• Nenhum resultado encontrado

Assis Brasil na trajetória dos “invisíveis”

1 QUATRO FACES DO PROCESSO LITERÁRIO BRASILEIRO DE ACORDO COM A

2.3 Campo literário e memória

2.3.1 Assis Brasil na trajetória dos “invisíveis”

As páginas seguintes constam de uma apresentação da trajetória do escritor-crítico, Assis Brasil, cuja configuração se faz como testemunho do contexto cultural de uma época. Foram utilizados como recurso metodológico para a elaboração deste tópico dados mnemônicos obtidos por meio de entrevistas que culminaram em um itinerário não apenas de suas experiências pessoais, mas também de outras histórias paralelas que, juntas, permitiram compreender melhor o espaço no qual Assis Brasil atuou. A elaboração do relato foi baseada nas experiências do crítico registradas tanto na entrevista Memória e aprendizado (2010), quanto na entrevista inédita O ziguezague da vida literária (2012). A despeito de as memórias não representarem lugar seguro, suscetíveis que estão aos contágios da imaginação, ambas podem ter pontos de confluências sem, de todo, coincidirem. Portanto, as fontes não invalidam o relato a seguir enquanto testemunho de uma época. Como foram as memórias do autor (lembradas ou imaginadas) a matéria-prima para a elaboração deste tópico, houve um

cuidado especial para que a linguagem utilizada não distorcesse o formato original de suas declarações.

Isso posto, vale retomar o pensamento de Paul Ricœur que, em A memória, a história, o esquecimento, com lançamento em 2000, lembra que uma longa tradição filosófica fez da memória uma província da imaginação. Na contracorrente dessa tradição que desvalorizou a memória, Ricœur procedeu a uma dissociação entre memória (voltada para uma realidade anterior) e imaginação (voltada para o fantástico). Elas teriam como traço comum a presença do ausente e como traço diferencial, de um lado, a visão do real anterior e, do outro, a visão do irreal. Assim, utilizando-se dos termos gregos mneme e anamnesis para designar, respectivamente, a lembrança como afecção passiva (phatos) e a lembrança como objeto de uma busca intencional (recordação), o autor difere a imaginação da rememoração (daquilo que, de fato, ocorreu). A ameaça entre rememoração e imaginação afeta, segundo ele, a ambição de fidelidade da memória, no entanto, conforme predicou, nada melhor que ela mesma para garantir que algo, de fato, aconteceu, antes de se transformar em lembrança.

A memória, reconheceu Ricœur, poderia se configurar como o equivalente fenomenal de um acontecimento físico. Um dos pontos que asseguraria tal distinção seria exatamente a ideia de que a memória pressupunha a existência de algo no passado. Para ele, só haveria

“mimética verídica ou mentirosa porque há, entre a eikon [imagem-lembrança] e a impressão

[registro dos acontecimentos], uma dialética de acomodação, de harmonização, de ajustamento que pode ser bem sucedida ou fracassar” (RICŒUR, 2007, p.32, grifo do autor).

Mesmo considerando o risco de fracasso ressaltado por Ricœur, foi o discurso oral de Assis Brasil (obtido por meio de gravação) a fonte priorizada no levantamento dos dados para a elaboração deste tópico, cujo intento é o de evidenciar a ótica assisiana sobre os meandros definidores do universo literário/cultural do qual fez parte e suas inexoráveis implicações sobre suas escolhas críticas.

Foi durante o período no qual ocorreram os encontros para a realização da entrevista que Assis Brasil recebeu o título de Doutor Honoris Causa concedido pela Universidade Federal do Piauí, em solenidade realizada na manhã do dia 12 de novembro de 2012, em Teresina, cidade que escolheu para residir, desde o ano de 2009. Citar esse fato é válido para que se possa destacar que em uma matéria jornalística sobre a solenidade de outorga do título, a repórter Carlienne Carpaso do portal O dia, destacou o seguinte fragmento do pronunciamento por ele feito: “Toda a minha vida é de caráter literário” (BRASIL apud CARPASO, 2012, s/p). De fato, até onde as leituras realizadas para esta pesquisa atestaram, a literatura foi, de fato, seu fundamento vital. Fatos determinantes na carreira do crítico serão

expostos por meio da narrativa de alguns episódios que revelam uma labuta, cujas consequências não trouxeram consigo as compensações almejadas. Desse modo, certo ressentimento atravessou o processo de retomada de suas memórias, talvez pelo fato do não reconhecimento em relação ao trabalho que desenvolveu.

