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“O capital humano é o principal instrumento de crescimento e riqueza dos países, com especial

relevo para os países pequenos e periféricos como Portugal.” 311

A noção de capital humano é recente. Em 1979, Theodore Schuktz e Sir Arthur Lewis, receberam o prémio Nobel de economia pelo seu trabalho pioneiro sobre capital humano, considerando as pessoas como um activo organizacional. O economista Gary S. Becker, também vencedor do Nobel em 1992, afirmou que o capital humano, a par dos bens físicos, faz parte da riqueza das nações312. Curiosamente, há 200 anos atrás, Adam Smith já havia referido a importância das competências humanas na riqueza das nações313. A teoria do capital humano observa a análise da formação contínua, que parte da procura de educação por parte do indivíduo314.

Em 1996, a OCDE definiu capital humano como “os conhecimentos que as pessoas adquirem ao

longo de toda a sua vida e aos quais apelam para produzir bens, serviços ou ideias no contexto de

mercados ou fora destes.”315

De facto, cada indivíduo em idade adulta ou activa, comporta em si um determinado stock de conhecimentos adquiridos quer através do ensino formal, quer através das experiências de vida e profissional. Para que este stock se transforme em capital, é necessário que o mesmo dê origem a um fluxo de rendimentos316, e para tal, torna-se necessário um investimento permanente neste tipo de capital, nomeadamente através de formação. De outro modo não estaremos a falar de capital intelectual ou humano. Não é contudo clara, a perspectiva contabilística sobre o capital humano, insistindo em considerar a formação como um custo e não como um investimento; se é feito investimento em capital fixo (propriedades, equipamentos e outros bens), é

311 Belmiro de Azevedo in CAMARA, Pedro B., GUERRA, Paulo Balreira, RODRIGUES, Joaquim Vicente, op. cit. p.17 312

PONCHIROLLI, Osmar, op. cit.

313 CARAPETO, Carlos, Administração Pública: Uma visão para a mudança, in Economia Pura, Janeiro/Fevereiro, 2005 314 CARRÉ, Philippe, CASPAR, Pierre, Tratado das Ciências e das Técnicas de Formação, Instituto Piaget, 1999

315 OCDE citada em CARAPETO, Carlos, Administração Pública: Uma visão para a mudança, in Economia Pura, Janeiro/Fevereiro,

2005, p. 29

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MIL-HOMENS, António, Para uma política de desenvolvimento dos recursos humanos em Portugal, in Comportamento Organizacional e Gestão, ISPA, Vol.3, N.º 1,1997

natural que se invista em capital humano (investigação, desenvolvimento e formação)317. Tal, contudo, não parece ser o entender contabilístico actual. No entanto, e como já foi afirmado, a aquisição contínua de conhecimentos e competências, assume-se como essencial para que se possa tirar vantagens dos tempos em que vivemos, cientes de que as grandes vantagens em termos de concorrência assentam no capital humano de cada Estado, cujos conhecimentos e competências são importantes catalizadores de crescimento económico, tornando-se essencial o investimento no indivíduo318. Neste seguimento, a OCDE aponta para a evidência cada vez mais nítida de que a aprendizagem e o investimento no capital humano são corolários no aumento do PIB, a par de uma maior participação cívica, de um bem-estar mais visível, e de uma menor exclusão social e criminalidade319. Contudo, segundo a OCDE, a participação dos indivíduos com idades entre os 25 e os 64 anos, na educação e formação ao longo da vida no espaço da União Europeia, era de apenas 8% em 2000, o que nos remete para a necessidade de maior investimento nas pessoas320. Neste âmbito, considera a Comissão Europeia que os empregadores são os principais responsáveis pelo desenvolvimento das competências da sua força de trabalho.

