• Nenhum resultado encontrado

7. A CULTURA MATERIAL – MÉTODOS DE INVESTIGAÇÃO

7.2. Os materiais cerâmicos

7.2.2. As fichas descritivas dos artefactos em cerâmica

Todas as fichas descritivas dos artefactos cerâmicos foram realizadas com recurso ao programa Filemaker Pro 12® (anexo 8), organizando-se em sete bases de dados dinâmicas e relacionais. As fichas descritivas seguem todas a mesma estrutura, variando em alguns campos de análise, que são ajustáveis às diferentes categorias de artefactos cerâmicos (figura A4-1 a A4-7).

119 seguem as propostas apresentadas por C. Tavares da Silva e J. Soares (1976-77), V. Gonçalves (1989), M. Calado (1995, 2001); C. Valera (1997, 1998, 2006b, 2013); R. Boaventura (2001), M. Diniz (2007), A. Sousa (2010), J. Soares (2013). Considerou-se igualmente pertinente seguir alguns dos critérios de análise tecnológica dos artefactos cerâmicos propostos por R. Vilaça (1995) e A. Osório (2013). No caso concreto dos elementos plásticos e de preensão e das perfurações seguiram-se as propostas de Séronie-Vivien (1982) e principalmente as inovações de J. Cauliez (2007; 2011, Cauliez, et al., 2012).

Os critérios de análise estabelecidos para os componentes de tear seguem, no essencial, a proposta por anteriormente apresentada (Costeira, 2010), que se baseava nos critérios de vários autores como V. Gonçalves (1989), M. Diniz (1994, 2007), A. Valera (1997, 1998, 2006b), R. Boaventura (2001), G. Branco (2007), S. Gomes (1998-1999, 2003, 2013) e da equipa do Centro Nacional de Investigação de Têxteis da Dinamarca (Mårtensson, et al., 2009), o que permitiu aprofundar algumas das características métricas.

A análise dos cossoiros seguiu as propostas apresentadas por F. Médard (2003), Z. Castro Curel (1980) e T. Pereira (2013). As duas últimas autoras estudam conjuntos de cossoiros mais recentes (Idade do Ferro), no entanto considera-se que as suas análises morfo-tecnológicas constituíam um bom ponto de partida para a abordagem de conjuntos mais antigos.

Para o estudo das colheres seguiram-se as propostas de H. Camps-Fabrer (1987) e C. Valera (1998). Na análise das queijeiras utilizaram-se os critérios apresentados por V. Gonçalves (1989) e A. Sousa (2010).

As fichas de materiais organizam-se em nove secções principais: i) Identificação da peça;

ii) Caracterização morfológica geral da peça e dos seus elementos constituintes; iii) Caracterização métrica geral da peça e dos seus elementos constituintes;

iv) Caracterização morfológica e métrica dos elementos plásticos de preensão/suspensão e das perfurações;

v) Análise tecnológica; vi) Análise das decorações; vii) Vestígios de utilização; viii) Observações;

ix) Documentação gráfica e fotográfica.

Identificação da peça

Todas as peças cerâmicas são identificadas pelo número da unidade estratigráfica (u.e.) de proveniência, pelo número de inventário e pela letra do sector de escavação.

Catarina Costeira

120

caso dos recipientes podem identificar-se peças completas, formas reconstituíveis, apenas o bordo, o bojo, a base, a carena, o elemento plástico, ou associações tais como o bordo e o elemento plástico, o bojo e o elemento plástico, a base e o elemento plástico, carena e o elemento plástico, o bordo e a carena, a base e a carena.

Para os componentes de tear e os cossoiros optou-se por codificar quatro tipos de estado:

1-inteiro; 2-integralmente reconstituível, 3-fragmento com perfuração; 4-fragmento mesial sem perfuração (figuras A4-31 e A4-34).

No que se refere às colheres e coadores podem-se identificar peças completas, ligeiramente fragmentadas, formas reconstituíveis, apenas a pá ou o cabo, ou os dois associados (pá + cabo). No conjunto das queijeiras identificam-se apenas fragmentos de bordo e bojo.

