• Nenhum resultado encontrado

Mauro Borges: colonização e modernização agrária como solução para os problemas agrários em Goiás

propriedade privada

4.3 Mauro Borges: colonização e modernização agrária como solução para os problemas agrários em Goiás

Mauro Borges Teixeira assumiu o governo de Goiás no ano de 1961. Para Rabelo614, esse governo marca o ponto alto da dinâmica desenvolvimentista no estado. Isto porque o governador goiano seguiu uma tendência nacional em desenvolver uma política com base no planejamento econômico e em uma forte atuação do Estado em se colocar como agente do desenvolvimento capitalista. O plano de governo de Mauro Borges foi elaborado pelo Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas, além de ser inspirado no plano de metas de Juscelino Kubitschek. Este planejamento foi resultado do trabalho de técnicos e economistas que fizeram um levantamento da estrutura socioeconômica de Goiás, enfatizando as principais necessidades para o seu desenvolvimento, onde a questão agrária615 ganhava um papel de destaque. Para Oliveira

(...) O „desenvolvimento econômico‟ previsto no Plano, portanto, seria alcançado principalmente via desenvolvimento agrícola, sustentado por obras de infra-estrutura e por um reaparelhamento administrativo do Estado. A questão agrária „amarrava‟ as várias pontas do Plano e lhe dava unidade616.

Entre os órgãos criados e reativados por Mauro Borges para auxiliar a agricultura destacam-se o Instituto de Desenvolvimento Agrário de Goiás (IDAGO), cujo objetivo era empreender transformações técnicas, econômicas e institucionais nas áreas da agropecuária, além de ser responsável pela outorga e concessões de terra. A Companhia de Armazéns e Silos do Estado de Goiás tinha a função de “(...) racionalizar o processo de comercialização de safras, eliminando, assim o ônus de uma mediação desnecessária”617. A Companhia Agrícola do Estado de Goiás (CAESGO) tinha, entre as muitas funções, dar assistência educacional, técnica e financeira aos agricultores como também ajudá-los a executar serviços em suas terras. E a Companhia de Abastecimento do Estado de Goiás (CIAGO), que tinha várias funções, mas, basicamente, desempenhava a responsabilidade de abastecimento agrícola das regiões rurais, procurando articular a CAESGO, CASEGO e Banco de Goiás para resolver esses problemas618.

614 RABELO, Francisco Chagas E. Mobilização social e tradicionalismo político em Goiás (Governo Mauro

Borges, 1961 – 1964). In: SOUZA, Dalva Borges de (Org). Goiás: Sociedade e Estado. Goiânia: Cânone Editorial, 2004, p. 50.

615

O plano econômico era divido entre três grupos de investimentos, sendo um deles destinados à agricultura. A preocupação de Mauro Borges com a questão agrária estava assentada nos seguintes fatores: dinamizar a economia e a agricultura para atender à população que vinha para o estado, solucionar os conflitos de terra que estavam presentes em várias regiões de Goiás, mas, sobretudo no norte; e resolver a disparidades regionais. Sobre o assunto ver dissertação de mestrado OLIVEIRA, Marisis Cunha de. A questão agrária em Goiás:

Governo Mauro Borges (1961-1964). Dissertação (Mestrado em História) – Instituo de Ciências Humanas e

Letras da Universidade Federal de Goiás, 1987;

616

OLIVEIRA, opt.cit., 1987, p. 86.

617 TEIXEIRA apud OLIVEIRA, op. cit., 1987, p. 99. 618 OLIVEIRA, op. cit., 1987, p. 98-102.

A questão agrária assumiu uma das prioridades do governo Mauro Borges, cabendo ao estado a iniciativa de resolver esses problemas, partindo de um conjunto de ações como: uma política de colonização, de cooperativismo e a criação de órgãos que auxiliariam o desenvolvimento da agricultura.

É importante, antes de prosseguir a análise sobre o governo de Mauro Borges, questionar parte da historiografia que valoriza sobremaneira a figura do governador e minimiza os aspectos sócio-históricos que configuram seu governo e os projetos políticos em gestação nessa conjuntura. Predominou na historiografia goiana a compreensão de Mauro Borges como um político moderno, inovador, diferenciando-se consideravelmente dos políticos tradicionais do estado. Assim, cristalizou-se a ideia de: primeiro, foi pioneiro ao adotar técnicas de planejamento, e segundo, de que pôs fim ao clientelismo. Nesse sentido, é preciso considerar que o plano sintetizava as tentativas anteriores de traçar diretrizes governamentais.

Deve-se pensar o planejamento de Mauro Borges, como apontou Esteves619, fruto de necessidades históricas do modelo de desenvolvimento econômico decorrentes da construção de Brasília e do plano de metas de Juscelino Kubitschek, que suscitou a adoção de planos de desenvolvimento regional como medida para os estados captarem recursos, não apenas da União, mas de organismos internacionais, como a Aliança para o Progresso, que abordaremos com mais atenção no próximo capítulo.

