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3. Os Sistemas de Formação dos Funcionários Públicos na União Europeia: os casos

3.4 Portugal: Sistema de Formação da Função Pública

3.4.2. O Sistema de Formação da Função Pública Portuguesa

“O reforço da qualificação dos funcionários e dos dirigentes da Administração é outra das metas

imprescindíveis para a valorização da função pública”865.

3.4.2.1 Breve História da Formação Profissional na Administração Pública

Em Portugal, a tradição nunca deu lugar à formação, até porque o que sempre relevou foi a “indoutrinação das rotinas administrativas”866. O ideal do funcionário ao serviço do Estado era: “Nem homem, nem besta, mas estátua”, sendo a formação dada pela experiência profissional no local com o trabalho do dia-a-dia.867. A formação no âmbito da Administração da Pública, só teve início com o III Plano de Fomento, que por sua vez decorreu de 1968 a 1973868. Este Plano evocava a necessidade de ser realizarem cursos de formação e aperfeiçoamento profissional, nomeadamente em organização e métodos. Apesar de ser uma iniciativa tímida, pois não houve uma política efectiva de recursos humanos, a verdade é que este tema p assou a merecer maior atenção, porquanto se procurou o empenho no desenvolvimento económico e se sentiu, em simultâneo, a necessidade de dotar o nascente Estado de Welfare de pessoas com formação a nível de políticas sociais. No nosso país dois acontecimentos influenciaram decididamente o sistema de formação profissional da nossa Administração Pública. Um desses acontecimentos é interno e marcou a transição de um regime totalitário para uma democracia em Abril de 1974. O outro é externo e ocorreu com a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia em 1986.

No Relatório do Grupo de Trabalho N.º 14 sobre a Reforma Administrativa de Portugal de 1966, chamou-se a atenção para o facto de que, um pouco por toda a Europa, os governos terem aberto escolas destinadas à formação e ao aperfeiçoamento dos funcionários públicos, e de Portugal não ter tido nenhuma iniciativa do género, reconhecendo-se um atraso administrativo de Portugal em termos de formação profissional.869 Com efeito, ”os governos constitucionais herdaram uma massa

de funcionários mal qualificados e desmoralizados.”870

. Não havia, de resto, nesta altura, “uma

gestão de recursos humanos digna desse nome”871

. De facto, “a carência de formação no

865

CORTE-REAL, Isabel, A Administração dos Cidadãos, I Congresso Nacional da Modernização Administrativa, SMA, 1990, p.157

866 ROCHA, J.A. Oliveira, Gestão de Recursos Humanos na Administração Pública, Escolar Editora, 1.ª edição, Lisboa, 2005 867 ROCHA, J.A. Oliveira, Gestão Pública e Modernização Administrativa, INA, Oeiras, 2001, p. 137

868 Idem.

869 Relatório Final do Grupo de Trabalho N.º 14 Reforma Administrativa, PRESIDÊNCIA DO CONSELHO, 1966 870

ROCHA, J.A. Oliveira, Gestão Pública e Modernização Administrativa, INA, Oeiras, 2001, p.137

871 GONÇALVES, Júlio Dá Mesquita, A Reforma Administrativa em Portugal: os primórdios, a teoria, a panorâmica e a finalidade, in

funcionalismo era inacreditável.”872

. As situações de formação existentes, com efeito, tinham um carácter puramente pontual e não estruturado873.

Antes de 1974 nunca tinha havido uma política de formação profissional da função pública. A partir desde ano assumiu-se em concreto as necessidades de formação existentes874 pois tornava-se urgente, lançar programas de formação. E foi o que aconteceu, com a criação de um organismo orientado para suprir as necessidades de formação contínua dos funcionários da administração central com a criação em 1979 do Instituto Nacional de Administração (INA), e da administração local com a criação posterior do Centro de Estudos e Formação Autárquica (CEFA).

Inicialmente o INA estava vocacionado para a formação dos quadros dirigentes e superiores. Tinha a missão de “contribuir, através do ensino, da investigação e da assessoria técnica, para o

aperfeiçoamento e modernização do Estado”, o que contribui para a sua autonomia científica. Teve

início a organização de programas de formação visando a tecnicidade dos funcionários, sobretudo nas áreas da fiscalidade e da informática.

Tendo em vista a formação sistemática dos funcionários, foi criado em 1976 o Departamento Central do Pessoal (DCP). Em 1980, o DCP deu lugar ao Centro de Formação da Administração Pública (CFAP), que por sua vez em 1984, passou para a Direcção-Geral de Emprego e Formação

(DGEFAP).875 Dois anos depois, a DGEFAP passou para a actual Direcção-Geral da

Administração Pública (DGAP). Prevê-se que a actual DGAP seja extinta e dê lugar à Direcção- Geral da Administração e do Emprego Público.876

Apesar da existência destes organismos, só se iníciou uma política sistemática de formação conjugada com o esforço de modernização administrativa, nos anos 90 com o PROFAP, o primeiro plano integrado de formação para a Administração Pública, que abordaremos de seguida.