Caracterização morfológica geral da peça e dos seus elementos constituintes

Realizou-se a caracterização morfológica geral dos recipientes, com a análise dos “quatro pontos característicos dos seus perfis” (Vilaça, 1995, p. 51) e a descrição dos seus elementos constituintes: bordo e lábio, carena, bojo e base.

A observação dos “pontos característicos” dos recipientes permite realizar a primeira divisão formal, que consiste na definição de formas simples, redutíveis a um sólido geométrico (esfera, cone, cilindro) e de formas compósitas ou complexas, que apresentam pontos de ruptura e/ou inflexão no seu perfil (carenas), resultando da associação de duas formas geométricas (Vilaça, 1995, p. 51; Calado, 2001, p. 44).

A conjugação da orientação do bordo e da determinação do diâmetro de abertura permitiu organizar as formas simples e compósitas em duas classes: as formas abertas, se o diâmetro do bordo for igual ao diâmetro máximo, e as formas fechadas, se o diâmetro máximo for superior ao diâmetro do bordo.

No que se refere aos elementos constituintes dos recipientes analisou-se a espessura e orientação do bordo (parte superior do recipiente), a forma do lábio (terminação do bordo) e da base (parte inferior exterior), a espessura e a posição da carena (ponto de inflexão e/ou ruptura). Os bordos podem ser simples (não espessados), adelgaçados, espessados internamente, espessados externamente, espessados internamente/externamente e almendrados (figura A4-11 e A4-12). Os bordos almendrados foram organizados em três classes (figura A4-13), resultantes da associação entre as medidas do bordo e do lábio: estreito (largura do lábio é igual ou inferior à espessura do bordo), médio (quando a largura do lábio é superior à espessura do bordo, mas inferior a 3,5 cm), largo (quando a largura do lábio ultrapassa os 3,5 cm) (Calado, 2001, p. 50). Quanto à orientação (figura A4-10), os bordos podem ser direitos (quando não apresentam mudança nítida de direcção relativamente à parede do vaso), introvertidos (quando se inclinam para o interior) e exvertidos (quando se inclinam para o exterior). O termo “exvertido”, apesar de não figurar no dicionário de língua portuguesa, tem uma longa utilização

121 no discurso arqueológico, sendo empregue por vários investigadores, nomeadamente Victor S. Gonçalves (Gonçalves, 1989), desde a década de oitenta. Assim, considera-se viável a sua utilização, ainda que possa suscitar algum debate.

Os lábios podem ser aplanados ou convexos (figuras A4-11 e A4-12). As carenas podem ser espessadas (se a espessura for igual ou superior a 1,5 cm) ou não espessadas (se a espessura for inferior a 1,5 cm), altas (índice de altura da carena entre 56 e 76), médias (índice da altura da carena entre 46 e 55) ou baixas (índice de altura da carena entre 25 e 45), de acordo com a sua posição no recipiente (figuras A4-21 e A4-22). As bases podem apresentar uma morfologia aplanada ou convexa (figura A4-23).

Organizaram-se os recipientes cerâmicos em sete tipos principais (Prato, Taça, Vaso, Pote, Prato Carenado, Taça Carenada, Vaso Carenado), seguindo a proposta tipológica que Manuel Calado construiu para os povoados Neolíticos e Calcolíticos da área da Serra d’Ossa (Calado, 1995, 2001), e que se enquadra na tradição de estruturas tipológicas do Sul da Península Ibérica, tendo como principal vantagem o facto de ter sido elaborada para contextos em que os recipientes cerâmicos se encontravam muito fragmentados, sendo por isso muito difícil a reconstrução, mesmo que mental, da maioria das formas. No estado actual do estudo das formas dos recipientes calcolíticos do Sul peninsular considera-se que, para os contextos de povoado, não se dispõe de um corpus morfológico baseado em recipientes inteiros ou integralmente reconstituíveis suficientemente diversificado e abrangente que permita a sua utilização comparativa no estudo de contextos com artefactos muito fragmentados, como o sítio de São Pedro. Efectivamente, o que está disponível são tipologias diversificadas que quando reconstroem a globalidade das formas o fazem com base em raros exemplares inteiros ou em propostas muito hipotéticas. Assim, considera-se que a construção de um corpus morfotipológico para os contextos de povoado enquadrados no 3.º milénio a.n.e., localizados no Sul peninsular deverá ser um dos grandes objectivos para o futuro, por forma a ultrapassar o problema da fragmentação, sem a perpetuação de ideias pré-concebidas ao nível formal e métrico.

