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REVISITANDO A LITERATURA

CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

1 TRANSIÇÕES JUVENIS: DIÁLOGOS POSSÍVEIS ENTRE PSICOLOGIA, CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS

1.1 AS IDADES DA VIDA: JUVENTUDE OU TRANSIÇÕES JUVENIS?

A compreensão das categorias juventude e transições juvenis pressupõe uma análise pautada na multiplicidade de subjetividades que emergem das condições concretas vivenciadas pelos jovens em dado momento histórico-cultural e as diferentes trajetórias por eles desenhadas. Nesta perspectiva, essas duas categorias são compreendidas como fenômenos políticos, culturais e sócio-históricos da modernidade. Por essa razão, essa revisão de literatura apresenta, inicialmente, um breve esboço histórico do desenvolvimento das concepções que nortearam a compreensão sobre transições na juventude, que, tomada como unidade, confere um discurso homogêneo e normatizador às experiências singulares e omite a condição do jovem como agente de transformação de sua própria realidade. Em seguida, discute as concepções de juventude sob a ótica da diversidade, para trazer os princípios gerais da abordagem psicossocial ou cultural relativas a transições juvenis.

Na literatura atual, para alguns estudiosos do desenvolvimento humano, as idades ou fases da vida foram organizadas em função das transformações biológicas, culturais, sociais e econômicas observadas, sendo então reconhecidas em, pelo menos, sete ciclos: infância, adolescência, juventude, idade adulta, meia idade, terceira e quarta idades (PAPALIA e OLDS, 2000). Entretanto, conforme a pesquisa de Debert (2004), pautada nos estudos sobre os autores que tratam das mudanças no mundo contemporâneo, a exemplo de Anthony Giddens e Nobert Elias, a idade cronológica não se apresenta mais como norteadora para o gerenciamento dos eventos marcadores de passagem. Esse ponto de vista, sobre o ciclo de vida tradicionalmente considerado como fechado e normativo, dá lugar à análise do curso de vida como um processo de experiências abertas, não cabendo mais rituais de passagens de uma etapa para outra, o que acentua a complexidade e a imprevisibilidade das transições juvenis.

Do ponto de vista antropológico, a institucionalização do ciclo de vida surgiu com o advento da modernidade, com papel e poder reguladores, ao padronizar a infância, a idade adulta e a velhice como etapas homogêneas e naturalizadas. Em contraste, os estudos antropológicos realizados nas sociedades não ocidentais mostraram que o ritual de passagem de um estágio para o outro não se orienta pela idade cronológica, mas pela transmissão do status social (poder, autoridade jurídica e outros) feita pelos mais velhos. A pesquisa da antropóloga norte-americana Margareth Mead4 aponta a tendência etnocêntrica da universalidade de

padrões culturais próprios de um grupo etário, que configura uma naturalização das transições de um estágio a outro no desenvolvimento (DAYRELL, 2002).

Do ponto de vista sociológico, a institucionalização do ciclo de vida prescreve um modo de ser jovem e a cristalização das idades da vida quando estabelece marcos de referência normativos: escolarização, casamento, trabalho e aposentadoria. Em grande parte, essas prescrições estão vinculadas aos aspetos comuns ao surgimento das sociedades modernas, entre eles, a separação entre o público e o privado, o programa de exclusão da criança do mundo do trabalho e a estruturação do sistema escolar. No que concerne o surgimento da categoria juventude, Galland (2003) afirma que ela está ligada à noção de indivíduo e de intimidade familiar como valores no pensamento contemporâneo. No seu estudo sobre as sociedades ocidentais, Debert (2004) observa que as idades cronológicas são justificadas através de três pontos: a atribuição de status social, o aparato cultural e a estruturação familiar. O mecanismo básico de status social diz respeito à maioridade legal, atribuição de papéis na entrada do mercado de trabalho e formulação de demandas sociais. O aparato cultural compõe-se de critérios e normas cronológicas, impostas por leis, para delimitar direitos e deveres do cidadão. Finalmente, a cronologização é também relevante para garantir a estrutura familiar, pois serve como regulação do ciclo de vida, ao refletir a hierarquia de poder entre seus membros, bem como a divisão de papéis entre eles.

