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2 O Processo de Aprendizagem de Coordenadores de Curso em Instituições de Ensino

2.3 Aprendizagem Formal e Informal

O coordenador de curso realiza diversas tarefas que possuem características muito específicas, além de lidar com profissionais das mais diversas áreas de formação e, consequentemente, com os mais variados perfis. Por meio da interação com os diversos atores envolvidos, há necessidade de desenvolver rapidamente mecanismos para adaptar-se e aprender a cada nova situação.

Fatores como a incerteza, a inserção em um ambiente muito instável, a administração constante de conflitos, além da importância da percepção e adequação à cultura das instituições a que pertencem, corrobora a ideia do aprender a aprender, a necessidade de uma educação permanente, flexível e versátil (TORRES, 1994).

No contexto do trabalho, a aprendizagem de um indivíduo pode advir de práticas formais e informais. A concepção tradicional de aprendizagem é normalmente relacionada a um espaço e tempo determinados – aprende-se nas escolas, em treinamentos específicos, na educação básica, nos cursos de graduação e pós-graduação, nos programas formais de mentoria – acreditando-se muitas vezes, que essa aprendizagem formal, institucionalizada e baseada em currículos orientados, com a figura de um professor, é a que mais oferece meios para o desenvolvimento de competências individuais (CONLON, 2004); é também chamada de aprendizagem explícita (POZO, 2002) que é o produto de ação proposital, organizada e consciente com o objetivo de aprendizagem.

No entanto, as práticas formais que sempre foram consideradas importantes fontes de aprendizagem nem sempre se efetivam necessariamente em competências (RUAS, 2001). Os indivíduos estão a todo o momento agindo e observando as suas experiências e, com elas, aprendendo.

Nesse sentido, muitos autores têm questionado a real eficácia dos processos de aprendizagem formais, visto em programas que procuram oferecer uma formação técnica, ou mesmo que se propõe a desenvolver um conjunto de atributos, contudo na maior parte das vezes, desvinculados da realidade do indivíduo no seu trabalho.

Estudos demonstram que uma quantidade significativa da aprendizagem de um adulto acontece de maneira informal. Slater (2004) relata pesquisa realizada em grande escala no Canadá com funcionários adultos. Os dados apontaram que 70% dos conhecimentos mais importantes relacionados ao trabalho foram conseguidos pela interação com outros trabalhadores ou oriundos de suas práticas de trabalho.

Corroborando a observação acima, Conlon (2004) reúne evidências de que a aprendizagem induzida pela organização da maneira como vem sendo realizada (instrução em sala de aula, treinamentos, seminários etc.), responde por aproximadamente de 10 a 20% do que os colaboradores aprendem em relação ao trabalho.

Victoria Marsick e Karen Watkins (2001) contribuíram significativamente para a discussão, explorando os conceitos de aprendizagem informal e incidental. As autoras apresentam a aprendizagem formal, referindo-se a atividades tipicamente institucionalizadas, patrocinadas em sala de aula, altamente estruturadas, consideradas como treinamento e educação e que implica o controle do processo de aprendizagem nas mãos do instrutor.

Em contraste, a aprendizagem informal pode ocorrer em instituições, mas normalmente não ocorre em sala de aula ou de maneira estruturada. A aprendizagem que se encontra principalmente nas mãos do aprendiz e suas experiências é considerada papel central na aprendizagem informal (MARSICK; WATKINS, 2001).

Assim, mesmo que uma organização não ofereça incentivos à aprendizagem, esta pode ocorrer nesse ambiente. Exemplos de aprendizagem informal são a aprendizagem autodirigida, networking, coaching, mentoring e observação (MARSICK; WATKINS, 2001). A aprendizagem incidental é definida como um subproduto de alguma outra atividade, como por exemplo, a realização de tarefas, a interação interpessoal, a percepção da cultura da organização, experimentação, por tentativa e erro, ou mesmo oriunda de aprendizagem formal. Ela normalmente acontece, porém na maior parte das vezes, de maneira tácita, não intencional e até inconsciente (MARSICK; WATKINS, 2001).

Marsick e Watkins (2001) revisaram o modelo de aprendizagem informal e incidental, e constataram que seu modelo estava ligado a conceitos relacionados com a Aprendizagem Experiencial (BOUD; COHEN; WALKER, 1993; KOLB, 1984), com a Aprendizagem Autodirigida (CANDY, 1991; KNOWLES, 1950), com a Aprendizagem na Ação como uma variação da Aprendizagem Experiencial (REVAN, 1982), com a Ciência da Ação (ARGYRIS; SCHÖN, 1974, 1978) e com a Reflexão em Ação (SCHÖN, 1993).

Além disso, Marsick e Watkins (2001) identificaram que as organizações podem incentivar a aprendizagem ao disponibilizar, por exemplo, tutoriais, recursos em materiais referenciados em biblioteca, assinaturas de jornais profissionais, cursos em vídeos e em computadores, e também destacaram o fato da organização encorajar a aprendizagem colaborativa.

A aprendizagem informal e incidental podem ser caracterizadas pela integração de rotinas diárias, pelo disparo de solavancos internos e externos, pelo acaso e oportunidade, pela baixa consciência, pelo processo indutivo da reflexão e ação e pela ligação de aprendizagem dos outros (MARSICK; WATKINS, 2001).