A definição dos tipos resultou da combinação dos índices de profundidade dos recipientes com a análise do ângulo formado pelo bordo e a parede do fragmento com o plano de abertura (Calado, 2001, p. 45). Os critérios e as problemáticas relacionadas com a construção tipológica serão abordados num subcapítulo específico.

Efectuou-se a análise morfológica geral dos componentes de tear, com a observação dos seus contornos, das características das arestas e cantos e da forma da secção.

Organizaram-se os componentes de tear em duas formas principais – placas e crescentes, subdivididas em diversos tipos e subtipos (designações codificadas), de acordo com critérios específicos, que abordarei no subcapítulo da construção tipológica. Analisou-se a morfologia da secção transversal nas duas formas. Para as placas considerou-se pertinente analisar o contorno, que pode ser rectangular ou ovalado, e as características das arestas e cantos, uma vez que sua variabilidade condiciona o formato geral da peça (Boaventura, 2001). Assim, as arestas são vincadas

Catarina Costeira

122

quando fazem um ângulo de aproximadamente 90º com a face, e arredondadas quando foram propositadamente boleadas. Os cantos podem ser arredondados ou angulosos.

Na caracterização morfológica dos cossoiros analisou-se a forma da secção que pode ser esférica, bitroncocónica, cilíndrica ou discóide e a morfologia das faces, que podem ser planas ou convexas. Para esta categoria de artefactos definiram-se quatro tipos distintos.

No estudo das colheres e coadores examinaram-se as morfologias da pá (oval ou elipsoidal) e do cabo (arredondado e pontiagudo). Para as colheres definiram-se dois tipos e três variantes. No caso dos coadores, a organização tipológica foi mais complexa, devido ao reduzido número de exemplares e ao seu elevado estado de fragmentação, definindo-se apenas um tipo.

Na abordagem morfológica das queijeiras analisou-se a forma geral (cilíndrica e esférica) e a forma do bordo (arredondado, aplanado, bisel), conseguindo definir um tipo com variantes.

Caracterização métrica geral da peça e dos seus elementos constituintes

Todas as medidas (sempre em cm) dos artefactos cerâmicos foram obtidas com uma craveira manual metálica, sendo sempre tiradas em pontos médios.

Para o conjunto dos recipientes cerâmicos, tendo em conta o seu elevado estado de fragmentação, analisaram-se as seguintes medidas: o diâmetro do bordo, o diâmetro do bojo, o diâmetro máximo, a altura total, a espessura do bordo, do bojo e da base e a largura do lábio (figura A4-24 a A4-27). No que se refere aos índices, apenas se calculou o índice de profundidade (IP = Altura: Diâmetro máximo X 100), seguindo a fórmula presente na bibliografia (Gonçalves, 1989; Sousa, 2010; Soares, 2013, entre outros).

No caso dos componentes de tear observou-se o comprimento, a largura, a espessura (figura A4- 32) e o peso e calculei os índices de alongamento (largura/comprimento x 100) e os índices de espessura (espessura/comprimento x 100).

