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3 ALOPOIESE DO DIREITO

Segundo o Professor Marcelo Neves, a alopoiese do direito prevalece na sociedade mundial. Na teoria de Luhmann, temos o conceito de autopoiese, com o termo auto-referência autopoiética, que é a condição da unidade operacional e estrutural do sistema jurídico. Na teoria dos sistemas sociais, a autonomia do direito com base na autopoiese operacional é conceito basilar da teoria luhmaniana.32

A alopoiese é a perda da autonomia operacional do sistema jurídico. Ocorre com a sobreposição do código da economia (ter/não ter), e do código político (poder/não poder), sobre o código do direito (lícito/ilícito).33

A teoria sistêmica trabalha com a ideia de diversos sistemas sociais – política, direito, economia, família, amor, ciência, religião, arte etc. Esses sistemas são

32 NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo-SP: Martins Fontes. 2011.

autônomos entre si, e ao mesmo tempo, se interseccionam, formando os acoplamentos estruturais.34

O princípio da diferenciação funcional é a essência da teoria dos sistemas. Na alopoiese do direito, ocorre a quebra da diferenciação funcional, ou seja, a desdiferenciação funcional forma à “corrupção sistêmica”. A consequência é a quebra da autonomia operacional do sistema jurídico, os outros sistemas, portanto, interferem no funcionamento e na operacionabilidade do ordenamento jurídico interno.35

A funcionalidade do sistema jurídico se expressa através dos elementos a) procedimento jurídico – processo b) ato jurídico – elementos do direito c) norma jurídica – estrutura d) dogmática jurídica – identidade. Na alopoiese, toda a funcionalidade e harmonia sistêmica do direito é comprometida, o direito perde a capacidade cognitiva de controle das expectativas de comportamento e concretização dos direitos fundamentais.36

O grande efeito da disfunção do sistema jurídico e da desdiferenciação social é a constitucionalização simbólica. A quebra da autonomia operacional do sistema jurídico afeta o acoplamento estrutural entre política, direito e economia. O poder econômico e político passam a colonizar o direito, assim, a Constituição do país, do Estado nacional, passa a ser deturpada em suas linhas mestras.37

Os pilares do Estado Constitucional são: A concretização dos direitos fundamentais; autonomia do sistema jurídico; a Separação dos Poderes; o procedimento eleitoral democrático; acoplamento estrutural entre política e direito. Na constitucionalização simbólica, essas estruturas fundamentais da Constituição não são concretizadas normativamente, o sistema jurídico-constitucional, sofre

34 NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo-SP: Martins Fontes. 2011.

35 NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo-SP: Martins Fontes. 2011.

36 NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo-SP: Martins Fontes. 2011.

injunções particularistas do poder político e do poder econômico. Assim, temos a ineficiência do sistema político-jurídico estatal.38

A constitucionalização simbólica revela o interessante paradoxo, a desconstitucionalização da realidade fática. A concretização desconstitucionalizante é o ato em que a norma Constitucional perde a capacidade de ordenar a realidade política e jurídica do Estado. Nesse sentido, o direito perde sua capacidade de orientar as expectativas normativas, a generalização congruente (universalização das normas jurídicas constitucionais), e a estabilização da diferenciação funcional.39

Neves, nos traz a questão da “realidade constitucional inconstitucional”. Sob esse prisma, ocorre o colapso do Estado democrático de direito. As injunções particularistas do poder econômico/político deslegitimam os atores do jurídicos e atos normativos procedimentais constitucionais descaracterizando o sistema constitucional e implodindo o Estado de direito em sua natureza estrutural.40

As relações reais de poder em âmbito nacional, serão os agentes do poder político e econômico e não mais os agentes políticos eleitos ou as forças sociais presentes no Estado. Os conglomerados transnacionais, as fundações internacionais, os metacapitalistas, os detentores do poder industrial dinástico, passam a exercer o poder de fato. O ideal constitucionalista será transformado em mero instrumento retórico de manutenção do status quo vigente e servirá para imunizar o sistema social contra as possíveis transformações reais das relações de poder. Caso ocorrido no Brasil a partir de 1988.41

Portanto, o texto constitucional é invocado como álibi na retórica dos agentes de poder. A manipulação ideológica e linguística revela a “politicagem” realizada no

38 SALLENAVE, Thyago. A constitucionalização Simbólica e a não realização do Estado democrático de direito na República Federativa do Brasil. Disponível em: http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/7003/1/20408978.pdf Acesso em: 02/12/2018.

39 SALLENAVE, Thyago. A constitucionalização Simbólica e a não realização do Estado democrático de direito na República Federativa do Brasil. Disponível em: http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/7003/1/20408978.pdf Acesso em: 02/12/2018.

40 SALLENAVE, Thyago. A constitucionalização Simbólica e a não realização do Estado democrático de direito na República Federativa do Brasil. Disponível em: http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/7003/1/20408978.pdf Acesso em: 02/12/2018.

41 SALLENAVE, Thyago. A constitucionalização Simbólica e a não realização do Estado democrático de direito na República Federativa do Brasil. Disponível em: http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/7003/1/20408978.pdf Acesso em: 02/12/2018.

âmbito do sistema jurídico. A partir da colonização do direito por outras esferas sistêmicas, as decisões judicias da ordem jurídica infraconstitucional subordina o direito positivo ás “constelações concretas de interesses” do poder global vigente. A hermenêutica constitucional pode a vir, dar outro significado normativo ao texto das leis, para fortalecer a seletividade dos interesses da classe supranacional.42

A corrupção sistêmica pode ser conceituada como o uso retórico ideológico da principiologia constitucional, o direito é colonizado pelos elementos de comunicação de outros sistemas sociais. Nessa perspectiva, ocorre a não realização do Estado democrático de direito. O Establishment global politico/econômico usa como propaganda ideológica a Teoria do Estado democrático, e legitima os atores políticos locais como meros funcionários administrativos dos interesses de classe, ou seja, “as injunções particularista da dominação política e econômica” sobre o sistema político e a sociedade como um todo.43

O fenômeno da alopoiese revela “a sobreposição do poder e do dinheiro ao direito”. “Os donos do poder” instrumentalizam o direito e exercem a instrumentalização do poder econômico da política, e também, a instrumentalização da economia pela política. O grande efeito da dominação, seria a desestruturação política da concretização da normatividade-jurídico constitucional e o uso dos Estados contemporâneos para o cumprimento das agendas dos poderes globais e o controle social das massas.44