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As diligências iniciais de inquérito: o primeiro despacho

IV. Hiperligações e referências bibliográficas I Introdução

3. Dados estatísticos

2.4. As diligências iniciais de inquérito: o primeiro despacho

A primeira diligência a ser determinada será a realização de pesquisas nas bases de dados existentes quanto a processos pendentes relativos ao denunciado.

Tal necessidade decorre da eventual apreciação de uma situação de conexão processual, para efeitos do artigo 24.º e 25.º do Código de Processo Penal.

Na prática judiciária é usual que também o denunciado – no inquérito em que se investiga a prática de factos que integram o crime de resistência e coacção sobre funcionário – tenha apresentado queixa contra o funcionário ou membro das Forças Armadas, militarizadas ou de segurança, havendo aí todo o interesse na investigação conjunta dos factos, devendo ser determinada a conexão dos processos, ao abrigo do disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 24.º do Código de Processo Penal.

Deverá ainda ser requisitado o certificado do registo criminal do suspeito e, uma vez que a moldura penal abstracta prevista para o crime de resistência e coacção sobre funcionário é de pena de prisão de um a cinco anos, deverá também ser determinada a pesquisa nas bases de dados sobre anteriores suspensões provisórias do processo.

Atente-se que, conforme disposto no artigo 125.º do Código de Processo Penal, impõe-se a recolha de todas as provas necessárias que não forem proibidas por lei.

Com efeito, nas diligências de inquérito torna-se essencial a produção de prova testemunhal, mormente inquirir os sujeitos (funcionários ou afins) sobre quem foi infligida a violência, de modo a contextualizar e apurar em concreto a conduta do agente, devendo a testemunha descrever os concretos actos de violência. Ademais, deverá ainda proceder-se à inquirição das demais testemunhas que tiveram contacto directo com os factos, isto é, das testemunhas presenciais.

No caso de as diligências de inquirição das testemunhas não serem presididas pelo Magistrado do Ministério Público, é relevante descrever, no despacho que as determina, as concretas questões a colocar, por forma a evitar que se tenham de realizar inquirições complementares e assim, permitir uma maior eficácia da investigação.

A prova testemunhal a produzir traduz-se, neste contexto, na prova primordial para aquilatar a existência do crime aqui em investigação, considerando que, apenas deste modo, se vislumbra possível apurar o circunstancialismo dos factos denunciados.

Dependendo das circunstâncias do caso concreto, poderá ainda ser necessário determinar a junção de prova documental, tais como relatórios clínicos no caso do visado ter recebido tratamento médico, bem como a extracção de fotogramas da captação por sistema de videovigilância, caso os factos ocorram em local possuidor desse mesmo sistema, devendo neste caso agilizar-se desde logo pela conservação das imagens, considerando o prazo de conservação das mesmas, que habitualmente é de 30 dias contados desde a sua captação.

CRIME DE RESISTÊNCIA E COACÇÃO SOBRE FUNCIONÁRIO

5. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

Poderá ainda revelar-se pertinente a produção de prova por acareação, nos termos do artigo 146.º do Código de Processo Penal, sendo que a determinação da mesma deverá basear-se sempre num juízo de oportunidade quanto à utilidade dessa diligência probatória.

Pese embora em teoria se admitam todos os meios de obtenção da prova que se encontram previstos na lei processual penal, isto é, exames, revistas, buscas, apreensões e, inclusivamente escutas telefónicas, considerando a moldura penal abstractamente aplicável (artigo 187.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal), parece-nos que, para além das revistas e apreensões, tais diligências não se afiguram, por princípio, úteis para a descoberta dos factos em investigação.

Na eventualidade de o agente ainda não ter sido constituído arguido48, deverá ainda

determinar-se a constituição de arguido e, por conseguinte, o interrogatório de arguido, nos termos gerais dispostos nos artigos 58.º, n.º 1, alíneas a) e d), 144.º e 272.º, n.º 1, todos do Código de Processo Penal.

