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2 O Processo de Aprendizagem de Coordenadores de Curso em Instituições de Ensino

2.4 O modelo de aprendizagem no local de trabalho

Diversos trabalhos abordam a aprendizagem no local de trabalho, bem como se propõem a investigar sobre como melhorar essa prática (EVANS et al.; 2010; SHIPTON, 2006; SMITH, 2003; ONSTENK, 1995).

Ao propor o estudo da aprendizagem de coordenadores em diferentes IES, partiu-se do princípio de que o local de trabalho pode influenciar e/ou estimular a aprendizagem desses profissionais, justificando assim, a escolha em utilizar o modelo de Aprendizagem no Trabalho de Illeris (2002; 2004; 2007), que considera as influências do ambiente no qual o indivíduo está inserido.

O trabalho de Illeris (2004) demonstra a necessidade de uma visão mais holística da aprendizagem e defende que, para a sua construção, deve ocorrer a interação entre aquisições individuais e processos sociais, ou seja, o encontro entre os ambientes de aprendizagem nas organizações (ambiente técnico-organizacional e ambiente sociocultural) e os processos de aprendizagem de seus colaboradores.

Illeris (2007) apresentou seu modelo baseado na junção de teorias de autores como Jorgënsen e Warring (2001) e de seus estudos anteriores, que havia resultado no modelo geral de Aprendizagem (2002) e no modelo de Aprendizagem no Local de Trabalho (2004).

No primeiro modelo chamado de modelo Geral de Aprendizagem, representado na figura 6, Illeris (2002) destaca dois processos: o processo de interação social da aprendizagem, que ocorre entre o indivíduo e seu ambiente e que são de natureza social e cultural; e o processo de aquisição psicológica, que ocorre no nível individual, em que se encontram as dimensões do conteúdo da aprendizagem (referente aos conhecimentos, habilidades e estratégias de aprendizagem) e da dinâmica da aprendizagem (referente às motivações e emoções).

A dimensão individual é representada pela seta horizontal, que interliga os aspectos de conteúdo e emocional envolvidos na aprendizagem. Já a dimensão social, representada pela seta vertical, se dirige para a seta da dimensão individual indicando que os dois processos são codeterminantes da aprendizagem. Para o autor, as setas duplas indicam a inter-relação dinâmica entre os elementos, que somente podem ser separados uns dos outros como elementos desconectados analiticamente.

Figura 6 - Processos e Dimensões da Aprendizagem Fonte: Illeris (2004. p. 436), traduzido pela autora

Para Illeris (2002), no processo contínuo de interação, são desenvolvidos estímulos por meio de opiniões, padrões de comportamento, impressões e percepções que os funcionários recebem em quantidade e por caminhos diferentes, deste modo, o encontro resulta na aprendizagem no trabalho.

O autor apresenta o conceito de identidade individual do trabalho, mostrando que a vida no trabalho ou as comunidades de trabalho levam ao processo de aquisição individual. Como demonstrado na figura 7, a identidade individual do trabalho está relacionada à vida no trabalho e ao campo da prática no trabalho pelas linhas pontilhadas na área central. A identidade é considerada tanto individual quanto social e refere-se aos significados que se atribui às experiências. AMBIENTE CONTEÚDO DE APRENDIZAGEM INDIVIDUAL DINÂMICA DE APRENDIZAGEM Aquisição Psicológica Interação Social Motivação Atitudes Conhecimentos Habilidades

Segundo Illeris (2004), a identidade individual é biográfica e refere-se aos significados que se atribui a uma experiência individual, enquanto a identidade social está relacionada às experiências na comunidade social.

