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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.6 AVALIAÇÃO NA ALFABETIZAÇÃO

2.6.1 Avaliação da aprendizagem dos alunos

O modelo tradicional de ensino, baseado na promoção do aluno de uma série para outra, pressupõe uma avaliação centrada em provas para avaliar conteúdos trabalhados de forma linear e submetem o aluno a um ambiente onde a ameaça de reprovação acaba sendo uma forma de motivação e controle da disciplina escolar. Essa forma de avaliação é autoritária, classificatória e excludente, conduzindo muitos alunos, principalmente os de classes menos favorecidas economicamente, ao fracasso e abandono escolar. Dificilmente um aluno brasileiro que passe pelo ensino fundamental, chegando ao ensino médio e ao superior, deixa de vivenciar essa realidade. A avaliação, na prática escolar tradicional, se destina a certificar o nível de cada criança de acordo com o que esperamos dela. O bom aluno recebe elogios, enquanto o aluno com menos recursos recebe comentários desvalorizadores, mesmo que dados com carinho. Dessa forma, a avaliação serve para confirmar uma hierarquia dentro da sala. (CURTO; MORILLO; TEIXIDÓ, 2000).

As críticas ao ensino tradicional e à consequente forma de avaliação, advindas de reflexões de origem social, política e de avanços nas pesquisas relacionadas ao ensino e à aprendizagem, têm proporcionado outras ideias acerca de uma função mais adequada para a avaliação:

[...] o elemento essencial, para que se dê à avaliação educacional escolar um rumo diverso ao que vem sendo exercitado, é o resgate da sua função diagnóstica. Para não ser autoritária e conservadora, a avaliação terá de ser diagnóstica, ou seja, deverá ser o instrumento dialético do avanço, terá de ser o instrumento da identificação de novos rumos, Enfim, terá de ser o instrumento do reconhecimento dos caminhos percorridos e da identificação dos caminhos a serem perseguidos. (LUCKESI, 2000, p. 43).

Logo, a função de diagnosticar não deve ser considerada como um fim, mas, sim, como ponto de partida para novas interrogações e desafios. Como esclarece

Hoffman (2000, p. 58), “A avaliação é a reflexão transformada em ação, não

podendo ser estática nem ter caráter sensitivo e classificatório”. Não se idealiza, de

fato, um processo de avaliação sem que este vislumbre uma construção contínua e mediadora.

Nesse sentido, pode-se destacar conceitos mais atuais que têm norteado as discussões sobre a função da avaliação, como o de diagnóstico e monitoramento. Neste caso, a perspectiva é de uma avaliação formativa, não só relacionada aos procedimentos do professor, mas também aos do aluno. Para Curto, Morillo e Teixidó (2000), a avaliação deve ser formativa, isto é, funcionar de modo que o aluno possa ver com clareza em que aspectos está melhorando, em que aspectos se encontra estacionado e, principalmente, em que direção pode e deve avançar. Assim, o aluno deve se tornar consciente do processo de aprendizagem e de como controlá-lo. Os autores afirmam que, para uma avaliação ser realmente formativa, deve conduzir o aluno, fazendo com que tenha uma consciência clara de si mesmo perante a aprendizagem.

É necessário que o aluno – com ajuda do professor ao avaliá-lo – identifique suas próprias dificuldades e seus recursos. Que identifique, por exemplo, quando a compreensão de uma palavra lhe escapa; em que situações concretas tem dúvidas ortográficas que merecem reflexão; que perceba quando se produz um erro de decifração que altera a compreensão do texto. Nisto deve consistir, em nossa opinião, a avaliação formativa. (CURTO; MORILLO; TEIXIDÓ, 2000, p. 215).

Segundo os autores, o conhecimento de si mesmo é relacionado à atitude e à predisposição para aprender, que dependem do autoconceito acadêmico. A imagem de si mesmo é determinante do êxito ou fracasso em tarefas escolares (CURTO; MORILLO; TEIXIDÓ, 2000, p. 215).

As reflexões acerca da utilização de uma função mais adequada para a avaliação podem ser observadas nos documentos elaborados pelo MEC. Com relação ao Programa Pró-Letramento, a defesa é por uma avaliação de dimensão formadora, fonte de informação para formulação de práticas pedagógicas, com registros ao longo do processo que ajudem na compreensão e descrição dos desempenhos e das aprendizagens dos alunos, com ênfase em progressões e demandas de intervenção pedagógica. Nessa perspectiva,

A dimensão formativa ou continuada da avaliação tem uma função diagnóstica, processual, descritiva e qualitativa, capaz de indicar os níveis já consolidados pelo aluno, suas dificuldades ao longo do processo e as estratégias de intervenção necessárias a seus avanços. Envolve, portanto, sistemas mais abertos de avaliação, a serviço das orientações das aprendizagens dos alunos e não apenas do registro burocrático de seus resultados. (BRASÍLIA, 2008, fasc. 2, p. 7).

O programa de formação posterior ao Pró-Letramento, Pacto Nacional pela

Alfabetização na Idade Certa – PNAIC, também indica que a avaliação dos

estudantes envolve a dimensão formativa ou continuada em detrimento de uma avaliação meramente técnica ou burocrática. Segundo o documento,

[...] a avaliação precisa ser feita para garantir as aprendizagens e não para punir os que não aprenderam – como outrora acontecia nas escolas de todo o mundo. O foco é em uma avaliação formativa, voltada para a redefinição permanente das prioridades e planejamento contínuo do fazer pedagógico. As avaliações diagnósticas utilizadas para conhecer as crianças e detectar quais saberes elas já dominam são pontos de partida para planejar estratégias para aproximá-las da escola. (BRASIL, 2012, p. 22).

