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3. O SÍTIO DE SÃO PEDRO: ENQUADRAMENTO GEOGRÁFICO E PAISAGEM

3.4. Geomorfologia e geologia

Apesar da sua estrutura geológica muito variada, o Alentejo distingue-se por uma simplicidade fisionómica (…) a planície e a peneplanície são as suas feições dominantes. Do alto da serra de Ossa só se descortinam de

longe em longe, como testemunhas das vastas cordilheiras que foram arrasadas, algumas colinas mais resistentes

Silva Teles, 1927

No enquadramento geomorfológico e geológico do sítio de São Pedro, considero pertinente integrá-lo numa área mais vasta do que os limites do cerro em que se implanta, que corresponderá grosso modo aos actuais limites do concelho do Redondo, permitindo assim uma aproximação a um território mais alargado.

A área de implantação do sítio de São Pedro insere-se na unidade morfoestrutural da Península Ibérica designada por Maciço Hespérico ou Maciço Ibérico (figura A1-4), formada por terrenos antigos Precâmbricos e Paleozóicos, que incluem diversas rochas metamórficas, sedimentares e eruptivas (Real, 1987).

No esquema tectono-estratigráfico presente na Carta Geológica de Portugal à escala 1:500 000 (figuras A1-5 e A1-6), o sítio de São Pedro integra-se na zona de Ossa-Morena, na transição dos sectores Estremoz – Barrancos e Montemor – Ficalho, pertencendo à formação de Ossa, que contém xistos psamitos esverdeados, micáceos e grauvaques (Carvalhosa, et al., 1987; Araújo, et al., 2013).

Este território apresenta um relevo diversificado e algo complexo (figura A1-8), em que a monotonia da peneplanície é interrompida por diversas elevações de formas arredondadas, a maioria das quais sem grande destaque na paisagem. A Serra d’Ossa e a Crista do Redondo, localizadas respectivamente a Norte e a Este do sítio em estudo, constituem dois elementos estruturantes deste território.

A planície na área do Redondo corresponde a uma superfície de erosão (Ribeiro, 2014, p. 96), com relevos suaves, a cerca de 250-300 m de altitude, constituindo um prolongamento da planície Montemor – Évora – Reguengos (Calado e Mataloto, 2001). Litologicamente, a área Norte (planície central do Redondo) desta planície caracteriza-se por rochas ígneas, nomeadamente granodioritos e

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quartzodioritos gnáissicos com dioritos associados (Martins, et al., 2008, p. 5), predominando no lado Sul (planície de Montoito – Santa Susana) os terrenos detríticos terciários, constituídos por argilas, cascalheiras e calcários concrecionados (Perdigão, 1976, p. 8). Estas duas áreas são separadas por uma faixa de rochas xistosas de relevo algo declivoso, intercalada por algumas faixas de anfibolitos (Calado, 2001, p. 22).

No limite Norte da planície ergue-se a Serra de Ossa, constituída por um conjunto de relevos de orientação geral NW – SE, com uma altitude máxima de 653 m (Alto de São Gens). Esta serra, com cerca de 40 km de comprimento e largura máxima de 15 km, apresenta uma morfologia complexa, genericamente triangular e topografia acidentada, com vertentes vigorosas (Feio, 1983). O maciço da serra é geologicamente constituído por rochas metamórficas, micaxistos, xistos e gnaisses. No sopé Sul da serra, desenvolve-se um extenso patamar de contorno irregular, com uma altimetria que varia entre os 350 e os 400 m, talhado maioritariamente nos xistos, apresentando-se muito dissecado pela erosão. No sopé Norte encontra-se “(…) uma faixa longitudinal, plana, de xistos devónicos brandos, um degrau pequeno mas vivo que dá para um patamar de xistos silúricos mais duros, coroados por retalhos de carapaça calcária, que sobe devagar até ao maciço calcário de Estremoz.” (Feio, 1983, p. 15). Na falda setentrional da Serra d’Ossa localizam-se importantes filões de cobre, associados a um “sistema filoniano subvertical de direcção NE a EW, instalado junto à terminação periclinal NW do Sinclinal de Terena (…). A mineralização ocorre em filões de quartzo com carbonatos associados (siderite) e é constituída por pirite, calcopirite, cobre arsenical e mispickel (arsenopirite), cobre nativo, cobre gris e rara blenda (…). Na parte superficial observam-se minérios secundários de cobre como malaquite, cuprite e calcantite acompanhados de hematite.” (Brandão e Matos, 2000, p. 484).

