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2.1 Trabalho Agrícola

2.1.2 Características da Colheita Manual de Laranja

A atividade rural pode ser classificada como não estruturada, ao contrário do que ocorre na indústria, pois não possui um posto definido e o conjunto de tarefas a serem executadas é muito variável. Para Abrahão et al. (2009), nesses casos em que a tarefa é mais flexível e há espaço para eventos aleatórios, o conceito de variabilidade já está incorporado na prescrição do trabalho.

O processo de colheita de frutos, como laranja, mamão, manga e caqui, produzidos em árvores de 5 a 6 m, é uma tarefa complexa e composta por uma sequência de atividades, parte delas com perfil marcadamente sensorial e outras de natureza física (OLIVEIRA et al., 2006; RODRIGUES et al., 2008).

Na colheita de laranja, não há uma descrição rígida da tarefa, apresentando, dessa forma, uma margem de manobra para adoção de modos operatórios distintos ao realizar a colheita. No estudo de Costa et al. (2010), foi observada a adoção de dois modos principais para realizar a operação de retirada dos frutos da árvore e completar o ciclo de colheita manual de laranja: a colheita com uso de sacola e a colheita em derriça.

A primeira segue as etapas de ação listadas na Tabela 2, com início de colheita nos pontos mais altos da planta, com uso de escada (“colher frutos na escada”), utilizando-se de uma sacola com fundo falso preso por ganchos; a etapa seguinte é a colheita dos frutos mais baixos, sem escada; e finaliza com a movimentação da escada e troca de árvore (Figura 1). A média de duração do ciclo de colheita de uma árvore na população estudada, no uso deste método, é de 16,3 minutos. Dentre as etapas de colheita, com maior duração no ciclo, destacam- se: “colher frutos na escada” com 49% e o “descarregamento da sacola” com 17% (COSTA e CAMAROTTO, 2012).

Tabela 2. Duração e Frequência dos ciclos observados da colheita manual, com uso de sacola. Tempo médio por árvore Frequência média por

árvore

Frequência média por dia

Colher frutos na escada 480 sec 6 120

Colher frutos sem escada 120 sec 4 80

Descarregar sacola 168 sec 8 160

Movimentar escada 96 sec 6 120

Colher do chão 108 sec 2 40

Trocar de árvore 6 sec 1 20

Fonte: COSTA e CAMAROTTO (2012).

O estudo acima também realizou uma análise cinesiológica da atividade, com a classificação e quantificação de movimentos presentes neste modo de colheita, divididos em quatro categorias: estáticos, dinâmicos, extremos e osteomuscular de precisão. As posturas extremas foram encontradas na tarefa de descarregamento da sacola e no alcance dos frutos, com posturas de tronco em flexão acentuada e braços acima do nível dos ombros.

Figura 1. Colheita do fruto com uso de sacola.

Fonte: COSTA (2013).

De acordo com a análise cinesiológica do estudo de Costa e Camarotto (2012), a adoção de posturas extremas de tronco e membros superiores necessárias para o alcance da fruta e sua colheita, somadas ao carregamento de peso da sacola e a repetitividade dessa tarefa, assim como o esforço físico envolvido na subida e descida das árvores, podem levar a dores nas costas, ombros, braços, antebraços e membros inferiores.

Lopes et al. (2000) corroboram esses dados ao apresentar relatos de trabalhadores acerca das condições de trabalho na colheita da laranja e o desconforto sentido ao fim da jornada, em que 83% reclamam já terem sentido algum tipo de dor muscular.

O modo derriça, apesar de ser a segunda forma de colheita mais utilizada, não é incentivada pelas empresas citrícolas, devido sua relação com danos à saúde da planta e prejuízos à safra seguinte. Ele é assim chamado devido ao seu processo de retirada dos frutos estar aproximado ao tipo de prática mais utilizada na colheita das lavouras cafeeiras, em que os frutos são arrancados e liberados no solo (SILVA et al., 2006). De acordo com Costa (2013), o modo derriça apresenta maior sobrecarga física na etapa de colheita dos frutos do solo, para armazenamento na sacola, uma vez que são necessárias posturas extremas em flexão de tronco, por tempo prolongado (Figura 2).

