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A Animação Desportiva como estratégia para o tempo livre e tempo de

II. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2.2. Conceitos de Animação Desportiva

2.3.3. A Animação Desportiva como estratégia para o tempo livre e tempo de

Sentimos necessidade e, ainda antes de entrarmos propriamente no cerne deste capítulo, de esclarecer e apresentar o que se entende por tempo livre e tempo de ócio.

Concordamos com Lopes (2008) quando diz que é difícil definir a noção de tempo livre, sem o articular com outras noções temporais tais como o tempo de trabalho, o tempo de ócio ou tempo de lazer. O autor (idem) refere que é necessário ter algum cuidado já que ao falarmos de tempos livres, não significa que estejamos a falar de tempos libertos. Isto porque os tempos gastos nas deslocações de casa para o trabalho e vice-versa, o tempo gastos em filas de trânsito, ir tratar de assuntos pessoais em entidades e instituições, o tempo gasto nas necessidades fisiológicas, etc., são realizados nos tempos livres mas que na realidade não são tempos livres, não são tempos libertos.

O mesmo autor (ibidem) afirma ainda que o indivíduo é, muitas vezes, reduzido à condição de cidadão sem cidadania, sem qualidade de vida, sem hábitos e práticas culturais, porque o tempo não o permite. O tempo livre, aquele que não é ocupado pelo trabalho, é, normalmente, consumido a viajar e raramente animado, quer no espaço familiar, quer em atividades culturais, lúdicas edesportivas.

Já no século passado, segundo Brito (1991) os tempos livres começam a ser pedagogicamente ocupados com práticas em que o prazer deveria prevalecer sobre o trabalho, como por exemplo, dançar, tocar piano, tarefas cujo objetivo era o bem-estar, o convívio, a diversão, os jogos, ou seja, as atividades lúdicas e recreativas.

Também Lull, citado por Lopes (2008), defende que existem dois tipos de tempo: o tempo do trabalho e o tempo do não trabalho (tempo livre em relação ao trabalho/emprego). O tempo de trabalho caracterizado pela: existência de um horário laboral, o salário resultante do serviço, a relação contratual entre o empregador e o empregado e outras tarefas relacionadas com o trabalho, como

sejam: a preparação do trabalho de casa, ações formativas de reciclagem laboral e ações no âmbito da educação permanente.

No tempo do não trabalho, o autor defende que existem dois tempos: um tempo que é dedicado ao cumprimento das obrigações cívicas, familiares, fisiológicas e o restante tempo, que corresponde ao tempo livre, liberto, que é no seu entender aquele o tempo de ócio.

Trilla (2004) diz-nos que o ócio tem muito a ver com a vivência de situações e experiências agradáveis e que dão prazer. É sinónimo de ocupação agradável, querida e, por conseguinte, livremente escolhida. O ócio deverá estar associado ao “esperado”, ao “querido”, ao “desejado”, ao “prazer”, ligado ao mundo da emotividade e por conseguinte, à felicidade e não motivado pelo dever ou o utilitarismo.

Na perspetiva de Dumazedier, citado por Lopes (2008:440-441), o ócio é:

“ (…) um conjunto de ocupações às quais o indivíduo se pode entregar de forma completamente voluntária depois de se ter liberto das suas obrigações profissionais, familiares e sociais, para descansar, para divertir-se, para desenvolver a sua informação e formação ou para participar voluntariamente na vida social da sua comunidade”.

Segundo o mesmo autor, um tempo de ócio permite aspetos positivos resultantes dos três D (s): - Diversão, Descanso e Desenvolvimento – os quais induzem uma participação ativa, recreativa e comprometida com os processos formativos da pessoa.

Face ao descrito, podemos concluir que existem diferenças entre o tempo livre e o tempo liberto (tempo de ócio). Sendo que, o tempo livre é aquele que o individuo dispõe para além dos seus compromissos e afazeres laborais, mas que ainda assim, pode ser um tempo de concretização de responsabilidades: pagar impostos, deslocações, afazeres familiares, etc.. O tempo de ócio será aquele que

é dedicado a atividades que transmitem à pessoa um tempo de liberdade, de prazer, de escolha, de desenvolvimento pessoal ou grupal.

Tal como referimos no ponto anterior2 a Animação Desportiva em contextos não formais é aquela que é realizada fora do contexto académico ou mesmo laboral, possibilitando assim dar atenção às carências e interesses concretos das populações recetoras. A Animação Desportiva pode ser entendida como uma forma de desenvolvimento lúdico-recreativo e de participação ativa.

Também concordamos com Cuenca, citado por Lopes (2008), quando refere a componente lúdica, associando o ócio à diversão, distração e jogo, bem como a outros atributos que conduzam a um indispensável equilíbrio psíquico e físico do ser humano. O autor refere ser fundamental a utilização do espaço físico natural para a realização de iniciativas várias de desporto e lazer e criatividade associadas à possibilidade de práticas formativas; o sentido festivo do grupo/comunidade, resultante de ações de sã convivência e consequente reforço dos laços sociais; o carácter solidário do ócio expresso pela necessidade das pessoas comunicarem, interagirem, dentro de uma noção de desenvolvimento comunitário.

O aumento do tempo disponível, segundo Lança (2003), teve como consequência direta uma mudança face ao comportamento, criando um estilo de vida orientado para a recreação e para o exercício físico. Assim, é atribuído ao desporto um conjunto de virtualidades, como por exemplo, a contribuição para o bem - estar dos indivíduos, melhorando as condições físicas e de saúde como um meio de relaxamento e anti-stress, podendo a AD ter um papel muito importante como estratégia de intervenção na motivação de um maior número de adeptos participantes.

A Associação Internacional WLRA (World Leisure & Recreation Association, 1994) citada por Trilla (2004) tornou pública uma carta sobre a Educação do ócio, onde reitera que o ócio é uma tarefa de experiência, um

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recurso de desenvolvimento, uma fonte de saúde e prevenção de doenças físicas e psíquicas, um direito humano que supõe estarem cobertas as condições básicas de vida, um sinal de qualidade de vida e um possível potencial económico. Concordamos com o autor (2004) quando refere que, falar de ócio, é falar da prática de um novo humanismo tornado realidade através do desporto, do turismo, da leitura, da música, do desfrute da arte, da distração, do jogo, do encontro com a natureza, da vivência de festividades ou do exercício da solidariedade.

Face ao descrito, parece-nos pois que o desporto, através da Animação Desportiva, como metodologia de intervenção, poderá ser utilizado no tempo de ócio dos indivíduos, não só como obtenção de prazer, mas também para melhorar e aumentar a qualidade de vida. Pensamos também que não se pode confundir o tempo livre com o tempo de ócio. Tal como quisemos demonstrar, o tempo livre é aquele que é gasto nos trabalhos domésticos, no cumprimento de obrigações fiscais, no estudo, na alimentação, na higiene pessoal, no dormir, enquanto o tempo de ócio é aquele que é gasto e livremente gerido no prazer, na liberdade, na convivência, na amizade, no companheirismo, na solidariedade.

Também Lopes, Galinha & Loureiro (2010) referem que a educação do ócio é um processo aberto, procurando melhorar a qualidade de vida das pessoas, não só na infância, mas que afeta todas as idades. Nesta medida, poderá também promover a importância da Educação Intergeracional, que trataremos no ponto 2.4.3, relevando a importância da Animação Desportiva neste capítulo.