Com o fim de elucidar a importância de trazer a narrativa de alguns acontecimentos marcantes na trajetória assisiana, fez-se também relevante expor categorias (pertinentes às causas expostas) que fazem parte do projeto teórico de Pierre Bourdieu, sociólogo francês que focalizou a importância da arte nas suas pesquisas, sobretudo, naquelas que vieram a público na segunda metade do século XX.

Segundo Bourdieu, o campo literário é, na verdade, um campo de forças e, por tal razão, haverá sempre nomes marginalizados, constatação que relativiza, histórica e sociologicamente, a noção de autonomia da arte, dadas as vinculações existentes que sobressaíram, desde o século XIX – como ressaltou em As regras da arte: gênese e estrutura do campo literário, 1992 –, entre o campo literário e o campo do poder que acabaram por transformar a literatura em uma verdadeira empresa literária, submetida que se tornou à política determinante do mercado editorial. A posição de cada agente no campo determina ganhos e perdas, pois todos estão em competições pelo domínio do “cabedal específico” de cada campo. A noção de campo, sobretudo, de campo literário foi pensada por Pierre Bourdieu com o fim de expor o confronto entre os agentes sociais para impor determinados interesses. No campo literário, ponderou, a luta se faz entre os agentes que dele participam, especialmente, pelo domínio de bens simbólicos; entre o escritor e as mais diversas instâncias legitimadoras da sua “existência literária”: editoras, agentes literários, imprensa, academias literárias, compadrios políticos, pertencimentos ideológicos, afinidades e laços. Nesse sentido, argumentou que

A história do campo é a história da luta pelo monopólio da imposição das categorias de percepção e de apreciação legítimas; é a própria luta que faz a história do campo; é pela luta que ele se temporaliza [...] engendra-se no combate entre aqueles que marcaram época e que lutam para perdurar e aqueles que não podem marcar época por sua vez sem expulsar para o passado aqueles que têm interesse em deter o tempo (BOURDIEU, 1996, p.181).

Com efeito, a imposição e a manutenção de categorias de apreciação, as quais Bourdieu denominou de habitus – modo de percepção condicionado pela lógica do campo que conduz a uma determinada forma de agir –, para legitimar uma dada posição no campo literário concorrem para o destaque de um nome em meio a um jogo no qual “existir é

diferir”. A forma como cada ator ou grupo engendra e projeta seus habitus se faz a partir da lógica do campo e da posição que cada um nele ocupa e/ou a que deseja ocupar. A movimentação interna do campo literário, normalmente, faz emergir alianças e concorrências geradoras de subcampos que, por seu turno, possuem dinâmica própria. Por conta das lutas internas é que alguns nomes são elevados e outros, diminuídos ou olvidados. Assim, Bourdieu

atesta que “o artista que faz a obra é ele próprio feito, no seio do campo de produção, por todo o conjunto daqueles que contribuem para o ‘descobrir’ e [o] consagrar enquanto artista ‘conhecido’ e reconhecido – críticos, prefaciadores, marchands etc.” (BOURDIEU, 1996,

p.193).

Como nenhum escritor ou crítico se faz ou constrói sua obra in vacuo, destacar alguns aspectos da categoria de campo literário, conforme os termos bourdieusianos, conferirá aos relatos assisianos projeção mais ampla, por evidenciarem que as lutas internas em decorrência da adesão ou recusa à doxa do campo implicam a criação de subcampos. Bourdieu, citando Michel Chaillou, referiu-se à “evocação literária da vida literária”, todavia, introduziu nesse processo de evocação, um elemento que julgou indispensável à devida compreensão da experiência literária: os “entornos negligenciados”, em outras palavras, os detalhes da vida e do cenário mais cotidiano da existência dos autores, visto que tais elementos são reveladores do modo como o escritor é produzido ou ignorado pelas mais diversas instâncias de legitimação do fazer literário.