No campo de saberes da psicologia, o estudo do desenvolvimento humano, no início do século XX, permeado pelos modelos funcionalista e evolucionista, propôs etapas ou estágios do ciclo de vida (infância, adolescência, idade adulta e velhice) como sendo rígidas, universais e lineares. Essa tendência conduziu a psicologia à construção de modelos normativos de ciclos de vida, que deveriam adequar-se a um conjunto de normas socialmente definidas que ditariam o que o indivíduo, em cada etapa de vida, deveria ou não fazer. A rigidez desse discurso sobre o desenvolvimento humano propiciou:

[...] uma concepção relativa à juventude como fase de transição, composta por um conjunto de etapas normatizadoras que conduziam progressivamente em direção a um mundo adulto em uma sequência linear em que a sucessão e a ordem das etapas a serem percorridas estariam ligadas à certeza do projeto dessa modernidade [...]. (GONZÁLEZ; GUARESCHI, 2009, p.113).

As autoras apontam essa concepção como desenvolvimentista e evolutiva e afirmam que ela se pauta na ideia de que cada indivíduo, em determinado momento do ciclo de vida, passa por transformações psicossociais pré-diagnosticadas pelas ciências médicas e psicológicas que ajudam a cristalizar um modo de ser e de agir do jovem (GONZÁLEZ;

GUARESCHI, 2009). Esta compreensão, que continua dominando as pesquisas nesse campo, tornou-se dominante desde a publicação sobre adolescência de Stanley Hall, em 1904. Aqui vale a pena destacar o comentário de Frota (2007, p.158) sobre essa obra:

Considerava que a adolescência era a retirada dramática das crianças do paraíso da infância, constituindo-se, desse modo, num período de crises, tempestades e tormentas. E é desta forma que ainda hoje muitos teóricos têm- se detido a falar sobre adolescência: como fase difícil, geradora de crises, um foco de patologias, um poço de sofrimento para jovens e suas famílias.

Desse ponto de vista, a adolescência seria uma etapa vital localizada entre a infância e a idade adulta e permeada por crises. Esse modo de pensar a transição na adolescência permeou a maioria das teorias psicológicas ancoradas no denominado modelo normativo de crise e contribuiu para apontar a juventude como lócus de germinação de problemas, oscilando entre marcadores biofisiológicos e psicossociais. Embora implique conceitos diferentes, esse modelo contribuiu para imprimir, na categoria juventude, a ideia de um vir a ser constante e apontar a juventude como etapa problemática. Assim, a visibilidade dessa etapa da vida surge, no discurso científico e popular, como portadora de aspectos negativos configurando um discurso patologizante em virtude dos problemas que parecia carregar: sexualidade, drogas, evasão escolar e delinquência (PAPALIA; OLDS, 2000; FROTA, 2007; GROPPO, 2010).

Steinberg e Morris (2001) admitem que as pesquisas sobre adolescentes se expandiram estando mais focadas no contexto, inclusive nas interações grupais e na cultura como variáveis influentes no processo de desenvolvimento. Porém analisam que essas pesquisas apesar de mais recentes, trazem ainda temas recorrentes focados em comportamentos de risco e a aspectos psicopatológicos. As autoras advertem que a fixação nesses temas acaba deixando preteridos os estudos sobre o desenvolvimento saudável do jovem e o conhecimento acerca de suas competências.

Camarano (2006), ao analisar o debate sobre juventude no Brasil a partir das décadas de 1970 e 1980, observa que muitas questões foram adicionadas, caracterizando-se por uma ótica pessimista centrada numa pretensa “crise” dos jovens, na instabilidade de suas relações afetivas e inserção no mercado de trabalho, violência, taxas de mortalidade e doenças sexualmente transmissíveis e na criminalidade. Spósito (2003) ressalta esse período da história brasileira como aquele em que os jovens chamavam mais atenção como vítimas de vulnerabilidades no campo da saúde, do emprego e alvo e motor da violência, do que como sujeitos políticos de direitos, e, por isso, as ações governamentais destinadas a esse público, estavam voltadas para minimizar o potencial de ameaça trazido por ele à vida social:

Traçadas, sobretudo, a partir da associação jovens e problemas, as ações operaram campos de significados que permitem duplo deslizamento semântico possível e, portanto, práticas políticas diversas: os problemas que atingem os jovens expõem uma série de necessidades e demandas não atendidas que resultariam no reconhecimento do campo de direitos e de formulação de políticas globais para a juventude; ou, de forma mais recorrente, os problemas que atingem os jovens transformam-se nos problemas da juventude e, portanto, é o sujeito jovem que se transforma no problema para sociedade.[...]. (SPÓSITO, 2003, p.67).

