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6. CAPÍTULO VI – RESULTADOS DA PESQUISA

6.1 A FORMAÇÃO DE REDES DE EMPRESAS

6.1.1 Caracterização das redes estudadas

A formação das redes de empresas é um fenômeno que vem ocorrendo há anos no mundo empresarial. No Brasil, e mais especificamente no Rio Grande do Sul, esse fenômeno teve um grande aumento a partir do ano 2000 com o lançamento do Programa Redes de Cooperação, como uma iniciativa do estado para a formação de redes. Fato a ressaltar é que, entre as redes investigadas nessa fase, duas delas se constituíram a partir de um desmembramento de redes de cooperação formadas há alguns anos, a partir de iniciativas desse programa.

REDE 1: A primeira rede estudada teve seu início em março de 2015 com 4 empresas integrantes. Hoje, a rede conta com seis integrantes e possui uma grande perspectiva de crescimento segundo o presidente entrevistado. Essa rede, conforme destacado anteriormente, formou-se a partir do término de uma rede que a precedeu. com integrantes que dela participavam. A seguir, destaca-se um breve trecho da fala do presidente atual dessa rede, no qual ele relembra a história de sua formação.

Primeiro, surgiu a associação da rede, que foi originada por meio de um projeto de redes de cooperação do governo do estado, onde tinham professores da universidade, que eram chamados, na época, de ‘consultores’ da rede. Então, acho que foi mais ou menos em 2005, que foi fundada nossa associação de corretoras. [...] Só que o que barrou nossa rede na época foi a SUSEPE, que não permitiu que nós, por meio da

associação, cadastrássemos os seguros nas seguradoras. Me parece que só uma deu certo, mas isso não adiantava, porque nós tínhamos que trabalhar com todas as seguradoras do mercado. Daí, isso acabou desmotivando o grupo. E a gente acabou só comprando algumas coisas em conjunto para escritório, tipo A4, tinta para impressora, etc. (Pres F 1).

Segundo o presidente entrevistado, essa antiga associação acabou se desintegrando e sendo fechada. Mas, depois de 10 anos, ele e mais três empresários novamente se uniram e iniciaram atividades conjuntas em rede.

Daí, depois de 10 anos, eu e mais três que faziam parte daquele grupo acabamos criando a rede, que é a que tem hoje. Nós começamos a nos unir em março de 2015, que foi quando começou o processo de formação dela. E nós levamos quase todo o ano para fazer o nosso cadastro junto com as seguradoras que existem no mercado (Pres F 1).

O principal objetivo da constituição dessa rede é trabalhar em conjunto no cadastro de seguros para que, com isso, a rede consiga negociar melhores condições com as seguradoras, e repassar isso aos integrantes. Assim, eles conseguiriam trabalhar melhor no mercado e oferecer melhores serviços, bem como conseguir atrair novos clientes. A ideia repassada pelo presidente é que não houvesse mais uma concorrência predatória entre os integrantes da rede e que, ao unir forças, os integrantes conseguissem melhores condições de executar suas atividades.

REDE 2: A outra rede estudada, da mesma forma que a anterior, é constituída por integrantes de uma rede que foi desmembrada. Conforme a conversa com o atual presidente, a rede foi totalmente redefinida em 2013, com a celebração de um novo estatuto e com a definição de certos critérios de quem poderia participar dessa nova rede. Segundo ele, a constituição da rede pelo programa Redes de Cooperação foi válida pelo aprendizado com o consultor da universidade e pela ideia de conseguir mais competitividade trabalhando em conjunto.

Naquela época, a gente participou de uma reunião quando foi formada a rede, e o professor nos falou: “vocês vão ter que ter o diferencial em alguma coisa. Serralheiros têm muitos aí, mas vocês vão ter que ser diferente.” Então, mudamos o ambiente das nossas empresas, para melhorar a impressão do cliente quando ele chegar. Mudamos a forma de atendimento, porque antes a gente falava com os clientes sem o mínimo de qualidade. Quando alguém ligava, a gente pedia de cara: “o que tu quer”. Sem nem ao menos falar boa tarde. Começamos a organizar nossas

oficinas de trabalho e a limpá-las. Tu pode chegar lá e ver que não tem nada atirado no chão (Pres F 2).