Figura 7 - Aprendizagem e Identidade no Trabalho Fonte: Illeris (2004, p. 437), traduzido pela autora

Ao relacionar o modelo geral de aprendizagem à vida no trabalho, tem-se o modelo de Aprendizagem no Local de Trabalho (figura 8). Nele, o ponto central é que os impulsos de aprendizagem ligados à vida no trabalho são influenciados tanto pela identidade no trabalho que está no nível individual, quanto pela influência do desenvolvimento da identidade básica do indivíduo, que o faz optar por determinados pensamentos e ações. Dessa forma, o lado individual da aprendizagem no trabalho é moldado pelo lado social e pela prática (ILLERIS, 2004).

Illeris (2004) cita que utilizou o modelo de aprendizagem no local de trabalho de Jorgënsen e Warring (2001) baseado nos conceitos de Ambiente de Aprendizagem e Processo de Aprendizagem, onde a aprendizagem acontece diante do encontro de um ambiente de trabalho de aprendizagem e a maneira pela qual os funcionários aprendem.

CONTEÚDO DE

APRENDIZAGEM DINÂMICA DE APRENDIZAGEM

INDIVIDUAL

Ident. Trab.

Illeris (2004) aponta que Jorgensen e Warring (2001) compreendem como Ambiente de Aprendizagem aquele que oferece oportunidades de aprendizado por meio de materiais e contatos sociais e como Processo de Aprendizagem, o indivíduo em um processo de aprendizagem contínuo que tem por base as experiências anteriores e que direcionam os planos e perspectivas futuras.

O processo de aprendizagem dos indivíduos é fundamental para o aprendizado no ambiente de trabalho, pois refletirá na maneira como eles irão conhecer e explorar as oportunidades de aprendizagem no trabalho (ILLERIS, 2004).

A aprendizagem ocorre na relação dinâmica entre os processos de aprendizagem dos funcionários, as comunidades que são formadas no ambiente de trabalho e o sistema técnico- organizacional da empresa, conforme figura 8:

Figura 8 - Modelo de Aprendizagem no Local Trabalho Fonte: Illeris (2004, p.432), traduzido pela autora

O modelo triangular é formado pelos três principais componentes da aprendizagem no local de trabalho: o ambiente de aprendizagem técnico-operacional (divisão do trabalho e de seu conteúdo, autonomia e aplicação de qualificações, interação social, tensão e estresse), o ambiente de trabalho social (comunidades de trabalho, culturais e políticas) e o processo de aprendizagem dos empregados (experiência do trabalho, educação e treinamentos, conhecimento).

Os dois lados do ambiente (técnico-operacional e social) de aprendizagem são importantes porque dinâmicas diferentes determinam o desenvolvimento de cada um deles – as condições de aprendizagem do ambiente técnico-operacional referem-se às condições de mercado e tecnológicas; já no ambiente de aprendizagem social, acontecem pelas condições sociais e culturais.

No entanto, a estrutura de aprendizado é comprometida pelo ambiente de trabalho quando este não oferece condições para interação do funcionário com o ambiente de aprendizagem. Assim, é necessário analisar as experiências e expectativas dos funcionários

PROCESSO DE APRENDIZAGEM DOS FUNCIONÁRIOS Experiência do Trabalho Educação e Treinamentos Conhecimento AMBIENTE DE APRENDIZAGEM SÓCIO-CULTURAL (SOCIAL) Comunidades de Trabalho Comunidades Culturais Comunidades Políticas AMBIENTE DE APRENDIZAGEM TÉCNICO-ORGANIZACIONAL Divisão do Trabalho e do Conteúdo do

Trabalho

Autonomia e Aplicação de Qualificações Possibilidades de Interação Social

para compreender a dinâmica do encontro entre o ambiente de aprendizagem e o processo de aprendizagem do indivíduo para então desenvolvê-lo.

Existe uma relação dinâmica entre todos os elementos do modelo que resulta na aprendizagem no local de trabalho. Esta relação evidencia-se, por exemplo, pelo fato de que o processo de aprendizagem de cada funcionário está intimamente ligado às suas experiências, pelos ambientes que se formam pelas condições sociais (aprendizagem social), da mesma forma que o ambiente técnico-operacional e o ambiente social também estão ligados a fatores externos ao ambiente de trabalho, como as condições políticas, sociais e culturais da sociedade.