O comprimento foi medido apenas nos exemplares de estado 1 e 2, no caso dos crescentes esta medida compreende a distância entre os dois extremos da peça em linha recta. A largura e a espessura foram analisadas em todas as peças que o permitiram, medindo-se sempre a área mais larga de todos os exemplares. O peso foi obtido através de uma balança digital de precisão (os valores foram todos arredondados ao grama) apenas para as peças inteiras e integralmente reconstituíveis. Os índices de alongamento e espessura foram apenas calculados nas peças de estado 1 e 2, revestindo-se de importância para a comparação métrica dos artefactos, principalmente quando são provenientes de diferentes contextos (Valera, 1997, p. 89).

No caso dos cossoiros analisou-se o diâmetro máximo, o comprimento, a espessura (figura A4- 35) e o peso. Esta última medida foi obtido através de uma balança digital de precisão (os valores foram todos arredondados ao grama), apenas para as peças inteiras.

123 pá e do cabo, a espessura da pá e do cabo e o diâmetro da pá (figura A4-30).

Para as queijeiras observou-se o diâmetro e a espessura do bordo e do bojo. Nas peças discóides analisou-se o diâmetro máximo, a espessura máxima e o peso (obtido com os mesmos preceitos dos componentes de tear e cossoiros). Nos suportes analisou-se o diâmetro, altura e espessura máxima.

As medidas que apresentam asterisco (*) não são totalmente fiáveis, devido à fragmentação da peça, mas relativamente aproximadas das originais.

Caracterização morfométrica dos elementos plásticos/de preensão e das perfurações

Nos recipientes cerâmicos pré-históricos (Neolítico, Calcolítico e Idade do Bronze) no Ocidente peninsular é frequente a presença de aplicações plásticos diversificadas: cordões, mamilos, pegas e asas, com distintas representatividades. Estes elementos são tendencialmente descritos de forma heterogénea e relativamente isolada, o que torna difícil a sua interpretação funcional e/ou decorativa e a comparação entre conjuntos diferentes.

Neste trabalho, no seguimento de reflexões anteriores (Costeira e Luís, 2015; 2016), pretendia-se contribuir para a uniformização terminológica das aplicações plásticas, através de uma revisão dos critérios analíticos tradicionais e da sua confrontação com a bibliografia actualizada, nomeadamente a elaborada por arqueólogos franceses no estudo de grandes conjuntos cerâmicos provenientes de intervenções de salvaguarda (Cauliez, 2007; 2011, Cauliez, et al., 2012), bem como para a discussão sobre as múltiplas funcionalidades destes elementos. Estes objectivos permitem justificar o inquérito detalhado construído para o estudo das aplicações plásticas.

No estudo dos elementos plásticos considera-se pertinente analisar os seguintes critérios: • tipo de elemento plástico (EP), de acordo com quatro possibilidades: asa, cordão, mamilo e

pega;

• localização do elemento plástico no recipiente (bordo, bojo, base ou carena); • número de elementos plásticos (Nº. EP) identificados (isolado ou múltiplo);

• forma da base do elemento plástico, que pode ser circular, ovalada ou rectangular (figura A4- 29);

• forma da asa, que pode ser em anel, cotovelo, asas cegas, ou sub-rectangular (figura A4-29) • forma da secção do elemento plástico e da asa, de acordo com as seguintes opções: alongada,

circular, cónica, hemisférica, lingueta, oval, triangular, sub-rectangular (figura A4-29);

• técnica de aplicação dos elementos plásticos e das asas, que pode ser por colagem, cravagem ou repuxamento;

• caracterização métrica dos elementos plásticos, em que se observou a altura, a espessura, a largura, e no caso especifico das asas, a distância entre as extremidades da asa e a distância entre a parede do recipiente e a curvatura da asa (figura A4-28).

Catarina Costeira

124

A leitura combinada destes critérios e o seu confronto com a bibliografia disponível permitiu construir definições objectivas para cada um dos elementos plásticos (Costeira e Luís, 2015), contribuindo para distinguir os mamilos das pegas.

A asa é um elemento plásticos geralmente em arco, de secção circular (asa de rolo) e oval (asa de fita), sendo que nestas últimas pode existir uma variante com uma ligeira depressão central. A morfologia da asa pode ser em anel ou cotovelo.

