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Aluno com deficiência da educação profissional e o conceito da PcD

CAPÍTULO 2. REVISÃO DE LITERATURA

2.4 DISCENTE COM DEFICIÊNCIA

2.4.1 Aluno com deficiência da educação profissional e o conceito da PcD

O último Censo Demográfico realizado em 2010 (BRASIL, 2012a) concluiu que 45.606.048 de brasileiros, ou seja, 23,9% da população têm algum tipo de deficiência, visual, auditiva, motora, mental ou intelectual.

Ainda na cartilha do último Censo (Brasil, 2010), encontra-se descrito que 18,60% das pessoas com deficiência são deficientes visuais; 5,10% são auditivas; 7% são aquelas pessoas com deficiência motora; e 1,40% são deficientes mentais ou intelectuais. O maior número de pessoas com deficiência se encontra na faixa etária de 15 a 64 anos, que totaliza 32.609.022; 3.459.401, de 0 a 14 anos, e 9.540.624, com 65 anos ou mais.

Para proporcionar melhor compreensão sobre quais as características dos alunos com deficiência que participaram do processo de pesquisa, foi necessário investigar na literatura científica e na documentação pertinente as contribuições teóricas que problematizam o conceito de discentes que participam ou participaram dos cursos de aprendizagem industrial do Senai.

Existe uma trajetória conceitual sobre as terminologias utilizadas para designar as pessoas com deficiência. Para os movimentos em defesa das pessoas com deficiência, os termos são instrumentos importantes, como se pode observar no documento ‘História do Movimento Político das Pessoas com Deficiência’, redigido e organizado pela antiga Coordenadoria Nacional das Pessoas com Deficiência, que hoje é denominada como Secretaria Nacional da PcD da SDH:

Para os novos movimentos sociais e suas políticas de identidade, as palavras são instrumentos importantes de luta política. A busca por novas denominações reflete a intenção de rompimento com as premissas de menos-valia que até então embasavam a visão sobre a deficiência. Termos genéricos como “inválidos”, “incapazes”, “aleijados” e “defeituosos” foram amplamente utilizados e difundidos até meados do século XX, indicando a percepção dessas pessoas como um fardo social, inútil e sem valor (BRASI. SDH, 2010b, p. 16- 17).

No final da década de setenta, amplo movimento começa a buscar novas terminologias para designar as pessoas com deficiência, antes consideradas como ‘excepcionais’ e ‘portadores’ de deficiência, termos que passam a ser criticados e substituídos por ‘pessoas com necessidades especiais’. Como afirma Cardoso: “O termo pessoas portadores de deficiência se popularizou na década de 80, hoje vem sendo

criticado e substituído por pessoas com necessidades especiais, ou pessoas com necessidades educacionais especiais” (2003, p. 18).

Afirma-se, ainda, que hoje, “[...] começa a ser usada a expressão pessoas deficientes. A inclusão do substantivo “pessoa” é uma forma de evitar a coisificação” (BRASIL.SDH, 2012d, p. 14), mas pode-se afirmar que essa terminologia também foi ulteriormente alterada incluindo a preposição ‘com’. Atualmente o termo correto para designar esse público é ‘PcD’.

Em relação a algumas deficiências específicas, em 1995, já se iniciam as discussões em relação à expressão ‘deficiência intelectual’, significando que há um déficit no funcionamento do intelecto, mas não da mente. Tal terminologia é introduzida oficialmente pela ONU no texto da Declaração de Montreal sobre a Deficiência Intelectual, consagrada em 2004. Durante anos, a PcD intelectual havia sido denominada com expressões do tipo ‘louca’, ‘imbecil’, ‘retardada’, ‘mongoloide’, ‘excepcional’ e ‘deficiente mental’. São expressões hoje consideradas depreciativas e, muitas vezes, discriminatórias.

O Decreto nº 3.298/1999 considera a PcD como aquela que possui “toda perda ou anomalia de uma estrutura ou anormalidade de estrutura ou função psicológica, fisiológica, ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade dentro do padrão considerado normal para o ser humano” (BRASIL, 1999, art. 3º).

