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3.5. Fenomenologia da Incidência em Pontes de Miranda e em Paulo de Barros

4.2.1. Critérios

4.2.1.1. Antecedente (Hipótese)

O legislador, selecionando determinadas propriedades do mundo, apanhando descrições dos eventos identifica critérios para os reconhecer. Na hipótese normativa encontraremos o critério material, o critério espacial e o critério temporal.

4.2.1.1.1. Critério Material

O critério material composto pelo verbo pessoal (não é possível utilizar verbos impessoais, sem sujeitos, como haver, amanhecer, etc.) de predicação incompleta (verbo transitivo, é obrigatória a presença de um complemento) e seu complemento descrevem uma conduta humana (representativa de relevância econômica ou de um signo presuntivo de riqueza).

137 A extensão semântica dos termos do critério material é causa de intensas disputas, em quase todos os tributos uma atribuição de sentido mais extensa pode ensejar a subsunção de muitas outras condutas, afetando diretamente o patrimônio do jurisdicionado. São exemplos: “auferir renda”, “circular mercadorias”, “prestar serviço”, entre outros.

Paulo de Barros Carvalho ressalta que seguindo os predicados da Lógica jurídica“o evento descrito no pressuposto há de situar-se no campo do possível, sob pena de jamais obter-se a disciplina dos comportamentos intersubjetivos. Também a conduta, modalizada deonticamente, não pode localizar-se na região do necessário ou do impossível, pois a norma assim construída não chegaria a ter sentido jurídico.” 201

Apesar de estarmos invadindo o campo ontológico das possibilidades, a ressalva é importante porque o direito possui o escopo de regular condutas humanas, apesar de sintaticamente fechado, autopoiético, ele guarda relação de ordem semântica e pragmática com a realidade social.

Por outro lado, tentar isolar o critério material é tarefa que causa tropeços em grande parte dos doutrinadores, frequentemente misturam-no com os demais critérios, apesar de reconhecermos a dificuldade de imaginar uma conduta desligada dos condicionantes de espaço e tempo.

No caso da regra-matriz sancionatória, tanto da norma primária sancionatória, quanto da norma secundária penal, ambas possuem, no seu descritor, o critério material, exibindo conduta contrária ao mandamento da RMIT.

No entanto, a experiência prática aponta que em algumas multas específicas, o critério material é duplo, ou seja, o enquadramento legal só ocorre em caso de descumprimento de duas normas primárias.

201 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, Linguagem e Método. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2011. p. 147

138 A relação sancionatória vem no prescritor das regras, nas primeiras, podem tratar de penalidade pecuniária, pena de perdimento, sujeição ou cassação de regime especial de tributação, apreensão de mercadorias, entre outras; ou, no caso das últimas, impor sanção de natureza criminal, como pena privativa de liberdade ou de direitos.

4.2.1.1.2. Critério Espacial

No que tange ao critério espacial o direito prevê o local onde considera ter ocorrido a conduta. Neste pondo da regra-matriz muitas vezes o conteúdo espacial é referido pelo âmbito de vigência da lei no espaço, pelo princípio da territorialidade, universalidade, etc.

Os dados relativos a lugar quando não diretamente indicados, por descuido do legislador, serão encontrados pela ligação com a competência dos entes tributantes. Por exemplo, na instauração do IPTU há uma informação tácita de que o critério espacial é o perímetro urbano do Município, por sua vez, no Imposto de Importação discrimina-se o local como sendo o da repartição alfandegária, bem mais restrito. Paulo de Barros Carvalho202 então aponta a forma como o critério espacial pode ser

encontrado:

a) Hipótese cujo critério espacial faz menção a determinado local para a ocorrência do fato típico;

b) Hipótese em que o critério espacial alude a áreas específicas, de tal sorte que o acontecimento apenas ocorrerá se dentro delas estiver geograficamente contido;

c) Hipótese de critério espacial bem genérico, onde todo e qualquer fato, que suceda sob o manto da vigência territorial da lei instituidora, estará apto a desencadear seus efeitos peculiares.

139 Cumpre destacar que por vigência territorial da Lei referimo-nos à aptidão da lei para irradiação de efeitos jurídicos dentro dos limites de sua territorialidade, neste prisma podemos notar uma clara diferença entre o critério espacial das hipóteses tributárias com o plano de eficácia territorial da lei, prova disto pode ser verificada no Imposto de Renda cujo critério espacial alcança em linhas genéricas, não só os acontecimentos verificados no território nacional, mas até fatos que compõem e ultrapassam nossas fronteiras.