A psicologia contribuiu muito para a confirmação dessa ótica através de um desenvolvimento teórico embasado no modelo normativo de crise e guiado por duas concepções: a concepção adultocentrista e a concepção de moratória social. Segundo explicam González e Guareschi (2009), a primeira supõe a obrigatoriedade de um conjunto de responsabilidades inerentes ao mundo adulto, submetido à regulação social e configurando o modelo adulto como norteador das transições para maturidade e responsabilidade social. Na concepção de moratória social, a transição entre infância e idade adulta confere ao jovem uma relativa liberdade, já que não se espera dele um posicionamento político ou profissional enquanto transita entre o mundo adolescente e o adulto.

Conforme observa Abad (2003), nessa concepção, a condição juvenil corresponde a uma etapa da aprendizagem para convenções, responsabilidades e papéis sociais da vida adulta, consistindo em diversas formas de privação de outras experiências socializantes e de autonomia. Autonomia é aqui definida como a capacidade da pessoa de elaborar suas próprias regras, efetuar racionalmente escolhas e gerir sua vida de forma livre e independente. Pappámikail (2010) afirma que, durante muito tempo, independência financeira era confundida com autonomização. A autora argumenta que as mutações contemporâneas possibilitaram que estas dimensões fossem consideradas como distintas: os jovens reivindicam ou assumem a autonomia, antes mesmo de conquistar sua independência financeira, hoje alcançada cada vez mais tardiamente.

González e Guareschi (2009) ressaltam que grande parte das pesquisas desenvolvidas se debruçou sobre a condição de transitoriedade, permeada pelo dualismo entre a juventude instável e impulsiva e o adulto estável e autônomo. Apoiado nessa visão de juventude, o discurso acadêmico e as instituições públicas criaram mecanismos regulatórios e legitimadores dos modos de ser e de viver dos jovens, culminando na sua institucionalização através da presença de agências encarregadas pela transmissão da cultura adultocêntrica hegemônica. A Psicologia apoiou-se nesse discurso para a elaboração de diagnósticos, elencando padrões de normalidade e patologias.

A concepção de moratória social enquadra o jovem num tempo de espera no qual ele se prepara para assumir o mundo adulto, tempo este em que é autorizado a fazer coisas ainda não toleradas na vida madura. Mas, ao mesmo tempo, há necessidade de controle por meio de instituições preocupadas em proteger e diagnosticar os indivíduos considerados ainda imaturos (GONZÁLEZ; GUARESCHI, 2009). Por sua vez, Groppo (2010) argumenta que este modelo de moratória social se assenta em paradigmas reformistas e desenvolvimentistas de transformação social, consistindo numa tentativa de homogeneização e almejando maior regulação social no processo de socialização dos jovens que, supostamente, atravessam um estágio frágil, perigoso e instável. Na realidade, segundo Abad (2003), esse tempo e espaço "liberados" foram mais bem caracterizados para os jovens de classes sociais onde a postergação das responsabilidades adultas foi legitimada socialmente. Para aqueles jovens de classes populares, o tempo e o espaço de espera tornam-se vazios, angustiantes e expõem a vulnerabilidades, pela falta de estudo, trabalho e outras alternativas de expressão cultural. Desse modo, esse modelo de moratória social deve ser analisado conforme as situações juvenis apresentadas nos mais diferentes recortes de classe, gênero e etnias.

No campo da psicologia, o conceito de moratória social foi primeiro apresentado por Eric Erikson, pioneiro nos estudos sobre o ciclo de vida e na delimitação de conceitos entre adolescência e idade adulta, baseado numa sequência normativa de fases e na descrição de mudanças que ocorrem no início da vida adulta. O modelo normativo de crise supõe que cada etapa do desenvolvimento é permeada por um conflito específico, levando o Ego a se adaptar aos sucessos e fracassos, reestruturando assim a personalidade.