O capital humano pode aumentar de duas maneiras: quando a organização usa bastante o saber detido pelos indivíduos, e quando estes sabem bastante sobre matérias que sejam úteis para a organização321. Com efeito, para que a Administração Pública rentabilize o seu capital humano, tal como em qualquer outra organização, torna-se necessário reduzir as tarefas em que não é preciso pensar, evitando que princípios tayloristas desperdicem as capacidades humanas322. Urge tirar benefício da mente das pessoas, evitando o uso ineficiente do capital humano. Por outro lado, a mobilização de capital humano, que traga mais-valias a uma organização pode ser alcançada através da formação323. Com efeito, as organizações do presente, há muito que deveriam ter começado a analisar criticamente os seus sistemas de recrutamento e formação de pessoal324, de forma a assegurar o melhor capital humano para a organização. À semelhança do restante capital, também o capital humano se deprecia, necessitando de actualização constante de conhecimento, o que, constitui um desafio imenso para as organizações, sobretudo para as organizações da

317 STEWART, Thomas A., op. cit.

318 COMISSÃO EUROPEIA, Comunicação da Comissão, Tornar o espaço europeu de aprendizagem ao longo da vida uma realidade,

Bruxelas, 2001

319 Idem. 320 Idem.

321 STEWART, Thomas A., op. cit. 322 Idem.

323

Idem.

Administração Pública, confrontadas com um período de contenção orçamental e redução de efectivos. Considera-se no entanto que existem carências de trabalhadores na Administração Pública ao nível dos quadros médios e altamente qualificados325. É pois através da aprendizagem que o capital humano cresce.326 Este, constituído por funcionários e dirigentes, constituem o verdadeiro combustível de uma reforma administrativa, a quem deve ser fornecida formação e incentivos para uma nova cultura de gestão pública327. Neste seguimento refere Corte-Real que “para serem eficientes as administrações têm que empregar profissionais preparados para

enfrentar problemas complexos, procurando hoje as soluções para os problemas de amanhã. A

formação profissional contribui para as respostas de que necessitam.”328

A nossa Administração Pública é acusada de ser lenta num ambiente de mudanças que exigem uma rápida adaptação. Porém, não há flexibilidade nem capacidade reactiva ou inovação, sem recursos humanos qualificados, informados, formados, motivados e que estejam empenhados nos objectivos da sua organização329. Com efeito, a realização profissional e pessoal dos funcionários públicos tem que ser uma preocupação do Governo, numa altura em que se reconhece que os recursos humanos são a principal riqueza e força potencial de uma organização, noção que na Administração Pública, nem sempre tem sido reconhecida e utilizada330. A formação, deste modo, assume-se como um factor de desenvolvimento e aproveitamento dos activos humanos a longo prazo. Sabe-se que a formação contínua prepara as pessoas para a mudança e desenvolve a confiança nas suas capacidades, evitando-se a diminuição da sua produtividade por falta de preparação e confiança331. Muitas organizações investem em tecnologia e não conseguem rentabilizar a capacidade instalada, pois este investimento exige mudanças estruturais, desde a organização do processo produtivo à gestão dos recursos humanos, perpetuando-se métodos de gestão tradicionais332 que negligenciam o factor humano. A Administração Pública, à semelhança destas organizações, procede do mesmo modo. Senão, vejamos a seguinte lista de indicadores333 da negligência do factor humano: elevadas taxas de absentismo; elevadas taxas de rotatividade de pessoal; falta de pontualidade; frequente

325MIL-HOMENS, António, op. cit. 326 SIMONS, P.R.J., op. cit.

327 CARAPETO, Carlos, Administração Pública: Uma visão para a mudança, in Economia Pura, Janeiro/Fevereiro, 2005

328 CORTE-REAL, Isabel, O capital humano na Função Pública: Investir no Homem, in A Administração Pública no limiar do Século

XXI: os grandes desafios, INA, 1999, p.37

329 KOVÁCS, Ilona, Novos Métodos de Gestão e o Factor Humano, Competir: Informação para a Indústria, Ano II, n.º 2 (Mai-Ago)

1991

330 CORTE-REAL, Isabel, A Administração dos Cidadãos, I Congresso Nacional da Modernização Administrativa, SMA, 1990 331 SCHULER, Randall S., JACKSON, Susan E., Gestão de recursos humanos: tomando posição para o século XXI, in Comportamento