Em 2006, a expressão ‘PcD’ é consagrada pela ONU e passa a fazer parte da terminologia utilizada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência que menciona como uma ‘PcD’ é, antes, de tudo considerada como qualquer outra pessoa, com direitos e deveres. Assim como se apresenta no item relacionado à trajetória das pessoas com deficiência, vale mostrar novamente que, pela Convenção dos Direitos da PcD, essa terminologia tem a seguinte definição:

Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo, da natureza física, mental, intelectual ou sensorial, as quais em interação com diversas barreiras podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2009. p. 26).

As categorias das pessoas com deficiência, também conhecidas como tipos de deficiência, totalizam o número de cinco, como se percebe por meio das legislações brasileiras. São assim categorizadas, como: DF, DA, DV, deficiência intelectual e mental e deficiências múltiplas.

O artigo 4º do Decreto nº 3.298/1999, alterado pelo artigo 70 do Decreto nº 5.296, de 2 de dezembro de 2004, define as categorias e conceitos de deficiências, que são sintetizadas abaixo:

Deficiência física: alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções. Deficiência auditiva - perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz. Deficiência visual - cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60o; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores. Deficiência mental: funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como:

a) comunicação; b) cuidado pessoal; c) habilidades sociais;

d) utilização dos recursos da comunidade; e) saúde e segurança;

f) habilidades acadêmicas; g) lazer e,

h) trabalho. Deficiência múltipla – associação de duas ou mais deficiências (BRASIL, 1999).

Sassaki (2004) tece um comentário sobre o conceito relacionado à ‘DM’ quando afirma que, atualmente, há uma tendência mundial (brasileira também) de se usar ‘deficiência intelectual’ em vez de ‘DM’, termo com o qual o autor concorda por duas razões: a primeira razão tem a ver com o fenômeno propriamente dito, ou seja, é mais apropriado o termo intelectual por referir-se ao funcionamento do intelecto especificamente e não ao funcionamento da mente como um todo, e a segunda razão por ser o termo já sancionado na Convenção dos Direitos da PcD, uma Lei, como já foi dito anteriormente, com status constitucional.

A partir dessa fundamentação teórica, se pode reconhecer o avanço em relação ao conceito e à terminologia da PcD. O leitor poderá perceber na figura n

º

1 uma linha evolutiva, criada pela pesquisadora, para demonstrar resumidamente a terminologia utilizada para designar as pessoas com deficiência:

Figura 1 – Avanço da terminologia utilizada para designar ‘pessoas com deficiência’

Fonte: banco de dados da pesquisa, 2012.

Vale apresentar o conceito de ‘PcD’ que era utilizado antes da Convenção dos Direitos da PcD e que era apresentado de acordo com a Política Nacional de Educação Especial:

[...] aquele que, por apresentar necessidades próprias e diferentes dos demais alunos no domínio das aprendizagens curriculares correspondentes à sua idade, requer recursos pedagógicos e metodologias educacionais específicas. Genericamente chamados de portadores de necessidades educacionais especiais, classificam-se em: portadores de deficiência (mental, visual, auditiva, física, múltipla), portadores de condutas típicas (problemas de conduta) e portadores de altas habilidades (superdotados) (BRASIL, 2007b).

O discente considerado como incluído é aquele que, mesmo tendo uma deficiência, encontra-se em uma turma de alunos sem deficiência. O discente que está em turmas consideradas ‘fechadas’ será designado nesta pesquisa como aquele aluno com deficiência que faz parte de turmas especiais, em que todos os alunos possuem uma ou mais de uma deficiência (entre seus pares).

