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PERÍODO V2 por

4. Análise empírica

4.1. Após o período

No final do período V2, as clivadas inversas são atestadas com mais freqüência, tanto em declarativas quanto em interrogativas96. A partir do século XVII, as interrogativas são atestadas com a forma expletiva é que.

-Declarativas :

(37) a. Êles estão tão pouco considerados e tão submetidos à tutela desta Corôa, que AQUI é que se hão-de fazer tôdas as negociações e .... (Cunha Brochado 1651-1735) b. De Deus são mais para temer os castigos, dos homens mais para temer os juisos. E D’ESTES é que nós fallamos. (Vieira 1608-1697)

95 Eu cuydo que é meu. (...) Nõ é teu, mais meu. (...) Se teu é, toma-o. 96 As interrogativas podem ser analisadas como clivadas invertidas.

c. AO PREDICAMENTO DA ACÇÃO é que pertence a verdadeira fidalguia. (Vieira 1608-1697)

d. E ISSO é que se chama postura, ou posição reta. (Argote 1676-1749) e. A respeito dos serviços que se fazem, O CRIADO é que deve ser pago e não a senhora. (CAVALEIRO DE OLIVEIRA 1702-1783)

f. SÓ DESTE é que se pode dizer que, incendiado e entretido por uma subs- tância que imagina e que arrazoa, não está sujeito a nenhum dos inconvenientes que.... (CAVALEIRO DE OLIVEIRA 1702-1783)

g. Na parte em que domina algum usurpador, PARA ELE é que se olha, e não para a usurpação; AIRES, Matias (1705-1736)

-Interrogativas:97

(38) a. M. E para que tempos, é que serve de Auxiliar? (Argote 1676-1749)

b. agora dizeis que os relativos não concordam com o seu substantivo em caso: logo com que substantivo é que concordam? (Argote 1676-1749)

c. M. E quando é que são Relativos? (Argote 1676-1749)

d. M. E quando é que são enclíticos os relativos O, Os, A, As? (Argote 1676-1749) e. M. E quando é que o mostra? (Argote 1676-1749)

Também nesse século continuam a serem atestadas, nos dados de escrita, as pseudo- clivadas invertidas:

(39) a. NAS INQUIETAÇÕES CIOSAS é onde a alma se acha como em desordem e como em delírio (CAVALEIRO DE OLIVEIRA 1702-1783)

b. Diraõ que fallo picante, ou lepido: ISSO he o que pertendo, para adoçar por todas as vias o desagrado da materia. (Manuel da Costa 1601-1667)

As clivadas (não-inversas) começam a ser atestadas no séc. XVIII, quando todos os quatro tipos apontados em (4b-e) acima tornam-se freqüentes. Os dados a seguir ilustram este fato, retirados das Cartas e outros Escritos da Marquesa D’Alorna (1750-1839):

97 Dados de Jerónimo Contador de Argote (1676-1749), no documento “Regras da Língua Portugueza, Espelho da Língua Latina”.

(40) a. é O REI LEGÍTIMO que devemos opor ao usurpador. (Clivada)

b. é NAS MÃOS DE VOSSA EMINÊNCIA que êles depositam hoje a sorte da Igreja e da França

c. DE INGLATERRA E FRANÇA que hão-de partir todos os raios, com que desaparecerão do painel da Europa as outras potências - e nós com elas. d. é ÊLE MESMO a quem a França ameaça

(41) a. DO PRÍNCIPE é que tudo depende. (Clivada invertida)

b. NA FRANÇA MESMA é que se devem buscar as mais eficazes diversões e os mais úteis aliados.

c. O MÉDICO é que me traz todos os meses os tais Review. d. e SÓ NISSO é que tenho empenho.

e. Isso não é tão pouco, mas DEUS é que sabe se será perverso ministro. (42) a. mas o que me custou mais a combater foi MINHA MÃE. (Pseudo-clivada)

b. e o que mais me admira são AS SUAS PROTESTAÇÕES DE SENTIMENTO. c. Ora pois, Senhor, o que tiramos daqui é que OS MINISTROS OU NÃO QUEREM OU NÃO SABEM FAZER OS NEGÓCIOS.

d. pois o que me serve é que O BEM SE FAÇA.

(43) a. UM JUÍZO CLARO E UMA CONSTANTE MODÉSTIA é quem determina o tempo que se pode perder com a sociedade inútil; (Pseudo-clivada invertida.) b. O MEU TEMPO E O MEU TRABALHO não é o que me faz chorar. c. ISSO é o que me despedaça o coração.

d. mas tanto um como outro Ministros declararam que O PRÍNCIPE é quem não queria.

e. e às vezes parece que O MERECIMENTO é quem exclui dos prémios. f. VOSSA ALTEZA REAL é quem há-de soltar tôdas as dificuldades, Também há casos de pseudo-clivadas extrapostas:

(44) a. foi VOSSA EMINÊNCIA quem me conduziu à presença de Sua Alteza Real b. foi VOSSA EMINÊNCIA quem julgou que eu era digna de expor, na presença do Príncipe Regente, meu Senhor, aqueles negócios de que me encarregavam pessoas dignas de grande atenção.

c. Não é ESPANHA quem deve estabelecer as regras da nossa conduta, mas é O NOSSO PRÍNCIPE quem deve ditar à Espanha o que convém;

5. Conclusões

Conforme nossas hipóteses:

a) a clivada (it-cleft) não aparece em sentenças raízes por violar o padrão V2; b) as clivadas inversas são possíveis, mas apenas com DP focalizado, fase em que ainda não se observam as interrogativas clivadas;

c) as pseudo-clivadas e pseudo-clivadas invertidas ocorrem nos documentos, caracterizando-se como um padrão perfeitamente licenciado no período V2; d) o período V2 admite também as perguntas-Q derivadas de pseudo- clivadas;

e) é com o aparecimento sem restrições de elemento focalizado, que as perguntas- Q clivadas aparecem no sistema; isso quando o português deixa de ser V2. Assim, procuramos responder às questões colocadas no início do texto considerando que a inexistência de clivadas no PA e no PC deriva de restrições relacionadas com suas características de língua V2. Mostramos que outros recursos estavam disponíveis para a focalização de constituintes, ativando sempre a periferia à esquerda da sentença (LP), como em outras línguas V2. Assumimos que a derivação da estrutura clivada com cópula inicial e com a cópula medial (é X que / X é que) está relacionada com as propriedades V2 e de sujeito nulo: línguas V2 só ativam LP para foco; línguas não-V2 podem ativar as duas, dsitribuindo-as entre: LP = foco contrastivo; MP = usada livremente, para os dois tipos de foco.

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PRIMEIRAS HISTÓRIAS SOBRE A DIACRONIA DO

No documento Para a história do português brasileiro (páginas 179-185)