A Este da planície do Redondo, ergue-se uma crista de direcção Norte – Sul, com cerca de 8 km de comprimento, recorte vivo e vertentes vigoras, mas altimetria suave. É um alinhamento de quartzo localizado dentro de uma faixa de xistos siliciosos do Silúrico, próxima do contacto com os metagrauvaques (Feio e Martins, 1993, p. 166).

O rio Guadiana, apesar de se localizar a uma certa distância do sítio em análise, é um elemento geográfico fulcral na estruturação do território da margem Sul da Serra d’Ossa, facilmente acessível pela rede de “caminhos naturais” (Calado, 2001, p. 13), simultaneamente uma barreira física e uma via privilegiada de circulação e captação de recursos.

O sítio de São Pedro implanta-se no topo aplanado de uma colina alongada de vertentes íngremes, pontuada por afloramentos rochosos de micaxisto (essencialmente formados por quartzo e micas). Este cerro integra o conjunto de elevações que bordejam a margem Nascente da planície central de Redondo, a Sul da Serra d’Ossa. A posição elevada sobre as planuras confere-lhe um claro ênfase na paisagem, com uma ampla visibilidade para todos os quadrantes, mas tendo como limites, a estrutura imponente da Serra d’Ossa no horizonte Norte e as elevações da Crista do Redondo no horizonte Este (figuras A3-1, A3-2, A3-3, A3-4, A3-5 e A3-6).

29 3.5. Hidrografia

A área onde se insere o sítio de São Pedro enquadra-se num interflúvio entre as bacias hidrográficas dos rios Degebe e Lucefécit, dois dos principais afluentes do rio Guadiana. Pela sua posição geográfica, a bacia do Lucefécit estabelece a ligação entre o território da Serra d’Ossa e o rio Guadiana (Calado, 2001, p. 22), desempenhando por isso um papel fundamental no que se refere às transitabilidades nesta área.

Este território é drenado por um conjunto de pequenos cursos de água e ribeiras, a maioria de carácter não permanente, de que se destacam as ribeiras da Pardiela e do Freixo. Os vales destes cursos de água apresentam uma forma encaixada, sendo por essa razão raros e de pequenas dimensões os fundos aluviais.

Considera-se pertinente referir a existência de numerosas fontes, algumas com caudais destacados, nas faldas da Serra d’Ossa, anteriores aos impactes negativos das plantações de eucaliptos, que desempenhavam um importante papel no abastecimento da vila do Redondo (Gonçalves, 1988, p. 57; Calado, 2001, p. 21), demonstrando a disponibilidade de recursos aquíferos na envolvente do sítio de São Pedro.

3.6. Clima

Na actualidade, o clima do Alentejo médio é tipicamente mediterrâneo, com Verões quentes e secos e Invernos chuvosos e curtos (Queiroz, 2003, p. 453). O sítio em estudo integra-se no piso bioclimático meso mediterrâneo inferior, presumivelmente seco superior, registando valores médios de precipitação em torno dos 600 mm (Rivas Martínez, 1982, 1987).

As reconstruções paleoclimáticas, a nível mundial, realizadas nas últimas décadas defendem um grande dinamismo climático durante o Holocénico (Bond, et al., 1997; Jalut, 2005, p. 227), com a ocorrência de episódios de variabilidade climática abruptos (de curta duração) e regulares (Mayewski, et al., 2004; López Sáez, et al., 2009, p. 91).

Para a vasta área do Alentejo os estudos paleoclimáticos são ainda pouco expressivos, contudo os trabalhos que se têm desenvolvido no Noroeste Alentejano (Queiroz, 1999, Mateus e Queiroz, 1993) e no vale do Guadiana (Duque, 2004; Soares, 2013), bem como noutras áreas do Sul e Interior da Península Ibérica (Jalut, 2005; Mejías Moreno, et al., 2014) associados ao estudo das variações do upwelling costeiro (efeito de reservatório) nas margens atlânticas ocidental e meridional da Península (Soares, 2005, 2011), evidenciam dois períodos climáticos durante o 3.º milénio, a.n.e. A primeira metade deste milénio caracteriza-se por um período climático seco e árido, com algumas subfases mais húmidas, influenciadas ainda pelo “Bond event 5” (Bond, et al. 1997; Berglund, 2003), enquanto a segunda metade do milénio parece marcado por um evento climático mais repentino, designado por “Bond event 4.2 ka cal BP”, que se caracteriza por um dos períodos de maior aridez em alguns dos

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territórios da Península Ibérica holocénica (Duque, 2004; Mejías Moreno, et al., 2014; Waterman, et al., 2016). Estas oscilações climáticas condicionariam a disponibilidade de água e a presença de algumas faunas e plantas silvestres, impondo importantes desafios às comunidades que habitavam o interior peninsular nesta cronologia.