Para Illeris (2004) os níveis técnico-organizacional e social se misturam, interagindo com o processo de aprendizagem individual, formando dessa interação a área de prática do trabalho e na qual a aprendizagem se desenvolve.

O autor demonstra nesse modelo que a aprendizagem que acontece no trabalho se origina na dimensão técnico-operacional e na social, onde o funcionário está inserido, e que a posição e a sua função na sociedade influenciam o que e como aprendem.

Illeris (2004), baseado na visão de construção social de Gergen (1994) e Burr (1995), mostra que a aprendizagem humana envolve simultaneamente, a interação social entre os indivíduos e o seu ambiente. O indivíduo recebe influências ou impulsos que podem ser absorvidos por meio da interpretação psicológica e do processo de aquisição; quando esses processos estão ativos a aprendizagem acontece.

É fundamental que no processo de aprendizagem seja envolvido tanto elementos racionais, quanto elementos emocionais mais amplos. Os fenômenos psicológicos como bloqueios, distorções e resistências também podem desempenhar um importante papel no processo de aprendizagem (ILLERIS, 2004).

Por fim, Illeris (2004) sobrepôs os dois modelos apresentados - o modelo Mais Geral de Aprendizagem e o modelo de Aprendizagem no Trabalho, formando o modelo Holístico de Aprendizagem no Trabalho, representado na figura 9.

Figura 9 - Modelo Holístico de Aprendizagem no Trabalho Fonte: Illeris (2004, p. 438), traduzido pela autora

Illeris (2004) apresenta primeiramente o modelo Geral de Aprendizagem, com sua base no nível individual e o ângulo voltado para baixo no nível social. No segundo modelo, sua base encontra-se no nível social e ambiental, e o ângulo, que se refere ao processo de aprendizagem dos empregados, está apontado para o topo, no nível individual.

Segundo o autor, uma condição fundamental é que os dois modelos tentam distinguir e fazer a conexão entre o nível individual e o nível social, ao passarem a impressão de que esses níveis são de natureza externa e mecânica; porém, o autor discorda, enfatizando que, na realidade, há uma dialética entre o subjetivo e o objetivo.

O ambiente objetivo está presente na experiência subjetiva e nos entendimentos, e é marcado pelas percepções subjetivas e ações. É uma questão de processos integrados de subjetivação e socialização em uma interação contínua, que só podem ser separadas analiticamente (ILLERIS, 2004). INDIVIDUAL AMB. APRENDIZAGEM SÓCIO-CULTURAL CONTEÚDO DE APRENDIZAGEM PRÁTICA NO TRABALHO IDENTIDADE NO TRABALHO AMB. APRENDIZAGEM TÉCNICO-ORGANIZACIONAL DINÂMICA DE APRENDIZAGEM AMBIENTE Nível Social Nível Individual

O modelo, ao sobrepor os dois triângulos, mostra a dialética de seus elementos centrais: a identidade do trabalho do primeiro modelo e a prática no trabalho do segundo modelo. A interação ocorre na sobreposição desses elementos, oportunizando importantes fatores de aprendizagem no trabalho.

Para Illeris (2004), é nesse espaço, onde a identidade no trabalho e a prática no trabalho se encontram, que estão os principais elementos para a aprendizagem no trabalho. Percebe-se, no processo, que a identidade dos funcionários influencia e desenvolve as comunidades de trabalho e estas também contribuem para a formação da identidade individual.

Ainda segundo o autor, as influências presentes no espaço de trabalho são marcadas pela prática do trabalho que os funcionários experienciam e filtradas pela identidade individual, influenciando a sua percepção e a relação do que acontece no ambiente de trabalho.

