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5. Política externa independente (“Autonomia pela diversificação”)

3.2. Antecedentes históricos e relações embrionárias (1800-19740)

A história comum entre Brasil e China pode ser considerada, de forma mais enfática e institucional, através da aproximação entre os dois países há época da fundação da República Popular da China, em 1949. Entende-se o período demarcado entre 1949 e 1974 como a primeira fase das relações sino-brasileiras, tendo seu final, a assinatura do acordo de reconhecimento diplomático entre as duas nações em 1974. Porém vale a pena ressaltar que os laços históricos que unem as duas nações podem ser datados do início do século XVII.

Historiadores chineses e brasileiros insistem em marcar a chegada de trabalhadores chineses ao Rio de Janeiro em 1810 como o início das relações entre ambos os países. Na verdade, as raízes dos contatos sino-brasileiros se encontram no comércio marítimo português nos séculos 17 e 18. Embora a Coroa portuguesa proibisse o comércio entre Macau, no sul da China, e o Brasil, navios portugueses que chegavam aos portos de Salvador, Recife e Rio de Janeiro abasteciam o mercado com sedas, porcelanas e até braços chineses. Segundo o acadêmico Charles Boxer, há indícios documentais que apontam a participação de trabalhadores chineses na extração de ouro em Minas Gerais durante o século 1865.

Os reflexos deste contato podem ser encontrados na botânica, na arquitetura, nos costumes e na culinária. Como Luís Antônio Paulino e Marcos Cordeiro Pires (2001) destacam, o sociólogo Gilberto Freyre observara, ao analisar anúncios publicitários nos jornais do Rio de Janeiro, na primeira metade do século XIX, o fascínio exercido pelas

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Eric VandenBussche. A China descobre o Brasil: o primeiro capítulo das relações sino-brasileiras. Disponivel em: http://vistachinesa.blogfolha.uol.com.br/2012/07/27/a-china-descobre-o-brasil-o-primeiro-capitulo-das-relacoes-sino- brasileiras

chinoseries entre os consumidores brasileiros, como podemos perceber na passagem

abaixo:

“Na Rua da Alfândega n°5 se acham à venda por atacado e miúdo todos os gêneros e fazendas da China, como sejam canela e chás, Alfojar, Pérola, Hisson, Uxim, Congo, Sequim, Tonkay e Suchon, toda a qualidade de charões, gangas, sedas e tonquins, tanto em peças como chalés, mantas, etc. No armazém da mesma casa se vendem varejados todos os chás novos do navio Maria I, pelos preços atuais e louça ordinária e em porcelana, para mesa e chá também do mesmo navio.”

(FREYRE, 2003:57 apud LUÍS E PIRES, 2011:20)

Do ponto de vista diplomático, tanto o Império chinês quanto a República brasileira não obtiveram contatos próximos com o país asiático. A primeira missão brasileira à China foi feita para negociar o estabelecimento de relações formais entre ambas as nações. Essa missão diplomática, liderada por Eduardo Calado e Artur Silveira da Mota, tinha como objetivo principal a negociação de um tratado que assegurasse a emigração de chineses para suprir a carência de braços nas lavouras de café66.A missão brasileira conseguiu, após longas negociações e graças à interferência da Inglaterra, assinar um tratado estabelecendo relações formais com a corte Qing. A forte oposição chinesa, porém, frustrou as repetidas tentativas brasileiras de incluir no tratado uma cláusula estimulando a emigração de trabalhadores chineses. Sem obter sucesso, o resultado positivo deste primeiro contato foi a abertura de um consulado brasileiro em Cantão (1843).

A posição da dinastia Qing em relação ao Brasil, entretanto, passou por uma transformação com a visita do militar Fu Yunlong ao Brasil, em 1889. O militar havia sido enviado ao Japão e ao continente americano pelo ZongliYamen (o órgão do governo Qing responsável pelas relações exteriores) para coletar informações sobre esses países. Após permanecer no Brasil durante um mês (de 7 de março a 5 de abril de 1889), Fu Yunlong preparou um relatório que enterrou as resistências da corte Qing em relação à emigração de coolies chineses ao país. Para Fu, os trabalhadores chineses no

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Eric VandenBussche. A China descobre o Brasil: o primeiro capítulo das relações sino-brasileiras. Disponivel em: http://vistachinesa.blogfolha.uol.com.br/2012/07/27/a-china-descobre-o-brasil-o-primeiro-capitulo-das-relacoes-sino- brasileiras

país se dedicavam ao cultivo do chá e, ao contrário dos coolies no Peru e em Cuba, não sofriam maus-tratos. Ele enfatizou as oportunidades que o Brasil oferecia aos imigrantes: a abundância de terras virgens e minas a serem exploradas. Porém, com a ascensão do Japão e a iminente queda do Império Qing, as relações entre as nações se deteriorou.

A retomada do diálogo sino-brasileiro se deu com a abertura do governo brasileiro de uma representação consular junto ao governo de Chiang Kai-shek em 1943, em meio aos acontecimentos da Segunda Guerra Mundial. A partir da fundação da RPC, governada por Mao Zedong, o governo brasileiro passa a adotar as determinações norte-americanas e continua a reconhecer oficialmente o Governo de Chiang em Taiwan. Porém, o interesse entre a RPC e o Brasil volta a ter valia a partir do governo Vargas partindo do pressuposto de que ambas as nações se identificariam como nações subdesenvolvidas.

Ambas as nações apresentaram na década de 1960 discursos semelhantes a respeito das Relações internacionais, figurando-se entre os terceiro-mundistas. De fato, a opção pela Política Externa Independente vigente no governo de Jânio Quadros (1961) possibilitou a primeira visita oficial de um governante brasileiro à China. Com a instauração do regime militar em 1 de agosto de 1964, a Politica Externa brasileira volta a adotar uma política de alinhamento com os EUA, rompendo as relações com a China.

Na década de 1970, diferentes fatores levaram a uma abertura de diálogo. Do ponto de vista chinês, interessava ao país encerrar o isolamento de Pequim no sistema internacional no sentido de recuperar algum poder de barganha. Do ponto de vista brasileiro, a retomada do discurso nacional-desenvolvimentista faz com que o Brasil encadeie a partir de uma nova perspectiva brasileira em diversificar seus parceiros e abrir novos mercados.