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soberania do Estado nacional nas relações internacionais A Paz de Westfalia terminou uma guerra de mais de 80 anos na Europa, e que foi considerada uma guerra mundial, em todos os continentes habitados A Ordem de Westfalia tinha

3. PODER JUDICIÁRIO

3.1 O ESTADO E A SEPARAÇÃO DE PODERES

3.2.1 Poder Judiciário no Período Colonial.

3.2.1.1 Capitanias Hereditárias

Precisamente pela influência dos colonizadores, a história do nosso Direito começou antes do descobrimento. Conforme assinala. Waldemar Ferreira151, “a história do Direito

Brasileiro, nos seus primórdios e em grande parte do seu desenvolvimento, confunde-se com o Direito Português”. A estrutura política daí decorrente, com instância de poder

consolidada, incorporando o aparato burocrático e profissional da administração lusitana impede, ou retarda, o surgimento de uma identidade nacional e, por consectário, de um sistema jurídico pátrio, daí a sua confusão com o sistema lusitano. A extensão do poder real na Colônia, como observa Wolkmer152, “implanta um espaço institucional que evolui para a

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DEDA, Artur Oscar de Oliveira. O Direito nos 500 anos do Brasil. Uma síntese da história do direito brasileiro. Revista do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, Aracaju n. 25, p. 7, jul./dez. 2000.

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Op.Cit. p. 7.

151 FERREIRA, Waldemar. História do Direito Brasileiro. Vol. I. São Paulo : Saraiva, 1962. p. 47. 152

montagem de uma burocracia patrimonial legitimada pelos donatários, senhores de escravos e proprietários de terras”.

Neste diapasão, como não poderia deixar de ser, o sistema jurídico teria, inevitavelmente, que decorrer também da Metrópole e dela atender os interesses. Considerando o primeiro modelo de exploração: as Capitanias Hereditárias, verificamos o estabelecimento dos órgãos da justiça na pessoa do capitão e governador, o ouvidor de capitania, nomeado pelo capitão governador e juízes ordinários “eleitos pelos vizinhos do

concêlho (grafia do original) entre os homens bons, cujas listas eram previamente alimpadas e apuradas, e sua nomeação era confirmada pelo capitão e governador, por si e por seu ouvidor”, conforme informa Trípoli153 citado por Saulo Ramos154, que, por sua vez, critica o fato de que se a monarquia portuguesa acertou ao estabelecer a escolha dos juízes entre os homens bons, pecou na distribuição das competências, deferindo a eles (homens bons) o poder de julgar somente causas cíveis nas pequenas vilas, com recursos ao Ouvidor da Capitania, enquanto:

Nos casos crimes, o capitão e o governador e seu ouvidor tinham jurisdição conjunta, para, sem apelação e agravo, absolver ou condenar escravos ou gentios, peões, cristãos e homens livres, até a morte natural inclusive, e bem assim para condenar as pessoas de maior qualidade até dez anos de degredo e cem cruzados de pena. Tratando-se, porém, de crimes de heresia – quando o herético fosse entregue por eclesiástico – traição, sodomia e moeda falsa, tinham competência para condenar à morte quaisquer pessoas, sem distinção de qualidade social e executas as sentenças.

Neste mesmo sentido a lição de Nequete155 que informa que sob o império das ordenações Manuelinas156 foi o Brasil dividido em capitanias, ocorrendo a organização política e judiciária através das cartas de doação. É ainda Nequete157 que informa que a falência do sistema de Capitanias teve como conseqüência também o cerceamento da ingerência dos Capitães e Governadores nos assuntos da Justiça, passando os ouvidores a

2003. p. 40.

153

TRÍPOLI, César. História do Direito Brasileiro. São Paulo : Revista dos Tribunais. 1936. Vol. I, p. 212.

154

RAMOS, Saulo. Política e Judiciário. Revista STJ 10 anos : obra comemorativa 1989 – 1999 – Brasília : STJ, 1999. p. 91.

155

NEQUETE, Lenine. O poder Judiciário no Brasil : crônica dos tempos coloniais. Ed. fac-similar – Brasília : STF, 2000. Vol I. p. 6.

156 ORDENAÇÕES DO REINO – Ordenações AFonsinas, promulgadas por D. Afonso V, em 1480; Ordenações

Manoelinas, promulgadas por D. Manuel I, em 1520; Ordenações Filipinas, promulgadas por D. Filipe III, em 1603; REGIMENTOS DA COLÔNIA Regimento de 1548. trazido por Tomé de Souza; Regimento de 1612, editado para o governo de Gapas de Souza; Regimento de 1763, editado para a administração dos Vice-reis. Fonte : http://www.infojus.com.br/area8/ivesfilho4.htm.

