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soberania do Estado nacional nas relações internacionais A Paz de Westfalia terminou uma guerra de mais de 80 anos na Europa, e que foi considerada uma guerra mundial, em todos os continentes habitados A Ordem de Westfalia tinha

2.2 GLOBALIZAÇÃO E ESTADO NEOLIBERAL

2.2.2 Concretização do Neoliberalismo

É senso comum que a Inglaterra foi o Estado precursor em direção à aceitação da ideologia neoliberal, com a chegada ao poder dos conservadores, vitoriosos nas eleições de 1979, que levou Margareth Thatcher ao posto de primeira ministra. Anderson77 esclarece, porém, que a Inglaterra é o primeiro Estado capitalista e desenvolvido a adotar o modelo neoliberal. A experiência pioneira, entretanto, conforme Sader e Gentili78, é encontrada na América Latina, no Chile, sob a batuta do ditador Augusto Pinochet, iniciada em 1973, com o golpe militar que apeou do Poder o socialista Salvador Allende, ao tempo em que a democracia foi relegada a segundo plano:

O neoliberalismo chileno, bem entendido, pressupunha a abolição da democracia e a instalação de uma das mais cruéis ditaduras militares do pós-guerra. Mas a democracia

75 O economista norte-americano Milton Friedman é atualmente o decano da Sociedade do Mont Pèlerin, tendo participado de sua fundação, em 1948, com Friedrich Hayek. Ao longo de sua extensa vida acadêmica, cuja reputação foi conquistada à frente do Departamento de Economia da Universidade de Chicago, EUA, Milton Friedman publicou inúmeras obras sobre política e história econômica. Em 1976 ganhou o prêmio Nobel de Economia, dois anos após Hayek. Outros colegas seus da Universidade de Chicago também fariam jus ao prêmio, entre os quais se destacam George Stigler (também fundador da Sociedade do Mont Pèlerin) e Gary Becker. Os estudos de econometria levaram Milton Friedman a fundar a chamada "escola monetarista" que, em síntese, estabelece uma forte correlação entre a oferta de moeda e o nível de atividade econômica. Ao longo das décadas de 60 e 70 Friedman foi uma das poucas vozes a defender a disciplina monetária (e fiscal) como única saída para o surto de inflação que os governos em quase todos os quadrantes do mundo estavam provocando. Até mesmo os Estados Unidos chegaram a ter quase 20% de inflação anual no final do governo Carter (1980).

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ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo. In Pós-neoliberalismo (Org. Emir Sader e Pablo Gentili). São Paulo : Paz e Terra, 1995, p. 12.

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Op. Cit. p.15.

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em si mesma - como explicava incansavelmente Hayek - jamais havia sido um valor central do neoliberalismo.79

Justamente pelo aspecto de total desprezo pela democracia, o modelo chileno não teve a atenção dos teóricos do neoliberalismo em seus primórdios, ainda que atualmente o Chile seja indicado como o Estado destoante da realidade latino-americana, quando comparado com Brasil, Argentina e Uruguai e Paraguai, entre outros países sul-americanos. Os estudos sobre o neoliberalismo apresentam por paradigma as reformas implementadas na Inglaterra, pela primeira ministra Margareth Thatcher, e nos Estados Unidos, na era Reagan. Assim, para Chacon80, desde o final dos anos 70, uma situação política nova firmou-se. O engajamento público do governo de Thatcher na tarefa de pôr em prática o programa neoliberal e a eleição de Ronald Reagan, em 1980, para a presidência dos Estados Unidos, é considerado como o ponto inicial da implementação da doutrina neoliberal. Dois anos mais tarde, Helmuth Kohl e a coalizão CDU-CSU, democrata cristã, chegam ao poder, derrotando Helmuth Schmidt, que defendia, juntamente com o seu partido, a manutenção do Estado de bem-estar social. A Dinamarca, país símbolo do modelo escandinavo de bem-estar, vê chegar ao poder a direita, comandada por Poul Schlüter, entre 1982 e 1984. Todos eles passaram a adotar políticas neoliberais, seguidos por quase todos os países do Norte da Europa Ocidental, com exceção de Suécia e Áustria.

Neste período e estando em marcha o processo de consolidação da Comunidade Européia, reúnem-se então as condições políticas e econômicas necessárias para a aplicação das receitas neoliberais em escala internacional, a princípio na Europa ocidental, como a única saída para a crise econômica, marcadamente pela sua integração como elemento central de anticomunismo. Este cenário reforça o neoliberalismo como corrente política e prenuncia o seu estabelecimento hegemônico no plano político e econômico na Europa e também na América do Norte. Na América Latina, sem contar o pioneirismo do Chile, a ideologia neoliberal alcança o poder no México (1988), na Argentina (1989), no Peru (1990) e na Venezuela (1989). O marco inicial nítido do neoliberalismo no Brasil é a chegada ao poder de Fernando Collor de Mello.

A queda do muro de Berlim, 1989, prenunciou o fim do comunismo como ideologia política concorrente respeitável da ideologia capitalista. A extinção da União Soviética, em 1991 marcou definitivamente a derrota do modelo comunista e retirou a última preocupação

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Op. Cit. p.13.

