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Relação entre o local e o global: a interligação com o mundo

3 TRILHAS METODOLÓGICAS

4.2 A RELAÇÃO ENTRE O MEIO E OS CONCEITOS GEOGRÁFICOS

4.2.4 Relação entre o local e o global: a interligação com o mundo

Viver em um determinado lugar e transitar por outros, manter relações sociais, econômicas e de afetividade com diversos outros lugares, seja na cidade onde se mora ou outras, fazem parte do nosso dia-a-dia consciente ou não. Se temos parentes que moram em outras cidades ou viajamos em férias para outros

lugares como a praia, temos uma ligação consciente entre os lugares e as pessoas. Mas, ao comprarmos produtos para a nossa alimentação e vestuário, mantemos relação inconscientes com outros lugares e pessoas. Foi proposta aos alunos uma reflexão sobre a ligação entre diversos lugares, sobre a relação de partes com um todo, enfim, a interação entre o local e o global.

Para a efetivação do trabalho, foi proposto aos alunos que observassem e descrevessem o que precisavam para sobreviver e o que utilizavam no cotidiano em suas casas. Os alunos foram motivados a reunir alguns rótulos e embalagens de alimentos mais utilizados nas residências de cada um, além de um produto que gostavam.

Ilustração 26 – Lista das coisas que a aluna Gabriela precisa em sua casa para sobreviver.

A atividade desejava levar os educandos a perceberem que no seu dia-a-dia necessitam de inúmeros produtos e bens. Além disso, que a existência de cada um

depende de bens provenientes de vários lugares. É importante levar os alunos a essa discussão, pois, como afirma Cavalcanti (2002, p. 64):

Nos moldes como a sociedade tem encaminhado o seu crescimento, não há como fugir do consumo, da prática do consumo, consumo esse ligado ao circuito produtivo e econômico, consumo que custa dinheiro, seja na produção das necessidades básicas materiais da vida cotidiana, das necessidades básicas não-materiais ou das necessidades não básicas sofisticadas, materiais ou não.

Os alunos trouxeram as embalagens para a sala de aula e através delas elaboraram suas listas. Posteriormente, as educadoras problematizaram a seleção dos produtos e a origem de sua fabricação. Para a identificação, utilizaram um mapa do Brasil e localizaram com eles os estados de onde provinham os produtos. Entre os produtos preferidos pelos alunos, estavam os salgadinhos, que foram identificados pelas professoras. Ao ser identificado, outras questões foram feitas aos alunos:

a) De onde vem o salgadinho? b) Onde ele é feito?

c) Como ele chega até aqui?

d) O que será que usam na fábrica para fazer o salgadinho? e) E de onde será que vem esse produto?

f) Como será que o produto é levado até as fábricas de salgadinho?

A partir dos questionamentos, os alunos puderam refletir buscando a ligação entre o espaço rural – lugar de produção da matéria-prima do produto –, o espaço urbano local de produção da mercadoria e os locais de circulação, de produção e de venda com a mediação das educadoras. Para tanto, foi elaborado um pequeno teatro, elaborado em pequenos grupos, por meio do qual, os alunos representaram as etapas que vão desde a produção até o consumo do salgadinho. Eles assim puderam vivenciar e interiorizar os diferentes processos de produção e funções estabelecidas pela sociedade em relação à distribuição das mercadorias nos vários setores econômicos. Segundo Cubero e Luque (2004, p. 99):

[...] as atividades no plano intrapsicológico são sociais porque se realizam com outras pessoas dentro de uma cultura e com ferramentas que a própria

cultura proporciona, mas são também sociais, porque são compartilhadas ou concebidas como funções distribuídas no grupo.

Ilustração 27 – Imagem de aluno representando o trajeto que o salgadinho faz até chegar ao supermercado.

Foto: P1, agosto de 2009.

A dramatização permite, por meio da expressão corporal, que os educandos experimentem, via representação, outros contextos e modos de viver. Também têm a chance de interagir no espaço cênico de maneira diferente do que fazem nos outros locais. Além disso, leva-os a se confrontarem com outros modos de vida e a identificá-los em suas próprias vivências. Dessa forma, a produção da matéria-prima do salgadinho foi retratada e simbolizada nas etapas que envolvem a fabricação do alimentam que faz parte do consumo e da vida dos alunos, estabelecendo ainda a relação com os demais produtos e espaços presentes em sua vida diária.

Para Callai (2003c, p. 58), “a geografia que o aluno estuda deve permitir que ele se perceba como participante do espaço que estuda, onde os fenômenos que ali ocorrem são resultados da vida e do trabalho dos homens e estão inseridos num processo de desenvolvimento”. Ou seja, o seu consumo, de suas famílias, no seu local de vivência, bem como de toda sociedade, desencadeia uma interdependência

entre diferentes lugares, pessoas e mecanismos econômicos e culturais. “A geografia é uma ciência que estuda o espaço, na sua manifestação global e nas singulares. Sendo assim, os conteúdos geográficos precisam ser “apresentados” para serem trabalhados pelos alunos nessa dupla inserção: a global e a local.” (CAVALCANTI, 2005, p. 203).

Todas as experiências do dia-a-dia de sala de aula e as oportunidades que a escola oferece, e que pode despertar a participação e o envolvimento das crianças, fazem parte do que Vygotsky (2000) chama de processo de internalização. Nesse processo, os movimentos, por meio da mediação de sujeitos mais experientes e dos símbolos da cultura transformam processos interpessoais em intrapessoais.

Todas as atividades do trabalho foram realizadas e sistematizadas pelos alunos. O resultado foi um esquema que representou as múltiplas relações existentes entre o espaço de vivência de cada um com outros lugares, por meio do consumo de um produto.

Ilustração 28 – Esquema representando a relação entre o espaço rural e urbano e entre diferentes lugares envolvendo um produto consumido pelos alunos.

A atividade suscitou ainda a reflexão sobre a presença de indústrias em Caxias do Sul e a relação dos educandos com elas, já que, em sua maior parte, são filhos de metalúrgicos que trabalham nas indústrias metal-mecânicas da cidade. Por isso, foram postas as seguintes questões:

a) Será que existe alguma fábrica de salgadinho aqui em Caxias do Sul? b) Que outras fábricas você conhece ou já ouviu falar?

Buscou-se direcionar o olhar das crianças para que percebessem que a paisagem urbana de Caxias do Sul é fundamentalmente caracterizada pelas indústrias. Elas puderam perceber que esses estabelecimentos produtivos, no caso as empresas de salgadinhos, resultam da interação entre o homem e a natureza e pela relação entre o espaço rural e o urbano. A ordem produtiva estabelecida pelas indústrias de Caxias do Sul próximas à escola foram reconhecidas e representadas pelos alunos no mapa da cidade.

A interação entre educandos e educadoras foi balizada pelo desenvolvimento de atividades que marcam a vida em sala de aula e conduzem a diversos contextos de aprendizagens, seja pelo uso de materiais ou pelos diálogos e reflexões. Os objetivos propostos nas atividades levaram os alunos a reconhecerem a intenção das educadoras. Ao mesmo tempo, as atividades possibilitaram a identificação em seu contexto e no dos demais lugares que fazem parte das relações sócioespaciais.