No caso concreto do território em que o sítio de São Pedro se integra, os dados faunísticos (Davis e Mataloto, 2012) e polínicos (Mataloto, et al., 2017) identificados parecem indicar um clima húmido e relativamente estável ao longo do 3.º milénio a.n.e., com paisagens relativamente arborizadas. Contudo, no decorrer deste milénio as paisagens parecem tornar-se mais abertas e humanizadas (Duque, 2004, p. 756), principalmente na proximidade das áreas ocupadas, como indicam os dados polínicos do sítio dos Perdigões (Danielson, Mendes, 2013).

3.7. Solos

Na área de estudo os solos são de carácter ácido, apresentando profundidades, texturas e granulometrias variáveis. O sítio de São Pedro implanta-se numa área de solos mediterrâneos pardos – argiluviados pouco insaturados de materiais não calcários, de granitos e quartzodioritos (Carta de Solos de Portugal, folha 36 – D 1: 50 000).

No que se refere à capacidade de uso do solo na actualidade, a área em questão caracteriza-se por solos de classe B e C, susceptíveis de utilização agrícola, mas com riscos de erosão elevados (figura A1-7).

A capacidade de uso dos solos é condicionada pela geologia, relevo, clima e principalmente pela acção antrópica, o que exige prudência na análise da capacidade de uso dos solos em épocas pré-históricas. Todavia, a inter-relação de todos os dados apresentados, associados aos vestígios de cereais presentes no registo arqueológico, leva a admitir que a área envolvente do sítio de São Pedro teria aptidão para o desenvolvimento de uma agricultura extensiva de sequeiro, como é largamente proposto para o território alentejano do 3.º milénio a.n.e. (Calado, 2001; Soares, 2013).

3.8. Vegetação

O sítio de São Pedro e o território envolvente insere-se na província biogeográfica Luso-Extremadurense, sector Mariânico-Monchiquense, subsector Araceno-Pacense, super distrito Alto alentejano (Costa, et al., 1998, p. 28). Estes territórios são dominados por duas séries de vegetação meso mediterrânea seca-subhuimida silicícola, a Pyro bourgaeanae-Quercu rotundifoliae S, em que predominam as azinheiras, e a Sanguisorbo hybridae-Querceto suberis S., em que se destacam os sobreirais (Rabaça, et al., 2007; Departamento de Ecologia da Universidade de Évora, 2007). Identificam-se também algumas áreas de “estevais do Genisto hirsutae-Cistetum ladaniferi e o esteval/urzal Erico australis-Cistetum populifolii e os urzais do Halimio ocymoidis-Ericetum

31 umbellatae, ocorrendo também de modo finícola, o amial Scrophulario-Alnetum glutinosae e o freixial Ficario-Fraxinetum angustifoliae, mais comum nas ribeiras e linhas de água” (Costa, et al., 1998, p. 28).

O dinamismo climático Holocénico, associado à forte intervenção humana neste território provocaram profundas transformações nos ecossistemas naturais, acentuando a desarborização das áreas de montado (Queiroz, 2003, p. 453), colocando-se sérias reservas à transposição desta caracterização biogeográfica para o passado.

Nas últimas décadas têm aumentado significativamente os estudos antracológicos e palinológicos de contextos arqueológicos, cronologicamente enquadrados no final do 4.º/3.º milénio a.n.e., localizados na Bacia do Guadiana, como La Pijotilla (Duque, 2004), Porto das Carretas (Soares, 2013; Queiroz e Tereso, 2013); ou Moinho de Valadares (Leeuwaarden e Queiroz, 2013; Queiroz e Ruas, 2013), que permitem uma aproximação a alguns táxones presentes no coberto vegetal calcolítico do Alentejo médio. Neste contexto é igualmente importante referir os dados da área de Reguengos de Monsaraz, nomeadamente da Anta 2 da Herdade de Santa Margarida (Queiroz, 2001, p. 186-190; Queiroz, 2003) e dos Perdigões (Wheeler, 2010; Danielson e Mendes, 2013), bem como os dos sítios de Moreiros 2, Arronches (Leeuwaarden e Queiroz, 2003) e da Ponte de Azambuja 2, Portel (Tereso, 2013). No sítio de São Pedro recuperou-se uma grande quantidade de carvões e sementes, que ainda estão em processo de estudo, encontrando-se apenas disponível para esta análise a informação proveniente das impressões em cerâmica de folhas e sementes, que foram identificadas pela Professora Ana Isabel Correia (FCUL).

