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Capacidade para casar e escolher o regime de bens 82

CAPÍTULO 2 – REGIMES DE BENS: NOÇÕES GERAIS 38

3.   Capacidade para casar e escolher o regime de bens 82

É certo que “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”162, toda pessoa então, é dotada de personalidade para figurar em uma relação jurídica. Assim, capacidade é a medida da personalidade.

Da análise mais aprofundada da capacidade emerge uma bipartição. A capacidade de direito permite à pessoa adquirir e gozar de seus negócios. Absolutamente todo ser humano possui capacidade de direito. Durante a gestação, entretanto, há apenas expectativa desse direito, cuja consolidação ocorrerá após o nascimento com vida.

Ao lado dessa primeira capacidade figura a capacidade de fato. Mais restrita em si, essa última é necessária para o exercício autônomo dos atos da vida civil. A posse das duas capacidades, de direito e de ação, é traduzida na capacidade plena. Os motivos que levam a falta de capacidade de fato são inúmeros, alguns reversíveis, outros não.

Toda pessoa nasce com a capacidade de direito e adquire a capacidade de fato no decorrer da vida, com o amadurecimento. No casamento há uma dupla observação para a capacidade plena.

Assim, “esta aptidão diz respeito ao discernimento (condições psíquicas) e à puberdade (condições fisiológicas). O discernimento vem da experiência que o tempo propicia, associa-se à autonomia do espírito. A puberdade vem com o desenvolvimento dos órgãos e glândulas que permitem conceber, e varia de indivíduo a indivíduo, com as condições de meio, de sexo, de saúde, de                                                                                                                

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educação e de alimentação. Sendo sua comprovação direta difícil e melindrosa ao pudor, como no Direito Romano o imperador Justiniano já reconhecia (Código, Livro V, Tít. 60, Const. 3), os sistemas jurídicos preferem instituí-la como presunção do fato de haver o indivíduo atingido certo limite de idade”.163

No mesmo sentido, PLANIOL compreende a necessidade da maturação da pessoa para que esta seja entregue ao casamento ao citar “em todos os tempos a puberdade sempre foi exigida como condição do casamento, imposta pela própria natureza. Tornou-se conhecido a respeito o debate que outrora se estabeleceu entre sabinianos e procuelanos; enquanto os primeiros fixavam o início da puberdade com a idade núbil, o que se comprovava em cada caso mediante inspectio corporis, preferiam os segundos marcar uma idade mínima para o casamento, fixando-se assim em doze anos para a mulher e em catorze para o homem”.164

E, ainda, “JUSTINIANO adotou o ponto de vista dos procuelanos, porque aquele exame nupcial, sempre melindroso, ofendia a pudícia. Os antigos canonistas preferiam o critério dos sabinianos, mas, no Concílio de Trento, prevaleceu a orientação dos procuelanos, elevando-se, porém, para catorze anos a idade mínima da mulher e dezesseis anos a idade mínima do homem”.165

Algumas vezes, porém, a exigência da maioridade civil é mitigada em favor do desenvolvimento mais veloz da pessoa. A fixação da idade núbil em 16 anos é prova de que o legislador reconhece que essa maturação pode vir antes dos 18 anos. Nesses casos há uma ressalva bastante importante sobre o patrimônio nas linhas do artigo 1641, III do Código Civil, “é obrigatório o                                                                                                                

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Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de direito civil, cit., p. 73. 164

Planiol. Traité Élémentaire de Droit Civil, 12ª ed., vol. 1, p. 266, apud, Arangio-Ruiz.

Historia del derecho romano. Madrid: Reus, 1943, pág. 338.

165

regime da separação de bens no casamento: III- de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial”.

Quando houver autorização dos pais para convalidar o ato166, estes poderão escolher o regime de bens ao qual os nubentes se submeterão. No caso de divergência sobre a autorização do casamento o juiz será chamado para dirimir a questão. Nesse caso, a lei impõe o regime da separação obrigatória de bens que será o regime legal. A maturidade fisiológica das pessoas, na maioria das vezes, vem primeiro do que a maturidade negocial, por isso a necessidade da reserva de bens. Assegura-se até o momento da celebração o direito dos pais, tutores e curadores de revogarem a autorização para o casamento.167

Deve-se dizer que “no sistema anterior, se o casamento fosse celebrado com autorização do tutor, obrigatoriamente deveria seguir o regime da separação absoluta de bens (Cod. Civil de 1916, art. 258, parágrafo único, n. III). Segundo o novo Código Civil, seja o consentimento dado pelos pais, seja pelo tutor, a escolha do regime será livremente facultada às partes. Somente é obrigatório o regime da separação de bens no caso de suprimento judicial de autorização (Cod. Civil de 2002, art. 1641, n. III).168

Antes dos dezesseis anos também é possível o casamento em situação excepcionalíssima de gravidez169, gerando capacidade matrimonial.

                                                                                                                166

Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, artigo 1517. 167

Nesse sentido, o estatuto das famílias n. 684/2007 - Art. 22. “Para o casamento das pessoas relativamente incapazes é necessária autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais. § 1o Havendo divergência entre os pais é assegurado a qualquer deles recorrer a juízo. § 2o Até a celebração do casamento os pais ou representantes legais podem revogar justificadamente a autorização. § 3o A denegação da autorização, quando injusta, pode ser suprida judicialmente.”

168

Washington de Barros Monteiro. Curso de direito civil, cit., p. 83. 169

A Lei 11.106, de 28 de Março de 2005, revogou os incisos VII e VIII, do artigo 107, do Código Penal, restringindo a atuação do artigo 1520, do Código Civil. Antes, também era possível o casamento, antes da idade núbil, para evitar a imposição ou o cumprimento de pena criminal.

O artigo 1517, do Código Civil, equiparou a capacidade matrimonial do homem a da mulher fixando a idade núbil em dezesseis anos para ambos, reflexo da igualdade preestabelecida pelo artigo 226, § 5o., da Constituição Federal, “a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 5o. Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”.170

Dessa forma, “o Código Civil de 1916 estabelecia idades diversas para homens – dezoito anos – e para as mulheres – dezesseis anos – tendo em vista que a capacidade civil era alcançada somente aos vinte e um anos (arts. 213, caput, e 6o. , n. I). A redução da idade núbil do homem ocorreu em virtude das disposições da Constituição Federal de 1988, que igualou juridicamente o homem à mulher (art. 5o., n. I), e do novo Código Civil, que reduziu a maioridade civil para dezoito anos (art. 5o., caput)”.171

Hodiernamente, a capacidade para o casamento acontece ao mesmo tempo para ambos os cônjuges. Devido a capacidade núbil ser atingida antes da capacidade civil, o casamento como ato solene que é, dependerá de autorização dos pais, responsáveis ou de suprimento judicial para se concretizar. A lei põe a salvo alguns atos que dependem de capacidade para sua realização, dentre os quais o matrimônio ocupa lugar de destaque.

                                                                                                                170

C.F. 1988, art. 226, §5o. 171