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CONTEXTUALIZAÇÃO DA AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOCENTE: ENQUADRAMENTO LEGAL COM COMENTÁRIOS

2. Contextualização da Avaliação de Desempenho Docente

2.1. Breve Resenha Histórica

No período entre 1947 e 1974, em que vigorava um regime político não democrático, a avaliação dos docentes era realizada pela inspecção, sem que os professores se pronunciassem sobre os resultados dessa avaliação inspectiva (Curado, 2002, pp. 15-16), sendo a responsabilidade da classificação inteiramente da inspecção que atribui o

bom

ou

deficiente

a partir da informação recolhida (Pacheco & Flores, 1999, p 184). Nos liceus, até 1974, a avaliação era da responsabilidade do reitor “pois os serviços da inspecção não são capazes de materializar as competências, traçadas no

plano dos normativos” (

idem

). Entre 1974 e 1986, com a institucionalização do regime democrático, a

avaliação dos professores “desapareceu da agenda educativa”, uma vez que era conotada com uma forma de controlo, própria de um sistema autocrático do passado (Curado, 2002, p. 16). Em 1986, a Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), Lei nº 46/86, de 14 de Outubro, definiu os princípios estruturais da carreira docente, onde a questão da avaliação de professores volta a ser equacionada, associada às questões da progressão na carreira e do desenvolvimento profissional.

Em 1990, após um prolongado processo negocial, foi publicado o primeiro estatuto da carreira docente (ECD), que consagrou um conjunto de direitos e deveres, elegendo uma carreira única para educadores de infância e professores, Decreto-Lei 139-A/90, de 28 de Abril.

Relativamente ao ECD, Sanches (2008, p. 25) refere que:

o estatuto da carreira docente concretizou, na época, um conjunto de aspirações há muito reivindicadas pelos professores. (…) Definiu as linhas gerais da carreira docente, desde as condições de ingresso, ao desenvolvimento e progressão da carreira e à retirada da profissão. Constituiu os professores como um “corpo especial” no seio da função pública (…).

A primeira política de

praxis

avaliativa dos professores foi implementada em 1992, através do Decreto Regulamentar 14/92, de 4 de Julho, tendo como finalidades reforçar a autonomia das escolas e promover o desenvolvimento profissional dos professores. Eram considerados, neste dispositivo de avaliação, um relatório de auto-avaliação elaborado pelo professor e prova de conclusão de um número pré-estabelecido de créditos por frequência de acções de formação, sendo o avaliador o presidente do conselho directivo da escola (Curado, 2002, p. 16). A carreira docente foi dividida em dez escalões, em que os docentes, para atingir o escalão subsequente, deveriam elaborar um relatório de auto-avaliação e fazer prova de conclusão em acções de formação creditadas, devendo o número mínimo de créditos de formação contínua, ser iguais ao número de anos de permanência em cada escalão (Curado, 2002, p. 39). A obrigatoriedade do docente apresentar comprovativos relativos à certificação das acções de formação patenteia a importância da formação contínua no desenvolvimento profissional dos professores e, consequentemente, na progressão na carreira.

A publicação do Decreto-Lei nº 249/92, de 9 de Novembro, vem regulamentar a formação contínua, reconhecendo-se, pela primeira vez, a importância deste pré-requisito para progressão na carreira (Pacheco & Flores, 1999, p 140). Como consta no Decreto Regulamentar nº 14/92, o relatório de auto-avaliação deveria “conter a apreciação crítica da actividade docente”, considerando os indicadores e elementos da avaliação, explicitados no art.º 6º e, da sua análise, seria atribuída a menção de

Satisfaz

ou

Não Satisfaz

, pelo órgão de gestão do estabelecimento de educação/ensino. Assim, numa primeira fase, o órgão de gestão, cumpridas as exigências da carreira, atribui a todos os

professores a menção de

Satisfaz

. Numa segunda fase, o professor pode candidatar-se, uma única vez

ao longo da carreira, à situação de mérito, conforme previsto no Despacho nº 247/ME/93, de 24 de Dezembro.

