Foi possível perceber, ao longo de toda a série, o quanto o autor convoca o espectador a interagir com o desenho. A cada cena é possível descobrir novos achados, sejam os criptogramas variados que ele esconde ou, até mesmo, easter eggs como a data de aniversário do autor, seu rosto (caricatura), pois ele aparece em todos os episódios, às vezes como personagem. Essa caçada faz com que aquele que assiste participe e, não só isso, busque além do episódio visto. Para isso, a Disney não poupou esforços e colocou sites com jogos sobre o desenho, mistérios e, ainda, um desencriptador para as mensagens codificadas dos episódios (Figura 79).
Figura 77 - Site que faz a desencriptação das mensagens criptografas do desenho
Fonte: The Mistery of Gravity Falls67
O desenho é cheio de referências e percebemos que, no plano de expressão, há muito mais a ser mostrado do que somente a fala dos personagens, as imagens, o cenário e as cores. As imagens, como os símbolos que vimos anteriormente, nos trazem outros elementos para a constituição do nosso sentido para o desenho. As cores utilizadas são alegres e vibrantes, apenas na nave extraterrestre e final do episódio, temos a utilização de cores mais escuras – na primeira para dar ar de mistério e na segunda cena para dar a sensação de medo.
Além de todos os simbolismos, que apresentamos como parte integrante do episódio, há também a relação dos irmãos gêmeos Mabel/Dipper e tivô Stan/tivô Stanford, que poderiam ter o mesmo relacionamento com seus respectivos irmãos. No entanto, Dipper e Mabel são carinhosos um com o outro e, acima de tudo, bons amigos. Já a relação de Stan e Stanford é conturbada, visto que eles brigaram e cada um seguiu sua vida, sem que se encontrassem, pois
Stanford estava preso em outra dimensão. Utilizaremos o quadrado semiótico (Figura 80), para que as relações que estabelecemos fiquem mais compreensíveis e as relações possíveis possam ser visualizadas.
Figura 78 - Quadrado semiótico episódio Dipper e Mabel contra o futuro
Fonte: Material elaborado pela autora (2019)
Dentro de todas as características que elencamos do episódio Dipper e Mabel contra o
futuro, entendemos que, no plano de conteúdo, no nível fundamental o par de oposições está
entre criança vs adolescente, gerando o par de subcontrários não criança vs não adolescente. A partir dessas relações, temos o par de contrários representados por criança vs não adolescente e adolescente vs não criança, que levam às relações complementares que são, respectivamente, infantil e juvenil, entendendo que essas relações podem ser estendidas e que não precisam ficar demarcadas somente entre os termos complementares que citamos. Ao final do quadrado semiótico, atingimos as relações do termo complexo e neutro, que foram lidos por nós, respectivamente, como “adulto” (relação entre não adolescente vs não criança) e “infanto- juvenil” (relação entre criança vs adolescente). Como o episódio trata de vários assuntos ao mesmo tempo, poderíamos elencar outras oposições que estão na base do episódio como, por exemplo, presente vs futuro, mas para apresentar de forma mais estruturada optamos pelo par supramencionado.
Quanto à análise, a partir das categorias que determinam o ritmo no audiovisual, desenvolvidas por Fechine (2009), primeiro apresentaremos um quadro resumo das categorias
CRIANÇA ADOLESCENTE
NÃO ADOLESCENTE NÃO CRIANÇA
INFANTIL JUVENIL
INFANTOJUVENIL
(Quadro 20), para, logo após, apresentarmos o que encontramos no audiovisual analisado (Quadro 21).
Quadro 14 - Resumo das Categorias do Ritmo no audiovisual (Fechine, 2009)
Ritmo Vídeo Áudio
DURAÇÃO
Intensidade Planos curtos e movimentados Maior pulsação e intervalos menores
Extensidade Planos longos e demorados Menor pulsação e intervalos maiores
FREQUÊNCIA
Continuidade Planos longos, partindo de enquadramentos
mais abertos aos mais fechados Maior regularidade Descontinuidade Planos fragmentados Mudanças bruscas
COMBINAÇÃO
Acumulação Multiplicidade de elementos simultâneos Multiplicidade de elementos simultâneos Segmentação Planos sucessivos Sons em sequência com pouca variedade
de elementos. Fonte: adaptação do quadro de Fechine (2009, p. 350-355) por Pillar e Reginato (2016)
Quadro 15 - Análise do audiovisual através das categorias de ritmo
Ritmo Vídeo Áudio
DURAÇÃO
Intensidade
Planos curtos e movimentados. Não observamos planos longos, para dar sequencialidade às cenas, mas sim uma
justaposição de quadros.
Maior pulsação e intervalos menores. Temos mudanças repentinas nos sons, que
vão das falas a ruídos e músicas inesperadas. Pouquíssimos momentos em
que não há nenhum tipo de som.
FREQUÊNCIA
Descontinuidade
Planos fragmentados, é possível perceber os cortes que são feitos no decorrer do desenho, criando uma dinamicidade ou, até mesmo,
um ritmo mais acelerado nas imagens.
Mudanças bruscas, pouca regularidade seja no andamento, seja no padrão de duração
dos compassos. Apelo maior às descontinuidades e “saltos”. Vemos isso no
desenho quando repentinamente começa uma música para dar ênfase ao que está acontecendo, não há uma regularidade –
assim como começa, também repentinamente para.
Segmentação
Planos sucessivos, no desenho não há mais de uma ação ocorrendo no plano, há cortes para mostrar a mesma situação, mas tudo
ocorre de maneira linear. Os planos normalmente são mais focados naquilo que
está sendo feito, poderíamos dizer que são planos mais focados.
Sons em sequência com pouca variedade de elementos. Há uma segmentação no som
também, pois quando há falas, não há música e vice-versa. As músicas aparecem
e sons aparecem com pouca variedade de instrumentos.
Fonte: adaptação do quadro de Fechine (2009, p. 350-355) pela pesquisadora
A partir das análises feitas do episódio Dipper e Mabel contra o futuro, foi possível entender como se constituíram os planos e ritmos no audiovisual. As características que ressaltamos nos quadros das categorias de ritmo nos ajudaram a compreeender de que maneira o desenho tem-se mostrado para os espectadores – algo dinâmico e rápido, em que não há muito espaço para contemplação. O desenho tem um ritmo bastante frenético e há também uma multiplicidade de assuntos em cada um dos episódios. Essa maneira de construção está muito ligada ao que vivenciamos hoje, à rapidez e ao acúmulo de informações que recebemos todos os dias. Percebemos, assim, que é isso que não deixa o desenho cair na monotonia, tendo sempre algo novo e diferente a cada momento.
9.3 PESQUISA DE CAMPO COM PEDAGOGAS(OS) EM FORMAÇÃO - LEITURA DO