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Condições de Trabalho, Qualificação e Emprego da População Jovem e Adulta

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3. EJA: O RESGATE DE UMA DÍVIDA SOCIAL

3.1. Condições de Trabalho, Qualificação e Emprego da População Jovem e Adulta

A ideologia neoliberal incorporada à realidade brasileira no final da década de 1980 trouxe consequências negativas para a educação da classe trabalhadora. O Estado brasileiro transferiu suas responsabilidades para a ação das empresas. Com a falta de qualificação da força de trabalho, especialmente no que se refere à educação básica, constitui um grande empecilho econômico, cuja solução tem caráter estruturante, pois é capaz de provocar significativas mudanças no sistema competitivo ocasionando efeitos no nível de renda e emprego e na qualidade de vida para a camada pobre da população.

Nessa perspectiva, é importante para a educação de jovens e adultos considerar esses sujeitos além da situação escolar. O trabalho é muito importante na vida dessas pessoas, por sua condição social. Com o crescente desemprego estrutural e a perda de direitos dos trabalhadores no processo de mundialização do capital tem como resultado a concentração de riqueza nas mãos de poucos, enquanto milhões de adultos, jovens e crianças vivem na miséria. Frigotto (2005, p. 69) afirma que:

O capital perdeu sua capacidade civilizatória e, agora, para manter-se destrói um a um os direitos sociais conquistados pela classe trabalhadora (emprego, saúde e educação pública e aposentadoria digna, etc.), além de por em risco a vida humana pela degradação cada vez maior do meio ambiente.

Ainda, para o autor, o século XX terminou de forma paradoxal, com a ciência e a técnica que poderiam produzir uma melhor qualidade de vida aos seres humanos na execução de tarefas em menos tempo para sua sobrevivência e usufruir o seu tempo livre para o lazer. Entretanto, as relações do capitalismo produziram o desemprego estrutural ou o trabalho precarizado. Assim a classe trabalhadora de jovens e adultos enfrenta uma crescente instabilidade no emprego. A incorporação de novas tecnologias ao processo de produção provoca o aumento da exploração e do permanente medo da perda do emprego.

A ganância pelo lucro por parte dos detentores dos meios de produção e do capital financeiro, a preservação do capital como entidade abstrata e passível de ser conquistado com esforço, sacrifício e competência, a sedução da mercadoria que encanta a todos, mesmo os que não têm condições aquisitivas para adquiri-las, submetem os homens a toda sorte de frustração, alienação e exploração. Cria um cidadão submisso à ordem vigente, contribuindo com seu trabalho alienado para manter o sistema capitalista.

Segundo Frigotto (2005, p. 72), os capitalistas e aqueles que defendem o capitalismo apresentam um discurso falacioso ao anunciar a “[...] a chegada da sociedade do conhecimento, a sociedade do entretenimento, do lúdico ou do fim do trabalho e a sociedade do tempo livre [...]”, o que para o autor contrapõe-se à existência de uma:

[...] multidão de desempregados, subempregados e excedentes desnecessários à produção capitalista, cujo tempo livre não significa nem entretenimento, nem tempo lúdico, mas tempo torturado de precariedade – existência provisória sem prazo. Na mesma ordem de mistificação situa-se a apologia ao agronegócio e ao empreendedorismo e dos receituários de empregabilidade como formas dos desempregados resolverem sua situação.

34 O conceito de empregabilidade carrega uma ideologia difundida pelo toyotismo, que configura uma ambivalência. Por um lado, representa as exigências de novas qualificações para o mundo do trabalho. Ao mesmo tempo, de forma implícita, sua lógica organizacional leva a uma “produção enxuta”, diminuindo os postos de trabalho. O trabalhador deve, inclusive, ser formado para se adaptar com flexibilidade às novas formas de ocupação. Como forma de remediar a crise do desemprego defende-se o trabalho informal como possibilidade de emprego, como capacidade do trabalhador para resolver o problema estrutural do desemprego. Por isso, o toyotismo não está voltado para o desenvolvimento de políticas de pleno emprego.

Essa ideologia da formação profissional para a empregabilidade propalado pelo toyotismo é que vai constituir as políticas educacionais para a formação profissional a partir da década de 90. Para Alves (2009, p. 4),

O toyotismo é um estágio superior de racionalização do trabalho que não rompe, a rigor, com a lógica do taylorismo e fordismo. (...) No campo da gestão da força de trabalho, o toyotismo realiza um salto qualitativo na “captura” da subjetividade do trabalho pelo capital se distinguindo do taylorismo e fordismo por promover uma via original de racionalização do trabalho; desenvolvendo, sob novas condições sócio- históricas (e tecnológicas), as determinações presentes nas formas tayloristas e fordistas, principalmente no que diz respeito à racionalidade tecnológica. Poderíamos até afirmar que o toyotismo é o modo de organização do trabalho e da produção capitalista adequada à era das novas máquinas, da automação flexível, que constituem uma nova base técnica para o sistema do capital, e da crise estrutural de superprodução, com seus mercados restritos.

O autor explica que o toyotismo é uma inovação organizacional da produção capitalista sob a grande indústria, isto é, não se trata de uma nova forma de organização produtiva, mas combina o novo e o arcaico, articulando as formas tayloristas-fordistas reduzidas no processo de trabalho. Ao mesmo tempo, atribui importância fundamental para o controle da subjetividade do indivíduo no processo de produção capitalista.