Organizacional e Gestão, ISPA, Vol.3, N.º 2, 1997

332 (Taylor, Fayol e Ford) 333 KOVÁCS, Ilona, op. cit.

imobilização de máquinas por razões imprevistas; elevada taxa de produção defeituosa (reclamações e descontentamento face ao sector público); relações de desconfiança entre dirigentes e trabalhadores; baixo nível de flexibilidade (prazos de entrega prolongados, lentidão ou incapacidade na resposta às mudanças); forte polarização das qualificações e elevada percentagem de pessoal pouco qualificado; baixo nível de investimento em formação; poucas sugestões para melhoramentos nos produtos e nos métodos. Estes indicadores, embora retirados de um estudo no âmbito do sector privado, reflectem muitas das situações que têm lugar no sector público. A causa é a mesma e centra-se na negligência dos recursos humanos a favor do factor tecnológico, burocrático, ou economicista, não havendo suficiente investimento na formação das pessoas uma vez que estas não são vistas como um recurso estratégico.

A aposta da Administração Pública no sentido da modernização, tem dado lugar ao taylorismo informático, que apenas informatiza os métodos de gestão e perpetua a desresponsabilização e o desinteresse no factor humano334. Não consideramos que exista na Administração Pública a visão dos trabalhadores como capital humano, e sim uma visão que apenas os consegue encarar em termos de custos. Partilhamos a visão que considera o capital humano o potencial de crescimento, mudança e desenvolvimento existentes em todo o ser humano335. Deste modo, “uma das grandes

lições da estratégia organizacional moderna é que o valor não é mais uma questão de quem possui os bens de produção; é, antes, de quem tem as ideias, a inovação e as competências de gestão para criar valor. Estes poderes não são uma função da propriedade das organizações, antes respeitam

a ter pessoas (…) que fazem a diferença”336

. De facto, já em 1991, Alvin Toffler afirmava que “ninguém compra acções da IBM por causa dos bens materiais da firma. O que conta não são os

edifícios ou as máquinas da empresa, mas os contactos e o poder das suas forças de marketing e de vendas, a capacidade organizacional da sua administração e as ideias que fervilham dentro das

cabeças dos seus empregados”337

. Com efeito, à semelhança da renovação do capital e tecnológico e da provisão capital financeiro para investimento, que são actos comuns numa organização, também o capital humano necessita de renovação e desenvolvimento do seu conhecimento338. Por conseguinte, o que se pretende são trabalhadores aptos a lidarem com as mudanças que vão tendo

334 KOVÁCS, Ilona, op. cit.

335 CAMARA, Pedro B., GUERRA, Paulo Balreira, RODRIGUES, Joaquim Vicente, op. cit. 336

CUNHA, Miguel Pina, et al. op. cit. p. 747

337 Toffler citado por CUNHA, Miguel Pina, et al. op. cit. p. 747

lugar no dia-a-dia, polivalentes e actualizados em termos de conhecimento. Consideramos que é sobretudo a formação profissional que vai possibilitar atingir estes objectivos339.

A principal vantagem competitiva de Portugal no presente e futuro, dadas as condicionantes geográficas, demográficas e económicas, terá que ser o conhecimento, e mais concretamente a capacidade de gerar, gerir e desenvolver as potencialidades de cada trabalhador340. Ao mesmo tempo, importa que a Administração Pública, enquanto organização, rentabilize o investimento em capital humano e sua respectiva formação e saiba retê-lo, uma vez que a propriedade deste capital é partilhada pela organização e pelo indivíduo341. Sobre o capital humano, partilhamos as palavras de Moreira: “… descobrimos que é no ser humano, nas suas capacidades, nos talentos das nossas

gentes, que está a principal causa do desenvolvimento económico e humano: a fonte de riqueza não é outra senão o saber colocar à disposição dos outros os nossos próprios talentos, aquilo em que se tem vantagem, as diferenças específicas ou competências. Esta é a responsabilidade

fundamental da empresa: fazer “render” as diferenças com valor competitivo.”342