Evocando um estudo desenvolvido por Simões (1998), Curado (2002, p. 40), relativamente a esta política de avaliação de professores, refere “ ter-se verificado, que os relatórios de auto-avaliação

não eram analisados, e a classificação de

Satisfaz

era apenas um procedimento legal, tendo-a

considerado como ‘uma avaliação de professores que não avaliava’ e tão pouco ‘era levada a sério’ ”. De forma similar, Meyer e Rowan (1978, citados por Curado, 2002, p 19), referem que:

as escolas portuguesas parecem funcionar segundo uma “lógica de confiança”, que não requer que os corpos dirigentes olhem de perto para as práticas concretas de ensino, assim evitando ter de tomar medidas contra situações de ineficiência e ineficácia.

avaliação de professores é reformulada, no âmbito da revisão do ECD, pelo Decreto-Lei 1/98, de 2 de Janeiro. De acordo com o Decreto Regulamentar 11/98, de 15 de Maio, a avaliação de professores tem como propósitos, “a institucionalização de mecanismos de promoção do mérito e do profissionalismo dos professores e a melhoria da qualidade das escolas” (Curado, 2002, p. 40). Ou seja, a avaliação do professor, deverá desenvolver-se como uma “estratégia integrada no modo como as escolas, enquanto instituições dinâmicas e inseridas num sistema mais amplo, desenvolvem e procuram valorizar os seus recursos humanos” (Decreto Regulamentar nº 11/98, de 15 de Maio).

Embora Pacheco e Flores (1999, p. 188) considerem estes “pressupostos inovadores”, eles não garantem a qualidade do sistema, uma vez que se mantém o propósito da certificação, ignorando-se o

objectivo do desenvolvimento. A avaliação de professores continua a ter por base o relatório de auto-

avaliação, agora designado por “documento de reflexão crítica”, e na prova de conclusão de um número determinado de créditos de formação. O documento de reflexão crítica deve ser sucinto e abranger o trabalho desenvolvido pelo docente dentro e fora da sala de aula. A apreciação será efectuada pelo presidente do conselho executivo, com base no parecer do conselho pedagógico, para a qual seria constituída uma comissão de avaliação, composta por três a cinco professores da escola do professor avaliado e nomeada pelo conselho pedagógico. O parecer da comissão de avaliação, constituída por pares, será efectuado sobre o trabalho realizado pelo professor, não sendo a observação de aulas explicitamente considerada no processo (Curado, 2002, p. 16). A avaliação é

expressa em menções qualitativas de

Satisfaz

ou

Não Satisfaz.

A menção de

Não Satisfaz

implica a não

progressão na carreira, devendo ser acompanhada de um programa de desenvolvimento profissional.

Para obter a menção de

Bom

, o professor pode requerer a apreciação de outra comissão de avaliação.

Tendo obtido a menção de

Bom

, o professor pode, após quinze anos de serviço, requerer a

classificação de

Muito Bom

(Curado, 2002, pp. 41-42)

.

O documento de reflexão crítica é considerado como:

um registo que pode ajudar os professores a analisarem as suas actividades, mas não deixa de também ser reduzido a uma classificação administrativa sem qualquer efeito de diferenciação. Por outras palavras, não equivale a uma avaliação rigorosa, pois o referido documento não é julgado por avaliadores específicos em função de referentes criterialmente definidos, mas por uma mera tarefa de rotina administrativa com a finalidade de confirmar um propósito de certificação (Pacheco & Flores, 1999, p. 189).

Evidenciam, ainda, os autores que o modelo de avaliação implementado nos anos 80 e 90, embora tenha subjacente modelos ideológicos e profissionais diferentes, não se evidenciou ao nível da profissionalidade, relativamente à avaliação desenvolvida nos anos 30 e 40, pois:

manteve-se um processo de avaliação que não responsabiliza os professores e que reforça os procedimentos burocráticos e administrativos. Na medida em que é transformado num ritual de cumprimento de deveres formais, o processo de avaliação do professor continua a significar, hoje em dia, como no tempo dos liceus, a mera catalogação dos bons serviços. Trata-se de um processo que acentua o controlo administrativo em detrimento da melhoria profissional (Pacheco & Flores, 1999, p. 190).

No que concerne à formação contínua, Pacheco e Flores (1999, p. 131) referem que sendo imposta através do crédito como pré-requisito para progressão na carreira, não correspondendo a uma necessidade sentida pelos professores, veio a verificar-se, por parte destes, uma atitude pouco participativa. Nesta matéria, Curado (2002, p. 38) cita a opinião de Simões (1998): “os professores identificavam a avaliação como uma tarefa burocrática” a ser desempenhada para progredir na carreira; e a política de avaliação pouco impacto tinha sobre o desenvolvimento profissional dos professores”.

A actual administração constata “que o País investiu avultados recursos” o que não se traduziu no “aperfeiçoamento das competências científicas e pedagógicas relevantes para o exercício da actividade docente. Do mesmo modo, a avaliação de desempenho (…), converteu-se num simples procedimento burocrático sem qualquer conteúdo”, não diferenciando “os melhores profissionais e

aqueles que cumprem minimamente ou até imperfeitamente os seus deveres” (Decreto-Lei nº 15/2007).