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Bens excluídos da comunhão, reservados, particulares ou incomunicáveis 109

CAPÍTULO 3 – REGIME LEGAL: estudo sobre a opção legislativa 90

6.   Bens excluídos da comunhão, reservados, particulares ou incomunicáveis 109

A comunhão parcial é necessariamente mais limitada do que a comunhão universal. Consiste sua redução na exclusão dos bens particulares de cada cônjuge dos bens comuns.

Identificar um bem como reservado ou comum cabe à lei. O artigo 1659, do Código Civil de 2002, enumerou sete hipóteses de exclusão desses bens.

I. “Os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar”.

É da própria origem da comunhão parcial que os bens que cada cônjuge possua antes do casamento não comunique ao outro, fazendo parte, dessa maneira, dos bens reservados.

Sobre os bens adquiridos na constância da sociedade conjugal, nem sempre haverá comunicação integral de todo patrimônio. Bens doados só integrarão o patrimônio comum caso o doador informe que o casal será donatário, caso contrário o bem recebido fará parte dos bens particulares daquele que recebeu a doação.

O artigo 31 do Decreto-lei n° 3.365/41, reza que “ficam subrogados no preço quaisquer ônus ou direitos que recaiam sobre o bem expropriado”. Por isso, compreende-se que a indenização importa sub-rogação do bem doado.

Há ainda a possibilidade de cláusula de reversão, de acordo com o artigo 547, do Código Civil de 2002.209 Morrendo o donatário, o bem não fará parte de sua herança, mas sim retornará ao patrimônio do doador sobrevivo.

No regime da comunhão parcial o cônjuge viúvo é meeiro dos bens comuns e herdeiro dos bens reservados. Dessa maneira, de modo algum o bem cairá nas mãos do cônjuge supérstite.

Quando algum dos cônjuges receber herança de parente seu, não haverá comunicação desse patrimônio com os aquestos do casamento. Trata-se de direito pessoal.

Sempre que ocorrer a venda de um bem reservado, para que esse continue integrando o monte dos bens particulares, deverá ser ressalvado no título sua condição.

No ingresso dos nubentes no regime da comunhão parcial, para que não haja demanda desnecessária, ideal seria que se resguardasse via pacto antenupcial todos os bens que ambos possuem ao casar. Por óbvio que é possível fazer essa prova após o casamento, mas também com certeza será mais desgastante.

                                                                                                                209

Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, artigo 547 - “O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário”.

II. “os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares”.

Por sub-rogação entende-se que um bem foi alienado e posteriormente, ou no mesmo ato, outro foi colocado em seu lugar.

ZENO VELOSO faz um entendimento mais profundo da questão e explica que como “sub-rogação real uma coisa é substituída pela outra, admitindo duas hipóteses: direta e indireta. A direta consiste na saída de um bem e a entrada de outro no patrimônio de um dos cônjuges, através de um mesmo ato jurídico, utilizando-se um único instrumento e a troca ou permuta são exemplos expressivos deste caso. A indireta é aquela que se verifica quando o bem adquirido através de um negócio jurídico deu-se com o produto da alienação de um bem próprio, por outro negócio jurídico”.210 Por exemplo, “o cônjuge vende um bem particular, por escritura pública, e, com o dinheiro apurado, por meio de novo instrumento - até em data diferente – adquire outro bem”.211

O inciso em análise é explícito em dizer que são incomunicáveis os bens sub-rogados desde que adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges. Caso ambos os cônjuges contribuam para eventual diferença de valor – o novo bem ser mais caro que o antigo – sobre a diferença haverá comunhão e caberá cinquenta porcento do valor a cada um dos cônjuges.

                                                                                                                210

Zeno Veloso. Regimes matrimoniais de bens , in Direito de família contemporâneo (coordenação: Rodrigo Cunha Pereira). Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 171.

211

Assim, “comprovado, porém, que o bem adquirido na constância do casamento foi completado com valores oriundos da vida em comum, caberá a cada um dos conjuges na partilha 50% da diferença”.212

III. “As obrigações anteriores ao casamento”.

Não apenas bônus, mas também ônus fará parte do monte reservado. O cônjuge será responsável individualmente pelas dívidas contraídas antes do casamento.