A proposta é que, com base nos dados de avaliações diagnósticas, se possa definir quais estratégias usar, considerando também o tempo previsto para as aprendizagens. Por isso, deve-se ter clareza acerca da importância de avaliar para ensinar. O professor deve saber o que avaliar e também deve saber construir instrumentos adequados de avaliação, que possibilitem compreender a aprendizagem das crianças. Nesse processo,

A coordenação pedagógica tem o papel de promover situações de socialização entre os docentes sobre seus instrumentos de avaliação e resultados obtidos pelos estudantes. Desse modo, é importante estimular a existência de colegiados de avaliação para que a equipe pedagógica analise cada caso e possa decidir coletivamente quais são as melhores estratégias para garantir as aprendizagens. (BRASIL, 2012, p. 23).

No documento está explícita a proposta de que o professor considere como

instrumento de avaliação a Provinha Brasil20 e outras avaliações de larga escala,

bem como portfólios, diários de aprendizagem, cadernos de registro, entre outros modos de protocolar e acompanhar a progressão das crianças. Todos os instrumentos e estratégias de avaliação devem ajudar os profissionais da escola a definir metas e planejar ações que possibilitem a progressão de todas as crianças (BRASIL, 2012, p. 24). Resta saber de que forma essas recomendações

20 “A Avaliação da Alfabetização Infantil – Provinha Brasil é uma avaliação diagnóstica que visa investigar o desenvolvimento das habilidades relativas à alfabetização e ao letramento em Língua Portuguesa e Matemática, desenvolvidas pelas crianças matriculadas no 2.º ano do ensino fundamental das escolas públicas brasileiras. Aplicada duas vezes ao ano (no início e no final), a avaliação é dirigida aos alunos que passaram por, pelo menos, um ano escolar dedicado ao processo de alfabetização. A aplicação em períodos distintos possibilita a realização de um diagnóstico mais preciso que permite conhecer o que foi agregado na aprendizagem das crianças, em termos de habilidades de leitura e de matemática”. (INEP, 2014b).

relacionadas à avaliação dos estudantes e indicadas nos documentos oficiais do MEC têm sido incorporadas pelos professores e escolas.

As recomendações do MEC com relação à avaliação dos alunos são similares às apresentadas por Curto, Morillo e Teixidó (2000). Quanto aos instrumentos de avaliação, os autores lembram que, sendo a avaliação um processo contínuo, cada uma das atividades escolares deve ser avaliada de acordo com suas características concretas, ou seja, de cada texto, de cada situação.

A avaliação contínua da aprendizagem do aluno não requer o planejamento de atividades específicas de avaliação, diferenciadas da prática cotidiana da aula, mas um conjunto de elementos integrados em cada uma das atividades de classe que começam já no planejamento da atividade, são ajustadas no seu transcurso e são registradas mediante instrumentos simples e práticos. Em cada atividade, é realizada a avaliação considerando os objetivos de ensino, as características do tipo de atividade e as possibilidades e requisitos do tipo de texto que será utilizado. (CURTO; MORILLO; TEIXIDÓ, 2000, p. 217).

Os autores sugerem que o primeiro passo do processo de ensino é avaliar os conhecimentos e possibilidades de aprendizagem do grupo de alunos. Para cada atividade, o professor deve investigar junto aos alunos os conhecimentos que eles possuem acerca do tema – por exemplo: tipo de texto –, ajustando a orientação e a atividades a esse conhecimento. Os autores recomendam que o professor utilize uma pauta de avaliação inicial, relacionada ao nível de construção do sistema alfabético, com o intuito de observar e registrar as diversas hipóteses de cada criança. (CURTO, MORILLO; TEIXIDÓ, 2000, p. 216).

Com relação à avaliação contínua da aprendizagem dos alunos, os autores defendem que seja realizada a avaliação das atividades ao invés de atividades de avaliação. Os autores discordam da arraigada concepção escolar de se diferenciar as atividades cotidianas destinadas ao ensino das atividades destinadas à avaliação, que muitas vezes não correspondem ao que realmente foi ensinado às crianças. Dizem que a tradição de ofertar atividades avaliativas ao final de um período de ensino para medir a aprendizagem, que refletirá em documento escrito destinado aos pais, está vinculada à noção de exame, de medida, de qualificação e classificação.

Em lugar desse tipo de avaliação, os autores propõem a avaliação contínua das atividades de aprendizagem desenvolvidas em classe. Sugerem que o trabalho com uma sequência didática para o ensino de um gênero, por exemplo, possibilita

ao professor avaliar vários aspectos ao fazer os estudantes explicá-lo, lê-lo e escrevê-lo, por meio de diversas atividades. O professor vai avaliando constantemente o progresso dos alunos durante o andamento das atividades e acompanhando de perto o processo de aprendizagem. Os autores apontam alguns riscos e limitações relacionados à avaliação tradicional e a forma de evitá-los: o não registro das observações pelo professor, incorrendo em uma valorização subjetiva do nível alcançado pelos alunos (o correto é a observação e registro sistemático de algum aspecto determinado); a fragmentação das observações, ao recolher aspectos pontuais desconectados uns dos outros, que não permitam uma visão de conjunto da aprendizagem dos alunos acerca da linguagem escrita (o correto é diversificar as atividades e registros de observação, contemplando aspectos da oralidade, da leitura e da escrita), e ao deixar de observar algum aluno que não participa mais ativamente por timidez, por exemplo (o correto é organizar a aula e a atividade de forma que, em grupos reduzidos, o professor possa acompanhar o desempenho de todos). O professor deve avaliar diversas atividades, selecionando e escolhendo as situações mais significativas de cada aluno, não sendo necessário avaliar todos ao mesmo tempo e por meio da mesma atividade. (CURTO; MORILLO; TEIXIDÓ, 2000, p. 227).