No 3.º milénio a paisagem vegetal arbórea do Alentejo médio seria mais densa e diversificada, composta maioritariamente por quercíneas, das quais se destacam a Quercus rotundifolia/Quercus ilex L. (azinheira), a Quercus coccifera L. (carrasco), a Quercus faginea (carvalho cerquinho) e a Quercus suber (sobreiro). A folha impressa no fragmento [2864] 1 recolhido no sítio de São Pedro pertence ao género Quercus sp. As folhas impressas nos fragmentos [1994] 4 e [2951] 41 pertencem a plantas angiospérmicas dicotiledóneas (estampa 32)

Espécies como o pinheiro-bravo (Pinus pinaster), o pinheiro-manso (Pinus pinea), o zambujeiro ou oliveira-brava (Olea europaea var. sylvestris) e o zimbro vermelho (Juniperus oxycedrus) encontram-se também identificadas no registo arqueológico da Bacia do Guadiana, (Duque, 2004, p. 517; Queiroz e Tereso, 2013, p. 490).

Os dados polínicos evidenciam uma tendência decrescente do bosque e o desenvolvimento de uma paisagem mais aberta, com uma vegetação arbustiva, principalmente no final do 3.º milénio a.n.e, que se pode correlacionar com o crescente impacte antrópico e com a ocorrência de um período climático mais seco e árido (Mateus e Queiroz, 1993, p. 126-127; Duque, 2004, p. 517; Wheeler, 2010). No que se refere às espécies arbustivas destaca-se a presença de Erica scoparia (urze), Erica arborea (torga) no povoado do Moinho de Valadares (Leeuwaarden e Queiroz, 2013) e no povoado de La Pijotilla, a que se associa o Arbutus unedo (medronho), Rhamnus (frangula), Phyllyrea (adorna) e

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Rosaceae sp. (Duque, 2004, p. 517). Os efeitos da antropização do meio seriam mais expressivos na envolvente dos sítios habitados e utilizados para exploração agrícola e pastoril, conservando-se os bosques densos e diversificados em áreas mais afastadas, algumas de maior altitude.

No que se refere à paisagem cultivada, os diagramas polínicos da cronologia em estudo indicam a presença de Cerealia, nomeadamente Triticum aestivum durum (trigo) e Hordeum vulgare L. (cevada) (Duque, 2004). Nos sítios da Bacia do Guadiana com estudos arqueobotânicos disponíveis identificam-se vestígios de sementes destes cereais no povoado de La Pijotilla (Duque, 2004) e impressões de sementes de cevada em fragmentos de cerâmica no povoado Moinho de Valadares (Leeuwaarden e Queiroz, 2013). No caso concreto do sítio de São Pedro recolheram-se 23 fragmentos de recipientes cerâmicos com negativos de sementes na superfície interna e/ou externa. Nos fragmentos [2510] 8; [2776] 84 e [2779] 14 os negativos identificados correspondem a sementes arredondadas, elípticas, algo achatadas, sendo visível nalguns casos o sulco longitudinal relativamente profundo, ao longo de todo o comprimento da semente. Estas características ajustam-se às apresentadas por sementes de gramíneas, provavelmente trigo e cevada (estampas 32 e 33; figura A6- 23).

As leguminosas encontram-se representadas pela espécie Vicia faba L. (fava) identificada no Porto das Carretas (Queiroz e Tereso, 2013), em La Pijotilla (Duque, 2004) e em Vila Nova de São Pedro (Paço, 1954).

As espécies vegetais não alimentares, utilizadas em actividades artesanais como a tecelagem, de que se destacam o linho (Linum usitatissimum), estariam igualmente presentes na paisagem cultivada. Para os contextos do Alentejo médio ainda não estão disponíveis evidências directas para o cultivo desta planta. No entanto, a observação do registo arqueológico de sítios calcolíticos, localizados noutras áreas regionais como a Estremadura portuguesa, com os casos concretos de Vila Nova de São Pedro (Paço, 1944) ou Zambujal (Hopf, 1981), o Algarve, com os dados de Alcalar (Móran e Parreira, 2003) e a Andaluzia, com os indícios da Cueva de los Murciélagos de Zuheros (Cacho, et al., 1996), entre outros contextos em que se documentou a presença de sementes de linho permite colocar a hipótese do cultivo desta planta no Sul da Península Ibérica. De facto, no actual território português identificam-se sete variedades de linho, adaptadas às características das diferentes áreas regionais, com ciclos de sementeira/colheita díspares. “No Alentejo (…) onde se cultivam as variedades de linho de inverno – mourisco, abertiço e serrano – destinavam-lhe preferentemente os terrenos frescos das bordas dos cursos de água, e sobretudo os hortícolas.” (Oliveira et. al., 1978, p. 34). As sementes de linho identificadas em Vila Nova de São Pedro e no Zambujal pertenceriam, justamente, a variantes de cultivo de Inverno (Pinto da Silva, 1988; Silva e Soares, 2014, p. 166).