Na figura 5, é apresentado o modelo de aprendizagem informal e incidental de Marsick e Watkins (2001):

Figura 5 - Modelo de Aprendizagem Informal e Incidental Fonte: Marsick e Watkins (2001)

O modelo trata do ciclo de resolução de problemas por meio do pensamento reflexivo, ou seja, quando a natureza de um problema passa a ser repensada. De uma situação inesperada, o pensamento reflexivo busca soluções; envolve um ou mais ciclos de tentativa e erro e a busca pelo resultado esperado, o que leva à aprendizagem. A observação dessa experiência faz com que correções aconteçam e que essas observações sirvam como modelo para situações que ocorrerem no futuro (MARSICK; WATKINS, 2001).

O modelo apresentado na figura 5 corrobora essa explicação, mostrando que a aprendizagem acontece no dia a dia e em um determinado contexto (círculo no centro). Quando uma nova experiência ocorre, surge um problema a ser resolvido, um desafio ou uma visão de um estado futuro. Também é representado o contexto no qual a experiência acontece (lado de fora do círculo), mostrando que o contexto de aprendizagem pessoal, social, de negócios e cultural influenciam a maneira como as pessoas interpretam uma situação, suas escolhas, como agem e consequentemente, como a aprendizagem se efetua (MARSICK; WATKINS, 2001).

O sentido que uma pessoa dá a uma experiência poderá se alterar quando a mesma reflete e questiona esses entendimentos anteriores. O modelo de aprendizagem informal e incidental é circular, contudo, suas etapas não são lineares e nem necessariamente sequenciais.

Marsick e Watkins (2001) incluem o processo de aprendizagem incidental no modelo, mostrando que esse processo sempre ocorre de maneira consciente ou inconsciente.

A maneira como cada um vê as coisas, direciona quanto ao foco dado e como será interpretada a nova experiência. Ao final de um ciclo de aprendizagem, as lições aprendidas podem influenciar novas experiências. As pessoas também diagnosticam ou estruturam as experiências que vivenciam, acessando o que é problemático ou desafiador e comparam a nova experiência com a anterior, identificando similaridades e diferenças e usando suas interpretações para dar sentido ao novo desafio (MARSICK; WATKINS, 2001).

A interpretação do contexto também é utilizada pelas pessoas para refinar seus diagnósticos. Marsick (2009) apresentou atualizações em seu modelo e apontou, entre outros fatores, o importante papel das relações, cultura, estrutura da liderança e do ambiente ao promover a autonomia, a colaboração de outros, o diálogo reflexivo, receber feedback, regras comuns e de responsabilidade, na aprendizagem.

Para Marsick (2009), a aprendizagem é resultado das interações entre indivíduos e ambiente, e posiciona a aprendizagem dos indivíduos como dependente de contextos sociais maiores como comunidades de práticas, organizações e sociedades.

O modelo apresentado inicialmente por Marsick e Watkins (2001) parecia linear, enfatizando o significado individual sobre a interação social e a construção de significados, no entanto, nesta segunda revisão, Marsick (2009) acrescentou o importante papel do contexto.

A solução de um problema e o ciclo de aprendizagem apresentados em seu modelo, apesar de relevantes, não estão conectados a muitos aprendizes que buscam a combinação de metas individuais e organizacionais e de que parecem ser mais automotivados, autossuficientes e autodirigidos em estabelecer e atingir metas e a procurar oportunidades de aprendizagem, do que de suas metas pessoais (MARSICK, 2009).

O contexto organizacional – cultura, estrutura, processos e práticas – desempenha papel fundamental inibindo ou permitindo a motivação para a aprendizagem (MARSICK, 2009). A autora deixa clara a natureza altamente contextual da aprendizagem informal e que seu estudo requer que se recorra a outras disciplinas e áreas de atuação.

Segundo a autora, questões como intencionalidade, consciência, proatividade e reflexão crítica foram identificadas como facilitadores para a aprendizagem informal. Marsick (2009) também mostra que a aprendizagem varia de acordo com o contexto, os interesses e preferências dos atores-chave, mediada pela sua negociação de poder.

Marsick (2009) tenta unificar o modelo de aprendizagem informal e incidental e acrescenta alguns aspectos:

• a aprendizagem informal é sempre definida em contraste com a aprendizagem formal;

• a aprendizagem informal pode ser estudada por meio da análise dos processos e atividades de aprendizagem, como experimentação, reflexão, pelo erro, por idéias de outras pessoas, a análise da própria prática; dando e recebendo feedback e até conversando com colegas;

• as estratégias de aprendizagem do indivíduo são mediadas por suas crenças, valores, histórias e socialização prévia, corroborando os estudos da autora, que apontam que a intencionalidade, proatividade e reflexividade crítica afetam a natureza da aprendizagem;

• o contexto influencia as práticas e escolhas de aprendizagem, incluindo os estímulos para a aprendizagem, os recursos e influências do ambiente;

• os relacionamentos, incluindo os facilitadores ou barreiras ao seu engajamento, são apontados como fundamentais para a construção de comunidades de aprendizagem informal;

• fatores organizacionais como liderança, estrutura, cultura, sistemas e práticas, incentivos e recompensas, influenciam o clima para a aprendizagem;

• o gerenciamento do conhecimento (com base em tecnologia e pessoas) pode tornar- se um link entre a aprendizagem informal gerada individualmente e o acesso a um vasto número de pessoas.

O núcleo desses estudos é que se aprende com e por meio da experiência. A aprendizagem individual é muitas vezes implícita ou incidental e pode ser mais facilmente compreendida por meio de uma análise sociocultural, observando a interação entre o

indivíduo e seu meio social, histórico e cultural. As pessoas podem até mudar esses contextos, mas também são moldadas por eles (MARSICK, 2009).