Isso posto, serão dispostos alguns episódios referentes à vida literária de Assis Brasil que, embora envoltos, por vezes, de certo tom anedótico, revelam o lado sério dos embates travados no campo de produção dos bens simbólicos. Ao narrá-los, serão mostrados muitos daqueles “entornos” que patenteiam os descaminhos que contribuíram para o seu ainda desconhecimento no universo cultural, bem como para o de muitos escritores que tiveram lugar de destaque em sua crítica.

Em meio às diversas experiências narradas pelo crítico, terá destaque inicial uma situação na qual um editor o convidou a escrever o prefácio geral de uma coleção – com dez volumes – sobre a literatura russa, focalizando os contistas. Julgou que o convite foi feito devido a um ensaio que publicara, no SDJB, intitulado Paralelo: literaturas russa e brasileira, publicado em duas etapas, respectivamente, em 07 e 14 de outubro de 1961. A supervisão do projeto estava a cargo do enciclopedista Otto Maria Carpeaux , que faria o prefácio de cada volume, em particular. Como é sabido, ambos atuavam profissionalmente no mesmo espaço, então concorriam, algumas vezes, aos mesmos trabalhos. A introdução geral solicitada para o crítico piauiense foi entregue na data combinada, mas o pagamento,

informaram-lhe, seria efetivado na semana seguinte. Quando o autor da Tetralogia piauiense chegou à editora para recebê-lo, o diretor, de nome Jacob, hesitante, disse-lhe que o Sr. Otto Maria Carpeaux não havia aprovado o seu texto. A justificativa deveria ser plausível, pensou ele, visto que se tratava de um reconhecido e já consagrado crítico. Curioso ou ressentido, o crítico que teve seu texto recusado indagou o Sr. Jacob sobre o motivo da não aceitação, ao que este respondeu, “em meio a suores pudicos” que Sr. Otto Maria Carpeaux havia se negado a lê-lo, ameaçando, inclusive, desistir de fazer os dez prefácios, caso o editor insistisse em publicar o texto de Assis Brasil. Carpeaux era uma referência, portanto uma garantia de venda.

O argumento do editor revelou a submissão dos valores literários aos poderes do mercado, tal fato expôs a relação intrínseca entre o campo literário e o campo de poder, este – como lembrou Hermano Roberto Thiry-Cherques (2006) – é uma espécie de metacampo determinante das lutas em todos demais campos e subcampos. Diante da justificativa do Sr. Jacob, Assis Brasil concluiu que o motivo da desaprovação deveria ser uma crítica não elogiosa acerca de uma das publicações de Carpeaux, publicada em uma seção do SDJB chamada Tabela. Chegaram a Carpeaux comentários que diziam ser Assis Brasil o autor do texto, mas o crítico piauiense assegurou que havia sido Ferreira Gullar quem escrevera a tal crítica a Carpeaux.

O editor Jacob se despediu dele, devolvendo-lhe o texto rejeitado, mas, a contragosto, teve que pagar o valor combinado, pois o crítico decidiu que somente iria embora após a efetuação do pagamento, pois este não estava atrelado à vontade pessoal do outro prefaciador que sequer se dispusera a ler o texto. Assis Brasil ficou indignado com o fato de o enciclopedista não ter, pelo menos, apresentado razões baseadas em critérios profissionais para recusar seu texto, afinal ele já havia revelado todo o peso da sua erudição na monumental História da literatura ocidental, coleção em 8 volumes, lançada em 1947. Obra essa questionada, acrescentou, nos bastidores, por alguns críticos que diziam ser uma transcrição criativa e imponente, em português, de informações que o austríaco colhera de uma enciclopédia italiana, durante suas noites de insônia, conforme relatou Assis Brasil.