Figura 2. Colheita com derriça.

Fonte: COSTA (2013).

A etapa de armazenamento final dos frutos ocorre da mesma maneira tanto no modo derriça, quanto no método considerado tradicional, com uso de sacola, consistindo no deslocamento do trabalhador até o bag, para despejo dos frutos da sacola (LOPES et al., 2000; COSTA, 2013). Rodrigues et al. (2008), em seu estudo, abordaram o método de colheita manual de laranja com uso de caixas plásticas ao invés de bags para armazenamento final dos frutos colhidos.

Segundo Costa (2013), a articulação da coluna, principalmente o segmento lombar, foi indicada como uma das mais afetadas e de maior desconforto no trabalho de colheita manual de laranja, estando relacionada às atividades de colheita dos frutos do chão na derriça, armazenamento dos frutos, manuseio e sustentação da sacola.

De acordo com os estudos de Granata et al. (1999) e Fathallah (2010), as condições de trabalho acima citadas, acerca da colheita manual de laranja, configuram uma condição insatisfatória de trabalho, conforme exposto pelos autores, dada a exposição do trabalhador ao desenvolvimento de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT), os quais são decorrentes de levantamentos prolongados e repetitivos de carga, identificados como um dos principais riscos de disfunções na coluna na agricultura.

A tarefa de colheita também apresenta alto teor cognitivo, com ações que demandam atenção para não ferir o fruto, tronco e galhos da planta, a fim de não prejudicar a safra seguinte; além disso, os trabalhadores não devem romper a casca do fruto, evitando para isso o arranque

do mesmo com o pedúnculo, já que este elemento pode perfurar outros frutos, quando em estoque e fase de transporte (NASCENTE et al. 2004; COSTA, 2013).

Ainda para os autores, outras orientações referem-se à retirada de frutos apenas maduros, evitar derrubar frutos no solo e realizar a tarefa de forma rápida. Com relação à higiene, os colhedores devem manter o hábito de aparar as unhas e usar luvas de algodão, reduzindo assim danos aos frutos.

Os pomares de citros apresentam duas a três floradas, ou seja, dois a três períodos de maturação diferentes, o que amplia a duração da colheita, entretanto neste último período de maturação os frutos são poucos e esparsos nas árvores, caracterizando o período de colheita chamado repasse, o qual não favorece o trabalhador, pois há grande deslocamento e baixa produtividade (BAPTISTELLA, 1998).

A variabilidade do processo de colheita também incide na forma de organização do trabalho pelos colhedores, em que optam por trabalhar de forma individual, ou em parceria. A escolha desta última, normalmente, é feita entre familiares, evitando conflitos de competição por produtividade com desconhecidos (BAPTISTELLA et al., 1996; COSTA, 2013).

O rendimento da colheita manual está relacionado com as condições de manutenção dos pomares, grau de dificuldade de colheita (declividade do terreno, densidade de plantio, altura da planta, etc), acometimento de doenças e o desenvolvimento de variedades dos frutos (TACHIBANA et al., 2002). No Brasil, estudos apontam para uma média de 80 caixas de 27,2 kg por colhedor, podendo essa quantidade variar entre 60 e 101 caixas (BAPTISTELLA et al., 1996).

Estudos internacionais mostram semelhança com o Brasil no uso da colheita manual como principal técnica de retirada dos frutos nas propriedades citrícolas. Na Espanha, o uso desse método é majoritário devido à destinação da produção para o mercado in natura (JUSTE et al., 1991; TORREGROSA et al., 2012). Por sua vez, na Flórida, apesar de testes e desenvolvimento de máquinas de colheita, ainda há a predominância do uso de escadas, característica do sistema manual, com evolução apenas do sistema de carregamento de frutos do campo para indústria e mercado (ROKA et al., 2001).