Neste momento, encontrando-se preenchidos os pressupostos para a suspensão provisória do processo, deverá ser explicado ao arguido a possibilidade de aplicação desse instituto, devendo ser esclarecido quanto à natureza do mesmo e ser confrontado com o período proposto bem como quanto às injunções especificamente propostas, de modo a obter a sua concordância.

2.4.1. Exemplo de primeiro despacho49

Nos presentes autos, investigam-se factos susceptíveis de integrar, abstractamente, a prática do crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.º, n.º 1, do Código Penal.

i. Pesquise nas bases de dados pela existência de processos pendentes relativos ao denunciado _, melhor identificado a fls. _.

No caso de existência de processos pendentes em fase de inquérito, apresente-me os mesmos para consulta.

ii. Requisite certificado do registo criminal do denunciado e efectue pesquisas nas bases de dados sobre anteriores suspensões provisórias do processo.

iii. Proceda à inquirição dos militares da Guarda Nacional Republicana _ e _, devendo esclarecer o teor do auto de notícia, nomeadamente:

– Deverão ser formuladas questões reportadas ao caso concreto, designadamente quanto à actuação perpetrada pelo agente, de modo a ser prestado um relato o mais detalhado possível quanto aos actos de violência dirigidos aos sujeitos, concretizando-se também qual o acto praticado pelo visado no momento em que o agente se opôs à prática de acto relativo ao exercício das suas funções ou o constrangeu à prática de acto relativo ao exercício das suas funções mas contrário aos seus deveres.

48 Nomeadamente no caso de não se ter efectivado a detenção em flagrante delito e constituição de arguido ao

abrigo do artigo 58.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal.

49 Na perspectiva de que o Ministério Público, no caso em apreço, não delega a investigação no órgão de polícia

criminal.

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CRIME DE RESISTÊNCIA E COACÇÃO SOBRE FUNCIONÁRIO

5. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

iv. Proceda à inquirição das testemunhas _ e _, devendo as mesmas esclarecer os factos constantes do auto de notícia a fls. _, nomeadamente:

– Na medida em que se deve dar preferência à inquirição de testemunhas presenciais dos factos, também aqui deverão concretizar-se as questões de modo a detalhar a actuação do agente.

v. Em data posterior, proceda à constituição de arguido, o qual deverá prestar termo de identidade e residência, e realização de interrogatório nessa qualidade, de _, melhor identificado a fls. _, nos termos do disposto nos artigos 58.º, n.º 1, 61.º, 196.º e 144.º, do Código de Processo Penal50.

Deverá o mesmo esclarecer, querendo, os factos constantes do auto de notícia e que lhe são imputados, designadamente:

–Deverão ser formuladas questões que concretizem a sua conduta bem como ser questionado acerca da sua situação socioeconómica.

Na sequência das pesquisas às bases de dados da suspensão provisória do processo e da consulta ao certificado do registo criminal, cumpridos que se encontrem os pressupostos, deverá o mesmo ser confrontado com a possibilidade de aplicação do instituto da suspensão provisória do processo, devendo-lhe ser explicado que caso dê a sua concordância, o processo ficará suspenso pelo período determinado e que durante esse período deverá cumprir as injunções e regras de conduta que lhe forem propostas e que não poderá cometer crime da mesma natureza, pelo qual venha a ser condenado, sob pena do prosseguimento dos autos.

Mais deverá ser esclarecido que findo o período de suspensão, caso cumpra com o proposto, o processo será arquivado, não podendo ser reaberto, não ficando a constar do certificado de registo criminal qualquer registo relativo à prática deste ilícito.

Nesta medida, informe que a concordância do arguido deverá incidir quanto à suspensão do processo, à sua duração e às injunções e regras de conduta indicadas. Após, deverá ser questionado se concorda com a suspensão provisória do processo pelo período de _ meses, ficando sujeito à injunção de _, sem prejuízo de revisão das mesmas em face do grau de ilicitude apurado e das suas condições socioeconómicas, caso em que será sujeito a novo interrogatório para o efeito.

vi. Prazo para a realização das diligências: 60 dias.

Conclua oportunamente os autos após a realização das diligências ou, caso as mesmas não se encontrem concluídas, findo o prazo que antecede.