872 Idem. p. 34

873MADUREIRA, César, A Formação Comportamental no contexto da Reforma da Administração Pública Portuguesa, INA, 1.ª Edição,

Oeiras, 2004, p. 135

874 CEDEFOP, O Sistema de Formação Profissional em Portugal, (coord. Cardim J.C.), Lisboa, 1999 875 ROCHA, J.A. Oliveira, Gestão Pública e Modernização Administrativa, INA, Oeiras, 2001

3.4.2.2 PROFAP

Não obstante a importância da temática e da criação de organismos com competências no âmbito da formação, só em 1992 foi viabilizado um plano integrado de formação para a Administração Pública, cujo investimento ficou abaixo daquele verificado no âmbito da formação no sector privado877. Com efeito, só se iníciou uma política sistemática de formação, nos anos 90 com o PROFAP. Até então, nunca havia sido feita a articulação das políticas e dos programas de formação com a estratégia elaborada para a modernização administrativa878, reflectindo uma pressão exógena de reforma, vinda da comunidade europeia. O PROFAP, Programa Integrado de Formação para a Modernização da Administração Pública, foi desenvolvido, com o objectivo de adequar a capacidade de reposta da função pública às exigências decorrentes das políticas de ajustamento estrutural879. Entendia-se, nesta altura, a importância da formação, nomeadamente em assuntos comunitários. O PROFAP teve financiamento comunitário de cerca de 75% do Fundo Social Europeu. A medida 1 do referido programa previa expressamente a actualização de dirigentes e chefias, bem como o aperfeiçoamento dos activos, a formação inicial dos recém admitidos, a ligação da formação à promoção dos funcionários, e a formação de formadores880. O programa teve dois momentos distintos: a fase que abrangeu os anos de 1992 e 1993, designada por PROFAP I e a fase que se iníciou em 1994 e que decorreu até 1999, integrada no seio do segundo Quadro Comunitário de Apoio, o PROFAP II, cujas acções de formação foram ministradas pelo Instituto Nacional de Administração, pelo Centro de Estudos e Formação Autárquica, e outras entidades credenciadas881.

Para se estudar a realidade formativa que estaria em causa e conseguir definir programas de formação vocacionados para a realidade, foi feito um levantamento das necessidades de formação ao nível da administração central 882por altura do PROFAP I, mas não para o PROFAP II883. Por outro lado, os projectos financiados foram em grande parte os dos promotores de formação e não os dos serviços clientes, sempre que estes não foram coincidentes, o que nos permite concluir que as necessidades reais de formação nem sempre terão sido tidas em conta, tendo-se notado nos serviços

877 CORTE-REAL, Isabel, O Estado da Administração Pública (entrevista), in Administração, Abr/Mai/Jun 1993, p. 26

878 MADUREIRA, César, A Formação Comportamental no contexto da Reforma da Administração Pública Portuguesa, INA, 1.ª

Edição, Oeiras, 2004

879 CEDEFOP, O Sistema de Formação Profissional em Portugal, (coord. Cardim J.C.), Lisboa, 1999 880 Idem.

881 ROCHA, J.A. Oliveira, Gestão Pública e Modernização Administrativa, INA, Oeiras, 2001 882 CEDEFOP, O Sistema de Formação Profissional em Portugal, (coord. Cardim J.C.), Lisboa, 1999 883

MADUREIRA, César, A Formação Comportamental no contexto da Reforma da Administração Pública Portuguesa, INA, 1.ª Edição, Oeiras, 2004

um impacto ao nível das qualificações mas não necessariamente ao nível dos desempenhos globais dos serviços884.

Não obstante eventuais falhas, os anos 90 foram, de resto, a década dourada para a formação na Administração; reconheceu-se o capital humano como principal activo de uma organização, ainda que tal tenha ocorrido por força de uma pressão exógena de Bruxelas. Em 1998 surge a publicação do novo e actual diploma sobre a formação profissional na Administração Pública, o Decreto-Lei n.º 50/98, de 11 de Março, e a regulamentação do direito à formação profissional, através da atribuição de um crédito de trinta e cinco horas anuais de formação. A política de formação profissional passou a ser regida por princípios gerais: universalidade; utilidade funcional, continuidade, polivalência, flexibilidade, desconcentração, e complementaridade.

3.4.2.3 Órgãos coordenadores e consultivos de Formação

De acordo com o Decreto-Lei n.º 50/98, de 11 de Março, no nosso sistema de formação profissional existem órgãos coordenadores e órgãos consultivos da formação. A Direcção-Geral da Administração Pública é a entidade coordenadora do sistema de formação profissional da nossa Administração Pública885, a quem compete, entre outros aspectos, o estudo de estratégias de formação e aperfeiçoamento profissional da Administração Pública, a recolha de dados que permitam aferir do cumprimento dos planos de formação e investimentos efectuados pelas entidades de formação, estudar metodologias de elaboração de diagnósticos de necessidades de formação, verificar do cumprimento da realização de diagnósticos de necessidades de formação por parte dos serviços, através dos organismos centrais, e promover com periodicidade a avaliação dos efeitos da formação ministrada.

No que concerne aos órgãos consultivos estes são a Comissão Intersectorial de Formação (CIF) e os conselhos consultivos sectoriais (CCS). A CIF é um órgão consultivo do membro do governo que tiver a seu cargo a Administração Pública, que no nosso caso é o Ministro das Finanças e da Administração Pública, a quem compete colaborar na política de formação e aperfeiçoamento profissional e dar parecer sobre os planos anuais de formação dos organismos centrais de formação. Pesa sobre a CIF, a acusação de falta de reunião dos seus membros desde 1999.886

884 MADUREIRA, César, A Formação Comportamental no contexto da Reforma da Administração Pública Portuguesa, INA, 1.ª

Edição, Oeiras, 2004

885 Cf. Artigo 30.º do Decreto-Lei n.º 50/98, de 11 de Março 886http://www.ste.pt/actualidade/2003/08/act07082k3_01.html