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3 TRILHAS METODOLÓGICAS

3.2 EM BUSCA DOS DADOS: O CONTATO COM O AMBIENTE ESCOLAR

3.2.2 Aproximação com as Educadoras

Após a aceitação das professoras para participarem da pesquisa, foram considerados alguns procedimentos a respeito do processo de investigação junto a elas, com o esclarecimento dos objetivos da pesquisa e instrumentos de coleta de dados;

a) Apresentação do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (ANEXO B) a ser assinado pelas professoras e pela pesquisadora, a fim de estarem cientes da pesquisa.

b) Acordo de mútua colaboração, ou seja, forneceriam materiais, informações e elementos a respeito do trabalho e, ao mesmo tempo, teriam retorno dos mesmos a partir dos resultados da investigação.

Quanto ao processo de coleta de dados junto às professoras, dividiu-se nas seguintes etapas:

a) Entrevista semiestruturada (ANEXO C), envolvendo aspectos pertinentes ao processo de ensino-aprendizagem de Geografia nos anos iniciais. As entrevistas foram conduzidas de maneira flexível fazendo com que ocorressem em um clima de aceitação entre os sujeitos da pesquisa. Nesse sentido, as informações e concepções das educadoras fluíram de maneira autêntica e espontânea. Além disso, retrataram o modo como são estruturadas e vivenciadas suas práticas pedagógicas, em especial, em relação ao ensino de Geografia. A conversa com cada professora foi registrada em fitas magnéticas. Para preservar a identidade das entrevistadas, foram classificadas por meio de códigos (P1 e P2). Ao fim de cada entrevista, foram transcritos os diálogos e anotações realizadas.

b) Observações diretas nas salas de aula (ANEXO D) das professoras. Foi realizada uma observação em cada sala de aula no período de um dia letivo a fim de privilegiarmos o trabalho das educadoras no cotidiano. Esse procedimento de coleta de dados desempenhou um papel importante no contexto da pesquisa, pois conduziu o investigador a entrar em contato direto com a prática educativa e a

relação com as professoras/educandos no processo de ensino-aprendizagem. A pesquisadora teve como objetivo captar os acontecimentos referentes à prática das professoras para servirem de subsídios às discussões realizadas posteriormente sobre a mediação delas com o grupo de alunos em relação aos temas que foram desenvolvidos referentes à disciplina de Geografia.

3.2.2.1 Quem são as mediadoras e suas concepções educacionais.

Considerar os diferentes papéis e a importância que o professor assume diante do contexto educacional é reconhecer também o espaço que ele ocupa e as formas com as quais ele observa, avalia e manifesta suas concepções, anseios e perspectivas. O professor como um agente mediador possibilita aos seus educandos oportunidades de aprendizagem, promove a interação entre alunos e o mundo das linguagens ainda desconhecidas. É também aquele que, por intermédio de sua coragem, poderá impulsionar mudanças e avanços aos que, por meio de suas manifestações, tiveram oportunidades geradas por suas ações. Muitas vezes, nos percursos diários de sala de aula, os professores revelam a força de suas ações, opiniões e crenças carregadas de ideários que orientam suas manifestações.

Nesse sentido, acreditamos que a fala das professoras permite desvelar os incursos gerados por uma parte desses agentes que se fazem presentes, diariamente, nas salas de aula de diversas partes do país. Apresentar suas concepções, anseios e preocupações é levantar igualmente indagações e provocar impulsos que levem a reflexões.

As duas professoras envolvidas na pesquisa P1 (turno manhã) e P2 (turno tarde) possuem, respectivamente, 29 e 24 anos de idade e ambas atuam há, aproximadamente, cinco anos na docência com crianças de anos iniciais. A formação básica das professoras é o Curso Normal, antigo magistério, e graduação em Pedagogia. Além disso, P1 estava cursando pós-graduação em Educação Especial com Ênfase na Inclusão Escolar: Deficiência Mental e P2 cursava Letras e pós-graduação em Gestão Escolar.

As professoras trabalham em jornada integral de 40 horas semanais: em um turno, desenvolvem atividades na instituição objeto de nossa pesquisa com o 3º ano do Ensino Fundamental e, em outro turno, P1 trabalha com crianças da APAE

(Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais de Caxias do Sul) e P2 trabalha na cidade de Flores da Cunha em séries finais do Ensino Fundamental com a disciplina de Português.

A análise dos objetivos a respeito do ensino-aprendizagem por elas exercido a função de educadoras na instituição, voltam-se, principalmente, às capacidades de leitura, escrita e o desenvolvimento do raciocínio lógico amparado na disciplina de Matemática. É clara a hierarquia dos componentes curriculares de Português e Matemática no discurso das professoras quando enfatizam que os processos de ler e contar são destacados com evidência:

Bom, no 3º ano que eu estou trabalhando eu penso assim principalmente a leitura e a escrita porque eles vêm do 2º ano com bastante dificuldade. Eles estão conseguindo ler, mas não interpretar. Então, principalmente, eu acho a leitura e a escrita e toda a parte, a questão da matemática, cálculos, o raciocínio lógico [...] (P1).