O documento da Política Nacional de Educação Especial, em seu artigo IV, afirma que o objetivo desta Política na perspectiva da educação inclusiva é garantir:

[...] o acesso, a participação e a aprendizagem dos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas escolas regulares, orientando os sistemas de ensino para promover respostas às necessidades educacionais especiais, garantindo:

Transversalidade da educação especial desde a educação infantil até a educação superior; atendimento educacional especializado; continuidade da escolarização nos níveis mais elevados do ensino; formação de professores para o atendimento educacional especializado e demais profissionais da educação para a inclusão escolar; participação da família e da comunidade; acessibilidade urbanística, arquitetônica, nos mobiliários e equipamentos, nos transportes, na comunicação e informação; e articulação intersetorial na implementação das políticas públicas. (BRASIL, 2007b , art. IV).

Apesar de ser um termo bastante polêmico em termos de definição, Ribas (1994) comenta que a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, aprovada pela Assembleia-Geral da ONU, proclamou em seu artigo I o conceito de ‘pessoas deficientes’. Segundo o autor, esse termo significa pessoa incapaz de assegurar por si mesmo, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, ou não, em suas capacidades físicas ou mentais.

Ribas (1994) faz notar que com a palavra deficiente tem um significado muito forte e passível de alimentar preconceitos. De certo modo, ela se opõe à palavra eficiente. Ser deficiente, antes de tudo tende a indicar uma não capacidade, não ser capaz.

A atual legislação que trata sobre o assunto é o Decreto nº 5.296/2004, que ratificou o Decreto nº 3.298/1999, que obriga a empresa a contratar pessoas com deficiência.

No caso desta pesquisa, quando se referir à ‘PcD’, será seguido o conceito expresso em tal Decreto -5.296/2004-, em seu artigo 3º, que define a deficiência, a deficiência permanente e a incapacidade:

I- Deficiência – Toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano;

II- Deficiência permanente- Aquela que ocorreu ou se estabilizou durante um período de tempo suficiente para não permitir recuperação ou ter probabilidade de que se altere, apesar de novos tratamentos; e

III- Incapacidade – Uma redução efetiva e acentuada da capacidade de integração social, com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu bem-estar e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida (BRASIL, 2004).

Para o cumprimento da Lei, a contratação e o preenchimento da cota de pessoas com deficiência, o Decreto nº 5.296/2004 alterou o Decreto nº 3.298/1999 e definiu como deficiências possíveis de serem contabilizadas como cotistas nos processos de admissão de empregados por parte das empresas, apenas as pessoas com deficiência e grau definidos a seguir:

Física: Alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções;

II. Auditiva: Perda bilateral, parcial ou total, de 41dB ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500Hz, 1.000 Hz, 2.000 Hz e 3.000 Hz; III. Visual: Cegueira (na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica), baixa visão (acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica), os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60°, ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições acima; IV. Mental: funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos 18 anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como comunicação, cuidado pessoal, habilidades sociais, utilização dos recursos da comunidade, saúde e segurança, habilidades acadêmicas, lazer e trabalho.

V. Múltipla: Associação de duas ou mais deficiências (BRASIL, 2004).

Vale citar a proposta de substitutivo de Emenda à Constituição Federal nº 347-A, (BRASIL, 2010) que ’altera a redação do inciso III do art. 208 da Constituição Federal’ para garantir acesso à educação especializada para ‘portadores’ (termo anterior à convenção utilizada para designar pessoas com deficiência) de deficiência, ‘sem imposição de limite de faixa etária e nível de instrução’, preferencialmente na rede regular de ensino.

Verificou-se igualmente que o ciclo da vida escolar das pessoas com deficiência é interrompido justamente no momento em que se iniciam seu processo de alfabetização. Sabe-se que, diante das considerações anteriores, constata-se a necessidade de se repensar o acesso à educação no Brasil de modo geral.

A educação que almejamos para os cidadãos brasileiros não é unicamente aquela educação de conteúdo – que é importante também –, mas a implantação de uma educação em sentido amplo, que forme o participante como um todo, em seus direitos e deveres, levando-o a perceber o seu papel na sociedade, no aprendizado do respeito ao outro e ao convívio com a diversidade.

deficiência, principalmente quando se trata de DM, é que o ritmo do aprendizado geralmente difere do aprendizado que se observa na maioria da população, exigindo do professor uma atenção individualizada e o respeito ao grau de compreensão de cada indivíduo e ao desenvolvimento de suas capacidades.