A “manipulação” do trabalho através de um conjunto amplo de inovações organizacionais, institucionais e relacionais está presente na produção de mercadorias, tendo como base a “autonomia”, a polivalência do trabalhador, o trabalho em equipe, inserção dos trabalhadores no processo produtivo, produção enxuta. Ainda, para Alves, tanto o fordismo como o toyotismo combinam astuciosamente a “força” (destruição do sindicalismo industrial de massa) com situações convincentes, satisfatórias para o trabalhador mediante remunerações flexíveis ligadas ao desempenho individual, trabalho em equipe e forte propaganda ideológica.

Assim, o toyotismo consegue de forma qualitativa distinguir-se do fordismo quando consegue subsumir o trabalho ao capital através da mobilização da intelectualidade ou espiritualidade do trabalhador. Gentili (1995, p. 158), explica:

[...] políticos, empresários, intelectuais e sindicalistas conservadores não hesitam em transformar qualquer debate sobre educação em um problema de “custos”. (...) A esta altura dos acontecimentos, ninguém duvida de que temos de educar “para a cultura do trabalho”; o que, em bom português, quer dizer “educar para a cultura do mercado”. Os termos “eficiência”, “produtividade”, “produto educativo”, “rentabilidade”, “custo da educação”, “competência efetiva”, “excelência”, “soberania do consumidor”, “cliente-aluno”, etc. não são um produto alucinado de nossa exagerada crítica ao mundo dos negócios. Trata-se simplesmente do vocabulário que compartilham aqueles que professam sua fé nesta nova retórica.

35 As profundas mudanças nas qualificações exigidas para o trabalho industrial requer dos trabalhadores novas habilidades cognitivas e comportamentais, mas possuem significados paradoxais, como explica Alves (2008, p. 5):

[...] Por um lado, expressam a exigência orgânica da produção de mercadorias, com suas novas qualificações, adequadas à lógica do toyotismo, com suas novas exigências de subsunção real do trabalho ao capital. Por outro lado, expressam habilidades humanas exigidas pela nova base técnica de produção do sistema orgânico do capital, buscando ser compatíveis com um novo sistema de máquinas complexas, produto do desenvolvimento das formas produtivas do trabalho social.

Porém, percebe-se o desemprego crescente de trabalhadores escolarizados, principalmente nos setores modernos da sociedade, que tornam relativa à perspectiva instrumental da educação que se manifesta como se fosse capaz de garantir emprego.

É no embate de concepções de sociedade e trabalho que brota a disputa pela educação como prática social mediadora do processo político, social, cultural e de produção, ou seja, as novas formas do capital globalizado e de produção flexível, basilou as reformas educacionais dos anos de 1990. A ideologia educacional dessa reforma conduz à formação de um trabalhador “cidadão produtivo”, treinado para o imediatismo do mercado de trabalho. O que se busca é uma educação básica (fundamental e média) de qualidade para jovens e adultos que articule e consolide conhecimentos entre trabalho, ciência e cultura.

Existem, na sociedade brasileira, legiões de jovens que não concluíram o ensino médio ou o fazem de forma precária em cursos supletivos e no horário noturno. Sua condição social os obriga, muito cedo a buscarem um emprego para sobreviver. Além do mais, precisam enfrentar as dificuldades para conciliar o trabalho e escola. Por isso é importante possibilitar a esses jovens, a realização de uma educação básica de qualidade em que o ensino médio e profissional seja articulado, e ao mesmo tempo, possa situá-lo, especificamente em uma área técnica ou tecnológica. Mas para isso, é preciso vencer alguns desafios, como sugere Frigotto (2005, p. 77):

Na verdade, isto implica, também, um triplo desafio. Desconstruir, primeiramente, do imaginário das classes populares o entulho ideológico imposto pelas classes dominantes da teoria do capital, da pedagogia das competências, da empregabilidade, do empreendedorismo e da ideia que cursinhos curtos profissionalizantes, sem uma educação básica de qualidade, os introduzem rápido no mercado ao emprego. O segundo desafio é a mudança no interior da organização escolar, que envolve formação dos educadores, suas condições de trabalho, seu efetivo engajamento e mudanças na concepção curricular e prática pedagógica [...]. O terceiro envolve a sociedade civil e política. Trata-se de criar as condições objetivas e subjetivas para viabilizar em termos econômicos e políticos este projeto [...] que tem em seu ideário a mudança das estruturas que geram as desigualdades e a construção de um projeto societário de base popular [...] efetivamente socialista.

A educação básica precisa assumir sua função central na construção de um país, pois precisa desenvolver o aspecto social, cultural, político e econômico para uma relação de soberania e não de subalternidade com as outras nações. Para isso, é essencial educar adequadamente a todos e particularmente a classe trabalhadora e aos seus filhos. Nesse sentido, a escola precisa desenvolver conhecimentos sólidos vinculados a todas as dimensões da vida. Esses conhecimentos constituir-se-ão uma base para a compreensão crítica do funcionamento da sociedade humana e do mundo da natureza. O domínio desses conhecimentos é fundamental para a formação de sujeitos autônomos, livres e criativos, capazes de agir para a transformação da realidade social em que vivem.

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