[...] A gente prima pela leitura, escrita, e o início do processo dos cálculos; como resolver os cálculos, como é que eu vou montar uma conta e saber se é uma conta de mais, de vezes ou de dividir. Então, assim, o nosso foco principal seria a continuação da alfabetização ainda, só que a gente sabe que tem um monte de conteúdos também que a gente precisa trabalhar. Então, o que acontece: de início, assim, a gente dá bastante ênfase para a leitura e para a escrita, muita, porque a gente acredita até que, se eles não conseguirem ler e interpretar aquilo que está escrito, eles não vão desenvolver nada em nenhuma das outras áreas do conhecimento. Então, assim a gente foca mais para a continuação da alfabetização [...] e a gente vai planejando as coisas assim sempre usando muito o concreto porque eles ainda estão em uma idade, em uma fase que eles não conseguem abstrair muito, principalmente na questão da Matemática (P2).

A relação com o concreto evidenciada na fala da professora P2 se refere, basicamente, a atividades voltadas para a ludicidade com a utilização dos signos e símbolos novamente utilizados pelo Português e pela Matemática. P2, ao exemplificar as atividades desenvolvidas e relacionadas com o concreto, expressou algumas dificuldades:

Assim, no Português e na Matemática, existem muitos recursos, é mais fácil. No Português que a gente está tentando fazer, que não seria lá tão concreto assim, mas enfim o que tem dado certo esse ano é a questão dos jogos para cada conteúdo que a gente tem trabalhado com eles. Por exemplo: revisão do alfabeto, assim, palavras mais comuns utilizadas, a questão de sílabas, tudo a gente tem usado jogos. Então, eles constroem os jogos e, depois, eles brincam. Então, na hora que eles constroem o jogo eles já estão relacionando tudo aquilo que é visto [...] (P2).

Suas atividades se relacionam na produção de jogos que envolvem os números e a estrutura silábica dos campos disciplinares e não se vinculam ao cotidiano dos alunos que está imerso em sistemas de palavras e números.

A prática pedagógica balizada pela intencionalidade do professor, voltada para a aprendizagem do aluno, reside nas diversas formas que o professor desempenha e realiza o seu papel de mediador. É nesse movimento dinâmico que residem as possibilidades de crescimento. Para isso, se faz necessário acreditar nas inúmeras possibilidades de transformação: tanto dos mediados, tanto das práticas sistematizadas pelo mediador, que, habitualmente, se defrontam com o novo.

Para a professora P1, a importância do educador está ligada à afetividade para promover impulsos na aprendizagem e disposição do aluno, uma vez que a aproximação entre ela e o seu aluno é intensa devido à convivência diária em sala de aula.

Nossa, eu acho que o professor é tudo assim para o aluno, principalmente para a criança [...], mas, assim, eles te idolatram, eles acham que tu sabe tudo [...]. E eu coloco pra eles que a profe não sabe tudo, que a profe ainda estuda, mas, assim, a profe, nas séries iniciais, é fundamental e, assim, a solução eu acho da educação está na afetividade assim no afeto, na sensibilidade na vida do aluno [...]. Eu tenho um aluno que – agora relatando os pais – também que ele está com mais ânimo de levantar, com ânimo de fazer o tema e eu não estou fazendo nada de diferente, só estou dando atenção pra ele, então eu acho que tudo está ligado no afeto [...] (P1).

A educação e os sujeitos envolvidos no processo não acompanham uma padronização. Cada aluno carrega suas próprias características que, segundo a professora, devem ser estimuladas no contexto educacional por meio da afabilidade para despertar o potencial motivacional e cognitivo.

Para P2, a função do mediador – ilustrada no recorte abaixo – como aquele que deve promover o desenvolvimento do aluno:

Eu vejo o professor com o cargo de ser um mediador: utilizar aquilo que o aluno já sabe e ir estimulando ele a ir buscar mais conhecimentos. Ao mesmo tempo, assim, eu acho que o professor não pode ser aquele ditador assim: agora a gente vai fazer isso, aquilo e dar uma coisa sem sentido, sem significado para os alunos. Eu acho que eu tenho que dar um significado porque trabalhar isso e fazer com que aquela aprendizagem seja prazerosa. Assim, eu tenho que facilitar a aprendizagem para eles, eu tenho que buscar caminhos diferentes, adequados para essa faixa etária deles, mas que façam com que eles sintam prazer por aprender, que eles sintam gosto por fazer, para vir para a escola e por aprender mais, porque, se eu

não motivar eles, se eu não mostrar assim que existem any caminhos para se chegar a um mesmo objetivo, aí a coisa fica meio sem sentido. Então, assim, eu não posso ser aquela profe só que vai falar, falar, falar e não vai dar espaço para eles (P2).