Segundo Campos, desde os esforços para a prorrogação de mandato de José Ludovico em 1957, como falamos anteriormente, já estava em curso a renovação política de “quadros observadas no governo de Mauro Borges”620

. Esta visão é comungada por Francisco Chagas Rabelo, para quem: “A candidatura de Mauro Borges Teixeira surgiu, portanto, nesse contexto de renovação dos partidos tradicionais (PSD/UDN) e de crescimento dos partidos menores (PTB, PDC)”621

. Por tentar levar a cabo um projeto político modernizador, Mauro Borges entrou em rota de colisão com os setores tradicionais e conservadores de seu partido e, por isso, precisou acumular forças para fazer frente à influência e poder dos antigos quadros ligados às forças reacionárias do campo. Ele o fez aproximando do PTB, para quem concedeu a Secretária de Trabalho e Ação Social (SETAS) para Érides Guimarães, responsável por conduzir a política de estímulo à criação de associações rurais, sindicatos e de projetos de

619

ESTEVES, op. cit., 2013, p. 126.

620 CAMPOS, op. cit., 2009, p. 43. 621 RABELO, op. cit, 2004, p. 55.

colonização, o que, no entendimento do autor, representava uma tentativa do governador de constituir um populismo com base no campo.

Estas análises têm o mérito de compreender o plano Mauro Borges como resultado de uma dada situação histórica no país e a ascensão de novas forças políticas, sociais e econômicas em Goiás, mas pecam por compreender que Mauro Borges cooptou os camponeses com seu projeto para o agro. Essa compreensão despreza, primeiro, a atuação de do governador na repressão aos possieiros; segundo, que seu projeto, considerado nacionalista, logo dá lugar a adesão a proposta formatada pelo Estados Unidos de reforma agrária na América Latina para conter as reformas de base, questões que não foram ainda investigadas com atenção pela historiografia em Goiás.

A forma como o governo compreende os problemas agrários e, entre eles, os conflitos fundiários, é de eles decorrem do atraso da agricultura, com destaque para a produção camponesa, e não necessariamente da estrutura latifundiária. Seu posicionamento sobre a questão vai ficando mais explícito à medida que avança seu governo e, em entrevista ao jornal

Diário do Oeste, em outubro de 1961, disse: “O problema é artificial, pois existe, em Goiás,

enorme carência do braço para o cultivo da terra”622

. Em novembro do mesmo ano, foi enfático ao afirmar que: “(...)já não se pode aceitar uma reforma agrária retrógrada e deficiente com a simples distribuição de glebas aos lavradores, sem a devida assistência, sem o mínimo indispensável à sua sobrevivência”623

. Primeiro dizendo que uma reforma agrária distributiva não fazia sentido em Goiás, pois faltava braços qualificados para a agricultura. Segundo, propôs o aumento da terra e o do imposto territorial como medida de ataque frontal à grilagem de terras.

Nesse sentido, a campa categórica de Mauro Borges de combate à grilagem e à abertura política para o diálogo com o camponês, com o estímulo a criação de associações, sindicatos rurais e projetos de colonização, não passaram de medidas para institucionalizar a luta pela terra e forjar sua imagem como um político moderno que repudiava a política tradicional. Essa auto-representação foi assimilada por boa parte da historiografia goiana que, por isso, afirmou que houve um novo tratamento com a questão camponesa, sem observar a truculência e a violência de Mauro Borges para suprirmir os focos de revolta camponesa, como uma das primeiras medidas da execução de seu plano de governo.

Assim, a despeito da veemente declaração antes de assumir o executivo goiano de que combateria a grilagem, nada fez efetivamente para contê-la; ao contrário, deu continuidade na

622 Diário do Oeste, 8 de agosto de 1961, p. 1. 623 Diário do Oeste, 11 de novembro de 1961, p. 1.

campanha em tratar os posseiros como invasores. Desde o início, seu posicionamento foi em considerar que o problema no campo não seria solucionado pela distribuição ou desapropriação de terras, mas pela modernização e tecnificação da produção agropecuária, condições que supostamente seriam oferecidas aos camponeses nos projetos colonais.

Observando os principais projetos apresentados na Assembleia Legislativa e pelo Executivo goiano, e que ganhavam evidência no debate político, comprovam que as diferentes medidas para o camponês não visavam à permanência nas terras em litígio, mas precaver revoltas de maior magnitude que pudessem ameaçar a ordem vigente. Foi por isso que as classes dominantes e a Igreja católica incorporaram a discussão da reforma agrária numa roupagem tecnicista e de modernização para preservar a estrutura fundiária, esvaziando assim, o seu conteúdo social.

4.4 De posseiros a invasores: a criminalização dos movimentos de luta pela terra como

Outline

Documentos relacionados