A juventude na ótica eriksoniana é permeada, inicialmente, por um tempo no qual os indivíduos devem ensaiar diversos papéis de busca de sua identidade, vivendo um conflito central: identidade x confusão de papéis (ERIKSON, 1987). Nesta fase, o jovem exerce o direito de adiar as suas escolhas e responsabilidades, até chegar a um momento de assumi-las em consonância com seu Self, momento esse denominado de “moratória social”.

A transição do adolescente para a vida adulta, nessa perspectiva, assim como em todas as etapas do desenvolvimento, envolve uma sucessão de fases críticas ou momentos decisivos. O jovem que vive essa experiência de transição é denominado, por Erikson (1987), de Jovem Adulto, estando seus membros situados na faixa entre 20 e 30 anos, sendo o conflito central a Intimidade x Isolamento. A intimidade corresponde à capacidade de estabelecer laços afetivos com outras pessoas e no ambiente de sua própria profissão. Em contrapartida, o isolamento se caracteriza pela dificuldade de se comprometer com os outros e pela tendência do jovem a

distanciar-se destes e do mundo, vistos como invasores e ameaçadores da intimidade. A superação desse conflito leva o jovem a assumir responsabilidades para si e sua geração.

Neste modelo normativo de Erik Erikson, um ponto importante para a Psicologia é a consideração de que o desenvolvimento da personalidade não se esgota na adolescência, mas evolui ao longo da vida. Dessa forma, o Jovem Adulto apresenta marcos de transição, tão importantes quanto os outros ocorridos ao longo do ciclo vital, com destaque para o momento da maturidade para dar conta da reprodução e da autonomia.

Essa compreensão teórica tem desaparecido da paisagem dos livros didáticos e das pesquisas empíricas (STEINBERG; MORRIS, 2001), possivelmente por apresentar limitações, entre outras, em relação à construção da identidade orientada por parâmetros sociais estabelecidos pelo padrão masculino como normativo e pela exclusão de outros estilos de vida como solteiros, homossexuais, celibatários e casais sem filhos (PAPALIA; OLDS, 2000). No entanto, o trabalho de Erik Erikson inspirou outras perspectivas teóricas e pesquisas importantes inspiradas no modelo normativo de crise, trazendo como referência central o mundo adulto (concepção adultocentrista) para reflexão das transições juvenis, tais como os trabalhos de George Vailant, Daniel Levinson, Kenneth Keniston e, mais recentemente, Jefrey Arneth. Dentre eles, destaco alguns aspectos do trabalho de Arnett (2000), por apresentar alguns questionamentos e rupturas em relação às concepções e modelo de transições juvenis na ótica normativa e homogeneizante.

No que concerne às noções de adolescência e juventude os estudos no campo da Psicologia do Desenvolvimento mostram que não há uma delimitação clara e precisa entre elas na maioria das abordagens que as utilizam. Na sua pesquisa, Arnett (2000) constatou que poucos estudos enfocam as transições vivenciadas por jovens na faixa dos vinte anos, com as exceções notáveis dos estudos longitudinais, e propõe aos pesquisadores maior atenção para esse tema.

O autor reconhece, como Erik Erikson, a existência de um período de transição na passagem para a vida adulta, quando são exploradas novas possibilidades e direções nas áreas do amor, trabalho e visão de mundo, base para sua proposição de denominá-lo de Adultez Emergente. Considera que a Idade Adulta Emergente, abrange a faixa etária entre 18 e 25 anos, como um período teoricamente distinto da adolescência e do adulto jovem, devido à relativa independência de papéis sociais e de expectativas normativas que caracterizam o jovem deste grupo etário.

Embora reconheça as contribuições de Ekikson e os avanços de seus seguidores, para o tema da transição para a vida adulta, Arnett (2000) apresenta novas concepções para explicar

as transições juvenis. Argumenta que o conflito identidade x confusão de papéis, apresentado na teoria de Erikson (1987), se estende até após a adolescência nas sociedades industrializadas, configurando-se como uma identidade exploratória.

A identidade exploratória, um dos marcos nas transições juvenis, é permeada por incursões e experiências nos campos do amor, trabalho e visão de mundo de onde emergem a busca de experiências intensas ou incomuns, múltiplas possibilidades no curso de vida, e, ao mesmo tempo, a tomada de decisões duradouras. Arnett (2000) chama a atenção para esse período, que pode ensejar picos de comportamentos de risco pelo fato de o jovem ser menos monitorado pela sociedade e sentir-se menos constrangido em ocupar determinados papéis ou funções do que se estivesse já sendo considerado um adulto jovem. O autor observa ainda que há muito mais pesquisas voltadas para o comportamento de risco em adolescentes do que para o adulto jovem, o que deixa lacunas acerca dos picos deste tipo de comportamento nesse grupo etário.