Então, certas ideias e conhecimentos adquiridos naquela época foram válidos, contou o presidente. No entanto, a constituição da antiga rede com doze associados não deu certo, pois muitas pessoas não tinham a ideia de cooperar. Muitos buscavam apenas oportunidades para conseguirem alavancar mais seus negócios. A seguir, segue um trecho do presidente dessa rede, no qual ele fala sobre isso.

Aqui perto de mim, tem o Juca, e ele veio me falar de um cara da rede que pegou um cliente dele em frente à porta da casa quase. Fez um preço quase de custo, só para conseguir o negócio. E depois ainda fez mal feito, porque o Juca me contou que o cliente foi lá pedir para ele refazer uma coisa que o outro não fez (Pres F 2).

Fatos como esse fizeram com que a rede fosse se desintegrando até chegar ao ponto de praticamente encerrar as atividades. Foi quando o atual presidente e os outros componentes retomaram as atividades conjuntas, mas com uma nova forma de agir. A rede conta hoje com quatro integrantes e está voltada, basicamente, às ações de compra conjunta. O propósito da rede, além disso, é facilitar a troca de informações e criar um grupo de atuação conjunta baseado fortemente na honestidade e confiança entre os integrantes. As atividades dessa rede, por mais que não sejam muitas, auxiliam os integrantes para conseguirem preços de compra melhores junto aos fornecedores.

REDE 3: Outra rede pesquisada para esta parte da tese tem sua história de formação mais antiga, no entanto, passou por um processo de reestruturação parecido com o das anteriores. O trecho a seguir da entrevista com o presidente relata o início da história dessa rede.

Bom, a primeira coisa que se pensou foi em formar um escritório de compras, entre o nosso grupo, e aí surgiram ‘n’ projetos para que isso funcionasse. Seria que nem uma filial, que as mercadorias viessem aqui, para um centro e pudessem ser redistribuídas. Só que, perante a legislação, tu tens bitributação. E o governo nunca olhou isso com bons olhos, não sei o porquê. No meu ver, isso acabaria até com grande parte da sonegação de impostos, na época (Pres F 3).

Essa primeira tentativa dos empresários de criar um escritório de compras fez com que eles repensassem sua ideia e passassem a investir seus esforços na criação de uma rede. O

pensamento deles já era de constituir um grupo para trocar experiências e realizar outras atividades, como se pode ver no trecho a seguir.

Bom, então a gente criou aquele grupo e a gente percebeu que não podíamos simplesmente fazer compras em conjunto. Nós tínhamos, também, que criar a rotina de troca de informações. Então, essa troca de informações, elas vão gerando uma performance melhor na tua empresa, na minha empresa, nas tuas experiências, nas minhas experiências, e isso que estou falando só entre nós dois. Então, naquela época, isso foi em 1990, a gente percebeu isso. Alguns não aderiram ao grupo que tínhamos pensado de 20 empresas. Daí, acho que fechamos o grupo em 18 ou 16 empresas (Pres F 3).

O que acabou acontecendo, segundo a conversa com o presidente da rede, é que algumas empresas não se engajaram na ideia colocada pelo grupo de cooperação, de trabalhar em conjunto para conseguir vantagens para todos, e a rede não conseguiu crescer e desenvolver-se. O trecho a seguir da fala do presidente dessa rede, explica o porquê disso.

Bom, de tudo isso que eu estou te falando, eu quero dizer que tu precisa se aliar a pessoas honestas, transparentes. Tu não pode se aliar a pessoas que só querem tirar de ti, te sugar, que te tiram todo o teu conhecimento e não contribuir em nada. Houve casos dentro da nossa rede que tinham pessoas assim, oportunistas para colocar bem. Eles aproveitam a oportunidade para sugar, usar tudo que podiam e se achar. Só que isso não deu pra eles, porque eles, infelizmente, não foram longe (Pres F 3).

Segundo a conversa com o presidente, alguns integrantes da rede foram excluídos, e a rede foi estruturada de uma forma diferente, como o próprio presidente explica.

Então, hoje, nós temos 10 empresas, e estamos trabalhando de uma forma um pouco diferente, e retrocedemos um pouco em integrantes para reformular a rede. No ano de 2011, nós mudamos. A gente já criou uma rede com CGC, inscrição, e as outras coisas necessárias para ela funcionar (Pres F 3).

