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Modelo de acusação com pedido de indemnização civil 3.2 Modelo de acusação em situação de concurso efectivo

VI. Instrumentos hierárquicos:

1. Crime de resistência e coacção sobre funcionário Tipo objectivo de ilícito

3.1. Modelo de acusação com pedido de indemnização civil 3.2 Modelo de acusação em situação de concurso efectivo

V. Hiperligações e referências bibliográficas

I. Introdução1

Quase todos os dias somos confrontados com notícias de crimes de resistência à autoridade, fazendo-nos pensar se isso é resultado do défice de autoridade dos tempos que correm, ou, então, do exercício de cidadania activa. Viver em sociedade implica a existência de regras; regras essas cujo cumprimento compete a funcionários que estão adstritos a esse trabalho. Neste contexto, impõe-se uma reflexão dogmático-prática sobre a criminalidade contra a Autoridade Estadual, em particular, o crime de resistência e coacção sobre funcionário, devendo ser estudados quer os elementos objectivo e subjectivo que dão corpo a tal ilícito penal, quer problemas ao nível de questões laterais que se destacam na riqueza do dia-a-dia.

* Pelos contributos dados para o desenvolvimento da presente obra, um especial agradecimento a:

– Dr. João Paulo Amaro, à data, Procurador-Adjunto e Formador na Comarca de Braga, Núcleo de Vila Nova de Famalicão.

1 Notas prévias: o presente trabalho não está escrito em conformidade com o novo acordo ortográfico da Língua

Portuguesa, assinado em Lisboa, no dia 16 de Novembro de 1990, aprovado para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91, de 23 de Agosto, e ratificado pelo Decreto do Presidente da República com o n.º 43/91, de 23 de Agosto, por se entender que o mesmo não está em vigor com carácter de obrigatoriedade.

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CRIME DE RESISTÊNCIA E COACÇÃO SOBRE FUNCIONÁRIO

3. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

Cumpre assinalar que, de acordo com o último Relatório de Segurança Interna, durante o ano de 2017 foram praticados 1734 ilícitos desta natureza, reflectindo uma descida de 2,9% em relação aos últimos dados disponíveis. No entanto, e no domínio da criminalidade violenta e grave, representa ainda, juntamente com o crime de roubo na via pública e roubo por esticão, 74,7% de toda a criminalidade registada, com destaque nas zonas urbanas, cuja concentração de grupos violentos e de origens geográficas e sociais distintas constituem um factor de risco para comportamentos de resistência contra a autoridade do Estado, principalmente nas suas forças de segurança2.

Assim, partindo do pressuposto de que tal resistência e coacção é crime, torna-se necessário apurar em que medida é que essa mesma autoridade do Estado tem legitimidade, para discernir o que é ou não crime contra a autoridade legítima.

II. Objectivos

O objectivo do presente estudo não é o de dar respostas directas e acabadas sobre o tema em análise, mas, sobretudo, abrir um canal de discussão apresentando teorias e aprofundando conceitos.

Alarmados pela pressão mediática que proporciona uma certa banalização do que se possa entender como crime de resistência e coacção, cumpre analisar de forma mais consciente, ainda que sintética, do que estamos a tratar. Não é um crime complexo, certamente, mas a informação é escassa, pelo que se procurou, através do presente estudo, colmatar essa lacuna, abrindo a discussão e elucidando algumas dúvidas.

III. Resumo

O ponto de partida deste trabalho não poderia deixar de ser a lei. Não pretendemos tratar com detalhe o aspecto jurídico-penal deste fenómeno, no entanto, não podemos deixar de a ter como pêndulo orientador.

Para a prossecução dos objectivos propostos, decidimos dividir a exposição em 3 capítulos. Assim, num primeiro capítulo, concentramos todas as questões de cariz jurídico-dogmático, desconstruindo a letra do preceito e evidenciando as temáticas mais complexas.

Na parte final do presente estudo – dado que não olvidámos a preocupação formativa subjacente ao desafio lançado na realização do presente trabalho –, far-se-á breve análise de cariz mais prático centrada na investigação e na gestão do inquérito pelo magistrado do Ministério Público, sempre norteada pela realização do conjunto de actos e diligências de prova adequados à descoberta do crime, à determinação dos agentes e da sua

2 Segundo dados retirados do Relatório Anual de Segurança interna referente ao ano de 2017.

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3. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

responsabilidade3, concluindo-se, no terceiro capítulo, com a apresentação de dois modelos

de despacho final de acusação, seja com pedido de indemnização civil, seja com uma situação de concurso efectivo com o crime de injúria.

IV. Desenvolvimento

1. Crime de resistência e coacção sobre funcionário 1.1. Tipo objectivo de ilícito

Consta da previsão legal do artigo 347.º, do Código Penal:

«1 – Quem empregar violência, incluindo ameaça grave ou ofensa à integridade física,

contra funcionário ou membro das Forças Armadas, militarizadas ou de segurança, para se opor a que ele pratique acto relativo ao exercício das suas funções, ou para o constranger a que pratique acto relativo ao exercício das suas funções, mas contrário aos seus deveres, é punido com pena de prisão de um a cinco anos.

2 – A mesma pena é aplicada a quem desobedecer ao sinal de paragem e dirigir contra funcionário ou membro das Forças Armadas, militarizadas ou se segurança, veículo, com ou sem motor, que conduza em via pública ou equiparada, ou embarcação, que pilote em águas interiores fluviais ou marítimas, para se opor a que ele pratique acto relativo ao exercício das suas funções, mas contrário aos seus deveres, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal».

É um crime causal, pois o bem jurídico é tutelado em toda a sua extensão e contra qualquer forma de lesão ou perigo de lesão; comissivo, não sendo configurável a sua prática por omissão, na medida em que o facto punível é o de se «opor a que funcionário ou membro das

Forças armadas, militarizadas ou se segurança, pratique acto relativo ao exercício das suas funções, ou constranger a que pratique acto relativo ao exercício das suas funções, mas contrário aos seus deveres»; simples, porque se identifica só com um tipo legal; comum, já que o agente que realiza a conduta típica pode ser qualquer pessoa, e de execução vinculada uma vez que, mais nenhum meio, a não ser a violência ou a ameaça grave, leva ao preenchimento do tipo.

É, por fim, um crime de perigo. Ora, os crimes de perigo contrapõem-se aos crimes de dano, sendo o critério de distinção o tipo de actuação que o agente tem sobre o bem jurídico tutelado, seja em termos de perigo de lesão ou de efectiva lesão desse bem. Assim, quer o dano quer o perigo são formas de ofensa ao bem jurídico, apesar de nos crimes de perigo tal tutela ser antecipada.

3 Tal é a finalidade e âmbito do inquérito: “O inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a

existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação”. – cfr. artigo 262.º, n.º 1, do Código Processual Penal.

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3. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

Nesta acepção, nos crimes de dano, a consumação do crime supõe a lesão ou sacrifício de um objecto concreto; pelo contrário, nos crimes de perigo não se requer a efectiva lesão do bem jurídico, mas como o perigo se identifica com a probabilidade (séria) da ocorrência do dano penalmente relevante, o legislador previne o dano com a incriminação de certas situações de perigo4.

Entendemos, no que concerne ao crime em análise, que têm de existir actos concretos que se consubstanciem em impedir o cumprimento da ordem, mas que não tem necessariamente que ter que se verificar o integral não cumprimento da mesma. Ou seja, o resultado pretendido é o impedimento da prática do acto, mas não significa, necessariamente, que o acto deixe de ser praticado. Nessa conformidade, pode anular ou simplesmente diminuir a capacidade de actuação do funcionário.