Ficou evidente no relato e nas conversas que mantivemos que a educadora possuía a preocupação constante em desenvolver uma aprendizagem baseada em um processo significativo para os alunos e, além de tudo, que fosse algo vivenciado com prazer sem imposições estanques. Nisso reside a colocação de ambas em buscarem alternativas diferenciadas para trabalharem com os educandos na tentativa de significar para a vida dos alunos o que aprendem em sala de aula.

Diante de tais expectativas, o professor sempre busca munir-se de instrumentos que facilitem e auxiliem o seu fazer pedagógico. Esses elementos surgem a partir da prática cotidiana, como também dessa mesma prática (re)pensada sob a luz de estudos e reflexões. A busca por novos caminhos metodológicos é presente no percurso das educadoras.

Tudo é embasado em algum tema. A gente não trabalha nada solto. Tudo é pelo lúdico ou por uma história, por exemplo, [...] eu tinha que trabalhar substantivo próprio comum, aí a gente não vai lá e coloca no quadro o conceito no quadro: substantivo próprio comum é nanananana. A gente trabalhou com uma história, daí então a velhinha que dava nome às coisas. Era uma velhinha que morava sozinha e ela dava nome pra cama, pro carro e eram nomes próprios que ela dava. Então, a gente conta a história, explora, brinca, se dá pra fazer um jogo tudo pra depois trabalhar o conceito, então, tudo embasado, assim, em uma brincadeira, em um jogo, em uma história (P1).

[...] do concreto e do lúdico sempre partindo disso, mas a gente faz assim por temas geradores. Então, por exemplo, agora vamos supor: a gente escolheu uma história da velhinha que gostava de dar nome às coisas e, encima dessa história, a gente vai desenvolver vários conteúdos então, por exemplo, os substantivos, os adjetivos, a questão das histórias matemáticas que até então eles só sabem fazer adição e subtração sem reserva, sem retorno. A questão da ortografia, produção de texto, então, assim, por temas geradores e de preferência sempre que seja uma coisa legal, diferente, prazerosa, ou uma historinha ou um vídeo, ou um jogo ou alguma coisa bem lúdica que faça com que eles se insiram naquele conteúdo, com que eles se sintam estimulados a participar da aula, mas assim, de modo geral, a nossa metodologia, o nosso jeito de trabalhar com eles é assim, por temas geradores, então, dentro desse tema, a gente vai escolher uma coisa para trabalhar um vídeo, um jogo, uma história, alguma coisa assim ou um passeio, alguma coisa e aí desenvolve o conteúdo, assim, sempre de uma forma assim mais lúdica, mais brincando mesmo (P2).

Compreende-se que, por meio das falas das educadoras, podemos apreender o modo como pensam, agem e percebem o seu fazer pedagógico. Tais

condições se ligam à necessidade de fatores internos, de sua formação e ideais bem como de estruturas externas, sejam elas, os currículos determinados pelo sistema educacional e pelas demandas que a sociedade atribui à formação escolar.

3.2.3 As Professoras e suas Práticas de Ensino

Os espaços das salas de aula ocupados e vivenciados diariamente por educadores e educandos envolvem diversos momentos que são merecedores de atenção. Muito tem se discutido sobre a composição das classes escolares, dos processos de aprendizagem e do papel do professor enquanto mediador do conhecimento e pouco tem se dado atenção aos momentos em que é efetivada a construção de saberes: o espaço da sala de aula como sendo aquele onde são engendradas as rotas diárias dos processos educacionais e lugar onde em grande parte deveriam ser efetivadas as reflexões teóricas desenvolvidas pela ciência. Nosso objetivo não foi o de descrever as atividades desenvolvidas no período em que as observamos, mas descrever a organização da classe e a relação das educadoras com seus educandos. Também buscou-se verificar a maneira como se relacionam com seus alunos como forma de nos aproximar dos ambientes vividos na prática diária das professoras, compreender como procede o desenvolvimento de atividades com o objetivo de que nossas discussões posteriores fossem ligadas proximamente ao contexto em que se inseriam enquanto educadoras.

As professoras da pesquisa sempre trabalharam com crianças de anos iniciais sendo que este era o primeiro ano em que P1 regia uma classe com crianças de 3º ano. Já P2 sempre trabalhou com esse nível. Dessa forma, a experiência e o coleguismo de P2 sempre estiveram presentes junto à sua colega em todos os momentos de nossos encontros.

No turno da manhã, P1 contava com uma turma de 17 alunos e P2, no turno da tarde, com 27 alunos. As turmas eram heterogêneas e as salas de aula eram ocupadas pelas classes dos alunos e pelas caixas de seus materiais, como folhas e objetos que se concentravam em armários no fundo das mesmas. O espaço interno era claro e arejado e as paredes eram ocupadas com trabalhos coloridos voltados para a produção silábica e textual dos alunos.