Boatos à parte, interessa aqui evidenciar as consequências de fatos como esse que, a princípio, podem parecer banais por força das vicissitudes do meio literário, mas são reprodutores das regras que regem as competições internas do campo literário. Anos mais tarde, Assis Brasil foi convidado para fazer a atualização de um livro escrito por Otto Maria Carpeaux, intitulado Bibliografia crítica da literatura brasileira, na sua quinta edição. Era uma espécie de dicionário com nomes e obras de autores brasileiros, que o convidado

considerou cheio de omissões suspeitas, uma vez que Carpeaux vetara o nome de autores de quem ele não gostava, como o de Dalton Trevisan, por exemplo. Assis Brasil acrescentou ao dicionário quarenta e sete novos nomes, inclusive, o do contista paranaense. A autorização para a coautoria foi concedida por um parente de Carpeaux, pois este havia falecido, naquele ano, 1978, antes da reedição e o crítico piauiense foi o escolhido pelo editor para ampliar o trabalho que o crítico austríaco havia deixado incompleto. Esse fato quase anedótico, embora de cunho aparentemente pessoal, mostra como o métier da crítica literária está perpassado por atitudes passionais e/ou políticas que têm, inexoravelmente, implicações diretas na fixação do cânone. Por motivos semelhantes, não raramente, as omissões indevidas se alastram, autores ficam sem menção em obras críticas, por razões que se distanciam, sobremaneira, de procedências estéticas.

Tais comentários são faces especulares de uma concepção que se assomava de modo veemente, sobretudo, pelo que projetava de bloqueios, por força das instâncias e dos mecanismos de consagração mais centralizadores. A narração do crítico, presentificando episódios passados, fez com que suas lembranças atravessassem os corredores impiedosos do esquecimento, sobretudo, no que concerne aos critérios valorativos por ele empunhados na defesa da nova crítica, bem como da Crítica reflexiva – ambas centradas nos elementos intrínsecos da obra – ao se referir a alguns escritores marginalizados menos por questões focadas no talento literário de suas produções que nas influências e hierarquias do campo de produção de bens culturais e simbólicos. O ressentimento foi expulso por meio dos ecos de sua revolta pelas omissões injustas que permeiam o universo literário. Assim, não usou meios termos para dizer, na entrevista Memória e aprendizado, que o não reconhecimento de obras da magnitude daquelas produzidas por Maura Lopes Cançado, por exemplo, deu-se por força da marginalidade que acomete os esquizofrênicos e não pela escassez de sua obra.

Há de se ponderar aqui recorrentes declarações de mea-culpa por parte de críticos ou intelectuais por conta de radicalismos e juízos intransigentes cometidos não em virtude de questões ligadas ao mérito literário das obras, mas por terem embraçado ideologias que se revelaram tão falíveis quanto os juízos feitos em decorrência delas.

No que tange a este aspecto, Assis Brasil enfatizou que, sobretudo, nos anos imediatamente anteriores à implantação do estado de exceção no país, houve um grupo – com um considerável número de pessoas influentes no setor editorial – que exigia do escritor, como condição para editá-lo ou para lhe dispor espaço na mídia, sua participação na esquerda partidária. Tratava-se de um grupo ao qual o crítico chamou, seguindo uma terminologia em

voga, de Esquerda festiva25, do qual destacou os nomes de Ênio Silveira, Carlos Heitor Cony, Paulo Francis, Nelson Werneck Sodré, Nelson Coutinho, Leandro Konder e outros, que

“costumavam se reunir no hall do Hotel Ok, no centro do Rio de Janeiro, para tomar uísque”,

conforme suas palavras. A revelação desses excessos é imprescindível para desequilibrar a dualidade simplista esquerda versus direita, muitas vezes, utilizada para pensar esse período da história brasileira.

Por outro lado, não se pode concluir que o grupo ao qual o crítico se referiu como Esquerda festiva não tenha uma marca de reação crítica legítima. Nelson Werneck Sodré, para citar um nome, produziu obras de grande peso intelectual e atentas às injustiças cometidas pelo regime militar. Muitos desses intelectuais sofreram perseguições por parte do sistema que lhes renderam danos concretos em diversos aspectos: psicológicos, materiais e físicos, sem mencionar o exílio forçado a que tantos foram submetidos.

