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Análise do projeto político-pedagógico do curso de licenciatura em Letras da Universidade

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 81-87)

PROFESSORES DE FLE NO BRASIL

INFRAESTRUTURA TEXTUAL

3.3 Análise do projeto político-pedagógico do curso de licenciatura em Letras da Universidade

Abaixo, apresentamos a análise do projeto de acordo com os procedimentos de análise linguístico-discursivos de Bronckart e Machado (2004). Em seguida, inserimos dados coletados a partir dos questionários com os discentes e docentes da Universidade 1 para ampliar a discussão aqui proposta.

CONTEXTO SOCIOINTERACIONAL DE PRODUÇÃO DO TEXTO

Quando o texto foi produzido?

O texto final foi enviado ao Presidente da Comissão de Licenciatura em outubro de 2005. No entanto, como veremos mais adiante, a ideia da reformulação curricular dessa universidade começou em meados da década de 1980.

Qual é o contexto sócio-histórico em que o texto se insere?

Há uma seção do documento que descreve um breve histórico da proposta curricular. O debate sobre a reforma teve início na década de 1980, mas o documento só entrou em vigor em 2010. Em 1983, o atual Conselho Nacional de Educação enviou às universidades um Projeto de Currículo Mínimo do Curso de Letras, o qual extinguia a licenciatura dupla. Houve a criação da Comissão de Currículo da Faculdade de Letras, que negou a proposta do projeto.

Em 1988, a discussão sobre o currículo foi retomada por uma nova comissão, composta por vinte docentes e vinte discentes. O que é bastante interessante nesse momento é a participação numérica dos alunos ser igual à dos professores. No entanto, o fato de haver quarenta pessoas na comissão foi uma das dificuldades citadas no relatório final que foi encaminhado à Direção em abril de 1990, pois houve bastante dificuldade em conseguir reunir todo esse grupo mais de uma vez. No mesmo ano, a Direção da Faculdade de Letras propôs a criação de uma nova comissão de apenas dez membros: sete professores e apenas três alunos, sendo um professor de cada departamento (Letras Anglo-Germânicas; Letras Clássicas; Letras Neolatinas; Letras Orientais e Eslavas; Letras Vernáculas; Linguística e Filologia; e Ciência da Literatura).

Foi esse grupo que, após debates sobre o assunto com a comunidade, elaborou uma primeira versão do anteprojeto, que, na verdade, era uma reprodução do modelo anterior, o qual possuía vários pré-requisitos e ampliava de quatro para

cinco anos o curso com modalidade dupla. Os departamentos, no entanto, não receberam bem a proposta, e a comissão passou a trabalhar num modelo mais flexível de currículo.

O novo anteprojeto foi aprovado pela Congregação da Faculdade de Letras em 1993, mas não chegou a ser implantado. Quase dez anos depois, em agosto de 2002, graças à Resolução CNE/CP/02/200235, a Faculdade de Letras teve que

constituir uma nova comissão, denominada de Comissão de Licenciatura de Letras, para discutir e criar um currículo que estabelecesse um curso de licenciatura de acordo com a carga horária e o perfil dos cursos de formação de professores da educação básica, proposta pela Resolução.

Essa nova comissão foi presidida pela diretora da Faculdade de Letras da época e era composta pelos representantes de cada setor dos departamentos, além dos representantes dos alunos. Entre 2002 e 2003, representantes da Faculdade de Educação se reuniram com a comissão para possibilitar a implantação da licenciatura do curso de Letras. Por fim, as exigências da Resolução CNE/CP/02/2002 foram o que possibilitou a consolidação da nova proposta curricular da licenciatura em Letras dessa universidade.

Quem escreveu o texto?

O texto final foi escrito pela Comissão de Licenciatura em Letras, composta por professores da Faculdade de Letras da Universidade 1.

Qual o destinatário do texto?

