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As funções reparadora, equalizadora e qualificadora da EJA

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3. EJA: O RESGATE DE UMA DÍVIDA SOCIAL

3.3. O Decreto 5.840/2006 e a Institucionalização do PROEJA: A formação Integral dos

3.3.2. As funções reparadora, equalizadora e qualificadora da EJA

No final do ano de 2000 foi aprovado o Parecer CNE/CEB 11/2000, relatado pelo conselheiro Carlos Roberto Jamil, que trata das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos. O texto é composto das seguintes partes: fundamentos sócio- históricos da EJA, funções da EJA, histórico legal da EJA e bases legais vigentes. O mencionado Parecer e o Documento Base do Programa estabelecem como funções da EJA: a função reparadora, a função equalizadora e a função qualificadora. Esta última definida como o próprio sentido da EJA.

A Função Reparadora é explicitada no Parecer CNE/CEB 11/2000 como uma dívida social não reparada para com os analfabetos, cuja falta de domínio da leitura e da escrita como bens sociais, representa uma perda de um instrumento imprescindível para a convivência contemporânea. No referido Parecer, a EJA constitui-se em uma oportunidade de atender à exigência das competências requeridas pela vida cidadã e pelo mercado de trabalho. Mas, segundo Hortz (2009, p. 3): o PROEJA é uma política social pontual, e explicita que:

O PROEJA, enquanto um programa que visa elevar a escolaridade e qualificar a população urbana para sua integração social, seja pelo ingresso no mercado de trabalho formal ou em ocupações informais, contribui para o atendimento das necessidades evidenciadas pelos organismos internacionais e pelo Estado, pois se observa nos documentos destas instituições uma preocupação acentuada com os pobres urbanos e desempregados, principalmente com a população jovem, onde os índices de pobreza têm aumentado, conforme os seguintes dados de 1998 a 2001: a incidência da pobreza entre os jovens aumentou (o percentual de pobres com menos de 24 anos se elevou de 36% para 39% do total).

A referida autora (2009, p. 3) ainda, explica que o PROEJA, em seu Documento Base, enquanto política pública “compreende a educação como importante para a empregabilidade e, logo, para a redução da pobreza; o mesmo a destaca, especificamente para jovens e adultos, como um mecanismo de contenção da marginalidade”. Portanto, essas políticas sociais de caráter “indenizatório” para reparar falhas, visando minimizar a pobreza, são táticas da atual política do país para o crescimento econômico e redução da desigualdade, visto que segundo o Banco Mundial (1997, p. 31) as políticas sociais só devem ser exercidas “à medida que trazem vantagens mercadológicas, civis e governamentais”.

Mas a educação sozinha, e no caso a EJA, não pode reparar sozinha esta dívida social. Embora a escolar seja um espaço democrático de conhecimento, que se pode buscar uma sociedade mais justa, mediante o reconhecimento da educação enquanto espaço formal,

44 oferecida com qualidade e compreendida como um direito de todos e dever do Estado antes negado para esta parcela da população.

Para a Função Equalizadora, o argumento expresso no Parecer 11/2000 e ratificado no Documento Base é o seguinte: ao reparar a dívida do Estado para com os jovens e adultos, mediante oportunidades de continuidade da trajetória escolar, esta parte do princípio da discriminação positiva cuja justificativa é dar mais oportunidades a quem mais precisa, com o intuito de equalizar o público desta modalidade de educação e os que tiveram acesso à educação na idade própria. Entretanto, Hortz (2009, p. 4-5) explica:

Para a redução das desigualdades sociais, também se destaca a necessidade de focalizar as políticas sociais, conforme é colocado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, ao se afirmar que –“só ela permite que a transferência de um volume relativamente limitado de recursos tenha um significativo impacto sobre a desigualdade e a pobreza.”

Dessa forma, a equidade é propalada de maneira estratégica para minimizar as desigualdades sociais sem as eliminar, mas mantê-las em um nível que não prejudique os interesses capitalistas. Ainda, para a referida autora (2009, p. 5):

[...] Essa importância da equidade para o desenvolvimento justifica-se por esta colaborar para a manutenção das condições de governabilidade, para a estabilidade e permitir que a população continue consumindo, fazendo assim com que o ciclo de produção e consumo seja alimentado.

Dessa forma, a educação pode contribuir para o alcance da equidade à medida que possibilita condições para o trabalhador qualificar-se e inserir-se no mercado, aumentando assim o lucro para os empresários. Desse ponto de vista, a função reparadora e equalizadora presente no PROEJA e no Parecer 11/2000 representa funções demandadas pelo próprio Estado e pelos organismos internacionais.

A Função Qualificadora refere-se à atualização dos conhecimentos por todos durante toda a vida. Assim, o Documento Base do PROEJA (BRASIL, 2007, p. 42) declara que a função qualificadora:

[...] revela o verdadeiro sentido da EJA, compreendida na perspectiva da formação para o exercício pleno da cidadania, por meio do desenvolvimento do pensamento crítico e autônomo de cidadãos participativos, conscientes de seus direitos sociais e de sua compreensão/inserção no mundo do trabalho, entendido como elemento fundamental ao processo de omnização de homens e mulheres e de produção cultural.

Dessa forma, o termo trabalho é tomado como construção histórica que homens e mulheres realizam produzindo sua condição humana, mas, declara também, que a formação recebida “[...] para inserir-se de modos diversos no mundo do trabalho e inclusive gerando emprego e renda” (BRASIL, 2007, p.13). Pode-se inferir que essa formação recebida deve oportunizar trabalhos informais sem garantia trabalhista, ao mesmo tempo o trabalho e a renda são gerados pelo próprio indivíduo, pois não há emprego formal para todos. Já o Parecer CNE/CEB 11/2000 (BRASIL, 2000, p. 11-12) declara que:

Muitos jovens ainda não empregados, desempregados, empregados em ocupações precárias e vacilantes [...] podem encontrar na EJA, em suas funções de reparação e de equalização ou qualificação, um lugar de melhor capacitação para o mundo do trabalho e para a atribuição de significados às experiências sócio-culturais trazidas por eles. [...] Dentro deste caráter ampliado, os termos jovens e adultos indicam que em todas as idades e em todas as épocas da vida é possível se formar, se desenvolver

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e constituir conhecimentos, habilidades, competências e valores que transcendam os espaços formais da escolaridade e conduzam à realização de si e ao outro como sujeito.

O citado Parecer vincula o termo competência aos saberes obtidos na vida fora da escola, quando afirma que a educação de jovens e adultos oportuniza “retomar seu potencial, desenvolver suas habilidades, confirmar competências adquiridas”. Essa declaração influencia o surgimento de concepções e ações supletivas para a EJA, pois corrobora no sentido de que os saberes extra-escolares sejam tratados de forma aligeirada pela escola.

Além do mais, o mencionado documento afirma que neste século XXI é indispensável desenvolver competências para a vida cidadã e para o mundo do trabalho. Observa-se que o termo competência, relacionado ao mundo produtivo, adéqua-se à EJA pela “garantia” de qualificação e inserção no mundo trabalho. Entretanto, as competências que essa modalidade de educação precisa desenvolver não se restringem a uma atividade profissional específica, mas sim, ao desenvolvimento de competências mais amplas, visando à formação de pessoas capazes de engajar-se em mudanças e enfrentar desafios decorrente da instabilidade quanto à própria existência.

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