No modelo apresentado, observa-se que no lado esquerdo o ambiente de trabalho é um espaço para aquisição de entendimentos técnico-práticos e habilidades relacionadas ou não ao trabalho enquanto, no lado direito, é um espaço para a aprendizagem pessoal, social e cultural, não necessariamente ligadas ao trabalho. O autor reforça assim que, ao redor da área de sobreposição, podem ocorrer aprendizagens periféricas na vida profissional, mais gerais e menos relacionadas à natureza do trabalho.

Nesse modelo, a aprendizagem no trabalho é situada, pois o seu aprendizado acontece naquele ambiente, representado no modelo pela impossibilidade de realizar conexões verticais nem à direita e nem à esquerda.

Em revisão ao seu modelo, realizada em 2007, Illeris apresenta as Três Dimensões da Aprendizagem, representadas na figura 10:

Figura 10 – Dimensões da Aprendizagem Fonte: Illeris (2007, p.28)

Illeris (2007) acrescentou a aquisição do conhecimento na dimensão conteúdo, o que chamou de cognitivismo ou orientação do conhecimento.

A dimensão do incentivo contém elementos que mobilizam a energia mental para a aprendizagem. Assim, um novo entendimento ou a melhora de uma habilidade altera o padrão emocional, motivacional e a vontade do indivíduo.

A dimensão social ou societal relaciona-se ao processo de interação entre indivíduo e seu ambiente, formado por dois níveis: no primeiro, a interação social é situada e, no segundo, em um nível societal geral, responsável por estabelecer as premissas para a interação. Os elementos centrais para a troca e a relação com o ambiente são ação, comunicação e cooperação, promovendo a integração do indivíduo nos contextos sociais (ILLERIS, 2007).

A dimensão conteúdo e do incentivo são ativadas simultaneamente de forma integrada pelos impulsos do processo de interação entre o indivíduo e seu ambiente.

Abaixo, o detalhamento realizado por Illeris (2007) das três dimensões do modelo: SIGNIFICADOS DE COMPETÊNCIAS FUNCIONALIDADES EQUILÍBRIO MENTAL E FÍSICO SENSIBILIDADE INTEGRAÇÃO SOCIABILIDADE CONTEÚDO INCENTIVO Conhecimentos Entendimentos Habilidades Motivação Emoção Vontade Ação Comunicação Cooperação Interação

ambiente de aprendizagem técnico-organizacional – relacionada às qualificações requeridas pelo ambiente de trabalho, como o sistema técnico-organizacional que inclui os conteúdos e as divisões de trabalho, as oportunidades de autonomia e uso de qualificações, as possibilidades de interação social e a extensão da pressão sobre os trabalhadores;

ambiente de aprendizagem sócio-cultural – preocupa-se com os grupos sociais e processos no local de trabalho, como normas e valores, e contempla comunidades de trabalho, comunidades culturais e políticas;

processo de aprendizagem dos empregados – refere-se à consciência, socialização prévia e situação dos empregados e às perspectivas futuras. Envolve as experiências profissionais, educacionais e o conhecimento social.

O autor mostra que a aprendizagem abrange essas três dimensões, as quais devem sempre ser consideradas para o entendimento ou análise de uma situação de aprendizagem adequada.

Illeris (2007) considera que a interação entre o ambiente de trabalho e o funcionário o faz aprender, proporcionando desenvolvimento e, consequentemente, um melhor desempenho.

Para o autor, as organizações deveriam desenvolver de maneira estruturada um ambiente voltado à aprendizagem, diminuindo assim o risco do aprendizado incidental por meio de ações como o desenvolvimento de grupos autodirigidos, atividades de treinamento ligadas ao trabalho e até mesmo troca de experiências com redes internas e externas.

Portanto, Illeris (2002, 2004, 2007) mostra que na noção de aprendizagem encontram- se as dimensões apresentadas e que, embora sejam muito diferentes analiticamente, estarão sempre unidas na experiência.