Há, contudo, uma exceção a essa regra. Quando a contração de dívidas tiver resultado em benefício gozado por ambos os cônjuges, os dois, da mesma forma, responderão pela quitação.

Desse modo, “entende-se, todavia, que haverá comunicação dos débitos anteriores no caso de se beneficiar o cônjuge que não os tenha, como na hipótese de dívida contraída na aquisição de bens de que lucram ambos”.213

E ainda, as dívidas “feitas pelo marido depois da celebração, obrigam, não só os bens comuns, senão ainda, em falta dêsses, os particulares de um e outro cônjuge, na razão do proveito que cada qual haja lucrado”.214

IV. “As obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal”.

                                                                                                                212

Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de direito civil, cit., p. 214. 213

Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de direito civil, cit., p. 215. 214

Figura aqui o princípio unuscuique sua culpa nocet, segundo o qual cada um responde pela sua própria culpa. O cônjuge inocente não pode ser responsabilizado por ato que não deu causa, a menos que fique comprovado que ele obteve qualquer espécie de lucro.

A regra é que os bens reservados responderão pelo ato ilícito, porém comprovado proveito do casal, o patrimônio que pagará pela dívida será o comum e somente depois, subsidiariamente, o patrimônio particular de cada um, na medida do proveito que obtiveram.

A Súmula 251 do Superior Tribunal de Justiça, reforça esse entendimento no sentido de que “a meação só responde pelo ato ilícito quando o credor, na execução fiscal, provar que o enriquecimento dele resultante aproveitou ao casal”.

V. “Os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão”.

Esse inciso busca resguardar a sobrevivência e a dignidade da pessoa. Pense que para um dentista seu aparelhamento é fundamental para o desempenho da função sem o qual ele não conseguirá se manter. Além dos instrumentos de profissão, não é cabido exigir que se partilhe roupas, sapatos e acessórios do dia a dia.

Por fim, no tocante a livros, quando forem parte de uma biblioteca de um jurista ou qualquer um que precise dos livros para desempenhar sua função, estes serão incomunicáveis. Por outro lado, sendo um acervo de obras raras ou de cunho artístico, poderão ser partilhados.

MARIA HELENA DINIZ ensina que “quanto aos livros, convém lembrar que, se forem destinados a negócios ou se constituírem, por sua grande quantidade, parcela apreciável do ativo, deverão ser comunicáveis (JTJ, 71:197)”.215

VI. “Os provenientes do trabalho pessoal de cada cônjuge”.

É bastante lógico que o salário e demais ganhos obtidos com o esforço pessoal de cada cônjuge componha seu acervo de bens reservados, tanto mais porque como já analisado, o inciso II, do artigo 1659, do Código Civil de 2002, observa que os bens adquiridos com valores exclusivamente de determinado cônjuge a este pertence.

Ora, se o produto do ganho é reservado, o que dizer do próprio ganho?! Ocorre que o raciocínio não é tão simplista quanto aparenta.

Caso o próprio ganho fosse ser considerado como bem particular, absolutamente tudo adquirido a partir dele seria considerado uma sub-rogação e assim não haveria de se falar em comunhão parcial, mas sim separação de bens.

O projeto de lei n° 276/2007 do Deputado Léo Alcântara, substituído pelo projeto de lei n° 699/2011 apresentado pelo Deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), prevê alteração do artigo 1659 no intento de suprimir esse inciso VI, pois conforme consta no item 121 do projeto “A sugestão é do juiz ALEXANDRE GUEDES ALCOFORADO ASSUNÇÃO. Realmente, há necessidade de exclusão do inciso VI do artigo 1659, pois os proventos do trabalho são via de regra aqueles que servem à aquisição de bens, sendo que, se                                                                                                                

215

continuarem a ser incomunicáveis, todos os bens sub-rogados em seu lugar serão havidos como incomunicáveis no regime da comunhão universal e da comunhão parcial, o que não faz qualquer sentido”.