O cordão plástico pode definir-se como uma banda contínua de pasta em relevo, em que a altura é igual ou inferior à largura máxima. A secção pode ser hemisférica, cónica ou rectangular.

O mamilo é um elemento plástico de base tendencialmente circular em que a altura é igual ou inferior à largura máxima, podendo apresentar uma secção hemisférica, cónica ou em lingueta.

A pega é um elemento plástico de base tendencialmente ovalada em que a altura é igual ou inferior à largura máxima. Pode ter uma secção cónica, hemisférica, em lingueta, alongada ou rectangular.

A problemática da interpretação funcional/decorativa dos elementos plásticos será abordada num outro capítulo, no entanto é importante referir que o inquérito construído para a análise destes elementos teve em conta esta dupla perspectiva. Os elementos plásticos que foram considerados decorativos foram também descritos nos campos relacionados com a análise geral das decorações dos recipientes.

Nos recipientes cerâmicos em análise identificou-se um conjunto de fragmentos que apresentavam perfurações. De acordo com a funcionalidade podem definir-se dois tipos de perfurações nos recipientes cerâmicos: as perfurações de suspensão e as perfurações de reparação (Vilaça, 1995, p. 52). Estes dois tipos de perfurações distinguem-se principalmente pela área da peça em que se localizam. Como critérios principais de análise das perfurações definiu-se o número em que se identificam (isolada, dupla, múltipla), a sua localização (bordo, bojo, base, carena, mamilo, cordão, pega), orientação, diâmetro máximo e a presença de rebordo, indicador importante para determinar se a perfuração é realizada antes ou após a cozedura da peça. Estas três últimas informações apresentam-se no campo das observações, por falta de espaço para a criação de campos autónomos.

A presença de perfurações nos componentes de tear é um importante elemento para uma aproximação à funcionalidade destes artefactos, o que exigiu a sua análise métrica mais pormenorizada (figura A4-33). Na análise das perfurações indica-se o número total observável (Nº. Perf.), considerando-se como medidas (sempre em cm) pertinentes o diâmetro máximo (Diâm. Máx.) e o diâmetro mínimo (Diâm. Mín.). As perfurações são sempre descritas da esquerda para a direita, começando-se no caso das placas pela extremidade superior. Com o objectivo de localizar as perfurações na face da peça, mediu-se a distância entre estas e as extremidades laterais (Dist. Perf. Extrem. Laterais) e a sua distância em relação ao topo/base (Dist. Perf. Topo/Base). Estas medidas permitem aferir a centralidade ou lateralidade das perfurações. A distância entre as perfurações (Dist. Perf.) da mesma extremidade, e no caso das peças de estados 1 e 2, entre os extremos opostos, indica a

125 sua simetria. Nos crescentes mediu-se a distância entre as perfurações de cada extremidade em linha recta.

Nas perfurações dos cossoiros mediu-se o diâmetro máximo (Diâm. Perf.) e a distância entre a perfuração e as extremidades (Dist. Perf. Extrem.).

Na análise das perfurações das queijeiras e dos coadores definiram-se como critérios: a forma (oval ou circular), o tipo (cilíndrica ou repuxada), a aplicação (aleatória, alinhada horizontalmente ou verticalmente) e mediu-se o diâmetro máximo da perfuração (cm).

Análise tecnológica

Na aproximação à cadeia operatória da produção de cerâmica (Osório, 2013; García Rosselló e Calvo Trias, 2013, p. 27), as primeiras etapas: recolecção/extracção da argila, preparação da matéria- prima são obviamente anteriores ao modelado, no entanto considerou-se mais operativo localizar todos os campos de análise tecnológica dos artefactos cerâmicos depois da análise morfológica.