O desconforto maior de Assis Brasil se deteve em aspectos que puseram em risco a independência crítica e literária, perseguida de modo tão febril por ele, que dizia ter ousadia e satisfação de escrever sobre livros de estreia, independente do partido político do escritor em questão. Nesse sentido, sentiu-se indignado quando um escritor que lhe era muito caro, José J. Veiga – cuja obra, afirmou ele, foi o primeiro crítico a comentar, dando-lhe amplo espaço em sua página no SDJB – quando do lançamento de Os cavalinhos de Platiplanto (1959), seu livro de estreia, sofreu coerção por parte de Ênio Silveira que, para editá-lo pela Civilização Brasileira, exigiu sua participação esquerdista. Assis Brasil não hesitou em mostrar sua revolta com a postura do “editor festivo”, que também se recusou a editar livros de Samuel Rawet e de Clarice Lispector por considerá-los alienados. Ênio Silveira, acrescentou ele, sempre quis competir com José Olympio, todavia diversos autores, como Dalton Trevisan, por exemplo, deixaram sua editora, justificando a falta de profissionalismo do editor que não pagava os direitos autorais corretamente. A concorrência, segundo Assis Brasil, à época, sempre deixou a Civilização Brasileira em desvantagem, pois José Olympio publicava autores de diversos segmentos sociais e políticos.

Muitos que não pertenciam à esquerda partidária, enfatizou o crítico, foram excluídos, como foi o caso do romancista baiano Adonias Filho, cuja obra romanesca foi analisada cuidadosamente por Assis Brasil, inclusive, em um ensaio publicado em livro, no ano de

25 Henrique Veltman explica a expressão esquerda festiva no Jornal ASA: “O Zuenir Ventura conta em seu livro

1968, o ano que não terminou que a expressão teria sido inventada pelo colunista Carlos Leonam, em 1963. O ministro San Thiago Dantas declarou a ele que havia duas esquerdas no Brasil: ‘a esquerda positiva e a esquerda negativa’. Leonam replicou: ‘Tem outra esquerda, é a esquerda festiva’. A expressão foi publicada no JB, na entrevista com o ministro” (VELTMAN, 2010, p.8).

1969. Segundo Assis Brasil, Adonias Filho nunca hesitou em interceder, junto a seus amigos militares, a favor de escritores e intelectuais de esquerda. Lembrou o crítico que, quando trabalhava na Tribuna da imprensa, um jornal de oposição à ditadura, por volta de 1967, recebeu uma ligação de José Paes de Andrade, ligado ao cinema, dizendo-lhe que havia sido preso por frequentar a Cinemateca do Museu de Arte Moderna (MAM), considerada, na época, como um reduto de comunistas. José Paes lhe sugeriu que procurasse Adonias Filho na Biblioteca Nacional. Este, ao ver Assis Brasil entrar, de pronto, indagou-lhe quem ele queria que fosse solto, prontificando-se para ajudá-lo – “os gestos de solidariedade, acima de qualquer corrente política, não entram na história”, e lamentou que Adonias Filho não tenha ainda o reconhecimento do qual sua obra é digna.

Assis Brasil destacou que um editor novo naquele período, Gumercindo Rocha Dória criou as edições GRD que – ao publicar vários autores estreantes, como Rubem Fonseca e Nélida Pinõn – foi duramente insultado por Ênio Silveira pelo fato de ter sido membro do partido de Plínio Salgado. Certa feita, Ênio Silveira jogou na sarjeta todos os livros das edições GRD que viu expostos em sua loja, esbravejando que eram livros editados por um fascista e demitiu, logo em seguida, o funcionário responsável pelas aquisições, Geraldo Magela. Atitude de um “fascista esquerda festivo”, lamentou o crítico.

A discordância assisiana no que diz respeito ao estreito vínculo entre política e literatura já havia sido expressa no quarto volume do seu ensaio A nova literatura 1975, em um capítulo intitulado Crítica ideológica e afins, bem como ao longo de toda a defesa dos princípios que regiam tanto a nova crítica quanto a Crítica reflexiva. Todavia, no que concerne à sua produção ficcional, ele demonstrou forte pendor social, colocando em cena, em grande parte de sua ficção, protagonistas como: prostitutas, suburbanos, trabalhadores de baixa renda, presos políticos, enfim, representantes do lumpemproletariado, para usar uma expressão marxista.

Durante os anos de ditadura militar, é sabido que muitos intelectuais assumidamente de esquerda tiveram suas obras censuradas pelo próprio partido. Além disso, existiram artistas