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Canário (1992, pp.9-10) escreve que “o reforço da autonomia dos estabelecimentos de ensino é uma tendência geral, particularmente marcante em países de tradição centralizadora, nos quais se inclui Portugal e outros países do sul da Europa, nomeadamente a Espanha e a França.” Também Maria Beatriz Canário afirma que em diferentes países da Europa do Sul que têm em comum a centralização da administração do ensino, a ideia de projecto educativo de escola aparece quase simultaneamente, em geral associado a uma política de descentralização, e começa a ter consagração oficial no princípio dos anos 80.

Em França, a expressão aparece pela primeira vez num texto legal de 1980, no qual se afirma que a missão essencial dos directores de escolas do 2.º grau é «propor um projecto educativo global, uma política de escola, assegurar a sua coordenação e realização» (circular de 24 de Outubro de 1980 sobre recrutamento de directores de escolas do 2.º grau).

Em Portugal, a primeira menção num texto oficial é também de 1980, no Estatuto do ensino Particular e Cooperativo (decreto-lei n.º 553/80, de 21 de Novembro). Não podemos considerar que o uso da expressão no contexto do estatuto seja particularmente inovadora, pois tradicionalmente tem sido reconhecido às escolas particulares o direito a «ter um projecto educativo próprio». É no contexto da aplicação da Reforma que se segue à aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86, de 3 de Fevereiro) que surge a consagração legislativa do projecto educativo de escola em Portugal. O decreto-lei que regulamenta a autonomia das escolas do 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário (decreto-lei n.º 43/89, de 3 de Fevereiro)

Segundo Beatriz Canário “Projecto educativo e autonomia da escola são duas realidades indissociáveis” (1992, p. 110).

Rui Canário considera que “o Projecto Educativo surge como o instrumento, por excelência, da construção da autonomia do estabelecimento de ensino” (1992, p.12).

A reforma educativa não se pode realizar sem a reorganização da administração educacional […] transferindo poderes de decisão para os planos regional e local», estabelecendo que a autonomia da escola se concretiza:

“ Na elaboração de um projecto educativo próprio, constituído e executado de forma participada, dentro de princípios de responsabilização dos vários intervenientes na vida escolar e de adequação a características e recursos da comunidade em que se insere”, e apresentando no artigo 2.º, do referido diploma, o conceito de autonomia do legislador, esclarecendo: “Entende-se por autonomia da escola a capacidade de elaboração e realização de um projecto educativo em benefício dos alunos e com a participação de todos os intervenientes no processo educativo”. Pelo mesmo decreto são transferidas genericamente competências no plano cultural, pedagógico e administrativo para as escolas dos níveis de ensino referidos (Canário, B., 1992, p.111).

O Decreto-Lei nº 43/89, de 3 de Fevereiro, define o regime jurídico da autonomia das escolas, consubstanciado num PE concebido por cada instituição. O decreto-lei nº 115- A/98, de 4 de Maio, com as alterações introduzidas pela Lei nº 24/99, de 22 de Abril, confere à escola a centralidade no que às políticas educativas diz respeito, pretendendo-se que cada escola possa gerir melhor os respectivos recursos educativos, de forma a poder desenvolver o respectivo projecto educativo. Este deve responder adequadamente às finalidades educativas prescritas na Constituição da República Portuguesa e à Lei de Bases do Sistema Educativo.

Concordamos com Barroso quando afirma, “embora a elaboração de um projecto educativo possa trazer um real benefício às escolas, não se trata de uma panaceia para os seus problemas. Para conhecer as suas potencialidades e os seus limites é importante situá- lo num contexto mais técnico, enquanto fase do próprio processo de planificação e gestão de uma organização (1992, pp. 19-20).

Defende Barroso que se deve articular a elaboração do projecto de escola com a criação de uma relação contratual entre as escolas e a administração do sistema, na medida em que:

“a realização do projecto de escola exige competências e meios que habitualmente estavam concentrados nos serviços do Ministério da Educação. O projecto não pode servir para a Administração transferir responsabilidades, sem dar as possibilidades correspondentes. Por isso, é necessário que a elaboração de um projecto de escola envolva sempre a realização de um contrato que defina as obrigações das partes (escola e administração central e regional) em relação aos meios necessários à sua concretização” (1992, p.53).

Segundo Berta Macedo (1995) a Autonomia e o PEE assentam nos mesmos pressupostos, isto é, ambos exigem a construção do sentido da política educativa de escola; ambos potenciam a construção da identidade; ambos devem fazer uma gestão de dependências; têm de ter uma lógica de funcionamento e ambos exigem ou devem exigir a definição de uma política de melhoria.

Síntese do capítulo

Partindo da consideração da importância da ideia de projecto na nossa vida diária, transpusemo-la para a educação. Segundo Barroso, terá sido a partir da década de 80, do século XX, que as autoridades escolares associaram o reforço da autonomia dos estabelecimentos de ensino através da elaboração e execução de um Projecto Educativo. Em virtude de o Projecto Educativo ter aparecido contextualizado em políticas de sentido diferente, em vários países, procedemos a uma alusão ao efeito contaminação.

Em Portugal, a obrigatoriedade imposta às escolas de elaborarem um PEE, tem subjacentes preocupações de eficiência, eficácia, qualidade e avaliação, como forma de afastar práticas intuitivas de gestão escolar, em que se pretende assegurar uma maior e melhor rentabilização de recursos e menos despesismo com a educação, potenciando uma maior e melhor racionalização escolar.

Tentamos neste capítulo proceder a uma análise mais detalhada da génese, elaboração, implementação, concepções, objectivos e finalidades do PEE. Tal deve-se ao facto de o Projecto Educativo e autonomia da escola serem duas realidades indissociáveis (Canário, B., 1992), e ainda pelo facto de o Projecto Educativo surgir como o instrumento, por excelência, da construção da autonomia de cada escola ou agrupamento de escolas (Canário R., 1992).