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Autonomia das escolas: uma política do topo para a base imposta às 43

2. Análise em sede comparada da descentralização, (recentralização, redescentração) e

2.2 Autonomia das escolas: uma política do topo para a base imposta às 43

A autonomia das escolas, em termos ideais, deveria estar a par da participação local, na medida em que, historicamente, este princípio de gestão escolar está fortemente ligado à pretensão de liberdade de ensino por parte dos intervenientes no plano local, tais como os directores e os encarregados de educação, entre outros. No entanto, acabou por se assistir, na Europa, desde os anos 80 a que estas reformas tenham sido largamente

delineadas segundo quadros jurídicos nacionais, “ilustrativos de um modelo de processo decisório que parte do topo para a base, sem intervenção de qualquer força impulsionadora tangível emanada das próprias escolas” (Eurydice, a Rede de Informação sobre Educação na Europa, 2007, p.13)

De facto, na maior parte dos países europeus, as medidas de autonomia das escolas foram e são definidas no âmbito de um corpo normativo de leis jurídicas nacionais e que são impostas a todas as escolas.

Contudo, registam-se algumas diferenças, na medida em que nalguns casos, as novas responsabilidades das escolas foram atribuídas ao abrigo de regulamentos gerais que abrangiam um vasto conjunto de domínios do sistema escolar e que não tinham, portanto, a autonomia das escolas como seu principal objectivo. Inscrevem-se nesta categoria os países que referiremos em seguida. Foi o que aconteceu em Espanha, em que as leis e regulamentações sobre educação foram elaboradas e adoptadas no contexto da descentralização progressiva, em que se reconheceu às Comunidades Autónomas o direito de regulamentar a autonomia dos seus estabelecimentos de ensino, estabelecendo ao mesmo tempo um quadro de base geral que conduziu a uma estrutura relativamente homogénea nesta matéria a nível nacional. Em França, as primeiras leis de descentralização atribuíam um estatuto único de Etablissement Public Local d`Enseignement (Escola Pública Local) às instituições do nível 2 da CITE ( Classificação Internacional Tipo da Educação), e conferiam-lhes o estatuto de pessoa colectiva, condição necessária para adquirirem a autonomia de gestão Na Polónia, a Lei do Sistema Educativo, de 7 de Setembro de 1991, surgiu associada à Lei das Autarquias Locais, de 8 de Março de 1991, e como consequência defendia-se igualmente, quer os novos poderes das autarquias locais em matéria de educação como a transferência de responsabilidades para as escolas. No Reino Unido (Inglaterra e País de Gales), a Lei da Reforma Educativa de 1988 transferiu para as escolas muitas das responsabilidades anteriormente detidas pelas “autoridades educativas locais”. Reformas semelhantes foram introduzidas pelo Decreto da Reforma Educativa (Irlanda do Norte) de 1989. Em Itália também se registou esta tendência, tendo ido mais longe, ao consagrar no art.º 117.º da Constituição, que reconheceu, a partir de 2001, a autonomia dos estabelecimentos de ensino. A Grécia inscreve-se também nesta categoria.

Numa segunda categoria, menos frequente, engloba alguns países que estabeleceram regulamentos relativos à autonomia das escolas ao abrigo de legislação especificamente destinada a esse fim. Inscreve-se aqui o Luxemburgo que adoptou 44

legislação específica (a Lei de 25 de Junho de 2004) para a gestão das escolas secundárias gerais e técnicas (lycées e lycées techniques) que abre caminho a um projecto-piloto de autonomia das escolas. Igualmente se inscreve nesta categoria Portugal que, com o Decreto de 1998, pretendeu definir o enquadramento da autonomia das escolas.

A tendência para a aprovação de legislação específica, aliada às novas correntes de pensamento que se enformavam as reformas, disseminou-se em maior grau a partir do ano de 2000. Refere-se, ainda, neste estudo (Eurydice, a Rede de Informação sobre Educação na Europa, 2007. p.13), que “daí em diante, a autonomia das escolas tornou-se um fim em si mesmo, deixando de depender de reformas mais gerais no plano nacional ou de preocupações relacionadas com a modernização da administração pública”.

A terceira categoria, mais rara, tem lugar em alguns países que definem a autonomia das escolas recorrendo a regulamentos administrativos mais flexíveis, também mais adaptáveis, e emitidos por órgãos executivos. Inscrevem-se nesta categoria alguns Länder alemães, como por exemplo, o de Baden-Württemberg, com um projecto denominado “A Autonomia das Escolas e a Gestão da Educação no Ano Lectivo de 2006/2007”, ou na Baviera, que desenvolveu um programa de “transferência de liderança” no âmbito do projecto administrativo Projecto-Piloto Modus F.

Qualquer que tenha sido o modelo escolhido, tal como, legislação geral em matéria de educação, ou legislação específica ou regulamentos mais flexíveis, é aceite que a autonomia foi determinada ao nível central, através de procedimentos legislativos, o que permite afirmar que foi imposta às escolas em quase todos os países. A legislação estabeleceu a transferência de novas obrigações para as escolas sem que estas tivessem tido direito a exprimir o seu ponto de vista sobre a matéria. De facto, as escolas adquiriram novas responsabilidades à revelia das suas pretensões. (Eurydice, a Rede de Informação sobre Educação na Europa, 2007, p.14). O estudo da Eurydice exceptua o caso de Portugal e os Länder da Renânia-Palatinado, como os únicos casos em que as escolas tiveram a possibilidade de participar ou não nos projectos – piloto. No caso da Inglaterra, todas as escolas passaram a assumir amplas responsabilidades no domínio financeiro e de gestão, havendo algumas escolas que têm mais liberdade/responsabilidade noutras áreas, para além das aqui referidas.

Em relação à participação dos agentes educativos neste processo de autonomia das escolas, foi muito limitado, quando não era de esperar. Suponha-se que os agentes educativos estivessem na vanguarda do movimento da autonomia das escolas, ou tivessem

um papel importante neste processo. Acontece que, em alguns países, os representantes dos agentes educativos foram, quando muito, consultados acerca dos planos das reformas.

Em síntese e no “cômputo geral, após três décadas de uma enorme mudança, a política de autonomia das escolas está hoje generalizada na maioria dos países europeus. Recorreu-se a uma abordagem do topo para a base, que criou um quadro sólido para as novas liberdades das escolas” (Eurydice, a Rede de Informação sobre Educação na Europa, 2007, p. 15).