Não fica explícito a quem o projeto se destina especificamente, mas está implícito que se dirige àqueles que estejam ligados à formação dos licenciandos daquela instituição, isto é, os próprios docentes, pois o projeto deve servir de guia para suas práticas em sala de aula. Podemos pensar que o projeto se dirige também aos próprios licenciandos, para que eles tenham consciência de como se dá a sua própria formação.

Onde o texto circula?

Podemos acessar o documento facilmente através do site da Universidade 1.

Qual a finalidade prevista para o texto pelos redatores?

A finalidade é apresentar a mudança curricular da licenciatura em Letras da Universidade 1 para orientar alunos, futuros alunos e professores sobre a estrutura do curso, sobre os fundamentos do projeto pedagógico, incluindo o perfil acadêmico do aluno, etc.

Qual o uso efetivo do texto?

Em teoria, o texto é o que rege a estrutura e filosofia do curso. No entanto, seria preciso uma avaliação mais profunda das ementas e das práticas dos professores universitários para se descobrir se aquilo que está proposto no documento acontece de fato. Sabemos que, em termos de fluxograma, de carga horária, de trabalho final para conclusão do curso, ou seja, a organização do curso de forma global é de fato cumprida. Mas, nesta pesquisa, não objetivamos avaliar se os discentes saem da universidade com o perfil proposto no documento.

CARACTERÍSTICAS GLOBAIS DO TEXTO

Qual o suporte em que o texto circula?

O texto se encontra no site da Universidade 1. De forma geral, como o texto é organizado?

O texto é dividido em Apresentação; Introdução; Proposta curricular; e Grade curricular da habilitação. Analisaremos, aqui, a grade curricular da habilitação em licenciatura em Francês-Português, visto que o foco de nossa pesquisa é a formação do professor de francês.

INFRAESTRUTURA TEXTUAL

Qual o plano global do texto (suas partes constitutivas e articulações)? Apresentação: Há o relato de que a reforma curricular era algo bastante esperado pela comunidade acadêmica, haja vista sua trajetória de mais de vinte anos para ser concretizada. O projeto se propõe a construir um perfil profissional mais completo e consistente, pondo em diálogo políticas de incentivo à formação acadêmica e profissional e a iniciação científica.

Introdução: Esta seção é subdividida em alguns tópicos. O primeiro é a Estrutura da Faculdade de Letras, onde se faz menção aos sete departamentos

supracitados e afirma-se que esses departamentos trabalham em conjunto para a “formação integral do indivíduo”. O curso possui treze diferentes habilitações, sendo elas: Português-Alemão, Português-Árabe, Português-Espanhol, Português- Francês, Português-Grego, Português-Hebraico, Português-Inglês, Português- Italiano, Português-Japonês, Português-Latim, Português-Russo, Português- Literaturas de Língua Portuguesa, Português-Libras. Também é salientado que, através das disciplinas do curso, objetiva-se formar profissionais capazes de analisar criticamente o material da área do saber. O segundo tópico é Breve Histórico da Proposta Curricular, que pensamos já ter sido bem esmiuçado na segunda pergunta desta tabela. O último e maior tópico se chama Fundamentos do Projeto Pedagógico. De forma aqui bem resumida, é dito que, diante da realidade adversa de desprestígio do magistério e da desvalorização da área de estudos humanistas, o currículo se propõe, dentre outras questões estruturais, a evitar pré- requisitos e a ser mais flexível através de disciplinas eletivas. Prevê-se que a formação do aluno se fundamente nos campos linguístico, literário e científico- pedagógico. Para que o aluno possa participar de forma ativa e responsável da sua própria formação, são previstas 200 horas de atividades acadêmico-científico- culturais, que são os congressos, seminários, cursos de extensão, etc. No fim desta subseção, é informado que existe uma monografia obrigatória no final do curso, na qual o aluno pode escolher ser orientado por um professor da Faculdade de Letras ou da Faculdade de Educação.

