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Um exemplo de como as conexões da Estudar têm várias frentes e longo alcance é a história do próprio Daniel Vargas, um mineiro que chegou a assumir o cargo de secretário de Assuntos Estratégicos no Governo Lula, um posto com status de ministro. Quando terminou seu doutorado em Harvard, em 2013, com uma bolsa da Fundação Estudar e outra da universidade, Vargas foi convidado por Lemann para coordenar um grupo de líderes que debatiam periodicamente na universidade americana propostas de melhoria da educação brasileira.

“Durante quase um ano eu ajudei a organizar o trabalho desse grupo de grandes empresários, líderes congressistas de diversos partidos, representantes da sociedade civil”, diz Vargas. Esse trabalho, em que uma das frentes era identificar as prioridades para a educação brasileira, ligou-se a uma iniciativa de Tábata, que se tornara sua mentorada na Estudar. Sob sua orientação, ela e alguns colegas lançaram o Mapa do Buraco, um minucioso levantamento dos problemas da educação e de algumas soluções promissoras apontados por quem está mais próximo do assunto: os estudantes. O documento final foi entregue aos então presidenciáveis Dilma Rousseff e Aécio Neves – que enviaram seus representantes na área de educação para um debate na FGV.

Mais ou menos na mesma época, o professor de Harvard Roberto Mangabeira Unger voltava ao governo, dessa vez durante o Governo Dilma. Em sua passagem anterior, no segundo mandato de Lula, como secretário de assuntos estratégicos, Mangabeira convidara Vargas para trabalhar com ele. Em alguns meses, Vargas virou chefe de gabinete de Mangabeira, depois secretário de desenvolvimento sustentável, em seguida secretário executivo. Em 2009, quando terminou o período de licença de Mangabeira e ele teve que voltar à universidade, Vargas se tornou ministro interino da Secretaria de Assuntos Estratégicos durante alguns meses.

Naquela primeira passagem pelo governo, Vargas tinha acabado de completar 30 anos e estava numa posição de peso considerável. Mas ponderou que não tinha sustentação política para alçar outros voos e decidiu voltar para o doutorado em Harvard.

Já em 2013 a missão que Mangabeira lhe confiou era diferente. Ele se tornou o responsável por coordenar as políticas de qualificação do ensino básico dentro do projeto Pátria Educadora, que Dilma havia lançado. Vargas foi o elo entre as propostas levantadas pelo grupo de Harvard (de mais de

100 líderes de diversos setores brasileiros), as pesquisas de soluções como as do Mapa do Buraco e o trabalho de especialistas na secretaria. Com o avanço da crise, porém, a Secretaria de Assuntos Estratégicos foi extinta e o projeto, engavetado. “Acho que a qualidade intelectual dos projetos formulados pela SAE em educação é exemplar”, diz Vargas. “Minha expectativa é que, quando a poeira baixar, esses projetos sejam resgatados, talvez com uma nova cara, mas com a mesma essência. Eu espero que eles se tornem realidade.”

SELECIONAR, CATIVAR, CUIDAR

Cercar-se de gente boa parece um conselho óbvio. Dificilmente alguém diria o contrário: “Cerque-se de gente incompetente.” Mas o difícil não é entender o conceito. É praticá-lo, consistentemente. Na Estudar, isso é quase uma religião.

Um exemplo disso são o tempo e a energia dedicados à seleção dos bolsistas a cada ano. Em uma das etapas finais do programa para escolha dos cerca de 30 candidatos que serão aceitos na rede da Estudar, reúnem-se não só os três fundadores, mas o comitê executivo, o conselho e vários bolsistas envolvidos com a Fundação Estudar. São cerca de 40 profissionais de alto escalão do mercado financeiro, empresas, ONGs e serviço público, que fazem uma pausa em suas atividades para observar a conclusão do processo. Ninguém encara isso como boa ação para jovens necessitados (pelo menos não como fator principal). Trata-se de investimento. E de inspiração.

Essa preocupação com as pessoas é um traço fundamental da Estudar. “No meio do nada, assim, às vezes o Beto me ligava”, lembra Bernardo Hees. “Uma vez eu estava num terminal de trem em Mato Grosso e o Beto me telefonou. ‘Bernardo, estou ligando para saber como você está, como é que estão as coisas. Quando estiver em São Paulo, me procure’, disse ele. E todo final de ano me mandava um livro, alguma coisa com um recado para mim.”

João Castro Neves também coleciona experiências desse tipo: “Para um moleque de 28, 30 anos, acabando de sair do MBA, o presidente da empresa vir entrevistar você… E não só entrevistar. O Marcel (Telles) ainda contou uma história para me encantar. Ele falou: ‘João, nós vamos fazer aqui na Brahma uma mistura de McKinsey com Goldman Sachs, que é para a gente crescer pelo mundo.’ Eu respondi que, se fosse metade do que ele estava planejando, já estava ótimo.”

Quando o advogado Marcelo Barbosa recebeu sua bolsa para o mestrado em direito da Universidade Columbia, em 1996, o sócio responsável pela gestão do Garantia, Claudio Haddad, falou: “Puxa, eu vou bastante a Nova York, vamos nos encontrar um dia.” Barbosa respondeu que seria um prazer, mas achou que nunca mais o veria. “Imagina, tanta coisa que ele tem para fazer, não vai perder tempo acompanhando um estudante em Nova York”, lembra-se de ter pensado. “Acho que poucas vezes na vida eu quebrei a cara de uma maneira tão completa.” Haddad foi almoçar ou jantar com ele três ou quatro vezes, apresentou-o ao diretor jurídico do banco, serviu como seu mentor e ofereceu-lhe um emprego. “Eu era um

estudante duro, aquelas foram as únicas refeições realmente boas que fiz na época. Mas a proposta veio logo no começo do almoço, fiquei nervoso, nem aproveitei a comida”, diz.

Barbosa não aceitou o emprego – sem nenhum prejuízo para a relação dos dois. Voltou ao Brasil, para trabalhar na Vieira Rezende Advogados, firma que tinha aberto com alguns amigos antes de ir para os Estados Unidos. Anos mais tarde tornou-se presidente do conselho da Fundação Estudar.

CAPÍTULO 12

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