De acordo com suas pesquisas, a identidade raramente tem sido alcançada no final da adolescência porque nem todos os jovens conseguem desenvolver independência econômica e autonomia devido às condições culturais e econômicas. Isso é visto, nas sociedades industrializadas, como transição prolongada, que adia papéis e responsabilidades de adulto além dos anos de escolaridade. Pesquisas recentes reforçam essa tese do autor, ao mostrar que novos arranjos na sociedade contemporânea prolongam o processo de transição dos jovens para a vida adulta. Um desses arranjos consiste na ampliação do tempo dedicado aos estudos e à formação da carreira, devido à exigência de maior qualificação para inserção profissional e pela escassez de oportunidades no mercado de trabalho. Outros arranjos relacionam-se à coexistência de novas estruturas familiares, à maior participação feminina no mercado de trabalho, às tensões entre vida familiar e vida profissional, entre outros. Uma tendência atual, no Brasil, tem sido nomeada de “Geração Canguru” para caracterizar a trajetória dos jovens que prolongam sua convivência familiar em busca de melhor dedicação aos estudos. Um em cada quatro jovens com idade entre 25 e 34 anos vive com os pais, apresentam maior escolaridade média e maior taxa de ocupação.Entre 2004 e 2013, a proporção de indivíduos nessa condição subiu de 21,2% para 24,6% (IBGE, 2014).

Arnett (2000) esclarece que a identidade exploratória envolve várias possibilidades no ciclo de vida e tomada de decisões duradouras, processo que se inicia na adolescência, mas ocorre principalmente na Idade Adulta Emergente. Essa compreensão nos leva a refletir acerca da necessidade de reconstrução da concepção de moratória social que suporta as perspectivas teóricas apresentadas anteriormente, centradas no jovem como aparente unidade. Outro

relevante argumento de Arnett (2000) consiste na afirmação de que as transições são marcadas pelo momento histórico-cultural, assim, a Adultez Emergente é um período no curso de vida culturalmente construído, não sendo universal, muito menos imutável. Portanto, considerando a relatividade das transições e múltiplas possibilidades de direção no seu percurso, o modelo adulto como referência, presente na concepção adultocentrista, parece também perder sentido, nessa perspectiva. Na atualidade, constatam-se novos modelos de ser e de viver; o emprego estável, a construção de família nuclear e os filhos não são mais formas privilegiadas pelos adultos emergentes. Eles buscam trajetórias, expectativas e habilidades sociais às vezes inversas ao padrão de vida adulta, a depender das orientações socioculturais predominantes, escolaridade, origem social, vínculo familiar e integração profissional.

Arnett (2000), em suas pesquisas, apresenta três principais proposições que explicam a dinâmica do Adulto Emergente. A primeira diz respeito à diversidade demográfica e à imprevisibilidade das trajetórias juvenis. O autor afirma que há uma ampla gama de variedades demográficas que se reflete na vontade individual do jovem, por isso não há uma demografia normativa, especialmente entre 18 e 25 anos, momento em que o status demográfico desta pessoa é de difícil previsão no campo da habitação, estado civil e escolaridade, ensejando formas distintas de inserção social e configurações identitárias.

A segunda proposição reconhece que o Adulto Emergente é distinto subjetivamente do adolescente. Ele não se vê como adolescente e nem como adulto, não há denominação oficialmente destinada para o período em que vive (ARNETT, 2000). Pesquisas realizadas pelo autor mostram que a idade é apenas um marcador das transições subjetivas do adulto emergente para o adulto jovem e que, neste momento, as características mais importantes como condição para se tornar adulto, são a construção da autossuficiência, a tomada de decisões autônomas e a busca de independência financeira.

A terceira proposição afirma que o Adulto Emergente difere do Adulto Jovem porque é definido, em alguma medida, por sua condição de heterogeneidade, passando por um período pouco normativo, com vários graus de exploração de escolhas e de condução gradual para a vida adulta. O autor adverte que esta condição de heterogeneidade não pode correr o risco de

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