O artigo 208, inciso III, da Constituição Federal garante educação básica obrigatória e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, entretanto, sabe-se que as pessoas com deficiência nem sempre conseguem, aos 17 anos de idade, estarem aptas ao ingresso em uma universidade ou em um curso de educação profissional e menos ainda no próprio no mercado de trabalho.

Em se tratando de DM severa, o quadro é ainda mais complicado, pois a pessoa com DM necessita de um exercício contínuo e ininterrupto de estímulos, na busca de alcançar o maior grau possível de desenvoltura em suas habilidades.

De acordo com a Convenção sobre os Direitos da PcD, promulgada em 2009, pode-se afirmar que o conceito de ‘pessoas com deficiência’ é descrito como:

[...] aquelas (pessoas) que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais em interação com diversas barreiras podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2009, p.24).

Essa Convenção reconhece o valor de cada indivíduo independentemente de sua funcionalidade e apresenta linhas de ação que permitam que os países alcancem o objetivo de todas as pessoas atingirem seu potencial, independentemente do tipo ou do grau de deficiência, sem discriminação ou qualquer outro fator que poderá prejudicar o diferente, seja qual for a sua diferença:

Os alunos considerados fora dos padrões socialmente estabelecidos de “normalidade”, em face de um pensamento conservador, ficam marginalizados, estereotipados, segregados do convívio com os ditos “normais”. Em algumas sociedades, ser negro, ser velho, ser mulher, ser criança, ser deficiente etc., representou ao longo dos tempos – e ainda representa – uma condição de subalternidade de direitos e desempenho de funções sociais. As diversas formas de discriminação são reflexos da padronização social, que é ingenuamente explicada, por uma visão caritativa ou mesmo de proteção, chegando até no discurso em prol da segregação para se fazer um treinamento para posterior convívio social (MAGALHÃES, 2005, p.8).

Vale ressaltar que, para situar melhor quem é o aluno com deficiência participante desta pesquisa, a pesquisadora procurou contemplar todos os tipos de deficiência (física, mental/intelectual, auditiva, visual e múltipla), entendendo que todos têm fortes razões para contribuir para a definição do perfil do docente da educação profissional.

Dessa forma, o leitor poderá perceber, na análise dos dados e dos resultados apresentados, qual o verdadeiro posicionamento quanto ao perfil de quem atua com esse tipo de aluno e os limites e possibilidades da inclusão na visão do próprio aluno. Esse aluno com deficiência possui determinada limitação, dependendo do grau e do tipo de deficiência, mas isso não o impede de pensar, sugerir e contribuir para a construção do perfil docente de quem atua com seus pares.

Um participante importante na trajetória escolar do aluno com deficiência é o docente. Esse docente, considerado um dos agentes ativos do processo de ensino- aprendizagem, atualmente responde por muito mais que a mera transmissão dos conteúdos. E, como tal, deve ter domínio de outros quesitos, além do conteúdo a ser ministrado. Tais quesitos se referem aos aspectos culturais, sociais, econômicos e outros.

A presente pesquisa teve como foco a busca de contribuições sobre o perfil do docente que atua na educação profissional com alunos deficientes, bem como os limites e as possibilidades da inclusão de alunos com deficiência. Como consequência, se faz necessário apresentar, neste referencial teórico, os conceitos relacionados a esse participante ativo do processo escolar que prepara e ministra aulas em sala de aula e laboratórios e, como tal, precisa ser criativo, ativo, estar em constante aprendizado e saber lidar com as diferenças. Após uma definição sobre quem seja o docente que atua com o aluno com deficiência, tratar-se-á da relação professor e aluno com deficiência, itens teóricos que se consideram necessários para entender os resultados que serão apresentados posteriormente.