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do modelo capitalista em insistir no welfare state como contraposição à política comunista, buscando conter o seu avanço, mote inicial do Estado do bem-estar social. O caminho para adoção da ideologia neoliberal em escala global estava pavimentado. Sendo este fator uma das placas tectônicas – para lembrar a lição de Thurow - que impulsionaram à globalização no aspecto econômico, a globalização econômica passa a ser sinônimo das medidas econômicas neoliberais. Não existia nenhum outro modelo a fazer-lhe frente e nada de teórico era cogitado como alternativa.

Passaram a ser palavras de ordem em nível mundial: “a redução das despesas

públicas, a privatização, a flexibilização das relações de trabalho, a disciplina fiscal para eliminação do déficit público, a reforma tributária e a abertura de mercado ao comércio exterior”.81 Daí a crítica de Habermas82: “Hoje são antes os Estados que se acham

incorporados aos mercados e não a economia política às fronteiras estatais”.

Contundente também é a crítica de Batista.8384 que no mesmo sentido acredita que o fim da “guerra fria” e a desintegração da União Soviética precipitaram o final da discussão acerca de alternativas para o modelo neoliberal, tornando-o hegemônico:

A disputa ideológica Leste-Oeste, maniqueistamente travada entre modelos estereotipados do capitalismo à la Ronald Reagan, e o comunismo stalinista inviabilizariam a discussão racional e mais serena de alternativas importantes, em particular de outras modalidades de economia de mercado, como as praticadas na Europa ocidental e no Japão. O colapso do comunismo na Europa central e a neoliberalismoeglobalizacao.htm. Acesso em 26.05.2005.

81

PIOVESAN, Flávia. OP. Cit. p. 62.

82

HABERMAS, Jurgen. Nos limites do Estado. Folha de São Paulo, de 18.07.1999. Caderno Mais. P. 5.

83

BATISTA, Paulo Nogueira. O Consenso de Washington. In: SOBRINHO, Barbosa Lima e outros Em defesa do interesse nacional: desinformação e alienação do patrimônio público. São Paulo: Paz e Terra, 1994. 84 Paulo Nogueira Batista nasceu em Recife, no dia 4 de outubro de 1929. Formou-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro. Ingressou na carreira diplomática em 1952. Casou-se com Elmira Helena Pinheiro Nogueira Batista com quem teve quatro filhos. Foi presidente da Comissão Coordenadora da "Aliança para o Progresso", no Ministério do Planejamento, em 1962-63; Subsecretário de Planejamento Político do Ministério das Relações Exteriores, em 1967-69; e Subsecretário de Assuntos Econômicos do Ministério das Relações Exteriores, em 1973-75. Em 1975, foi negociador do Acordo de Cooperação Nuclear para Fins Pacíficos entre a República Federal Alemã e o Brasil. No mesmo ano, foi nomeado presidente das Empresas Nucleares Brasileiras (Nuclebrás), cargo que exerceu até 1982. Em 1983, assumiu a embaixada do Brasil junto ao GATT em Genebra, tendo representado o Brasil na Reunião Ministerial em Punta del Este para lançamento da "Rodada Uruguai", em 1986. Designado embaixador do Brasil junto à ONU, ocupou nesse cargo a presidência do Conselho de Segurança em 1988-89. Na condição de presidente desse Conselho, foi mediador entre os EUA e o Irã, na controvérsia sobre a derrubada de um avião de passageiros iraniano pela marinha norte-americana, e mediador entre o Irã e o Iraque na negociação do fim das hostilidades entre os dois países. O comando da embaixada do Brasil junto à Associação Latino-americana de Integração – ALADI, em Montevidéu, em 1993-94, foi sua última função como diplomata de carreira. Morreu em São Paulo, em 31 de julho de 1994.

desintegração da União Soviética, somados à adesão do socialismo espanhol e francês ao discurso neoliberal, facilitariam a disseminação das propostas do Consenso de Washington e a campanha de desmoralização do modelo de desenvolvimento, inspirado pela Cepal, que se havia montado na América Latina sobre a base de capitais privados nacionais e estrangeiros e de uma participação ativa do Estado, como regulador e até empresário.

A hegemonia do sistema econômico neoliberal manifesta então a necessidade de construir consensos quanto a valores ligados à economia de mercado tanto no plano mundial quanto no plano nacional, propondo que instituições políticas e jurídicas operem em favor da economia global. Ou seja, assim como se operou a migração da hegemonia do Estado- providência, de cunho social, para o Estado neoliberal, de cunho econômico, a lógica a ser internalizada naquelas instituições também deve migrar do social para o econômico. Consolidada a ideologia neoliberal na Europa e nos Estados Unidos, principal beneficiário, cuidou-se de implementá-la também em outros países, que a despeito de não estarem incluídos no clube dos países desenvolvidos, são, porém, receptores de cuidados especiais em razão de suas potencialidades como fornecedor e de seu amplo mercado consumidor, além da capacidade de resultar em oportunidades para investimentos do excedente e da poupança interna dos países desenvolvidos.