Acompanha esse entendimento MARIA HELENA DINIZ ao entender que “a incomunicabilidade seria só do direito à percepção dos proventos, que, uma vez percebidos, integrarão o patrimônio do casal, passando a ser coisa comum, pois, na atualidade, marido e mulher, vivem de seus proventos, contribuindo, proporcionalmente, para a mantença da família, e, consequentemente, usam dos seus rendimentos”.216

A principal dificuldade é, na verdade, “precisar o momento exato em que os valores deixam de ser proventos do trabalho e passam a ser bens comuns, volatizados para atender às necessidades do lar conjugal”.217

Segundo VIRGILIO PANAGIOTIS STAVRIDIS não foi acaso do legislador inserir o inciso VI no artigo 1659. Ele realmente desejava excluir da comunhão qualquer provento, inclusive salário. Por isso se extrai da primeira leitura desse inciso que “qualquer verba percebida como ganhos decorrentes de atividade laborativa do cônjuge esteja excluída compondo apenas seu patrimônio particular”.218

VII. “as pensões, meio-soldos, montepios e outras rendas semelhantes”.

Todas essas rendas encaixam-se nos direitos personalíssimos e portanto não admitem divisão. Pode-se conceituar montepio como “pensão destinada a                                                                                                                

216

Maria Helena Diniz. Curso de direito civil, cit., p. 167. 217

Silvio de Salvo Venosa. Direito civil, cit., p. 352. 218

Virgilio Panagiotis Stavridis. Novo código civil: do direito de família. Coordenação: Heloísa Maria Daltro Leite, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2002, p. 341-342.

amparar herdeiros ou descendentes, em linha reta, de servidores do Estado, de acordo com os descontos feitos nos vencimentos de tais servidores com aquele fim, i. e., de serem garantidos o futuro e subsistência da família do contribuinte”.219

A expressão meio-soldo pode ser utilizada para indicar “a metade dos vencimentos devidos aos militares, correspondente ao posto em que ele se reforma ou à pensão que se destina aos seus beneficiários”.220

A pensão pode ter diversos desdobramentos em seu entendimento, sendo o conceito geral “benefício com o fim de prover regularmente a subsistência e amparar o futuro de alguém”.221 Mas ainda pode ser interpretada como pensão previdenciária, ou seja, “renda garantida aos dependentes do segurado quando este vem a falecer”222, ou também como pensão civil quando “é a equivalência econômica da lesão ou da incapacidade experimentada pelo ofendido”.223

A tença hoje não participa mais o rol de rendas descritas no inciso VII, do artigo 1659, mas no ordenamento anterior compunha o artigo 263, I. Trata-se de “pensões periodicamente recebidas do Estado ou de pessoa de direito público ou privado, ou, até mesmo, de um particular, para subsistência do beneficiário”.224

                                                                                                                219

R. Limongi França (Professor coordenador). Enciclopédia saraiva do direito, cit., vol. 53, p. 220.

220

R. Limongi França (Professor coordenador). Enciclopédia saraiva do direito, cit., vol. 52, p. 197.

221

R. Limongi França (Professor coordenador). Enciclopédia saraiva do direito, cit., vol. 58, p. 40.

222

R. Limongi França (Professor coordenador). Enciclopédia saraiva do direito, cit., vol. 58, p. 58.

223

R. Limongi França (Professor coordenador). Enciclopédia saraiva do direito, cit., vol. 58, p. 51.

224

VIII. “São incomunicáveis os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao casamento”.

Antes do casamento não há que se falar em comunhão de adquiridos, assim os bens amealhados nessa data pertencerão apenas ao respectivo titular compondo seu rol de bens particulares.

Ainda que o bem tenha sido negociado antes da união e por razões de financiamento, por exemplo, tenha entrado no patrimônio do cônjuge após o matrimônio, em nada terá direito o outro consorte, salvo ressalva em pacto antenupcial.

Comenta ZENO VELOSO que “no Código, a nosso ver, a expressão está empregada como negócio que deu origem à aquisição, ato jurídico (lato sensu) que produz a adquirição do bem. O momento da aquisição, o fator temporal, é que sobreleva para o deslinde da questão”.225

IX. “Os direitos patrimoniais do autor, executados os rendimentos resultantes de sua exploração, não se comunicam, salvo pacto antenupcial em contrário”.226

Este também é considerado direito personalíssimo e por isso não admite divisão. Por acordo mútuo, contudo, esse direito pode ser relativizado e os direitos do autor entrarem na união.

                                                                                                                225

Zeno Veloso. Regimes matrimoniais de bens, cit., p. 180. 226