Proposta Curricular: Esta seção traz, em alguns parágrafos, os objetivos da licenciatura em Letras. Há uma ênfase no discurso de que se deve formar um profissional crítico, consciente, desprendido de preconceitos, que ultrapasse as limitações impostas pela norma linguística tradicional, que seja um professor- orientador que estimule a autonomia criativa do aluno etc. Em seguida, o documento discorre de maneira mais precisa sobre os objetivos do projeto, especificando os aspectos linguísticos/literários e educacionais envolvidos ao longo dos oito períodos previstos para o curso de Letras. Apesar de na Apresentação ser trazido um único objetivo geral – passível de críticas –, vemos que há, sim, objetivos específicos para o profissional docente.

A lentidão para que a proposta curricular entrasse em vigor pode parecer um indício de divergências de interesses dos professores e dos alunos da instituição. Somente após vinte e quatro anos de debates o projeto foi aprovado. Esse processo ilustra o que é dito por Silva (2014) sobre como o currículo não é neutro, mas, sim, lugar, espaço, território, relação de poder, além de percurso, autobiografia, nossa vida, nossa identidade. Fica evidente, pelo processo de construção do projeto da instituição, o quanto sua identidade é multifacetada e crítica.

No último parágrafo da Apresentação, é reconhecido que o projeto pode conter imperfeições e que deverá sofrer adaptações ao longo do tempo e de acordo com a prática, o que é bastante interessante, pois assume-se a não fixidez e a não perfeição do documento, diferentemente das DCNCL. Esse não engessamento torna o documento mais próximo da realidade da formação docente, que não é perfeita e é muito adaptável às diferentes situações. Observamos que houve a tentativa de dialogar com as DCNCL, e isso é percebido em diversas partes do texto, especialmente quando há ênfase na flexibilidade do curso e nas diversas competências e habilidades que se espera que o formando alcance.

O documento prega a “formação integral do indivíduo”. Contudo, não há uma explicação de como seria exatamente essa formação integral. Pensamos que talvez se trate de uma preocupação de pôr em diálogo políticas de incentivo à formação acadêmica e profissional e a iniciação científica. Algo que também não fica muito claro é o fato de o objetivo central do curso ser, ao longo de oito semestres, “formar profissionais capazes de averiguar, analisar e criticar material desta área do saber, do seu cotidiano e das diversas culturas com as quais mantêm contato durante o curso”. Não conseguimos compreender por que um curso de licenciatura em Letras precisa ter como objetivo central formar analistas de material, pois esperávamos uma ênfase nas questões didático-pedagógicas.

Recorremos, então, ao projeto político pedagógico destinado ao curso de Bacharelado da mesma instituição e vimos que ambos são idênticos, havendo apenas um adicional no texto que investigamos e que trata de questões de licenciatura. Parece que o documento aqui em análise valoriza demais a formação conteudista para o curso de Letras. No final do texto, na seção da Proposta Curricular, são apresentados outros objetivos, como veremos no

quadro à frente, mas o que nos chamou a atenção é que justamente o objetivo destacado no início do documento seja o de formar profissionais capazes de analisar materiais. Pensamos que o texto defende a formação de um profissional crítico, não um simples utilizador de materiais já prontos. No entanto, da forma que tal objetivo foi trazido, pode parecer que o propósito primordial do curso de licenciatura em Letras de tal universidade seja o de formar analistas de materiais. Vemos aqui uma aparente divergência com relação às DCNCL, que preconizam como objetivo: “[...] formar profissionais interculturalmente competentes, capazes de lidar, de forma crítica, com as linguagens [...] e conscientes de sua inserção na sociedade e das relações com o outro” (BRASIL, 2001:30). Contudo, nas diretrizes, também não identificamos questões educacionais como foco central. Além disso, conforme mencionado anteriormente, ao fazer uma análise linguístico-discursiva do documento, Quevedo-Camargo (2007) concluiu que a língua ainda é a grande protagonista, ou seja, o foco das DCNCL também recai sobre a formação linguística do graduando.

Na tabela a seguir, trazemos os objetivos específicos presentes no documento e uma análise do que é enfatizado em cada um deles.

OBJETIVO PREVISTO APRIMORAMENTO

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 81-87)