Na abordagem tecnológica dos artefactos cerâmicos todas as observações foram macroscópicas, não sendo possível o recurso a análises arqueométricas, devido ao período de austeridade financeira em que desenvolveu esta investigação. Tenho consciência da importância da interdisciplinaridade no estudo das cerâmicas pré-históricas e das potencialidades das análises laboratoriais das pastas cerâmicas para uma aproximação aos barreiros de origem das argilas e para a reconstituição dos gestos que foram realizados na sua preparação, na modelação, cozedura e decoração dos artefactos (Osório, 2013) e no carácter algo ingénuo e impreciso de algumas observações macroscópicas realizadas na “Era da Técnica” em que os estudos arqueológicos aspiram à aproximação das técnicas pré-históricas de forma objectiva. No entanto, considero que a análise exclusivamente arqueológica é aceitável, enquanto outras vias não são possíveis.

No que se refere às pastas dos artefactos cerâmicos analisou-se a sua homogeneidade, consistência, a frequência e dimensão dos componentes não plásticos.

Os componentes não plásticos (CNP) podem ser partículas de origem geológica, fazendo parte integrante da argila, ou resultar de uma alteração antrópica, com o intuito de promover a consistência e maleabilidade da pasta e aumentar a resistência da peça no processo de secagem e cozedura (Vilaça, 1995, p. 47; Osório, 2013, p. 44). As análises macroscópicas efectuadas não permitem determinar a origem destes componentes não plásticos. De facto, sem análises petrográficas, considerou-se pouco significativo determinar o tipo de minerais destes componentes, ainda que os mais comuns no conjunto em análise sejam o quartzo, os feldspatos e as micas. Para além de minerais (areia, terra, pedras esmagadas e mesmo restos de outras cerâmicas), os componentes não plásticos também podem ser de origem orgânica (vegetais, como plantas e sementes; animais, como ossos e cunhas moídas, estrume, entre outros) (Osório, 2013, p. 53).

Catarina Costeira

126

componentes não plásticos (figura A4-37). Estes componentes são muito frequentes quando são superiores a 30%, frequentes entre 15% e 30% e raros quando surgem entre 1% e 15%. A sua dimensão varia entre finos, inferiores a 0,5 mm, médios, entre 0,5 mm e 1 mm, e grandes, superiores a 1 mm.

As pastas apresentam uma textura homogénea, quando os componentes não plásticos se encontram bem integrados na matriz argilosa e granular, quando os componentes não plásticos e a argila formam grânulos de diâmetro superior a 1 mm (figura A4-36).

A consistência das pastas organizou-se em três classes:

• compacta, pasta rija, que fractura com dificuldade mesmo com a utilização de uma ponta de aço, os c.n.p. são raros e de pequeno calibre, granulometricamente bem distribuídos; • semi-compacta, pasta de resistência média, que fractura com alguma facilidade com o

emprego de uma ponta de aço, em que os c.n.p. são de frequência média, de médio calibre, granulometricamente de distribuição mediana;

• pouco compacta, pasta que fractura facilmente com o emprego de uma ponta de aço, em que os c.n.p. são muito frequentes, de médio e grande calibre e granulometricamente mal distribuídos;

• friável, pasta que fractura muito facilmente com o emprego de uma ponta de aço, em que os c.n.p. são muito frequentes, de médio e grande calibre e em que se verifica a desagregação da argila e dos c.n.p.

Nesta análise não se definiram critérios específicos para a observação do fabrico dos artefactos cerâmicos, apesar da sua variabilidade e da presença de algumas marcas nos fragmentos estudados. Nos casos em que se considerou relevante, indicou-se a presença dessas marcas e efectuou-se a sua descrição no campo das observações.

No 3.º milénio a.n.e., os artefactos cerâmicos eram modelados manualmente, com recurso a diferentes técnicas (rolo, placas, repuxamento, entre outras), que poderiam ser utilizadas isoladamente ou em associação (Osório, 2013, p. 55), e eventualmente com a utilização de moldes, elaborados em cestos, couro, madeira, pedra, escavados na areia ou com reaproveitamento de recipientes cerâmicos partidos (Vilaça, 1995, p. 47; Inácio, 2015, p. 25), para determinadas formas, como por exemplo os pratos e algumas peças carenadas. A utilização de moldes de diferentes tipos de materiais pode