), de junho de 1998, no texto “Aquisição do Português

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se faz presente, quando a autora faz referência às dificuldades dos alunos surdos quanto a

aquisição da L2 ao afirmar que “Se o fracasso existe, ele tem que ser enfrentado a partir de uma

proposta nova calcada nas reais necessidades do aprendiz surdo, para quem a primeira língua é

a língua dos sinais e para quem a Língua Portuguesa é uma segunda língua com função social

determinada” (FREIRE, 1998, pg. 49).

O termo letramento aparece novamente na edição 18/19 (dezembro de 2002 a julho de

2003). Destacamos que o tema da revista em questão foi “Linguagem escrita: uma dinâmica de

grupo”. Nesta edição o texto “Problematizando o ensino da língua portuguesa na educação

de surdos”, por Dorziat e Figueiredo (2003, pg. 41), faz menção ao letramento ao propor que

“cabe ao professor propiciar ao aprendiz, enquanto sujeito histórico, momentos de construção

do seu próprio discurso”. Esse trecho dialoga com nossa perspectiva de letramento acadêmico,

na qual o aluno surdo precisa se constituir autor de vários gêneros textuais, tornando-se hábil

também para produzir com autonomia, textos presentes em novos espaços nos quais irá circular

ou mesmo fazer parte.

O termo letramento na íntegra surge pela segunda vez na vigésima (20) edição de

dezembro de 2003, que aborda a temática “Linguística e alfabetização”. O texto

“Leitura-Escrita e Letramento: que espaço ocupam na Educação Infantil” (FRANGELLA, 2003).

O texto apresentou uma reflexão sobre o processo de leitura e escrita, tendo como foco a

educação infantil.

O marco relacionado aos estudos de letramento no âmbito da revista Espaço, ocorre

através do lançamento, em 2013, da edição número 39 (janeiro/junho). O dossiê intitulava-se

“Letramento e Surdez”. No entanto, a edição apresenta apenas dois (02) textos diretamente

relacionados à temática, a saber: “Por uma compreensão do letramento visual e seus

suportes: articulando pesquisas sobre letramento, matrizes de linguagem e artefatos

surdos”, por Taveira e Rosado (2013) e “Surdez e letramento: concepções e implicações no

desenvolvimento de competências interdisciplinares”, por Araújo (2013).

Taveira e Rosado (2013) discutem a importância da utilização da linguagem visual

desde a mais tenra idade, ou mesmo desde o primeiro momento de contato do surdo com a

língua de sinais, de forma a interagir com esses símbolos imagéticos, propiciando assim sua

imersão no universo de significação. O texto destaca também aspectos do letramento visual ao

expor que “O uso da linguagem visual e das modalidades da forma visual e das combinações,

dos hibridismos que denotam as características da visualidade, é uma questão de sobrevivência

dos surdos...” (pg. 31).

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As questões referentes a visualidade surda, são de fato fundamentais para a aquisição e

desenvolvimento da Língua Portuguesa, visto que este é o principal canal de obtenção de

informações utilizado por esses sujeitos. Todavia, a utilização de estratégias pautadas na

visualidade não pode e nem deve ser considerado o suficiente para promover a aprendizagem,

antes, devem estar associadas a outras estratégias, tais coma a utilização da análise contrastiva

– denominada também de linguística contrastiva (BROCHADO, 2003; QUADROS, 2004),

dessa forma, podemos obter a base para o letramento acadêmico (GERARDI, 2014), foco de

nossos estudos.