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Sob o aspecto formal, a única exigência tecida pela lei de regência para o estabelecimento da convenção de arbitragem,

No documento PRÁTICA PROCESSUAL NOS TRIBUNAIS SUPERIORES (páginas 113-116)

3 MÉTODOS EXTRAJUDICIAIS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS

1. Sob o aspecto formal, a única exigência tecida pela lei de regência para o estabelecimento da convenção de arbitragem,

por meio de cláusula compromissória – em não se tratando de contrato de adesão –, é que esta se dê por escrito, seja no bojo do próprio instrumento contratual, seja em documento apartado. O art. 4º da Lei n. 9.307/96 não especifica qual seria este documento idôneo a veicular a convenção de arbitragem, não se afigurando possível ao intérprete restringir o meio eleito pelas partes, inclusive, v.g., o meio epistolar. Evidenciada a natureza contratual da cláusula compromissória (autônoma em relação ao contrato subjacente), afigura-se indispensável que as partes contratantes, com ela, consintam.

1.1 De se destacar que a manifestação de vontade das partes contratantes, destinada especificamente a anuir com a convenção de arbitragem, pode se dar, de igual modo, de inúmeras formas, e não apenas por meio da aposição das assinaturas das partes no documento em que inserta. Absolutamente possível, por conseguinte, a partir do contexto das negociações entabuladas entre as partes, aferir se elas, efetivamente, assentiram com a convenção de arbitragem. 2. Por meio da cláusula compromissória, as partes signatárias ajustam convenção de arbitragem para solver eventuais conflitos de interesses, determinados ou não, advindos de uma relação contratual subjacente, cuja decisão a ser prolatada assume eficácia de sentença judicial. Desse modo, com esteio no princípio da autonomia da vontade, os contratantes elegem um terceiro - o árbitro, que pode ser qualquer pessoa que detenha, naturalmente, a confiança das partes -, para dirimir, em definitivo, a controvérsia a ele submetida. Como método alternativo de solução de litígios, o estabelecimento da convenção de arbitragem produz, de imediato, dois efeitos bem definidos. O primeiro, positivo, consiste na submissão das partes à via arbitral, para solver eventuais controvérsias advindas da relação contratual subjacente (em se tratando de cláusula compromissória). O segundo, negativo, refere-se à subtração do Poder Judiciário em conhecer do conflito de interesses que as partes tenham reservado ao julgamento dos árbitros. 2.1 Afigura-se absolutamente possível que as partes, por anteverem futuras e pontuais divergências ao longo da consecução do objeto contratual, ou por conveniência/necessidade em não se fixar, de imediato, todos os elementos negociais, ajustem, no próprio contrato, a delegação da solução de tais conflitos a um terceiro ou a um comitê criado para tal escopo e, também com esteio no princípio da autonomia de vontades, disponham sobre o caráter de tal decisão, se meramente consultiva; se

destinada a resolver a contenda imediatamente, sem prejuízo de a questão ser levada posteriormente à arbitragem ou à Justiça Pública, ou se vinculativa e definitiva, disposição contratual que, em qualquer circunstância - ressalvado, por óbvio, se existente algum vício de consentimento, - deve ser detidamente observada. 2.2 Será, portanto, a partir da natureza conferida pelas partes à decisão do terceiro ou do comitê criado para o escopo de dirimir determinada controvérsia, respeitada a autonomia dos contratantes, é que se poderá inferir se se está, ou não, diante de um método alternativo de heterocomposição de conflitos de interesses.

[...]”12 (destaque nosso)

Em seu voto, o relator destacou diversos pontos no sentido da defesa e legitimidade da cláusula que estabelece a dispute board, apontando que apenas há abertura para envolvimento do judiciário no que concerne o contrato e as disposição e pareceres do comitê no que tange matéria relativa à consulta, ao passo que matéria constante de decisão vinculante não poderia ser revisto, o mérito, pelo judiciário:

Na espécie, segundo convencionado pelas partes contratantes, a eventual divergência sobre o valor das ações pertencentes ao Sr. Hugo Pedro de Figueiredo, a serem adquiridas por Haakon Lorentzen, Erling Sven Lorentzen e Lorentzen Empreendimentos S.A, deve ser dirimida por um avaliador nomeado por cada parte e, não havendo consenso, estes, em conjunto, indicariam um terceiro, para tal propósito, cuja decisão, segundo expressamente ajustado, seria final e aceita pelas partes de modo definitivo.

Trata-se, pois, na compreensão deste relator, de inequívoca cláusula compromissória, por meio da qual as partes signatárias convencionaram que a controvérsia acerca da definição do valor das ações a serem adquiridas (conflito de interesses determinado, portanto), advindos de uma relação contratual subjacente (no caso, do acordo de unificação das companhias de navegação), deve ser decidida por dois "avaliadores", indicados por cada parte, que, se necessário for, indicarão um terceiro para tal propósito, cuja decisão "será final, definitiva e acatada pelas partes”.

[...]

Será, portanto, a partir da natureza conferida pelas partes à decisão do terceiro ou do comitê criado para o escopo de dirimir determinada controvérsia, respeitada a autonomia dos contratantes, é que se poderá inferir se se está, ou não, diante

12 https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI264821,61044-A+jurisprudencia+defensiva+ataca+novamente

de um método alternativo de heterocomposição de conflitos de interesses.13

Em suma, o envolvimento do judiciário, nos casos em que os comitês são estabelecidos como legítimas fontes para analisar e conferir uma solução às controvérsias relacionadas com a execução de um contrato, com base na autonomia dos contratantes, deverá ser limitado (no caso de avaliar as premissas e contexto em que o contrato foi celebrado) ou inexistente (no contexto de que o mérito relativo a assunto no âmbito de competência dos comitês não deverá ser revisto pelo judiciário).

Ainda, no contexto do contrato objeto de análise do Resp, o ministro relatou que foi criado um comitê de caráter consultivo, destacando que os pareces desse comitê já não teriam caráter vinculante:

Na hipótese dos autos, interessante notar que as partes contratantes, cientes da complexidade da operação societária de unificação das companhias de navegação, assim como da necessidade de manutenção de um ambiente de cooperação e parceria dos signatários, chegaram a nomear um Comitê Consultivo para, em caráter opinativo, dirimir as questões divergentes pontuais. Ressai evidente que, nesse contexto, a deliberação do Comitê Consultivo não teria, em princípio, o condão de vincular definitivamente as partes contratantes porque assim não avençaram.14

Nessa linha, com base nesse precedente, pode-se notar um prestígio, por parte do posicionamento do STJ nesse caso, à autonomia das vontades, destacando, ainda que não haja matéria positivada farta em relação ao tema de dispute boards, que o estabelecimento de métodos alternativos de solução de conflitos pelas partes deverá ser respeitado pelo judiciário, quando em cláusula que constitui tal método restar claro que os pareceres são de natureza definitiva e vinculante.

Em caso recente destaca-se ainda o caso da ampliação da Linha 4-Amarela do Metrô de São Paulo, em que o Banco Interamericano para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) exigiu a presença de um dispute board para o acompanhamento da obra, cuja comissão foi composta por três engenheiros e custou aproximadamente 0,06% do valor da obra (orçada em 1,55 bilhão de dólares).

13 http://www.stj.jus.br/SCON/

No documento PRÁTICA PROCESSUAL NOS TRIBUNAIS SUPERIORES (páginas 113-116)