As esparteiras (Lygeum spartum e Stipa tenacissima) são espécies vegetais autóctones da Península Ibérica, presentes nas áreas do Centro e Sudeste, cuja utilização para a tecelagem e cestaria pode ter resultado da sua recolha directa (esparto selvagem), mas também do seu cultivo, uma vez que a intensificação da presença desta planta e o alargamento dos seus territórios terá sido resultado da

33 acção antrópica (Alfaro Giner, 1984).

3.9. Espécies faunísticas

A heterogeneidade da paisagem vegetal permitiria a presença de uma grande diversidade de espécies faunísticas. Esta abordagem centra-se nos registos faunísticos provenientes de sítios arqueológicos do final do 4.º/3.º milénio a.n.e, preferencialmente localizados no Alentejo médio. Estes dados apresentam limitações para a aproximação aos ecossistemas calcolíticos, uma vez que resultam principalmente de escolhas antrópicas, sendo as espécies de mamíferos terrestres as melhores representadas.

Os estudos de conjuntos faunísticos de contextos do Neolítico final e Calcolítico do Sul de Portugal sofreram um forte incremento nas últimas décadas, ainda que muitas das amostras sejam reduzidas, o que a par da construção de inquéritos e utilização de metodologias diversificadas tornam difícil a correlação de alguns dados. Utilizam-se os dados faunísticos disponíveis para o povoado do Porto Torrão (referente às primeiras campanhas, Arnaud, 1993), Monte da Tumba (Antunes, 1987), Paraíso (Davis, 2012), Ponte da Azambuja 2 (Nabais, 2013), Perdigões (Costa, 2010, 2013; Cabaço, 2010), Juromenha (Valente e Carvalho, 2014), Moinho de Valadares (Valente, 2013), Mercador (Moreno e Valera, 2007; Moreno, 2013), Monte do Tosco (Pajuelo, 2013), Porto das Carretas (Cardoso, 2013a) e para o sítio de São Pedro (Davis e Mataloto, 2012) para esboçar alguns comentários sobre os táxones selvagens e domésticos que constituíram os ecossistemas destas comunidades.

Das espécies faunísticas selvagens, presentes nas colecções referidas, destacam-se o Cervus elaphus (veado-vermelho), o Capreolus capreolus (corso), Equus caballus (cavalo), Bos primigenius (auroque), Sus scrofa (javali), Lepus sp. (lebre) e Oryctolagus cuniculus (coelho). A presença de carnívoros como o Iberian lynx (lince), Vulpes sp. (raposa), ou o Canis lupus (lobo), bem como de roedores, répteis e aves são residuais. Esta grande diversidade de espécies com habitats díspares reforça a pluralidade paisagística do Alentejo médio no Neolítico Final/Calcolítico. De facto, a ocorrência de cervídeos, javalis e coelhos indica a presença de bosques e florestas mais ou menos densos (Davis e Mataloto, 2012), ao invés dos auroques, equídeos e das lebres que habitariam preferencialmente espaços abertos (Cardoso, 2013b, p. 562).

No que se refere às espécies faunísticas domésticas, ainda que nalguns táxones sejam difíceis de distinguir das selvagens, identificam-se o Sus domesticus (suínos), o Bos taurus (bovinos), o Ovis aries (ovinos), Caprinae (caprinos) e o Canis lupus familiaris (cão). No Alentejo, ao contrário de outros territórios do Sul peninsular, como a Estremadura, os suídeos apresentam um grande destaque, o que se pode relacionar com a abundância de sobreiros e azinheiras nas áreas de planuras (Moreno, 2013, p. 349; Davis e Moreno, 2007).

O sítio de São Pedro implanta-se num território multifacetado, com recursos litológicos e minerais abundantes e variados, em que as planícies de solos agrícolas e pastos se combinam com

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áreas mais densamente arborizadas e com a estrutura imponente da Serra d’Ossa, importantes espaços cinegéticos e de captação de recursos silvestres. A fisionomia da peneplanície torna este espaço fulcral na mobilidade e contactos entre o litoral atlântico do Tejo e as planícies interiores do Guadiana (Mataloto, 2010, p. 264).

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