Como visto na fala anterior, essa rede conta, então, com 10 empresas, que têm como característica fundamental uma relação fortemente baseada na confiança entre os seus integrantes. A rede atua com os objetivos de proporcionar aos integrantes melhores condições para negociar com os fornecedores e conseguir informações entre os integrantes para melhorar os seus negócios.

Em geral, o que se pode visualizar dessas redes estudadas é que a estrutura de governança delas é semelhante. Todas podem ser encaixadas no modelo de rede autogerenciada por um grupo de organizações líderes destacado no capítulo III deste trabalho. Esse grupo de empresas líderes se refere, basicamente, ao presidente, vice-presidente e secretário, que são escolhidos assim que a rede é formada, com a constituição do seu estatuto.

Nesse formato, conforme descrito no capítulo III desta tese, todos os integrantes, em geral, é que acabam tomando as iniciativas de liderança dentro da rede, propondo ideias e ações a serem nela implementadas. Foi isso que se pôde perceber na fala dos presidentes entrevistados, que há o envolvimento das outras empresas integrantes na promulgação de ideias e atividades. Os trechos destacados a seguir mostram o que dois presidentes falaram quando questionados sobre essa questão.

Nós nos reunimos, pelo menos uma vez por mês, convidamos todos os corretores também, e a gente daí discute as questões, toma as decisões, vê o que está acontecendo de errado, de gerenciamento e outras questões, e o que poderia ser feito. Fizemos uma ata, e esta ata é repassada para todo mundo de maneira uniforme aprovar (Pres F 1).

Somos nós mesmos que administramos a rede. Eu sou o presidente, mas isso não interfere muito. Nós somos somente em 4 integrantes, daí a gente só vê o que cada um quer ou sugere e vai fazendo (Pres F 2).

Em relação à tomada de decisões, ficou claro, diante da entrevista com os presidentes, que estas são tomadas sempre em conjunto, sejam as decisões referentes às questões estratégicas, sejam elas referentes às questões mais rotineiras. Isso é algo característico de redes nessa fase de evolução, em que o próprio grupo gestor, por não ter experiência em lidar com questões que envolvem outras empresas, acaba não tomando as decisões isoladamente. O baixo número de empresas integrantes também possibilita esse tipo de tomada de decisões, pois obter a opinião ou decisão de cada um sobre determinado ponto é bastante facilitado.

As decisões a gente toma em conjunto dependendo do que cada um quer. Aquele um tá precisando de tal coisa, então a gente compra ou vê se dá pra fazer. A gente liga pra um e pra outro, e assim vai. Não tem muito que enrolar (Pres F 2).

No que diz respeito à estrutura de relações nessa rede, pode-se perceber um fato diferente do que descrito na literatura sobre o tema. As relações entre os integrantes,

principalmente naquelas redes formadas pelo desmembramento de uma antiga rede, são caracterizadas por laços fortes já estabelecidos entre os integrantes. Esse fato é compreensível, visto que esses integrantes já se conheciam e tiveram atividades conjuntas há mais tempo.

Por fim, em relação ao nível de competências dessas redes notou-se que é bem baixo. Era um fato esperado nessas redes por elas terem sido recentemente criadas. As atividades desenvolvidas por elas ainda são muito incipientes e sem grandes proporções devido ao pequeno número de integrantes.

A tabela 7, apresentada a seguir, resume as principais características de cada uma das redes estudadas nessa fase da pesquisa empírica do trabalho.

Tabela 7 – Características das redes estudadas na fase de formação de redes

Características Rede 1 Rede 2 Rede 3

Área de atuação Prestação de Serviço Prestação de Serviço Comércio Empresas que a compõem Corretoras de seguros Serralherias Lojas de matérias de

construção

Ano de formação 2015 2013 2010

Número de integrantes 6 4 10

Forma de governança Autogerenciada Autogerenciada Autogerenciada

Liderança e tomada de decisões Descentralizada – todas empresas participam Descentralizada – todas empresas participam Descentralizada – todas empresas participam

Relações de confiança Fortes Fortes Fortes

Fonte: elaborado pelo autor

Na continuidade da análise dos resultados, exploram-se os aspectos influenciadores da interdependência entre a rede e as empresas integrantes e vice-versa.