No campo tributário os estudos sobre o critério espacial são contidos, em contramão à crescente elevação da complexidade dos negócios jurídicos. No atual mundo globalizado, as bordas físicas são facilmente ultrapassadas e operações econômicas entre empresas que possuem sede em distintos países, com centros de distribuição espalhados em outros, ocorrem o tempo inteiro.203

Na regra-matriz sancionatória tributária, o critério espacial assemelha-se ao da norma primária, a lei indica o lugar em que considera ocorrido o fato antijurídico. No entanto, dificilmente há enunciado expresso do critério espacial.

4.2.1.1.3. Critério Temporal

No domínio do Direito Tributário dois direitos fundamentais do cidadão são atingidos: o de propriedade e o de liberdade. Daí a importância da norma trazer a indicação do marco temporal em que considera ocorrido o evento tributário.

O critério temporal, nessa variável da hipótese normativa o direito aponta um instante em que considera ocorrido o fato, é comum, no entanto, a equivocada visão de que este critério pode ser classificado em: fatos geradores instantâneos, continuados e complexivos, consoante o lapso temporal de suas ocorrências. Mas Paulo de Barros

203 Sobre o tema, um dos raros estudos aprofundados é a dissertação de mestrado de Lucas Galvão Britto pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

140 Carvalho é incisivo ao expor não ser correto imaginar um vínculo jurídico instaurado continuamente, a confusão é feita pela mistura entre a camada linguística dos fatos com a camada dos eventos.

Em verdade a imputação normativa sempre depende do átimo em que o direito considera como ocorrido o evento, antes não há relevância jurídica:

“os fatos geradores seriam instantâneos quando se verificassem e se esgotassem em determinada unidade de tempo, dando origem, cada ocorrência, a uma obrigação tributária autônoma. Os continuados abrangeriam todos os que configurassem situações duradouras, que se desdobrassem no tempo, por intervalos maiores ou menores. Por fim, os complexivos nominariam aqueles cujo processo de formação tivesse implemento com o transcurso de unidades sucessivas de tempo, de maneira que, pela integração dos vários fatores, surgiria o fato final. (...)pela facilidade de enquadramento das figuras tributárias numa das três categorias. O IPI, o ICMS e o Imposto de Importação, por exemplo seriam casos de fatos geradores instantâneos; o IPTU e o ITR entrariam como fatos continuados; e o IR consubstanciaria a forma clássica do fato gerador complexivo.” 204

Ora, em todas as citadas espécies os chamados fatos geradores só ganham importância jurídica no instante preciso considerado pelo direito, antes disso os componentes isoladamente não tem o condão de fazer surgir a relação tributária, é por isso que o citado autor combate: O acontecimento só ganha proporção para gerar o efeito prestação fiscal, mesmo que composto por mil outros fatores que se devam conjugar, no instante em que todos estiverem concretizados e relatados, na forma

204 CARVALHO. Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 23ª edição. Editora Saraiva, 2011. p. 336-337

141 legalmente estipulada. Ora, isso acontece num determinado momento, num especial marco de tempo. Antes dele, nada de jurídico existe, em ordem ao nascimento da obrigação tributária. Só naquele átimo irromperá o vinculo jurídico que, pelo fenômeno da imputação normativa, o legislador associou ao acontecimento do suposto.205

Por outro lado, Paulo de Barros Carvalho critica veementemente o legislador pela impropriedade cometida ao considerar em diversas passagens o critério temporal como sendo o fato gerador do imposto, são exemplos, os artigos, 19, 23 e 46 do Código Tributário Nacional. A pretexto de selecionar um fato se está indicando um instante, exatamente o critério temporal.

Na regra-matriz sancionatória, o critério temporal indica o instante em que considera ocorrido o fato antijurídico. No entanto, nem sempre é fácil identificar o referido momento. Ademais, na maioria das multas tributárias o critério temporal coincide com o não pagamento do tributo ou a não apresentação do dever instrumental, ou seja, o instante do fato ilícito coincide com o prazo de pagamento ou o prazo de entrega do dever instrumental.