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serem nomeados pelo Rei: “[...] lembrou, assim, o Alvará de 24 de março de 1708, que eles

eram juízes da Coroa; e a Carta Régia de 4 de março de 1802 reiterou que as Ouvidorias do Brasil não pertenciam aos donatários, como alias já estava expresso no Alvará de 19 de julho de 1790, esclarecido pelo de 7 de janeiro de 1792.”

Wolkmer assinala que o direito vigente no Brasil colônia foi transferência da legislação portuguesa contida nas compilações de leis e costumes conhecidos como ordenações reais. Contudo, “a insuficiência das ordenações para resolver todas as

necessidades da Colônia, tornava obrigatória a promulgação avulsa e independente de várias “Leis Extravagantes”, versando sobretudo sobre matérias comerciais”158 Rossen159 vê nessa possibilidade de reinterpretação e na promulgação de leis extravagantes como uma da origens, entre outras, do tão famigerado e paradoxalmente antigo e atual “jeitinho” brasileiro.

A monarquia portuguesa legou aos brasileiros uma liberdade na reinterpretação das leis que foi precursora do jeito. A carta Régia de 20 de janeiro de 1745, expedida por D. João V ao Corregedor do Crime da Corte e escrita pelo diplomata brasileiro Alexandre de Gusmão, continha a seguinte licença para reinterpretar a legislação portuguesa no Brasil numa maneira relaxada: Sua majestade me manda advertir a Vossa Mercê que as leis costumam ser feitas com muito vagar e sossego, nunca devem ser executadas com aceleração, e que nos casos de crimes sempre ameaçam mais do que na realidade mandam, devendo os Ministros executores delas modificá-las em tudo o que lhes for possível, porque o Legislador é mais empenhado na conservação dos vassalos do que nos castigos da justiça; e não quer que os ministros procurem achar nas Leis mais rigor de que elas impõem.

Nequete160 enfatiza também um ponto característico do judiciário no período colonial: o conflito entre as autoridades judiciárias civis e religiosas, notadamente pelo privilégio de asilo de criminosos em edifícios eclesiásticos, onde as autoridades civis não podiam entrar, e ainda pelas avocatórias religiosas em situações civis.

A conclusão crítica de Duarte161 com relação à organização judiciária no primeiro período colonial é de que não se pode dizer que houve uma organização, porquanto não houve a existência de um “ordenamento jurídico, a que se dê com justeza, o nome de organização

judiciária do Brasil, (...) com hierarquia funcional bem acentuada e uma área de competência e jurisdição específica (...) quem ditava tudo era o poderoso donatário, seguindo-se a este os governadores gerais, capitães generais e capitães-mores”. A crítica de

158

OP. Cit. p 49.

159

ROSSENN, Keith S. O jeito na cultura jurídica brasileira. Rio de Janeiro : Renovar. 1998. p. 33.

160

OP. Cit. p. 28.

161

DUARTE, José. Escorço sobre a organização judiciária no Brasil. Revista de jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado da Guanabara. Guanabara, TJEGB, 1968. p. 14 Apud. COUTINHO, Milson. História do Tribunal de Justiça do Maranhão. 2ª ed. atual. Lithograf, 1999. p. 27.

Duarte não encontra em Coutinho162 ressonância, para quem “a Colônia não contou com uma

regular organização judiciária, nem por isso se pode deixar de afirmar que essa organização existiu, em termos modestos, é verdade, mas existindo, reafirme-se, de fato e de direito”. O

historiador e desembargador maranhense Coutinho tem razão. O regime de organização era acanhado se comparado com o sistema jurídico atual, mas não se pode dizer que não havia uma organização. Igual sensação é esposada por Saulo Ramos163, ao informar, com base em César Trípoli, que a antiga organização judiciária não chegou a ser instaurada em todo território brasileiro, porque muitos donatários nem sequer vieram tomar posse de suas capitanias, em outras não havia como se estabelecer o mecanismo judicial para pequenas povoações.

A título de conclusão quanto a este primeiro período colonial, observa-se que a administração da justiça, no período das capitanias hereditárias, estava entregue aos senhores donatários, os quais dentre outras funções exerciam também a de juiz, cabendo-lhes organizar seus domínios e obtendo a exclusividade o direito de aplicar a lei aos casos ocorrentes, dirimindo conflitos de interesses e direitos entre os habitantes da capitania.